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15 março 2023

Sobre a quebra do SVB

No dia 10 de março, o SVB deixou, oficialmente de existir. Fazendo um retrospecto, o SVB é a sigla para Sillicon Valey Bank e sua atuação incluía principalmente uma rica região dos Estados Unidos. Foi a maior quebra de um banco daquele país, desde a crise de 2007. 

O foco de atuação do SVB eram as empresas de tecnologia. No final de 2022, a instituição tinha perdas não realizadas em valores superiores a 15 bilhões de dólares, para um patrimônio líquido de 16 bilhões. A avaliação feita pelas autoridades do Banco Central dos EUA e do FDIC - o fundo que garante os depósitos, realizada no próprio dia 10, indicava a insolvência da instituição. Neste processo, criou-se um novo banco, o Silicon Valley Bridge Bank. 

O problema com o SVB trouxe uma discussão sobre regulamentação do setor bancário (e o setor é muito regulamentado), teste de stress, a auditoria sem ressalvas da KPMG 14 dias antes da falência (Lynn Turner, que foi chefe de contabilidade da SEC no passado, diz que isto é um problema), os fundos ESG (que tinham relação com o banco), os efeitos sobre starups, a inutilidade das notas das agências de ratings, entre outros pontos.

Apesar de ser um grande banco, o SVB talvez não esteja na categoria "Grande Demais para Falir", como o Credit Suisse. Sua aposta na taxa de juros foi muito arriscada. E há aqui uma discussão sempre importante sobre o risco moral, embora Mankiw ache que isto não seja relevante.

Como ocorre em muitos casos de falência, aparecem agora as pessoas que previram os problemas, alertando para a necessidade de leitura atenta dos sinais da contabilidade. Isto pode ser uma das causas da corrida bancária que ocorreu entre fevereiro e março no SVB. (Aqui a coluna de John Cochrane, nesta linha)

Sobre a questão da auditoria é que ocorreu uma corrida bancária para sacar dinheiro da instituição a partir de fevereiro. Como a auditoria era referente a 2022, os auditores não estavam trabalhando com isto, já que seria um evento posterior. Mas deveriam destacar os riscos, mesmo depois do encerramento do exercício. Mas gostei deste trecho:

Um porta-voz da KPMG recusou-se a comentar sobre as auditorias específicas, devido à confidencialidade do cliente. Em uma declaração, a firma disse que não é responsável por coisas que acontecem depois que uma auditoria é concluída.


Maior lucro da história

 

A empresa estatal de petróleo Saudi Aramco divulgou o que talvez seja o maior lucro de uma empresa na história - sem considerar a inflação. O lucro divulgado foi de 161 bilhões de dólares, que significa 46% a mais que o ano anterior. A empresa é também a segunda empresa mais valiosa do mundo, atrás apenas da Apple. 

O gráfico acima foi feito imaginando o que a Saudi Aramco poderia comprar com este lucro. Uma combinação possível seria: Campbell's, Coinbase, Etsy, eBay, Kellogg's, Crocs, Zoom, Snap, Pinterest e Ralph Lauren.

14 março 2023

Rir é o melhor remédio

 

Excel e o copo vazio

Meta-análise na contabilidade faz sentido?

A meta-análise é um importante técnica de pesquisa, que ganhou popularidade a partir do final do século passado. Em termos científicos, a meta-análise é a tentativa de juntar pesquisas realizadas separadamente e que conduziram a determinadas conclusões. A meta-análise mostra que se pesquisas separadas podem chegar a uma conclusão, a junção dos resultados pode ou solidificar o que sabemos ou destacar descobertas que não foram vistas nas pesquisas separadas. 

A figura acima é o símbolo da Cochrane Collaboration. Entre 1972 a 1981 algumas pesquisas procuraram mensurar os efeitos dos esteroides em mulheres grávidas. Cada pesquisa trouxe um resultado, que individualmente não contribuía substancialmente para a ciência.  Cada linha do símbolo acima é uma pesquisa. Entretanto, dado o número limitado de pessoas na amostra, os resultados não eram conclusivos.

Em 1989 foi realizada uma meta-análise, juntando os dados dos experimentos. A conclusão é que o esteroide reduz o risco de que os bebês morram em razão do nascimento prematuro. Veja que no final do símbolo há um losango. A reunião dos dados de diferentes pesquisa mostrou isto. Isto tudo pode ser lido no livro Ciência Picareta, de Ben Goldacre, como um exemplo de como a ciência pode ajudar a humanidade. 

O tempo passou e hoje a meta-análise é bastante utilizada em diversas ciências. Mas a técnica, se bem usada, pode contribuir para evolução do conhecimento humano, se for usada de maneira inadequada, pode ser um problema. Recentemente, um estudo de meta-análise sobre o efeito do empurrão (nudge) ganhou destaque. Mas uma análise crítica do mesmo revelou os dois perigos da meta-análise. 

O primeiro problema é que alguns estudos são melhores do que outros. A meta-análise tende a considerar que todos estudos são bons. E isto é algo que precisa ser visto com cuidado. O estudo do empurrão, citado anteriormente, usou 283 resultados e não excluiu nenhum em razão da qualidade. É difícil imaginar que todos os estudos eram de boa qualidade. 

Há aqui também o problema do viés de publicação. Isto pode induzir a certos resultados. É bem verdade que existem técnicas para resolver em parte este problema, mas acredito que dificilmente o pesquisador conhece e aplica tais técnicas. 

O segundo problema é a possibilidade de combinar resultados que não são comparáveis. Os estudos comportamentais podem ser usar de experimentos. E cada experimento pode ter uma visão e um desenho diferente. O que torna difícil fazer comparações, ao contrário do que ocorreu com o estudo original da meta-análise. 

Estas críticas estão bem apresentadas em um texto crítico do DataColada. Veja o texto aqui

Contabilidade - Os aspectos apresentados anteriormente são válidos para a contabilidade. Veja uma questão importante para a contabilidade financeira, que poderia ser resolvida pela meta-análise: o uso das normas internacionais é bastante positiva para um país. Os estudos individuais podem ser agrupados para tentar responder a esta questão. Considere que um pesquisador investigou o caso com empresas de diversos países, que fizeram a convergência entre 2000 a 2015. E outro pesquisador fez pesquisa semelhante, com convergência entre 2005 a 2020. Havendo superposição temporal e, possivelmente entre os países, o uso da meta-análise pode levar a conclusões inadequadas, já que podemos ter um caso de dupla contagem. Este é o ponto que faz com que a meta-análise, na contabilidade financeira, deva ser considerada com cautela. 

Temos aqui uma terceira crítica ao uso da técnica, que não apareceu no texto do DataColada: a possibilidade de existir dupla contagem nas pesquisas, onde uma mesma empresa, para um mesmo período, faz parte da amostra de mais de uma pesquisa. É quase certo que isto não seria um problema na contabilidade gerencial, mas merece o cuidado na contabilidade financeira.

Assim, com respeito a pergunta do título, a meta-análise pode ser usada na contabilidade, com o cuidado indicado no texto: fazer uma análise da qualidade da pesquisa, ter o cuidado de combinar resultados compatíveis e evitar uma dupla contagem. Com o cuidado devido, a técnica pode ser fundamental para solidificar conhecimentos. Mas sem este cuidado, pode levar a conclusões inadequadas. 

(Alguns dos pontos colocados neste texto foram frutos de discussão com o mestrando Antônio, que apresentou uma visão bem madura sobre o assunto. Nesta discussão, conclui que até o presente momento não tivemos, na nossa área e no Brasil, uma pesquisa de qualidade sobre o assunto. Espero estar enganado)


13 março 2023

Bem-estar financeiro também é importante

Quando pensamos em bem-estar, frequentemente pensamos em nossa saúde, incluindo nosso estado mental. Pesquisas descobriram que a boa saúde financeira tem uma enorme influência na melhoria do bem-estar geral, enquanto a saúde financeira precária está ligada ao estresse, depressão e falta de produtividade. Pessoas que recebem informações financeiras a educação geralmente informa que se sente mais confiante, mais no controle das finanças pessoais e exibe melhores comportamentos financeiros. Também é importante observar o impacto positivo adicional que as boas finanças têm sobre a comunidade em geral e as gerações vindouras.

A economia comportamental tem sido amplamente utilizada para explicar o baixa eficácia das iniciativas de alfabetização financeira e as razões das más decisões financeiras que as pessoas tomam.


Segundo a autora, a opção é a alfabetização financeira. Muito esforço é focado nos programas, mas nem sempre é possível imaginar um sucesso na mudança no comportamento dos participantes. Vários dos programas, não levam em conta fatores psicológicos. A intenção de mudar o comportamento financeiro é importante. 

O fim é o bem-estar financeiro. 



Teóricos ou Gurus: quem está certo (ou errado) em finanças pessoais

No final do ano passado, o professor James Choi publicou um artigo no NBER onde fazia uma análise dos livros mais populares na área de finanças pessoais. Choi comparou os conselhos dos autores com as recomendações da teoria. Há algumas diferenças interessantes. Um exemplo, a teoria aconselha que uma pessoa deve tentar quitar as dívidas com elevado custo em primeiro lugar. Isto faz sentido, já que a teoria olha a taxa de juros das dívidas. Mas os gurus de finanças pessoais indicam que você deveria começar com as dívidas de pequeno montante, deixando de lado a taxa de juros. O sentido é que ao quitar pequenas dívidas, a pessoa começa a criar um hábito saudável de tentar resolver sua vida financeira. O conselho dos gurus é mais no sentido comportamental. 

Quem está certo: a teoria ou os gurus? Depende, segundo Tim Harford


Às vezes, os livros populares estão simplesmente errados. Por exemplo, uma afirmação comum é que quanto mais tempo você mantém ações, mais seguras elas se tornam. Não é verdade. As ações oferecem mais riscos e mais recompensas, independentemente de você as manter por semanas ou décadas. 

Em outro trecho do artigo de Harfor:

o conselho econômico padrão é que devemos facilitar o consumo ao longo de nosso ciclo de vida, acumulando dívidas enquanto jovens, acumulando economias na próspera meia-idade e gastando essa riqueza na aposentadoria. Tudo bem, mas a idéia de um "ciclo de vida" carece de imaginação sobre todas as coisas que podem acontecer na vida. As pessoas morrem jovens, passam por divórcios caros, deixam empregos bem remunerados para seguir suas paixões, herdam quantias arrumadas de tias ricas, ganham promoções inesperadas ou sofrem de problemas de saúde crônicos.

Não é que esses sejam resultados inimagináveis - eu apenas os imaginei -, mas que a vida é tão incerta que a idéia de alocar o consumo de maneira ideal ao longo de várias décadas começa a parecer muito estranha. O conselho financeiro bem usado de economizar 15% de sua renda, não importa o que aconteça, pode ser ineficiente, mas tem uma certa robustez.

O trabalho de Choi é bem interessante. Mas creio que supor que exista "uma" teoria talvez seja otimismo demais. 

Foto: Jannes Jacobs