05 agosto 2016
04 agosto 2016
Links
Fotos mostrando a evolução do tempo em celebridades
Quants: alquimistas de Wall Street (documentário)
As cinco melhores aberturas de Olimpíadas
Economia está em tudo (vídeo com Ha-Joon Chang)
Quants: alquimistas de Wall Street (documentário)
As cinco melhores aberturas de Olimpíadas
Economia está em tudo (vídeo com Ha-Joon Chang)
03 agosto 2016
Sete Brasil
Retrospectiva – A empresa foi fundada em 2011, como consequência da expectativa da exploração do petróleo no Brasil, na camada pré-sal. Seus acionistas eram fundos de pensão, bancos, empresas de investimento e a Petrobras. Logo após sua criação, a empresa venceu licitações na Petrobras para construção de 28 sondas. Em 2013, recursos institucionais do FGTS, no total de 2,5 bilhões, foram alocados na empresa por meio de debêntures.
Continuidade – A palavra continuidade é usada 16 vezes na demonstração financeira do exercício encerrado em 31 de dezembro de 2015. Na primeira vez, na abertura das notas explicativas, informa-se que “não há como assegurar a continuidade operacional do grupo no atual cenário. Com isso, (...) contratou uma firma internacionalmente reconhecida para elaborar um laudo de avaliação do valor de mercado dos ativos e, consequentemente, suportar o valor de recuperabilidade de cada ativo”. Ocorreu uma mudança de atitude na empresa, já que no ano anterior as demonstrações foram preparadas sob o pressuposto da continuidade. Com efeito, nas demonstrações é possível encontrar frases como “situação de elevada probabilidade de não continuidade” ou “dúvida substancial sobre a continuidade operacional da Companhia”.
Efeitos da Recuperabilidade – é possível verificar os efeitos tanto nas diversas demonstrações contábeis da empresa. No balanço, o ativo da controladora caiu de quase 10 bilhões de reais, para 1,9 bilhão. A principal alteração foi na linha “investimentos”, que de 8,4 bilhões, no final de 2014, passou para zero um ano depois. Do ativo da empresa no final de 2015, 93% corresponde a “partes relacionadas”, do circulante. Já o ativo do balanço consolidado caiu de 23,7 bilhões para 491 milhões de reais entre final de 2014 e 2015. A principal alteração está no item imobilizado (de 23,3 bilhões para 488 milhões de reais). Ao mesmo tempo em que ocorreu uma redução substancial no ativo, o passivo aumentou, de 16,2 bilhões para 23,7 bilhões de reais. A empresa tinha ao final de 2015 14,6 bilhões de empréstimos e financiamentos.
Se o ativo reduziu em 23 bilhões e o passivo aumentou, o efeito vai aparecer no patrimônio líquido. No balanço consolidado do final do ano de 2014 o patrimônio líquido era de 7,7 bilhões; um ano depois tinha a situação de passivo a descoberto, ou seja, patrimônio líquido negativo de 23 bilhões.
A demonstração do resultado, o prejuízo operacional de 148 milhões de 2014 aumentou para 35 bilhões de reais, sendo 34 bilhões decorrente da perda de recuperabilidade. As despesas financeiras aumentaram de 34 milhões para 1,055 bilhão. Mas a empresa foi ajudada com variações cambiais: 4,5 bilhões positivo. O resultado líquido foi de 31,3 bilhões; ou 32,5 bilhões, considerando o resultado abrangente.
Empréstimos e financiamentos – Conforme informado, o volume de empréstimos era de 14,6 bilhões para um ativo de menos de meio bilhão. Somando com debêntures, a dívida onerosa era de 17,4 bilhões em 31 de dezembro de 2015 e 13,6 bilhões um ano antes. Como a empresa tem sérias dúvidas sobre a chance de continuidade no futuro, é sempre interessante saber quem são aqueles que dificilmente irão receber seus recursos. A análise das demonstrações mostra que os principais credores são na ordem: FGTS, Caixa Econômica Federal e três operações de empréstimo-ponte onde estão envolvidas as grandes instituições financeiras que atuam no Brasil: Banco do Brasil, Itau, Santander e Bradesco. Segundo o Valor Econômico (TORRES, Fernando. Conta da Sete Brasil para bancos fica em R$10 bi, 2 de agosto de 2017) o Banco do Brasil seria o principal credor, com R$3,5 bilhões, seguido FGTS.
Um aspecto que chama a atenção é que a soma da dívida onerosa no final de 2014 era de R$ 13,6 bilhões. E isto gerou em 2015 despesas financeiras de R$1 bilhão. Numa conta grosseira, dividindo a despesa financeira pelo valor da dívida temos 7,4%, que corresponderia a taxa de juros aproximada dos empréstimos. Este valor está superestimado, já que a nota explicativa informa que as despesas com juros de empréstimos foram de R$879 milhões. (Note que considerando o valor médio de empréstimos e financiamentos e este valor de despesa, a taxa de juros das dívidas onerosas seria de 5%. E isto é taxa nominal. Considerando uma inflação de 8%, tem-se uma taxa real de juros negativa).
Geração de caixa - poderia argumentar que a amortização contábil seria um lançamento que não afetaria caixa. Entretanto, analisando o fluxo de caixa da empresa tem-se que um caixa das operações negativo em 119 milhões. É certo que este resultado é melhor que o obtido em 2014, mas o balanço mostra que a empresa tinha, no final de 2015, 196 milhões de caixa e equivalentes. Persistindo a situação do ano passado, a empresa em poucos meses não terá mais caixa. Outro aspecto interessante do fluxo de caixa é que brusca redução do fluxo de investimento. Se no ano de 2014 este fluxo era negativo em 5 bilhões, em 2015 praticamente zerou, com a redução expressiva da aquisição de imobilizado.
Corrupção - a Sete Brasil foi criada recentemente diante do sonho de aproveitar o petróleo como indutor do crescimento econômico. Mas a empresa dependia de um cliente somente: a Petrobras. Tendo sido criado um esquema de corrupção na estatal, era natural que o mesmo tenha ocorrido na empresa. O depoimento de Pedro Barusco indicou que ex-executivos da Sete Brasil combinavam pagamentos de 1% dos valores dos contratos de construção das sondas. A empresa informa que moveu ações de responsabilidade civil contra estas pessoas. Mas uma das consequências é que a empresa não está conseguindo empréstimos junto ao BNDES, que poderia reduzir a possibilidade de descontinuidade. Além disto, a operação Lava Jato foi responsável pela ênfase no relatório do auditor.
Mas o problema da Sete Brasil com a justiça não é tão simples quanto a empresa faz crer. A empresa informa não foi “intimada pelas autoridades competentes” e que “diversas ações foram adotadas (...) no sentido de investigar detalhadamente as alegações, não tendo sido identificados nenhum ato ilícito em relação aos contratos com terceiros”. Mas nada impede que processos da CVM sejam abertos, investigação sobre o aporte do FGTS na empresa seja objeto de questionamento e os fundos de pensão que investiram na empresa queiram um aprofundamento das investigações.
É sintomático que as quatro vezes que a palavra Lava Jato é citada nas demonstrações, duas tenham origem no texto do auditor, que o termo “corrupção” não conste das informações e que “propina” seja citada uma vez. Além disto, a empresa não fez nenhum impairment em razão da corrupção, ao contrário do que ocorreu com a Petrobras.
Impairment - O impairment realizado pela empresa é o principal ponto das demonstrações contábeis. A perda de recuperabilidade de 34 bilhões é muito expressiva. E alguns detalhes aparecem na nota explicativa 12a. Neste ponto a empresa usa de jargões e não fornece informações relevantes para o usuário.
Segundo a empresa, a perda na recuperabilidade significa que a Administração reconhece não ser possível assegurar a continuidade das unidades. Fala em “dificuldades de financiabilidade (sic) do projeto” como “principal motivador para reestruturar o plano de investimentos”. Não seria melhor falar em paralisação das operações?
Para fazer o teste, a Sete Brasil contratou um “consultoria independente de reconhecimento internacional”. A Sete Brasil revela que está usando o serviço da Alvarez & Marsal, especializada em recuperação de empresas, mas não informa o nome da consultoria que fez a avaliação do imobilizado, responsável pela amortização da empresa. Qual a razão? Pelo que foi informado pela empresa a abordagem usada é no mínimo simplória: dados históricos dos preços pagos de vendas de ativos similares, com ajustes e estimativa do custo de reconstruir a unidade inteira de forma “idêntica”, que a empresa chama de “princípio da substituição” quando conhecemos como custo de reposição (que é um pouco diferente do custo corrente). O problema é que o mercado de sondas, o principal produto da Sete Brasil, não é algo como a produção de pregos, computadores ou sapatos. São produtos específicos, onde a obtenção de dados históricos é muito difícil. E isto está claro no item “referências de operações recentes de ativos similares” (observe que o termo é similar, não idêntico) são citados dois casos somente.
A partir daí, analisou-se a evolução física das ondas em construção pela empresa. Assim, sondas que tiveram uma evolução física menor que 5% foram considerados como tendo um valor justo de zero.
Vamos fazer um breve exercício numérico nesta postagem. As duas operações de venda de sondas citadas pela Sete Brasil tiveram um custo de 860 milhões de dólares e 700 milhões de dólares, sendo a primeira vendida por 24,4% deste valor e a segunda por 9,3%. A empresa informa que existem duas sondas já quase concluídas da empresa tiveram um custo de 2,5 bilhões cada, que corresponde a 750 milhões de dólares no câmbio atual. Considerando 9,3% sobre duas sondas cujo cronograma físico está mais avançado, temos um valor aproximado de R$476 milhões, que corresponde a quase o mesmo valor existente no imobilizado no final de 2015. Aplicando o mesmo critério em todas as sondas da empresa o valor seria de R$3,2 bilhões. Bem acima do montante encontrado pela empresa. Mas o critério para avaliar as ondas pela empresa contratada não seria os dados históricos pagos em vendas similares e a estimativa de custo para reconstruir? Outra informação que reforça que o valor da recuperabilidade seja muito pessimista é o fato de que das 29 sondas o valor médio da baixa foi de 99,13%. Ou seja, somente foi considerado em média 0,87% do valor contábil. Este valor é um pouco menor que a relação entre o valor após a recuperabilidade e antes do teste: 1,4%. Mas independente da medida, o valor obtido é reduzido.
Um argumento a favor do laudo da consultoria é que no valor de custo estão inclusos ineficiências e pagamentos da corrupção. Mas o valor encontrado parece que as sondas foram avaliadas muito mais como sucatas do que como ativos.
Motivos - São possíveis várias explicações para o excesso de perda que consideramos anteriormente. Primeiro, em situações onde a empresa pretende fazer uma grande redução no valor do ativo, é usual que as empresas façam em valores excessivos para evitar novas baixas no futuro. Nestas situações, os gestores preferem pecar por excesso. Uma segunda razão pode ser a insegurança da empresa contratada com respeito ao laudo. E esta incerteza pode ter sua origem na possível descontinuidade, o que levaria a liquidação forçada, aos desdobramentos da investigação de corrupção, aos problemas do mercado do petroleo entre outros. Esta incerteza pode ser a mesma que levou a empresa de auditoria a não expressar nenhuma opinião no laudo de avaliação. Outra possível explicação é a estratégia da gestão de crise da empresa, onde reduzir ao máximo o valor do ativo pode conduzir a melhores termos na negociação futura com os credores.
Conclusão - se nas demonstrações de 2014 os valores estavam em excesso, aparentemente o resultado do teste de recuperabilidade pode estar reduzindo em excesso o ativo.
Continuidade – A palavra continuidade é usada 16 vezes na demonstração financeira do exercício encerrado em 31 de dezembro de 2015. Na primeira vez, na abertura das notas explicativas, informa-se que “não há como assegurar a continuidade operacional do grupo no atual cenário. Com isso, (...) contratou uma firma internacionalmente reconhecida para elaborar um laudo de avaliação do valor de mercado dos ativos e, consequentemente, suportar o valor de recuperabilidade de cada ativo”. Ocorreu uma mudança de atitude na empresa, já que no ano anterior as demonstrações foram preparadas sob o pressuposto da continuidade. Com efeito, nas demonstrações é possível encontrar frases como “situação de elevada probabilidade de não continuidade” ou “dúvida substancial sobre a continuidade operacional da Companhia”.
Efeitos da Recuperabilidade – é possível verificar os efeitos tanto nas diversas demonstrações contábeis da empresa. No balanço, o ativo da controladora caiu de quase 10 bilhões de reais, para 1,9 bilhão. A principal alteração foi na linha “investimentos”, que de 8,4 bilhões, no final de 2014, passou para zero um ano depois. Do ativo da empresa no final de 2015, 93% corresponde a “partes relacionadas”, do circulante. Já o ativo do balanço consolidado caiu de 23,7 bilhões para 491 milhões de reais entre final de 2014 e 2015. A principal alteração está no item imobilizado (de 23,3 bilhões para 488 milhões de reais). Ao mesmo tempo em que ocorreu uma redução substancial no ativo, o passivo aumentou, de 16,2 bilhões para 23,7 bilhões de reais. A empresa tinha ao final de 2015 14,6 bilhões de empréstimos e financiamentos.
Se o ativo reduziu em 23 bilhões e o passivo aumentou, o efeito vai aparecer no patrimônio líquido. No balanço consolidado do final do ano de 2014 o patrimônio líquido era de 7,7 bilhões; um ano depois tinha a situação de passivo a descoberto, ou seja, patrimônio líquido negativo de 23 bilhões.
A demonstração do resultado, o prejuízo operacional de 148 milhões de 2014 aumentou para 35 bilhões de reais, sendo 34 bilhões decorrente da perda de recuperabilidade. As despesas financeiras aumentaram de 34 milhões para 1,055 bilhão. Mas a empresa foi ajudada com variações cambiais: 4,5 bilhões positivo. O resultado líquido foi de 31,3 bilhões; ou 32,5 bilhões, considerando o resultado abrangente.
Empréstimos e financiamentos – Conforme informado, o volume de empréstimos era de 14,6 bilhões para um ativo de menos de meio bilhão. Somando com debêntures, a dívida onerosa era de 17,4 bilhões em 31 de dezembro de 2015 e 13,6 bilhões um ano antes. Como a empresa tem sérias dúvidas sobre a chance de continuidade no futuro, é sempre interessante saber quem são aqueles que dificilmente irão receber seus recursos. A análise das demonstrações mostra que os principais credores são na ordem: FGTS, Caixa Econômica Federal e três operações de empréstimo-ponte onde estão envolvidas as grandes instituições financeiras que atuam no Brasil: Banco do Brasil, Itau, Santander e Bradesco. Segundo o Valor Econômico (TORRES, Fernando. Conta da Sete Brasil para bancos fica em R$10 bi, 2 de agosto de 2017) o Banco do Brasil seria o principal credor, com R$3,5 bilhões, seguido FGTS.
Um aspecto que chama a atenção é que a soma da dívida onerosa no final de 2014 era de R$ 13,6 bilhões. E isto gerou em 2015 despesas financeiras de R$1 bilhão. Numa conta grosseira, dividindo a despesa financeira pelo valor da dívida temos 7,4%, que corresponderia a taxa de juros aproximada dos empréstimos. Este valor está superestimado, já que a nota explicativa informa que as despesas com juros de empréstimos foram de R$879 milhões. (Note que considerando o valor médio de empréstimos e financiamentos e este valor de despesa, a taxa de juros das dívidas onerosas seria de 5%. E isto é taxa nominal. Considerando uma inflação de 8%, tem-se uma taxa real de juros negativa).
Geração de caixa - poderia argumentar que a amortização contábil seria um lançamento que não afetaria caixa. Entretanto, analisando o fluxo de caixa da empresa tem-se que um caixa das operações negativo em 119 milhões. É certo que este resultado é melhor que o obtido em 2014, mas o balanço mostra que a empresa tinha, no final de 2015, 196 milhões de caixa e equivalentes. Persistindo a situação do ano passado, a empresa em poucos meses não terá mais caixa. Outro aspecto interessante do fluxo de caixa é que brusca redução do fluxo de investimento. Se no ano de 2014 este fluxo era negativo em 5 bilhões, em 2015 praticamente zerou, com a redução expressiva da aquisição de imobilizado.
Corrupção - a Sete Brasil foi criada recentemente diante do sonho de aproveitar o petróleo como indutor do crescimento econômico. Mas a empresa dependia de um cliente somente: a Petrobras. Tendo sido criado um esquema de corrupção na estatal, era natural que o mesmo tenha ocorrido na empresa. O depoimento de Pedro Barusco indicou que ex-executivos da Sete Brasil combinavam pagamentos de 1% dos valores dos contratos de construção das sondas. A empresa informa que moveu ações de responsabilidade civil contra estas pessoas. Mas uma das consequências é que a empresa não está conseguindo empréstimos junto ao BNDES, que poderia reduzir a possibilidade de descontinuidade. Além disto, a operação Lava Jato foi responsável pela ênfase no relatório do auditor.
Mas o problema da Sete Brasil com a justiça não é tão simples quanto a empresa faz crer. A empresa informa não foi “intimada pelas autoridades competentes” e que “diversas ações foram adotadas (...) no sentido de investigar detalhadamente as alegações, não tendo sido identificados nenhum ato ilícito em relação aos contratos com terceiros”. Mas nada impede que processos da CVM sejam abertos, investigação sobre o aporte do FGTS na empresa seja objeto de questionamento e os fundos de pensão que investiram na empresa queiram um aprofundamento das investigações.
É sintomático que as quatro vezes que a palavra Lava Jato é citada nas demonstrações, duas tenham origem no texto do auditor, que o termo “corrupção” não conste das informações e que “propina” seja citada uma vez. Além disto, a empresa não fez nenhum impairment em razão da corrupção, ao contrário do que ocorreu com a Petrobras.
Impairment - O impairment realizado pela empresa é o principal ponto das demonstrações contábeis. A perda de recuperabilidade de 34 bilhões é muito expressiva. E alguns detalhes aparecem na nota explicativa 12a. Neste ponto a empresa usa de jargões e não fornece informações relevantes para o usuário.
Segundo a empresa, a perda na recuperabilidade significa que a Administração reconhece não ser possível assegurar a continuidade das unidades. Fala em “dificuldades de financiabilidade (sic) do projeto” como “principal motivador para reestruturar o plano de investimentos”. Não seria melhor falar em paralisação das operações?
Para fazer o teste, a Sete Brasil contratou um “consultoria independente de reconhecimento internacional”. A Sete Brasil revela que está usando o serviço da Alvarez & Marsal, especializada em recuperação de empresas, mas não informa o nome da consultoria que fez a avaliação do imobilizado, responsável pela amortização da empresa. Qual a razão? Pelo que foi informado pela empresa a abordagem usada é no mínimo simplória: dados históricos dos preços pagos de vendas de ativos similares, com ajustes e estimativa do custo de reconstruir a unidade inteira de forma “idêntica”, que a empresa chama de “princípio da substituição” quando conhecemos como custo de reposição (que é um pouco diferente do custo corrente). O problema é que o mercado de sondas, o principal produto da Sete Brasil, não é algo como a produção de pregos, computadores ou sapatos. São produtos específicos, onde a obtenção de dados históricos é muito difícil. E isto está claro no item “referências de operações recentes de ativos similares” (observe que o termo é similar, não idêntico) são citados dois casos somente.
A partir daí, analisou-se a evolução física das ondas em construção pela empresa. Assim, sondas que tiveram uma evolução física menor que 5% foram considerados como tendo um valor justo de zero.
Vamos fazer um breve exercício numérico nesta postagem. As duas operações de venda de sondas citadas pela Sete Brasil tiveram um custo de 860 milhões de dólares e 700 milhões de dólares, sendo a primeira vendida por 24,4% deste valor e a segunda por 9,3%. A empresa informa que existem duas sondas já quase concluídas da empresa tiveram um custo de 2,5 bilhões cada, que corresponde a 750 milhões de dólares no câmbio atual. Considerando 9,3% sobre duas sondas cujo cronograma físico está mais avançado, temos um valor aproximado de R$476 milhões, que corresponde a quase o mesmo valor existente no imobilizado no final de 2015. Aplicando o mesmo critério em todas as sondas da empresa o valor seria de R$3,2 bilhões. Bem acima do montante encontrado pela empresa. Mas o critério para avaliar as ondas pela empresa contratada não seria os dados históricos pagos em vendas similares e a estimativa de custo para reconstruir? Outra informação que reforça que o valor da recuperabilidade seja muito pessimista é o fato de que das 29 sondas o valor médio da baixa foi de 99,13%. Ou seja, somente foi considerado em média 0,87% do valor contábil. Este valor é um pouco menor que a relação entre o valor após a recuperabilidade e antes do teste: 1,4%. Mas independente da medida, o valor obtido é reduzido.
Um argumento a favor do laudo da consultoria é que no valor de custo estão inclusos ineficiências e pagamentos da corrupção. Mas o valor encontrado parece que as sondas foram avaliadas muito mais como sucatas do que como ativos.
Motivos - São possíveis várias explicações para o excesso de perda que consideramos anteriormente. Primeiro, em situações onde a empresa pretende fazer uma grande redução no valor do ativo, é usual que as empresas façam em valores excessivos para evitar novas baixas no futuro. Nestas situações, os gestores preferem pecar por excesso. Uma segunda razão pode ser a insegurança da empresa contratada com respeito ao laudo. E esta incerteza pode ter sua origem na possível descontinuidade, o que levaria a liquidação forçada, aos desdobramentos da investigação de corrupção, aos problemas do mercado do petroleo entre outros. Esta incerteza pode ser a mesma que levou a empresa de auditoria a não expressar nenhuma opinião no laudo de avaliação. Outra possível explicação é a estratégia da gestão de crise da empresa, onde reduzir ao máximo o valor do ativo pode conduzir a melhores termos na negociação futura com os credores.
Conclusão - se nas demonstrações de 2014 os valores estavam em excesso, aparentemente o resultado do teste de recuperabilidade pode estar reduzindo em excesso o ativo.
PL 257
[...]
Os entes subnacionais entraram em colapso, informação que deixou de ser novidade depois que as mazelas de Estados emblemáticos como Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul ficaram conhecidas em rede nacional. Dentre as medidas de socorro surgiu um acordo entre União e Estados, em que a renegociação das dívidas ganhou relevância, mas o que de fato importa, que é a necessidade de um ajuste estrutural nas contas dos Estados, passou quase que despercebido. Afinal, todos se concentraram em criticar (mais ou menos acertadamente) a irresponsabilidade fiscal dos governos estaduais, sem se aprofundar no que o projeto tem de mais relevante, que são as contrapartidas de ajuste e as correções no conceito de pessoal da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).
Parte-se da constatação de que o problema dos Estados não é de endividamento, e sim do atual patamar de gastos correntes. Estes crescem historicamente acima da inflação e, mais grave, acima da taxa de crescimento das receitas. A conta é simples: se os gastos – em particular os de pessoal – aumentam acima do crescimento das receitas e se, adicionalmente, as receitas param de crescer, é natural que, mais cedo ou mais tarde, as despesas superem as receitas. Estamos no mais tarde, isso já aconteceu há muito na maioria dos Estados brasileiros e ficou mais evidente a partir da frustração de receitas extraordinárias e ordinárias que passamos a enfrentar desde o início de 2015.
Voltemos, então, aos conceitos. Os Estados sofreram colapso semelhante na década de 1990, quando então se partiu para a renegociação das dívidas com a União, culminando na Lei de Responsabilidade Fiscal, editada em 2000. Um dos objetivos da LRF era evitar uma nova crise fiscal dos entes subnacionais e para isso um dos pilares foi a definição de um teto para o comprometimento da receita com despesas de pessoal. A ideia é simples: há que limitar os gastos com pessoal para que sobrem recursos para investimentos e custeio da máquina pública.
Afinal, de que servem médicos se não há remédios ou hospitais minimamente equipados? Ou policiais sem viaturas ou equipamentos de segurança e armas? Ou professores sem escolas, ou dando aulas para alunos sem merenda, ou sem alunos por falta de transporte?
Não foi, portanto, por arbitrariedade do legislador, ou pura e simples maldade ou malquerença em relação aos servidores públicos – e menos ainda para evitar o desenvolvimento de instituições fundamentais como o Judiciário, o Ministério Público ou a Defensoria Pública – que se definiu um teto para as despesas de pessoal. Ao contrário, foi para que se exigisse uma gestão eficiente de recursos que são escassos (sim, os recursos públicos também o são!). Esse teto foi então estipulado em 60% para o caso dos Estados e distribuído entre os diversos Poderes de forma a que cada um tenha de atender a seu limite máximo.
Ao longo do tempo, contudo, o que se observa é que os Estados, legitimados pelos Tribunais de Contas, têm driblado esse teto ao criar despesas de pessoal fora dos conceitos da LRF. Auxílios de toda sorte, verbas indenizatórias e até mesmo despesas com pensionistas e o Imposto de Renda sobre a folha de pessoal têm sido considerados como “outras despesas”, sendo excluídas dos limites da LRF.
O que o PLP 257 faz é aprimorar o conceito e incluir essas despesas dentro dos limites, dando aos Estados – e a todos os Poderes – o prazo de dez anos para se reenquadrarem nos limites originais. Adicionalmente, esse projeto estabelece um controle para o aumento das despesas correntes, a exemplo do que faz a proposta de emenda constitucional (PEC) dos gastos. O objetivo é garantir que, passados os 24 meses de carência, os Estados consigam arcar com o serviço das dívidas – e não tenham consumido esse espaço com novas despesas obrigatórias, o que invariavelmente nos levará novamente à mesa de negociação em 2018.
Logo, é descabido o argumento de que haverá um desmonte da Lava Jato ou demissões em massa nos Poderes autônomos como consequência da aprovação do PLP 257. Há que voltar ao básico e levantar a questão da forma certa – com base nos números corretos: se estamos gastando, 75%, 80%, 85% das nossas receitas com despesas de pessoal e não têm sobrado recursos para garantir condições de trabalho aos milhares de servidores públicos, tampouco para investimentos básicos, é preciso refazer o debate.
E esse debate passa pela definição de prioridades e por exigir eficiência na gestão dos recursos públicos, inclusive no que se refere a recursos humanos. Essa é a única forma de garantir a sustentabilidade dos direitos adquiridos pelos servidores e a solidez institucional dos diversos Poderes. Há aí uma agenda que precisa ser aberta. Mas não será escamoteando os números e fingindo que o problema não existe que conseguiremos reverter o desequilíbrio atual e fazer o debate necessário.
Fardo do setor público e o crescimento medíocre
Não consigo (nem tento) disfarçar meu pessimismo sobre o futuro do país, em que pese a perspectiva de alguma recuperação à frente.
Não me interprete mal. Acredito que estamos melhores agora do que há alguns meses e muito mais do que estaríamos caso o governo anterior não tivesse sido afastado.
[...]
Da mesma forma, não é possível vender como vitória da equipe econômica a meta de deficit de R$ 139 bilhões para o ano que vem, apesar de tentativas em contrário. Para que esse valor se materialize, será necessário obter R$ 55 bilhões de receitas ainda não especificadas que certamente não se repetirão em outros anos, ou seja, o valor recorrente do deficit, que balizará a meta para 2018, será de R$ 194 bilhões.
Acrescentando à lista, agora o governo federal cedeu mais uma vez aos Estados, ao permitir que não contabilizem certos gastos no limite de sua folha de pagamento.
[...]
Quem acompanha o tema há de ter notado a situação dos Estados brasileiros, esmagados pelo peso de seus gastos com pessoal. Oficialmente, 17 deles estouram o limite prudencial, mas uma especialista como Ana Carla Abrão Costa, secretária da Fazenda de Goiás, estima que gastos com o funcionalismo podem ter ultrapassado 80% da receita líquida, comprometendo qualquer possibilidade de gestão.
Não há como escapar à conclusão: o setor público brasileiro se tornou, há muito, refém de interesses especiais.
Nesse contexto, a chance de se concretizar um ajuste fiscal da magnitude do requerido para estabilizar a dívida relativamente ao PIB é mínima, para colocar de forma delicada.
Assim, muito embora possamos imaginar que a economia comece a se recobrar já na segunda metade deste ano, não há como sonhar com uma recuperação vigorosa como na saída de outras recessões, pelo contrário: o fardo do setor público há de garantir crescimento medíocre ainda por muitos anos.
Não me interprete mal. Acredito que estamos melhores agora do que há alguns meses e muito mais do que estaríamos caso o governo anterior não tivesse sido afastado.
[...]
Da mesma forma, não é possível vender como vitória da equipe econômica a meta de deficit de R$ 139 bilhões para o ano que vem, apesar de tentativas em contrário. Para que esse valor se materialize, será necessário obter R$ 55 bilhões de receitas ainda não especificadas que certamente não se repetirão em outros anos, ou seja, o valor recorrente do deficit, que balizará a meta para 2018, será de R$ 194 bilhões.
Acrescentando à lista, agora o governo federal cedeu mais uma vez aos Estados, ao permitir que não contabilizem certos gastos no limite de sua folha de pagamento.
[...]
Quem acompanha o tema há de ter notado a situação dos Estados brasileiros, esmagados pelo peso de seus gastos com pessoal. Oficialmente, 17 deles estouram o limite prudencial, mas uma especialista como Ana Carla Abrão Costa, secretária da Fazenda de Goiás, estima que gastos com o funcionalismo podem ter ultrapassado 80% da receita líquida, comprometendo qualquer possibilidade de gestão.
Não há como escapar à conclusão: o setor público brasileiro se tornou, há muito, refém de interesses especiais.
Nesse contexto, a chance de se concretizar um ajuste fiscal da magnitude do requerido para estabilizar a dívida relativamente ao PIB é mínima, para colocar de forma delicada.
Assim, muito embora possamos imaginar que a economia comece a se recobrar já na segunda metade deste ano, não há como sonhar com uma recuperação vigorosa como na saída de outras recessões, pelo contrário: o fardo do setor público há de garantir crescimento medíocre ainda por muitos anos.
Assinar:
Postagens (Atom)