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27 fevereiro 2019

Viagens acadêmicas


  • Gerhards propõe a redução no número de viagens acadêmicas para ajudar na redução da emissão de CO2
  • Na proposta, redução dos membros de conselhos e comissões, uso de tecnologia, pagamentos compensatórios e evidenciação do número de viagens
  • Na prática, no Brasil, esta redução já esta ocorrendo

O professor de sociologia Jurgen Gerhards defende a posição de que os acadêmicos deveriam reduzir o número de viagens realizadas. Uma vez que as viagens aéreas contribuem com a emissão de CO2 e estudantes e docentes estão entre aqueles que viajam com frequência, Gerhards propõe algumas medidas para reduzir este número de viagens:

(a) redução dos membros dos conselhos consultivos e comissões acadêmicas
(b) usar tecnologia de videoconferência em palestras e reuniões
(c) fazer pagamentos compensatórios dos danos ambientais
(d) evidenciar o número de voos realizados nos últimos anos para que a comparação entre as universidades criasse pressão para reduzir as viagens.

Dois comentários sobre a proposta. Em primeiro lugar, creio que o número de viagens já reduziu, pelo menos no Brasil, em razão do uso de tecnologias e restrição orçamentária. No passado, toda comissão examinadora de mestrado e doutorado tinha pelo menos uma passagem aérea. Nos dias atuais, os participantes preferem ficar na sua cidade. Em um programa médio de pós-graduação isto significa pelo menos 10 passagens por ano. O segundo aspecto é reduzir os incentivos para participação em congressos e eventos acadêmicos. Entretanto, estes eventos são importantes como ponto de encontro e discussão entre os cientistas.

Rir é o melhor remédio


26 fevereiro 2019

Economia e fragilidade das empresas

  • Uma pesquisa investigou a relação entre a economia de mercados emergentes e a fragilidade das empresas
  • Há uma relação entre as variáveis, sendo que tamanho da empresa parece ser relevante para as conclusões
  • Foi usado o índice Z de Altman para mercados emergentes e empresas brasileiras faziam parte da amosta

Uma pesquisa muito interessante relacionou dados de milhares de empresas de mercados emergentes com a fragilidade financeira de mercados emergentes. Usando o índice Z de Altman para mercados emergentes, Laura Alfaro, Gonzalo Asis, Anusha Chari e Ugo Panizza recentemente publicaram um Working Paper indicando que há uma relação entre as flutuações econômicas dos países e as finanças corporativas. Quatro conclusões da pesquisa:

O tamanho da empresa desempenha um papel importante na relação entre alavancagem, fragilidade da empresa e taxa de câmbio.
A relação entre o tamanho das empresas e o índice Z permaneceu constante no tempo
De forma surpreendente, grandes empresas nos mercados emergentes são mais vulneráveis financeiramente
Crescimento de vendas de grandes empresas estão correlacionados diretamente com o crescimento do PIB

B3 e a Montanha Mágica 3


  • O desempenho da B3 deve considerar que a empresa é um monopólio
  • Além disto, nos últimos anos, enquanto a receita aumentava, o número de empresas que participava do mercado de capitais diminuía
  • Isto é incoerente com a missão da empresa e com o que a sociedade espera de uma bolsa de valores

Nós postamos que o desempenho financeiro da B3 é entre muito bom e excelente. Mostramos que seus índices correspondem a um bônus AAA; mostramos que a margem líquida média é acima de 50%.

Dois aspectos importantes sobre esta discussão. Em primeiro lugar, a B3 é um monopólio. Tem conseguido barrar a entrada de concorrentes e é praticamente a única porta de entrada para uma empresa que deseje abrir o capital no Brasil ou para um investidor que deseje investir em ação. Sendo monopólio, o desempenho só pode ser ameaçado quando existem novos competidores. Observe que enquanto a margem da B3 é de 50%, a margem de um supermercado é menos de 5%; uma grande diferença entre a empresa e o comércio varejista é justamente a competição.

O segundo aspecto refere-se a missão da empresa. No site da B3 nos encontramos a missão da empresa:

promover a sustentabilidade e o investimento social privado alinhados à estratégia, contribuindo para o fortalecimento institucional da B3

Se um dos objetivos é promover o investimento social privado, será que a B3 está cumprindo com sua missão? Neste sentido, busquei o número de empresas com ações negociadas na bolsa (fonte: Séries Temporais, Banco Central) e calculei a correlação com a receita líquida da empresa. A correlação mede a relação, direta, inversa ou inexistente, entre duas variáveis. Atenção: a correlação não mede a relação de causa ou efeito entre duas variáveis. O valor da receita foi corrigido pela inflação, usei o IPCA do IBGE, e transformado em logaritmo.

A relação entre as duas variáveis foi de -0,4411. Como foram usadas 42 observações, o parâmetro crítico, a 5%, era de 0,3044, positivo ou negativo. Ou seja, existe correlação entre a geração de receita por parte da B3 e o número de empresas que participam do mercado acionário no Brasil. Até aqui, tudo bem. O problema está no sinal negativo. Ele indica que quanto maior a receita da B3, menor é o número de empresas participantes no mercado acionário brasileiro. No período, quando o número de empresas estava diminuindo - caiu de 396 empresas em 2008 para 339 em 2018 - a receita da B3 estava aumentando. E o lucro em níveis elevados.

Em razão do monopólio, das elevadas margens líquidas da empresa e do número decrescente de empresas com ações na bolsa, caberia a pergunta: será que a B3 está promovendo o investimento social privado? Não seria melhor, para o mercado de capitais brasileiro, que a empresa reduzisse sua “receita”, prejudicando seus “acionistas”, mas beneficiando a sociedade (acreditando que um mercado de capitais fortalecido é importante para um país)?

Nota Técnica: calculei a correlação entre a receita líquida da B3 e o valor total do mercado acionário brasileiro e o resultado não foi significativo (correlação igual a 0,288). Mas usar o comportamento do mercado como um todo pode ser complicado, em razão das grandes variações ocorridas durante o período: crise financeira de 2008/2009, problemas políticos no Brasil, recessão etc.
Fiz também o cálculo de modelos de regressão e as conclusões obtidas foram aproximadamente as mesmas que foram relatadas aqui.
A série histórica da B3 é afetada nos últimos anos pelo fato da empresa ter abocanhado outras entidades. Levei em consideração este fato, mas não encontrei relevância nos dados, já que afeta somente os dois últimos anos da série.

B3 e a Montanha Mágica 2


  • A análise da B3 ao longo do tempo, de 2008 até 2018, revela um empresa com uma margem líquida média de 58%.
  • Em média, a B3 obtem um lucro líquido de 416 milhões de reais por trimestre
  • Os números mostram que o desempenho da B3 é excepcional

O gráfico abaixo apresenta a serie histórica de quatro variáveis contábeis da B3: ativo total, receita líquida, lucro líquido e caixa das operações (Fonte: economática)


Os números mostram uma grande variação nos anos mais recentes, provavelmente resultante de negociações realizadas pela B3. Isto fez a receita média aumentasse de 0,7 bilhão por trimestre para 1,2 bilhão. Todos os números foram corrigidos pelo IPCA do IBGE para final de dezembro de 2018. Ou seja, já está sendo considerado a inflação desde o início da série, em setembro de 2008.

Nos 42 trimestres da série, a B3 teve um lucro de 17,5 bilhões, uma média de 416 milhões de lucro por trimestre. No período, o caixa gerado com as operações foi de 24,5 bilhões de reais, tudo corrigido para dezembro de 2018. O desempenho da empresa é bastante consistente, tanto é assim que a margem líquida, resultado da divisão do lucro líquido pela receita, foi de 58% no período. É muito raro uma empresa ter uma margem tão elevada.

B3 e a Montanha Mágica - 1


  • O desempenho da B3 em 2018 foi excepcional, tanto em termos de lucratividade, quanto na distribuição de dividendos aos acionistas
  • Atualmente, a situação da empresa é equiparada a uma nota AAA de bônus, a melhor possível

Com um ativo de 38 bilhões de reais, sendo 2/3 financiados por capital próprio, e margem líquida de 43%, o desempenho da B3 realmente foi invejável em 2018. Os acionistas agradecem, pois irão receber 1,4 bilhão de JSCP. Parece tudo ótimo com o balanço apresentado empresa empresa. Eis o que diz o release da empresa (via aqui):

No ano de 2018, a receita total da B3 atingiu R$5.351,9 milhões, alta de 20,6% em relação a 2017. Na mesma comparação, o EBITDA recorrente cresceu 28,8% e totalizou R$3.424,5 milhões em 2018, enquanto o lucro líquido recorrente foi 26,4% maior e somou R$2.634,5 milhões.


Mais ainda:

Buscaremos manter e fortalecer nossas capacidades em operações e gestão de risco, tecnologia de ponta e inovação, relacionamento e atendimento aos clientes, engajamento com os reguladores e desenvolvimento e retenção de talentos. Ainda em 2018, demos início a uma série de projetos e ações concretas que suportam a execução desse plano. Continuaremos trabalhando com determinação para oferecer aos clientes e reguladores soluções que excedam as suas expectativas e, assim, continuar a ser a plataforma escolhida pelo mercado para a maior parte das suas necessidades”.

Se você usar o indicador de Altman para o mercado emergente, a B3 teria uma classificação de bônus correspondente a 7,95 ou AAA. A melhor nota possível.

Parece que a B3 está cumprindo com sua missão.

Fonte: Altman, E. An emerging market credit scoring system for corporate bonds. Emerging Markets Review 6 (2005) 311 –323

Rir é o melhor remédio