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16 novembro 2019

Novo aeroporto do México

Este é um caso que mistura política, corrupção, custo perdido, custo planejado, controle social, lobby e outros aspectos. A história é a seguinte: no governo passado, o México decidiu construir um novo aeroporto para sua capital. O atual estava lotado, sem capacidade de expansão. Com um terço do projeto finalizado, o novo governo convocou um plebiscito. Já tinham sido gastos mais de 4 bilhões de dólares além do valor orçado para a obra. O projeto era bastante arrojado, com um formato de X:
Em lugar de tomar uma decisão, o governo convocou um plebiscito. Poucas pessoas votaram, mas a vitória foi para a opção de parar a obra. Denúncias de corrupção e problemas ambientais, além da impopularidade do ex-presidente, foram importantes para o resultado. O custo de interrupção seria de 9 bilhões, bem menor que o custo de terminar o aeroporto.

Mas a maioria dos contratos de exploração do aeroporto já tinha sido concedido, sem licitação. E o fato de Texcoco ser uma área com problemas no solo faria a alegria das empresas de manutenção.

Mesmo com este cenário, há mais de cem processos judiciais movidos por lobistas e empresas interessadas contra o cancelamento da obra e a possibilidade de construir uma obra alternativa, por um custo bem menor.

Outro aeroporto, situado a 55 quilômetros da cidade do México, foi iniciado e está previsto para ser concluído em 2022. O orçamento, mesmo depois de majorado, está perto de 5 bilhões de dólares, bem abaixo do aeroporto de Texcoco.

Há muito interesse envolvido, o que obviamente inclui o homem mais rico do México, Carlos Slim.

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Aprendizado e Transparência

Há uma investigação nos EUA se o cartão de crédito da Apple, lançado em agosto de 2019, é tendencioso contra as mulheres. As empresas de tecnologia resolveram entrar na área financeira e alguns problemas estão aparecendo. O caso mais noticiado, a moeda digital do Facebook, parece que deve encontrar mais resistências que o esperado. E agora o caso da Apple.

A empresa está oferecendo seu cartão de crédito para interessados. Mas parece que o limite para os homens é bastante superior ao das mulheres. É bem verdade que o cartão tem a chancela do Goldman Sachs, que é o responsável pela decisão. Um caso relatado no Quartz mostra um engenheiro de  software que recebeu um limite 20 vezes maior do que o da sua esposa.

O banco parece que usou um algoritmo para determinar estes limites. Mas este é um problema, pois geralmente algoritmos possuem um grave problema: a falta de transparência. Eis um trecho da Quartz

Por exemplo, em 2018, quando o Goldman quis mostrar sua capacidade quantitativa determinando o vencedor da Copa do Mundo de futebol, seus pesquisadores se voltaram para o aprendizado de máquina. Eles poderiam ter usado estatísticas básicas, mas isso não teria sido tão preciso. Os analistas quantitativos do Goldman disseram que um método de previsão que usava aprendizado de máquina era cinco vezes mais preciso do que usar uma regressão estatística mais simples.

O problema do uso de um método de aprendizado de máquina é que dificulta a explicação de como funciona uma previsão. As ferramentas de aprendizado de máquina são, na maioria das vezes, caixas pretas: prometem precisão, mas os cientistas de dados que utilizam perdem a capacidade de entender o quanto cada fator é importante para o resultado final de uma previsão (na estatística, isso é chamado de "inferência”). (...)

Como disse recentemente a matemática Cathy O'Neal à Slate, quando as empresas optam por usar algoritmos, “elas olham para o lado positivo (...) e ignoram o lado negativo, que é que eles são assumindo muitos riscos."

A ciência de dados, como um campo, tende a se concentrar em fazer previsões. Esse objetivo restrito pode levar as empresas a se distanciarem do viés ou de como elas podem explicar as metodologias de tomada de decisões para os reguladores e o público em geral. Também pode levar a uma menor consideração das deficiências de dados inseridas nos modelos algorítmicos - algumas pesquisas sugerem que a pontuação de crédito é discriminatória, e qualquer modelo que incorpore esses dados refletirá esse viés. Mas, em muitos casos, na moderna ciência de dados, se o modelo tornar uma previsão "melhor" em termos estatísticos, seus outros efeitos poderão ser negligenciados.

Rir é o melhor remédio

Fonte: aqui

15 novembro 2019

Ainda sobre Libra e as empresas de tecnologia

Sobre a questão da moeda digital do Facebook, uma reportagem do WSJ (via aqui) chama a atenção para o interesse dos gigantes em tecnologia em entrar na área financeira. O Google deverá oferecer conta corrente para as pessoas, em parceria com o Citigroup e a Universidade de Stanford. A Apple possui um cartão de crédito. A Amazon também estaria interessada em conta corrente. E o Facebook que uma moeda digital.

A abordagem do Google parece projetada para fazer aliados, e não inimigos, nos dois campos. As marcas das instituições financeiras, e não as do Google, estarão na frente das contas, disse um executivo ao The Wall Street Journal.

Problemas contábeis na Via Varejo

Dona de redes como Casas Bahia e Ponto Frio, a varejista apresentou seu quinto trimestre negativo seguido. O faturamento caiu 10,7% em relação ao mesmo trimestre do ano passado, e o prejuízo triplicou, para 244 milhões de reais, enquanto a margem operacional encolheu de 6,6% para 4,3%.

Enquanto isso, a Via Varejo disse à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) que a primeira fase das investigações de fraude reportadas ontem não encontrou irregularidades, de modo que o caso não interfere nos números apresentados.

Segundo divulgado pelo site Suno Notícias, as denúncias, recebidas internamente, teriam a ver sobretudo com gastos operacionais (batizados de Opex na linguagem financeira) sendo apresentados na forma de investimentos (batizados de Capex). A inversão entre Capex e Opex pode colocar despesas como ativos no balanço e melhorar de forma errônea o resultado.


Fonte: Aqui. Aqui também.

Benford e a qualidade das demonstrações

Existem várias ferramentas e fórmulas matemáticas diferentes que podem ser utilizadas para determinar a força das demonstrações financeiras de uma empresa. Uma das ferramentas mais intrigantes e úteis para detectar irregularidades contábeis é a fórmula matemática Lei de Benford - um conceito desenvolvido pelo físico Frank Benford na década de 1930.

A lei de Benford afirma que, em muitos tipos de dados numéricos, sejam demonstrações financeiras, números populacionais, endereços de ruas, extensão de rios, etc., ocorre um padrão previsível. Mais números começam com o dígito 1 do que começam com o dígito 2, mais começam com 2 que 3 e assim por diante. Com base nesse padrão, a distribuição do primeiro dígito em um número não é aleatória, é logarítmica, como mostrado abaixo:


Pesquisas sugeriram que a Lei de Benford pode ser usada para detectar anomalias nos dados, seja de erros de escritório, chance aleatória ou manipulação definitiva. Quando um conjunto de números que se espera conformidade com a distribuição não o fizer, isso pode ser um sinal de que há algo errado com os dados. Essa análise simples do primeiro dígito de números em um conjunto de dados pode ser usada para ajudar a descobrir fraudes e outros problemas de dados em várias instâncias, incluindo casos contábeis, científicos e legais.

Além disso, a pesquisa descobriu que as demonstrações financeiras, como um todo, estão em conformidade com a distribuição e que as divergências individuais do padrão "podem refletir a qualidade informacional das divulgações financeiras".

Com base nessa teoria, se a distribuição de números nas demonstrações contábeis de uma empresa não estiver em conformidade com a distribuição esperada de acordo com a Lei de Benford, é uma indicação de que as demonstrações contábeis dessas empresas devem ser revisadas mais minuciosamente ao avaliar a qualidade das demonstrações contábeis.

Os dígitos nas demonstrações financeiras que não estão em conformidade com a distribuição da Benford não significam inequivocamente que a fraude ocorreu. No entanto, se um indivíduo fabricar números nas demonstrações financeiras, é altamente improvável que o indivíduo possa manipular os números de uma maneira que esteja em conformidade com a Lei de Benford.

Para demonstrar a utilidade dessa estatística, considere o exemplo da Synchronoss Technologies Inc. [SNCR]. Em 2017, a Companhia divulgou uma investigação do Comitê de Auditoria que atrasou o arquivamento de seu relatório anual, uma correção de não confiança relacionada ao reconhecimento de receita que reduziu o lucro líquido em US $ 112 milhões, um ajuste necessário nas finanças relacionadas ao custo das receitas e fraquezas materiais no controle interno sobre relatórios financeiros.

As demonstrações financeiras da Synchronoss Technologies falharam em conformidade com a Lei de Benford para o exercício fiscal encerrado em 31 de dezembro de 2015 e 2017:



O desvio acentuado que ocorre em torno dos primeiros dígitos de 5, 7 e 9, em particular, deve servir como um indicador de que essas demonstrações financeiras devem ser analisadas de perto para outras anomalias. Os indivíduos que avaliam as demonstrações financeiras podem usar um desvio da Lei de Benford como ponto de partida para determinar quais empresas podem justificar um exame adicional.

Existem vários métodos para medir a aderência de uma demonstração financeira à distribuição de Benford. O Audit Analytics sinaliza desvios da Lei de Benford de duas maneiras:

Estatística Kolmogorov-Smirnoff (KS) - Determina se as demonstrações financeiras da empresa divergem da lei de uma maneira estatisticamente significativa comparando o maior desvio único a um valor crítico
Estatística Mean Desvio Absoluto (MAD) - Encontra o desvio médio da distribuição real das demonstrações financeiras da empresa para a distribuição Benford ideal

Entre o Russell 3000, examinamos empresas que não cumpriram a Lei de Benford com base em informações financeiras em seu último relatório anual e sua correlação subsequente com outros eventos contábeis notáveis ​​que são indicadores da qualidade dos relatórios, incluindo controles ineficazes de divulgação (SOX 302) ou controles internos (SOX 404), atualizações financeiras e registros atrasados.

As empresas que não obedeceram à distribuição da Lei de Benford tinham maior probabilidade de ter opiniões adversas 302 e 404, atualizações financeiras e registros tardios.

Isso indica que as empresas com demonstrações financeiras que não estão em conformidade com a distribuição da Benford têm mais chances de ter controles internos e de divulgação ruins - e ter controles ruins pode levar a resultados financeiros de baixa qualidade, devido a meios intencionais ou não intencionais. Esse tipo de ambiente geralmente leva a resultados desfavoráveis, como registros e atualizações pontuais.

Embora a Lei de Benford não deva ser usada como uma ferramenta de tomada de decisão por si só, pode ser uma ferramenta de triagem útil para indicar que um conjunto de demonstrações financeiras merece uma análise mais profunda.

Fonte: Aqui

Adeus Libra?

A moeda digital Libra começou a ser criada em 2017. Em maio de 2019 tivemos a confirmação de que o Facebook planejava lançar um moeda digital. O anúncio ocorreu em junho, com previsão de lançamento em 2020.

O entusiasmo inicial recebeu uma ducha de água fria dos reguladores. Já em julho, o Facebook reconhecia que precisava da aprovação legal. Em setembro, o próprio Zuckerberg, fundador e executivo do Facebook, indicava que esperaria a aprovação dos reguladores dos Estados Unidos. E dias depois começou a debandada das empresas que apoiavam, inicialmente, o projeto. Inicialmente, o PayPal; depois, eBay, Mastercard, Stripe, Visa e Mercado Pago.

O Financial Times afirmou

Vários deles [parceiros] também disseram que, apesar de suas ambições de promover a libra como esforço conjunto, o projeto tinha sido ligado muito fortemente ao Facebook, numa época em que a empresa está às voltas com vários escândalos de violação de privacidade e com uma enxurrada de investigações antitruste nos EUA e na Europa. (...)

A participação inicial desses membros revestiu o projeto de credibilidade pública e de viabilidade regulatória. Sem eles, o âmbito das ambições da libra talvez teria de ser corrigido. 

O título do texto do FT diz muito: Facebook subestimou peso da regulação em moeda digital. E estas incertezas regulatórias afastam os parceiros

O futuro do projeto dependerá agora em grande medida da possibilidade de ele obter as necessárias aprovações regulatórias, o que poderá envolver a implementação no formato do projeto. 

Mesmo a meta inicial de lançamento em 2020 já é questionável. Há resistências claras dos reguladores, seja por conta dos efeitos sobre a estabilidade financeira, ou em razão da privacidade dos dados. Denúncias recentes de violação de dados pessoais e disseminação de desinformação na rede social realmente não ajuda muito. Além disto, há muitas dúvidas sobre o projeto (Rudegeair, Peter; Tracy, Ryan. Facebook mantém plano de criar moeda, Valor Econômico, 24 de outubro de 2019, C3).

dúvidas como a nova moeda lidaria com questões sensíveis, como lavagem de dinheiro. O ministro das finanças da França chegou a dizer que o país não permitirá o desenvolvimento da moeda na Europa. A Bloomberg tentou executar o código da moeda e os recursos que a nova moeda teria não existem ainda. ]

Diante deste cenário, há três dias o Facebook anunciou o lançamento do Facebook Pay. Este serviço facilitaria as transações entre usuários em uma situação de compra na rede. Mas a empresa parece que não desistiu da Libra:

No post, o Facebook também foi bem claro ao dizer que essa nova plataforma não têm nada a ver com a libra, sua futura criptomoeda, ou com a Calibra wallet, a carteira virtual que a apoiará. Esses serviços terão sua própria rede separadamente.

Mas o fato disto ocorrer duas semanas depois que os “sócios” da Libra terem abandonado a empresa não parece ser coincidência. É um sistema mais “tradicional”. Será realmente o enterro da moeda digital Libra?