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26 abril 2019

A prospecção da Aramco

A Saudi Aramco é uma conhecida dos leitores do blog. Já em 2017 fizemos postagens sobre o valor da empresa, sua governança, entre outros aspectos. O tempo passou e parecia que a empresa tinha esquecido a IPO, apesar da revelação de alguns números contábeis. Parecia que realmente a IPO tinha sido cancelada. As questões políticas podem ter prejudicado os planos do governo saudita.

Nos últimos meses a empresa volta a ser notícia com três fatos: (1) expansão, com aquisição de empresas; (2) divulgação dos resultados; e (3) emissão de títulos. Vamos analisar cada um dos aspectos.

Expansão - Em março, a empresa adquiriu a Saudi Basic Industires, na segunda maior operação dos últimos tempos, no valor de 69,1 bilhões de dólares, livre de dívida. Mais recente, a empresa estaria interessada em uma emrpesa indiana.

Divulgação dos resultados - Esta talvez seja a notícia mais comentada da empresa. Mais especificamente, a imprensa destacou o lucro de 111 bilhões de dólares de 2018, o que faria a empresa mais lucrativa do mundo.

Emissão de títulos - Em lugar da abertura de capital, a Aramco emitiu bonds recentemente, com maturidade de até 30 anos. Este talvez seja o fato mais importante e iremos detalhar a seguir.

Para emitir o título, a empresa preciso de uma nota de agência de rating. O Estado de S Paulo faz uma boa análise sobre a questão do rating da

Apesar do grande lucro, a gigante estatal do petróleo foi classificada por agências de crédito em linha com a Arábia Saudita, o que significa que a economia lenta do reino pesará sobre o custo de empréstimo da Aramco.
Os ratings são considerados nível de grau de investimento e indicam baixo risco de crédito, mas as agências não deram notas mais altas à Aramco devido a fortes ligações entre o reino saudita e a empresa. Especificamente, a Fitch observou "a influência que o Estado tem na empresa ao regular o nível de produção, tributação e dividendos". Sem as interferências estatais no comando da empresa, ela estaria em nível semelhante a petroleiras como Exxon Mobil, Chevron e Shell.
A Moody's disse que a Aramco pagou US $ 58,2 bilhões em dividendos em 2018 e US $ 50,4 bilhões em 2017. Ainda não está claro como esses dividendos são distribuídos dentro da monarquia saudita e de sua família governante. Já a Fitch disse que a Aramco respondeu por cerca de 70% da receita orçamentária do governo saudita entre 2015-2017, mas não ficou claro se esse número incluía os dividendos mencionados pela Moody's.

A questão importante disto é o prêmio pago pela empresa. Na emissão de três anos, o prêmio ficou 0,55% acima dos juros dos EUA (que corresponde a 2,288%). No título de cinco anos, o prêmio foi de 0,75%. Para os títulos de 10 anos, o prêmio foi de 1,05% e de 20 anos foi de 1,4%. (Fonte aqui) Nada mal, considerando a previsão da empresa, muito embora a emissão tenha sido feita após a divulgação do resultado (onde, veremos, existe um “detalhe” importante que ficou “esquecido”). E que a empresa cancelou/adiou a oferta de ações, o que poderia sinalizar problemas.

Neste sentido, a Reuters escutou alguns especialistas que concordaram que o lançamento do bônus foi positivo para a empresa. Um CIO disse que é um “crédito fantástico”, lembrando que a empresa é parte do governo da Arábia Saudita. Mas esta questão (e o problema da governança) é muito maior no lançamento de ações, o que não seria o caso.

Razão da Emissão - A questão mais interessante é qual a razão da empresa fazer uma emissão de títulos? Afinal é a empresa com o maior lucro do mundo, que gerou um caixa livre de 86 bilhões de dólares e possuía, em 31/12/2018, 48 bilhões de dólares em caixa.

"Esse título está sendo emitido por duas razões: para estabelecer o status da Aramco como uma identidade corporativa independente e para permitir a transferência de riqueza para fora da empresa", disse Marcus Chenevix, no texto da Reuters

Continua a agência de notícia:

Muitos vêem o acordo como um exercício de construção de relacionamento com investidores internacionais antes de sua oferta pública inicial programada, prevista para o ano passado e depois adiada para 2021.

Detalhe importante - Comentei, anteriormente, sobre um detalhe "esquecido" do resultado da empresa. Este detalhe é a alíquota do imposto de renda. Até 2017, o percentual da alíquota era de 85%. Recentemente o governo reduziu a alíquota para 50% (veja o prospecto, onde isto está dito).

Agora imagine um governo cuja a principal fonte de renda é uma empresa que paga 85% do seu lucro. De um exercício para outro a alíquota é reduzida. Usando a alíquota de 85%, a Aramco deveria ter um tributo de 181 bilhões de dólares, reduzindo seu lucro para 31 bilhões. Ou seja, o governo abriu mão de 80 bilhões de dólares de receita tributária. (Para fins de comparação, o PIB da Arábia Saudita é de 680 bilhões. Ou seja, "perdeu" 12% do PIB de receita)

A questão da governança aqui torna complicada esta questão. Se o dinheiro não foi para o governo, foi para o acionista, que é ...

Big Data e Ciência

Zhang mostra com a grande presença de dados criou uma crise na ciência. O seu argumento parte de uma história envolvendo o estatístico Ronald Fisher. Uma senhora fez uma afirmação de que seria capaz de separar corretamente uma bebiba. Usando oito xícaras, Fisher distribuiu xícaras aleatoriamente para que a senhora provasse, sendo quatro de um sabor e quatro de outro. Lidando com uma distribuição hipergeométrica, ao acertar todos as xícaras, Fisher calculou que a chance do acerto ser por advinhação seria de 1,4%.

O processo usado por Fisher corresponde a construir uma hipótese, coletar dados e analisar o resultado. O problema é que o grande número de dados torna difícil fazer isto nos dias atuais.

Por exemplo, os cientistas podem agora coletar dezenas de milhares de expressões genéticas de pessoas, mas é muito difícil decidir se alguém deve incluir ou excluir um gene em particular na hipótese. Nesse caso, é atraente formar a hipótese baseada nos dados. Embora tais hipóteses possam parecer convincentes, as inferências convencionais dessas hipóteses são geralmente inválidas. Isso ocorre porque, em contraste com o processo do “de degustação da senhora”, a ordem de construir a hipótese e ver os dados se inverteu.

Se um cientista hoje usar 100 senhoras que não sabem distinguir o sabor após provar todas as oito xícaras. Mas existe uma chance de 75,6% de pelo menor uma pessoa advinhar, por sorte, o sabor. Se a análise fosse feita somente para esta pessoa, poderia concluir que ela tem condição de fazer a distinção entre os sabores. O problema é que o resultado não é reproduzível.

Se a mesma senhora fizesse o experimento novamente, ela provavelmente classificaria os copos erroneamente - não tendo a mesma sorte que na primeira vez - já que ela não poderia realmente dizer a diferença entre eles.

O exemplo mostra como algumas pesquisas, nos dias atuais, dependem de “sorte” para produzir resultados desejados.

Conta no Instagram fiscaliza gasto caros de pastores


  • Uma conta do Instagram está postando fotos de pastores dos EUA com suas roupas de grifes
  • E o valor de cada produto

Uma conta do Instagram, denominada PreachersNSneakers, está provocando uma mudança de comportamento de um grupo de pessoas: pastores de igrejas. Nos Estados Unidos, não no Brasil. A conta basicamente posta fotografias de pastores de celebridades usando roupas de grife caras. Ao lado, o custo de cada material. Veja uma postagem do pastor John Gray com um tênis que custa 5,6 mil dólares ou quase 22 mil reais.

Os pastores e seguidores mais fieis dizem que são presentes que ganham ou que são compras realizadas com dinheiro que obtiveram. Mas não deixa de ser um gasto frívolo e esbanjador, usualmente condenado por muitas religiões. Vários dos pastores possuem amizade com celebridades, como Chad Veach, amigo de Justin Bieber. Alguns deles mudaram suas contas no Instagram.

Fonte: Oh No They didn´t  (um site sobre celebridades)

Rir é o melhor remédio

Amém.

25 abril 2019

Contabilidade e Eleições: Demonstrações de 2018 - Parte 6


Se você chegou até aqui, lendo todas as postagens, deve ter notado um aspecto importante: um grande destaque dos relatórios foi a greve dos caminhoneiros. Qual a razão?

Contabilidade e Eleições: Demonstrações de 2018 - Parte 5

  • Usando os dados de algumas demonstrações com exercício findo em 31/12/2018, o blog fez uma seleção de trechos onde alguns dos fatos que ocorreram no ano foram considerados por parte das empresas. 
  • Começamos com as eleições e na parte 1 já demos os parabéns para as empresas que não ignoraram o fato político. 
  • Na segunda parte comentamos como algumas empresas aproveitaram da eleição. 
  • Na parte 3 comentamos que algumas empresas fizeram comentários otimistas e poucas foram pessimistas/realistas. 

Nesta análise merece destaque o relatório da Sabesp, que apresentou como as eleições são relevantes em uma empresa com propriedade do estado. O trecho é longo, mas vale a pena:

Refletindo as mudanças no ambiente governamental motivadas pelas eleições para governador do estado e para a presidência da república, em 2018 a alta direção da Companhia passou por duas alterações relevantes. A primeira em maio, quando a Sra. Karla Bertocco assumiu a posição de presidente da Sabesp, em substituição ao Sr. Jerson Kelman. A segunda ocorreu em dezembro, quando a Sra. Karla deixou o cargo que, no início de janeiro de 2019, passou a ser ocupado pelo Sr. Benedito Braga. (...) A empresa [sobre a Lei Estadual 16.525 que criou uma empresa para exercer o controle acionário da Sabesp] ainda não foi criada e, devido às eleições para o governo estadual no segundo semestre de 2018, a operação foi suspensa e a Companhia está atualmente aguardando orientações do Conselho Diretor do Programa Estadual de Desestatização. (...) Em meio a um ambiente político bastante incerto em função das eleições para os governos estadual e federal, a Companhia  registrou  o  início  de  mais  uma  parceria  histórica:  um  acordo  com  o  Município  de  Guarulhos  para  equacionamento da dívida com a Sabesp e a transferência da operação dos serviços de água e esgoto do município para a Companhia. (...) Na Renda Fixa, preponderaram as estratégias focadas em títulos públicos federais, que se valorizaram pelo  resultado  das  eleições  presidenciais,  considerando  favorável  pelos  agentes  de  mercado  a  uma agenda de reformas e de cunho liberal. 

Observe que o trecho fala na mudança da gestão - em razao da política do estado - e incerteza quanto as alterações societárias.

Contabilidade e Eleições: Demonstrações de 2018 - Parte 4


  • Usando os dados de algumas demonstrações com exercício findo em 31/12/2018, o blog fez uma seleção de trechos onde alguns dos fatos que ocorreram no ano foram considerados por parte das empresas. 
  • Começamos com as eleições e na parte 1 já demos os parabéns para as empresas que não ignoraram o fato político. 
  • Na segunda parte comentamos como algumas empresas aproveitaram da eleição. 
  • Na parte 3 comentamos que algumas empresas fizeram comentários otimistas e poucas foram pessimistas/realistas. 


Agora vamos destacar as empresas que enfatizaram os efeitos da eleição no desempenho da empresa ou da economia. A Moinho Paulista enfatiza o efeito na economia:

O ano de 2018 foi marcado por eventos extraordinários  como  a  greve  dos caminhoneiros,  importante  desvalorização cambial, grandes aumentos nos preços de trigo e eleições gerais, que afetaram o crescimento da economia brasileira. 

Achei bem interessante a redação da Mills Estruturas:

Outros fatores que contribuíram para os desafios de 2018 eram exógenos à nossa indústria com ano de eleição presidencial, bem como com uma greve de caminhoneiros no meio do percurso. 

A Votorantim o efeito sobre o setor:

O  gradual  processo  de  recuperação  da  economia  nacional,  em  ritmo  abaixo  do  esperado  após  a  greve  dos caminhoneiros  e  as  incertezas  decorrentes  das  eleições,  impactou  as  vendas  de  cimento  no  Brasil

A BB Investimento foi mais “econômica”:

Adicionalmente,  as  incertezas  atreladas  ao  processo  eleitoral  tiveram  impactos  adversos  sobre  o  nível  de  investimentos  e  as  expectativas  das  famílias.

A Alupar foi mais genérica:

No cenário doméstico, o ano foi impactado pela greve dos caminhoneiros e pelas incertezas das eleições presidenciais.

e a Restoque bem específica, comentando sobre seu resultado:

Alinhado  com  esse  resultado,  a  Companhia  obteve  um  lucro  líquido  de  R$  103,5  milhões, apesar do impacto não recorrente de R$ 18,2 milhões de variação cambial ligado ao cenário de maior volatilidade neste ano de eleições. 

A Concessionária Auto Raposo Tavares (e a Invepar, pois os trechos são iguais) tratou do efeito sobre uma variável, o fluxo de veículo:

Ainda de acordo com a ABCR, o desempenho do fluxo de veículos foi prejudicado pelos choques negativos que afetaram a economia no ano de 2018, como a indefinição política causada pelas eleições, a greve dos caminhoneiros e pela conjuntura internacional menos favorável às economias emergentes. 

O Iguatemi já foi “heróico”. Diante dos problemas, que incluiu as eleições, mesmo assim eles foram capazes de entregar bons resultados:

O ano de 2018 foi desafiador. Apesar de uma economia ainda fragilizada que cresceu menos do que se esperava  no  início  do  ano  e  de  alguns  eventos  pontuais  que  trouxeram  bastante  volatilidade  (Copa  do mundo, greve dos caminhoneiros, eleições) fomos capazes de entregar um crescimento de 18% do nosso Lucro Líquido e seguir na trajetória de redução do endividamento da companhia. 

A equação “eleição = incerteza” também foi destacada pela Coelba:

Em 2018, a economia brasileira foi marcada pelo baixo crescimento e por grandes incertezas geradas tanto por eventos internos quanto externos. Externamente, a guerra comercial entre EUA e China e o aumento da taxa de juros americana pelo FED desaceleram a economia mundial. Internamente, a greve dos caminhoneiros e as incertezas sobre as eleições frustraram as expectativas de crescimento. 

E na Telefônica:

O ambiente doméstico em 2018 foi marcado por incertezas políticas em função da eleição presidencial, enquanto o ambiente externo tornou-se gradativamente menos favorável às economias emergentes, com a normalização da política monetária nos países avançados e em meio a tensões comerciais entre EUA e China. 

Algo na mesma linha da Notre Dame (e BCBF Participações, já que os trechos são iguais)

Apesar da instabilidade política gerada pelas eleições em 2018, o Brasil assistiu a uma continuidade no processo de melhoria dos principais indicadores macroeconômicos, todavia longe do potencial de crescimento do país. 

A Slaviero, apesar de fazer um vinculação com as eleições, foi menos simplista:

Ao longo do ano de 2018, o cenário político permaneceu agitado em decorrência do cenário das eleições Presidenciais, Governadores e Congresso Nacional, bem como a continuidade de denúncias envolvendo os poderes executivo, legislativo e algumas companhias e órgãos da administração pública. Esses acontecimentos trouxeram incertezas no cenário econômico prejudicando assim o desenvolvimento do País.

Na mesma linha, a SER faz uma análise onde as eleições é uma parte da equação:

Já no segundo semestre do ano, o setor de ensino superior também apresentou retração de demanda, novamente em função de um desempenho anêmico da economia a partir de junho, dessa vez por conta de eventos como a greve dos caminhoneiros, Copa do Mundo e eleições para presidente da república e governadores dos estados, eventos extemporâneos que acabaram por reduzir a demanda durante o segundo semestre do ano. 

A Estácio foi concisa, mas também no mesmo sentido:

Adicionalmente, outros fatores como a eleição presidencial e a greve dos caminhoneiros contribuiu para restringir o avanço da recuperação econômica.

Ainda na linha “incerteza = eleição”, um trecho da Weg parece indicar que a recuperação lenta foi em decorrência das eleições:

No Brasil, apesar dos juros e da inflação estarem nos níveis mais baixos dos últimos anos, o desempenho econômico foi marcado por uma recuperação lenta, influenciados principalmente pelas incertezas na política com as eleições presidenciais e a paralisação dos caminhoneiros, que afetaram a produção, o consumo e o PIB. 

O Banco Rendimento foi dramático na sua análise:

O ano de 2018 foi marcado por extrema volatilidade. Apesar de ter começado com uma certa estabilidade e prometendo a retomada do crescimento depois de um longo período de recessão, as denúncias de corrupção, a greve dos caminhoneiros e as eleições gerais no segundo semestre praticamente paralisaram a economia nacional.

A Ultrapar faz uma análise um pouco diferente. Parecia que o país estava bem até meados do ano e depois da greve dos caminhoneiros ocorreu redução no crescimento até as eleições.

Esse problema, aliado às incertezas das eleições majoritárias, levou o Brasil a ter um crescimento apenas moderado em 2018. O ano de 2018 foi marcado pela greve dos caminhoneiros, que paralisou o país e impactou diversos setores da economia, reduzindo a intensidade da recuperação da atividade econômica brasileira observada até meados de maio, com reflexos negativos nos índices de confiança dos consumidores e dos empresários, que voltaram a apresentar crescimento após a definição das eleições nacionais.

Para terminar esta postagem, a única empresa que enxergou a polarização dos sentimentos por conta das eleições foi a T4f:

No Brasil, fomos afetados pelos acontecimentos da Greve dos Caminhoneiros, seguido pela Copa do Mundo, e, no último semestre, pela forte polarização das eleições, que concentraram as atenções da mídia e, consequentemente, do nosso público. (...) É importante lembrar que, conforme explicamos anteriormente, em 2018 fomos impactados por uma redução na demanda por ingressos de música ao vivo a partir de junho, que acreditamos ser consequência dos eventos da Greve dos Caminhoneiros (Brasil), seguida pela Copa do Mundo, a crise na Argentina e pela forte polarização das eleições no Brasil.