Do Jornal de Negócios, por Sónia Santos Dias:
Em março de 2021, a Organização das Nações Unidas (ONU) deu um passo decisivo no sentido de valorizar o capital natural existente no mundo: adotou uma nova forma de medir índices sobre economia e ambiente. "Um passo histórico e transformador na forma como vemos e valorizamos a natureza", descreveu na altura António Guterres, secretário-geral da ONU.
Com este novo parâmetro, denominado Sistema de Contabilidade Económica - Contabilidade do Ecossistema (SEEA EA, sigla em inglês), pretende-se assegurar o reconhecimento do capital natural, como florestas, rios, oceanos, desertos, pantanais e outros ecossistemas, como valor económico de um país, fazendo assim "concorrência" ao tradicional PIB, que tem servido para medir a riqueza nas últimas décadas. Com isto, já não será possível contabilizar uma determinada destruição ambiental como progresso económico, além de que o novo quadro ajudará a reformular decisões e políticas para o desenvolvimento sustentável dos países. Os novos parâmetros deverão estar em cima da mesa para a tomada de decisões na Conferência Internacional sobre Mudança Climática, COP-26, a ter lugar em Glasgow, na Escócia, em novembro deste ano.
Quanto vale então o capital natural do mundo? Para além do índice contabilístico, na prática, são precisas ferramentas que façam essa contagem à volta do planeta. Nada que, em pleno século XXI, a tecnologia não resolva. Uma dessas ferramentas foi lançada pela ONU em abril deste ano, no seguimento do novo SEEA EA, e é sustentada em inteligência artificial. A nova ferramenta digital de código aberto permite, pela primeira vez, uma contabilidade de ecossistemas rápida, padronizada e personalizável em qualquer lugar da Terra, segundo informa a ONU.
"O ARIES para SEEA Explorer representa uma mudança de jogo para os governos que desejam implementar o padrão SEEA EA recentemente adotado", enfatizou Stefan Schweinfest, diretor da Divisão de Estatística da ONU. "Esta aplicação permite que os países deem início à compilação de contas a partir de fontes de dados globais, que eles podem refinar com dados nacionais." As contas sobre o ecossistema produzidas pelos países rastrearão a extensão, condição e serviços fornecidos pelos ecossistemas em forma de contas e indicadores físicos e monetários.
Recuperar um mundo naturalmente descapitalizado
Cerca de 30% das árvores de todo o mundo estão em risco de extinção, segundo a última estimativa da Botanic Gardens Conservation International, divulgada neste mês de setembro. No universo dos peixes de água doce, uma em cada três espécies também está ameaçada de extinção, de acordo com o relatório "Peixes Esquecidos do Mundo", publicado em fevereiro deste ano por 16 organizações internacionais de conservação. Apenas dois exemplos das grandes perdas de capital natural que estão a ocorrer em todo o planeta a uma velocidade estonteante. Por isso, a Assembleia Geral das Nações Unidas declarou 2021-2030 como a Década para a Recuperação dos Ecossistemas.
De acordo com o Programa das Nações Unidas para o Ambiente (PNUMA), a degradação dos ecossistemas marinhos e terrestres afeta de modo relevante o bem-estar de 3,3 mil milhões de pessoas em todo o mundo, e tem associado um custo anual de cerca de 10% do produto bruto do planeta em termos de perda de espécies e de serviços dos ecossistemas essenciais para a alimentação, agricultura, gestão de água, etc. A emergência de ações de restauro é, portanto, global. Assim, a nível planetário, perspetiva-se a recuperação de 350 milhões de hectares de ecossistemas e solos degradados até 2030, o que poderá gerar 9 triliões de dólares em serviços dos ecossistemas, incluindo a dissipação de 13 a 26 gigatoneladas de gases com efeito de estufa.
No espaço europeu, o Pacto Ecológico Europeu põe a preservação e a recuperação do capital natural no centro da agenda política europeia e destaca a urgência da transição para um novo paradigma de desenvolvimento. A Estratégia de Biodiversidade para 2030, parte integrante do pacto, é o braço que assume os compromissos e ações específicas para recuperar a biodiversidade do espaço europeu até 2030. Por exemplo, alargar as zonas Natura 2000 atuais, bem como restaurar os ecossistemas degradados e geri-los de forma sustentável. No âmbito deste plano, a Comissão proporá objetivos de restauração da natureza vinculativos até ao final de 2021.
Fonte: Aqui. Outra leitura sobre o tema aqui