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16 outubro 2017

Horizonte temporal na privatização


O valor de uma empresa é dado pelo fluxo de caixa futuro descontado pelo custo de oportunidade de capital. Uma das questões no processo de fazer a mensuração deste valor é quão longe deve ser o valor futuro. Ou seja, qual o horizonte de tempo que devemos considerar. Quando a empresa possui vida futura delimitada por um contrato, o correto seria considerar este horizonte temporal. Se o horizonte de tempo não estiver delimitado, o usual é considerar um fluxo de cinco ou dez anos (ou outro período de tempo qualquer) e ao final considerar um fluxo em perpetuidade.

No caso das concessões governamentais, a estimativa deve levar em consideração o prazo do contrato. Se estamos avaliando uma empresa que explora uma rodovia e o contrato possui mais oito anos, o horizonte de tempo será oito anos. Ao final deste período, a rodovia volta para o governo, que irá fazer um novo leilão. Mas o valor da empresa criada para explorar esta rodovia deve ser estimado considerando estes oito anos, mais o eventual valor residual, que irá corresponder ao pactuado no contrato de concessão.

Para o governo, transferir uma concessão para o setor privado envolve obter os recursos, que podem ser maiores se o objeto da exploração foi vantajoso ou não. O preço obtido no leilão pode aumentar se as regras forem claras, não existir contestação provável, o objeto de exploração pode gerar um fluxo de caixa futuro atrativo, entre outros aspectos. Ao fazer um leilão para concessão de um bem do governo, quanto maior a atratividade, maior o preço a ser obtido no leilão. Muitas vezes o governo chega a garantir fontes de financiamento a juros subsidiados como uma forma de atrair mais interessados.

A regra para obter um valor substancial num leilão é simples: melhorar, no máximo, a chance da concessão gerar um elevado fluxo de caixa futuro.

No processo de discussão sobre a oferta da Eletrobras anunciou-se que o governo estaria estudando aumentar o horizonte de tempo do contrato da usina Tucuruí (Fonte: Ritter, Daniel. Novo Contrato de Tucuruí torna-se decisivo para oferta da Eletrobras, Valor Econômico, 2 de outubro de 2017, B1). Originalmente o contrato termina em 2024. Neste ano, o governo teria que fazer um leilão para decidir quem iria explorar esta usina. Tucuruí é uma hidrelétrica muito importante para a Eletrobras: equivale a 8400 mW, mais que o dobro das quatro usinas que foram leiloadas recentemente pelo governo federal e que eram da Cemig. Se o processo sair em 2018, isto corresponde de 6 a 7 anos de exploração. A proposta, conforme divulgada na mídia, seria prorrogar por 30 anos a concessão. Seria um grande incentivo para atrair interessados.

A ideia possui uma transferência temporal de riqueza. Em lugar de receber recursos em 2024 numa eventual prorrogação da concessão, o governo antecipa deste recebimento. Isto seria muito interessante para um governo que está com dificuldades de fechar as contas públicas, neste ano e provavelmente no próximo.

Neste caso, para o eventual interessado em adquirir a Eletrobras, o horizonte temporal seriam os trinta anos de exploração de Tucuruí.

Links

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15 outubro 2017

Fato da Semana: Punição para dirigentes da Petrobras

Fato da Semana: Punição pelo teste de recuperabilidade

Data: 11 de outubro 



Contextualização - Desde que a Operação Lava-Jato começou a mostrar a existência de um grupo de executivos desonestos agindo na maior empresa brasileira que a sua contabilidade está sob o escrutínio público. A primeira reação do maior acionista da empresa foi trocar os dirigentes; entretanto, a nova Graça Foster também estava na empresa quando a corrupção era algo cotidiano. O atraso na publicação das demonstrações contábeis só ocorreu em razão de uma reação tardia da empresa de auditoria: ou acertava o valor do balanço, retirando as "luvas" (como dizem os portugueses) ou não haveria assinatura.
Depois de meses, a empresa anunciou que o efeito da corrupção teria sido de R$6 bilhões e que não seria possível indicar em que exercício social ocorreu o fato. Acreditou quem quis nesta história. A queda do presidente Rousseff ajudou a mudar, novamente, a gestão da empresa. Durante este período, os reguladores, em especial a ANP e a CVM, pareciam adormecidos, sem ação. Talvez em virtude da baixa popularidade do atual presidente ou diante do quadro vexaminoso de inércia, os reguladores resolveram agir. Nesta semana, a CVM puniu 40 dirigentes por um problema contábil: a falha no teste de recuperabilidade, entre 2010 e 2014.

Relevância - O teste de recuperabilidade foi a primeira norma contábil do CPC aprovada no Brasil. Na prática talvez seja a mais inútil de todas (iremos falar sobre isto no blog). E aquela que demanda mais conhecimentos do setor contábil, que geralmente não sabe o que significa a recuperabilidade.
A punição da CVM pode, quem sabe, ajudar a melhorar a qualidade da aplicação do CPC 1 no Brasil. Ou quem sabe fazer com que empresas, como a Petrobras, levem mais a sério da sua contabilidade.

Notícia boa - Notícia boa para a contabilidade, em razão do exposto anteriormente.

Desdobramento - Sou cético quanto a mudança cultural sobre a aplicação do CPC 1. Mas a contabilidade da estatal cometeu tantas falhas que podemos ter mais punições.

Mas a semana só teve isto? - Semana muito movimentada. Ficamos sabendo que o problema do hacker na Deloitte foi muito mais sério do que anunciado anteriormente; a SEC anunciou uma proposta de simplificação da evidenciação; os escandinavos reconheceram novamente um trabalho em finanças comportamentais, premiando Thaler com o Nobel de Economia; e um levantamento do G1 mostrou os efeitos da Operação Lava-Jato (estamos vivendo a história).

Descobrindo fraude por satélite


A SEC informou que descobriu uma fraude de US$3,3 bilhões na empresa de construção doméstica Desarrolladora Homex. Teriam sido mais de 100 mil vendas falsas, com aumento nas receitas. Para descobrir a fraude, a SEC usou imagens de satélite. O fato ocorreu entre 2010 e 2012. Em 2014 a empresa decretou falência. A empresa também atua no Brasil.

Rir é o melhor remédio


14 outubro 2017

Tarde demais

Suely Caldas afirma que a intervenção na Previc no fundo dos Correios teve um grande erro de timing:

Seis anos depois de rombos persistentes e crescentes, sem nenhuma chance de serem recuperados, a Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc) finalmente decretou intervenção no Postalis – o fundo de pensão dos Correios. Agiu tarde. E deixa se arrastar por anos situação semelhante na Previ e na Petros – as duas maiores fundações de previdência de funcionários do Banco do Brasil e da Petrobrás.

Entregue a políticos e sindicalistas sem preparo técnico para multiplicar lucro e valorizar o patrimônio acumulado pelas empresas e funcionários, a gestão financeira desses fundos se agravou nos governos Lula e Dilma, com operações desastrosas de toda ordem – sejam motivadas pela corrupção rasteira de engordar o patrimônio dos dirigentes emagrecendo o dos funcionários; sejam para socorrer interesses políticos e ideológicos do momento comprando títulos das dívidas da Argentina e da Venezuela, quando a falência dos dois países já era patente; ou injetar dinheiro na Sete Brasil, que deveria construir sondas para a Petrobrás, mas construiu corrupção e falência.

O uso político é um dos males em fundos de empresas estatais, mas há outros, alguns estruturais, que datam de sua criação, nos anos 1960, e nunca corrigidos, apesar de velhos conhecidos. O pior deles é manter até hoje o plano de benefício definido, pelo qual o aposentado tem garantido o valor do último salário da vida ativa sem que tenha contribuído para isso. A conta já nasce desequilibrada, nunca fecha e o rombo cresce como bola de neve, empurrado para o futuro.


Aproveitando: a Petros confirmou a venda da sua participação na Eldorado.