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25 abril 2019

Contabilidade e Eleições: Demonstrações de 2018 - Parte 3


  • Analisamos as demonstrações contábeis de 2018 e como as empresas trataram as eleições
  • Na postagem anterior, comentamos três casos de empresas que "aproveitaram" das eleições
  • Na primeira postagem informamos que a maioria das empresas ficaram silenciosas sobre o assunto

É interessante notar que encerradas as eleições qual foi a percepção das empresas sobre o novo cenário. Algumas empresas indicaram que as incertezas iriam continuar. Outras, que encerrado o processo teríamos um novo ciclo de otimismo.

Entre os otimistas, algumas entidades onde o governo atua fortemente, como as filiais do BB:

BB Investimento - Passadas  as  eleições,  ocorreu  uma  nítida  recuperação  dos  níveis  de  confiança  de  consumidores  e  empresários,  tendo  em  vista  o  comprometimento do governo eleito com as reformas estruturais necessárias para reequilibrar as contas públicas e, consequentemente, colocar o País de volta numa trajetória de crescimento sustentado. 

BB Seguridade - Tal desempenho é em grande parte justificado pela retração de 7,7% nas contribuições de previdência aberta, segmento que foi impactado pelo ambiente de indefinição que perdurou até as eleições de outubro de 2018 e limitou a captação para produtos de longo prazo, além de um nível de desemprego ainda elevado. 

Brasilprev - Após as eleições, os pronunciamentos do governo eleito aumentaram a percepção de que as reformas, em especial da previdência, poderão ter uma tramitação mais acelerada, buscando a melhoria das condições fiscais do Brasil e boas perspectivas de crescimento econômico sustentado.

Algumas entidades apresentaram uma análise positiva para os próximos dias (após 31/12). Eis o caso da Metalfrio:

Tendo navegado com sucesso através da turbulência de múltiplas eleições presidenciais em muitos dos nossos principais mercados durante 2018, esperamos padrões de demanda mais normalizados nos próximos trimestres. Continuamos atentos aos desafios externos, como a volatilidade cambial e as pressões inflacionárias, que provavelmente continuarão no curto prazo, bem como as tensões comerciais atuais e os desdobramentos macroeconômicos que causam incerteza no mercado.

[Adorei o "tendo navegado"]

O Bancoob faz uma longa análise, mas com um enfoque otimista após a eleição. A entidade chega a usar o termo otimismo:

A inflação seguiu baixa, a taxa de juros nos mínimos históricos, houve recuperação moderada do crédito, as contas externas permaneceram sólidas, a taxa de desemprego apresentou redução modesta e os índices de confiança melhoraram, principalmente após o desfecho do processo eleitoral. (...) Com o término do processo eleitoral houve uma melhora dos indicadores, embora de forma desigual. (...) Em suma, o ano de 2018 foi marcado por maior instabilidade nos mercados e aumento da apreensão entre os agentes econômicos, seja por fatores externos ou internos. A piora do ambiente externo e a tensão pré-eleitoral acentuaram a volatilidade e pressionaram os ativos do país, movimento parcialmente revertido apenas com o desfecho das eleições. Embora persistam dúvidas quanto à governabilidade durante este novo mandato, a visão de continuidade da agenda liberal e do apoio às reformas necessárias – principalmente de cunho fiscal – proporcionou a melhora da confiança da sociedade na parte final do ano. O maior otimismo, seja de consumidores, empresários e investidores, representa um importante ponto de partida para 2019.

A empresa BRMalls acredita que após as eleições haverá expectativas de melhorias estruturais:

O ano de 2018 também se mostrou mais um ano desafiador para o varejo, com eventos atípicos como a greve dos caminhoneiros e a incerteza das eleições, mas terminou com expectativas de melhorias estruturais importantes para os próximos anos. 

O mesmo ocorreu com a Santos Brasil. Sua análise associa o otimismo com a nova equipe econômica anunciada:

Em 2018, o período que antecedeu a eleição presidencial foi marcado por incertezas políticas que impactaram o rumo da economia e, especialmente no nosso negócio, em conjunto com uma maior volatilidade cambial, arrefeceram a movimentação e armazenagem de contêineres então estimadas para os meses de novembro e dezembro. Com o fim das eleições e a divulgação das equipes que formariam os pilares do novo Governo Federal, principalmente a econômica, começou a aflorar um maior otimismo em relação ao futuro da economia doméstica. 

Já a Telefônica deixa implicito que o motivo do otimismo foi o candidato que saiu vitorioso nas urnas:

No ambiente doméstico, o ano foi marcado por dois grandes desafios: a greve dos caminhoneiros, que paralisou diversos segmentos no segundo trimestre e afetou a atividade econômica, e, em seguida, a eleição presidencial, que gerou elevadas incertezas diante de uma disputa polarizada da qual o candidato de viés liberal, Jair Bolsonaro, saiu vitorioso. Isso foi positivo para as perspectivas de continuidade das reformas econômicas ao longo deste novo ciclo presidencial.

Da mesma forma, a EDP faz uma associação entre um otimismo e a vitória de Bolsonaro nas urnas:

No cenário político nacional, as eleições presidenciais, que culminaram com a vitória de Jair Bolsonaro, trouxeram fôlego e expectativas para retomada do crescimento do país. 

A Cielo também indica redução de incerteza após as eleições:

No campo econômico e político, tivemos o início de um processo gradual de retomada do crescimento, com redução dos níveis de incerteza, passadas as eleições presidenciais. 

A Fábrica Carioca de Catalisadores também é otimista, mas associa uma recuperação com o fim do processo político eleitoral:

Em 2018, diante do cenário macroeconômico, no Brasil, a atividade econômica retomou a trajetória de recuperação, embora ainda lenta, mais com a redução dos níveis de incerteza, passadas as eleições presidenciais.

Mas existem exceções. Destaco em particular duas empresas. A TOTVS reconhece a popularidade dos novos governantes, mas vê desafios de um congresso com muitos partidos e coloca o termo nova política entre aspas, como se duvidasse da sua existência. Nós também.

Passadas as eleições, o Brasil entra em uma nova fase política, caracterizada pela renovação no ambiente legislativo, intensa fragmentação partidária e a tentativa de implementação de uma ‘nova política’ pelo Executivo. Embora com alta popularidade, a governabilidade de Jair Bolsonaro pode enfrentar desafios com os mais de 30 partidos no Congresso. 

Outra empresa que está receosa é a Embraport:

As expectativas foram piorando com a economia mostrando um ritmo mais fraco do que o esperado, sobretudo, pela incerteza com o futuro político do país e qual seria a agenda econômica adotada pelo novo Governo. A greve dos caminhoneiros também contribuiu para a piora da previsão de crescimento da economia no ano, que recuou para 1,3%.  (...) Após a vitória de Bolsonaro, chegou a recuar abaixo de R$ 3,70, mas termina o ano ao redor de R$ 3,90 em meio às incertezas com o xadrez político e o cenário externo. 

A Claro apresentou um texto isento. Mas associou economia com baixo crescimento e eleição. Pelo menos até setembro:

O país começou 2018 com a economia em lenta recuperação e expectativas positivas, apesar dos temores por se tratar de ano de eleição presidencial. As expectativas, no entanto, foram piorando devido à incerteza com o futuro político do país e à insegurança de qual seria a agenda econômica de um novo governo. Essa lentidão na recuperação da economia manteve-se ao longo do ano, agravada pela greve de caminhoneiros, que praticamente paralisou o país no primeiro semestre. Só a partir de setembro é que a corrida presidencial começou a demonstrar qual seria a tendência mais provável do desfecho eleitoral. 

Contabilidade e Eleições: Demonstrações de 2018 - Parte 2


  • Pesquisamos as demonstrações contábeis de 2018 para ver como as empresas trataram as eleições
  • Nesta postagem, mostramos três casos de empresas de "aproveitaram" as eleições

Usando os dados de algumas demonstrações com exercício findo em 31/12/2018, o blog fez uma seleção de trechos onde alguns dos fatos que ocorreram no ano foram considerados por parte das empresas. Começamos com as eleições e na parte 1 já demos os parabéns para as empresas que não ignoraram o fato político.

Nesta segunda parte gostaríamos de destacar as empresas que “aproveitaram” as eleições de alguma forma. Este é o caso da Votorantim, da TOTVS e da Burguer.

A Votorantim aproveitou o seu nome, que começa com Voto, e o fato de estar fazendo 100 anos, para criar uma campanha de voto consciente:

Várias ações foram promovidas em 2018 para celebrar os 100 anos da Votorantim. Como o centenário coincidiu  com  um  ano  de  eleições  gerais  para  o  Brasil,  a  Votorantim  decidiu  reforçar  seu  papel  de  empresa  cidadã  e  apoiou  o  voto  consciente,  por  meio  da  plataforma  “Guia  do  Voto”,  que  inclui  um livro sobre o processo eleitoral e as funções de cada cargo eletivo, e ainda um site e aplicativo para fomentar,  de  forma  ideologicamente  neutra  e  apartidária,  a  reflexão  e  a  consciência  dos  eleitores  no processo de escolha dos candidatos. (...) O  ano  de  eleições  gerais  do  Brasil,  marcadas  por  uma  renovação  importante  de  eleitos  e  partidos,  coincidiu com o de nosso centenário. A Votorantim sempre foi muito convicta de seu papel cidadão e  por  isso  promoveu  uma  campanha  publicitária  em  favor  do  voto  consciente.  Aproveitando  o  fato  de  que  “Votorantim”  tem  no  início  do  seu  nome    a  palavra  “voto”,  criamos  o  mote  “Eu  voto”  e  o utilizamos  em  temas  que  são  essenciais  para  o  País,  como  a  educação,  a  natureza  e  as  pessoas.  Além da campanha publicitária, desenvolvemos o “Guia do Voto”, um aplicativo com conteúdo voltado para o exercício da cidadania.

A TOTVS também fez uma campanha sobre o voto:

2018 foi um ano importante para a democracia brasileira, com intensa participação e reflexão social sobre a política e o futuro da nação, com as eleições presidenciais. Neste período, sendo a TOTVS um relevante ator do setor brasileiro de tecnologia, não se manteve alheia às discussões e buscou estimular o engajamento cidadão de seus profissionais, instigando a todos, através da campanha #VOTOCONSCIENTE, quanto ao seu papel neste processo de construção de uma sociedade melhor.

Finalment, a BK Brasil também usou as eleições para suas campanhas:

Entre os destaques estão a campanha “Whopper em Branco”, realizada durante as eleições presidenciais, e a campanha do “Saiba a Diferença”, que mostrou a diferença entre preconceito e opinião.

Contabilidade e Eleições: Demonstrações de 2018 - Parte 1


  • Apresentamos várias postagens sobre como as empresas comentaram sobre as eleições de 2018 nas suas demonstrações contábeis
  • Nesta postagem, destacamos que a maioria sequer mencionou este fato

As demonstrações contábeis devem procurar relatar o que ocorreu com uma determinada empresa. Entre as informações prestadas existem possibilidades da gestão informar como o ambiente externo afetou o desempenho e algumas das decisões tomadas.

Usando os dados de algumas demonstrações com exercício findo em 31/12/2018, o blog fez uma seleção de trechos onde alguns dos fatos que ocorreram no ano foram considerados por parte das empresas.

Vamos começar com as eleições presidenciais. Este é um assunto delicado, já que as empresas tendem a evitar tomar partido de uma determinada corrente. Mesmo assim, algumas empresas dedicaram algumas linhas ao assunto. Em alguns casos a palavra foi citada, mas associada a eleição do Conselho de Administração ou outro assunto interno. Deixamos de lado isto, assim quando aparece um termo associado a “escolha”.

É importante salientar que as empresas citadas estão de parabéns. Ignorar um fato político tão relevante é uma atitude ruim. Ser genérico, falando em “incertezas” também não ajuda, já que sempre teremos incertezas no cenário econômico e político. Esta foi a atitude da maioria das grandes empresas brasileiras que divulgaram balanço: esconder o fato “eleição” como se não tivesse existido. E corresponde também a uma das principais conclusões que chegamos ao olhar as demonstrações contábeis.

Um caso curioso. O Santander Capitalização (assim como a Evidence Previdência) não falou das eleições no Brasil. Mas falou das eleições na Argentina. Aparentemente este fato é mais relevante que as nossas eleições. Veja o trecho:

Contudo, o Banco pondera que o ambiente internacional ainda deverá ser fonte de preocupação, com novos eventos importantes já programados e com potencial de adicionar nervosismo aos mercados, tais como a conclusão do processo de saída do Reino Unido da União Europeia (Brexit) e a eleição presidencial na Argentina. Nesse contexto, o Santander acredita na possibilidade de que o ambiente internacional acabe se sobrepondo levemente ao quadro doméstico e provoque elevação branda do risco-país. 

Rir é o melhor remédio


24 abril 2019

Ilusão Monetária na precificação de ativos

Resumo:

Nominal stock prices are arbitrary. Therefore, when evaluating how a piece of news should affect the price of a stock, rational investors should think in percentage rather than dollar terms. However, dollar price changes are ubiquitously reported and discussed. This may both cause and reflect a tendency of investors to think about the impact of news in dollar terms, leading to more extreme return responses to news for lower-priced stocks. We find a number of results consistent with such non-proportional thinking. First, lower-priced stocks have higher total volatility, idiosyncratic volatility, and market betas, after controlling flexibly for size. To identify a causal effect of price, we show that volatility increases sharply following pre-announced stock splits and drops following reverse stock splits. The returns of lower-priced stocks also respond more strongly to firm-specific news events, all else equal. The economic magnitudes are large: a doubling in a stock's nominal price is associated with a 20-30% decline in its volatility, beta, and return response to firm-specific news. These patterns are not exclusive to small, illiquid stocks; they hold even among the largest stocks. Non-proportional thinking can explain a variety of asset pricing anomalies such as long-run and short-run reversals, as well as the negative relation between past returns and volatility (i.e., the leverage effect). Our analysis also shows that the well-documented negative relation between risk (volatility or beta) and size is actually driven by nominal prices rather than fundamentals.

Fonte: Can the Market Multiply and Divide? Non-Proportional Thinking in Financial Markets with Richard Townsend .

Convergência e Divergência no Emprego


  • Até o término da recessão econômica, o desempenho do emprego na economia era parecido com o do setor contábil 
  • Recentemente, os números começaram a divergir

A partir dos dados do emprego formal da economia e dos dados do setor contábil - considerando aqui contadores e auditores, técnicos e escriturários - fiz a correlação entre estas duas variáveis para os últimos 24 meses. Assim, em janeiro de 2016 eu calculei a correlação entre a economia e o setor contábil, considerando de fevereiro de 2014 a janeiro de 2016. O resultado foi de 0,97, indicando que existia uma relação muito forte entre o que estava ocorrendo na economia e o resultado do setor contábil. Fiz isto para os meses seguintes, até março de 2019 - que corresponde ao período entre abril de 2017 a março de 2019. O resultado, sob a forma gráfica, está a seguir:

É possível notar que a relação entre o desempenho da economia e do setor contábil foi bastante próxima até início de 2018. Se em janeiro de 2018 a correlação era de 0,91, no mês seguinte caiu para 0,89. Em março de 2018 foi para 0,87, depois para 0,83 e assim por diante. Em novembro a relação ficou em -0,51. O sinal negativo é importante que mostra que nos últimos 24 meses, terminados em novembro, enquanto o desempenho era bom na economia, os números eram ruins na contabilidade. E poderia ser vice-versa, mas este não é o caso.

Ou seja, o desempenho do setor contábil descolou da economia nos últimos meses. Isto já tinha sido constatado em algumas postagens de fizemos ao analisar os números do emprego formal aqui no blog.

Emprego no Setor Contábil em Março


  • Em março ocorreu uma redução de 1.147 vagas no setor contábil. Os números foram ruins para ambos os sexos, qualquer grau de instrução e para qualquer ocupação
  • Em termos acumulados, são 41.425 vagas a menos

Em março foram admitidos 9.528 novos empregados no setor contábil no Brasil. Em compensação, o número de demitidos foi de 10.675, indicando uma redução de vagas de 1.147 somente no mês. Com isto, desde janeiro de 2014, são 41.425 vagas que foram fechadas. Em termos acumulados, este número só é pior que dezembro de 2017. Como em geral o próximo mês, abril, geralmente a variação no mercado de trabalho formal no setor contábil é negativa, é possível que este patamar negativo seja superado.

Os números também foram negativos para a economia como um todo, com 43.196 contratações a menos que demissões. Um número ruim para o governo.

No desempenho da contabilidade, os admitidos tinham um salário médio de R$2313 e os demitidos um salário de R$2763, uma diferença de quase 20%. O tempo de emprego daqueles que foram demitidos era de 36,46 meses, um número elevado em relação a uma média histórica, mas dentro do normal quando consideramos os últimos meses. Os admitidos tiveram, em março, uma idade média de 30,83 anos, um valor que está aumentando nos últimos meses.

Os números de março foram ruins para ambos os sexos, para qualquer grau de instrução e para qualquer ocupação. Nos últimos meses, os trabalhadores com curso superior e escriturários foram poupados dos cortes, o que não ocorreu no mês em análise.

O gráfico mostra o comportamento ao longo do tempo do índice de emprego/desemprego.