Na véspera da independência do Brasil o ensino da contabilidade apresentava algumas características interessantes. Em primeiro lugar, não existiam estabelecimentos formais de ensino, ao contrário do que já ocorria em alguns países europeus. O processo de ensino era muito mais precário e menos institucionalizado. Segundo, os professores não eram exclusivos da área, sendo muito mais polivalentes. Naquela época a população brasileira era bem reduzida, com um grau de urbanização baixo, e existiam muitos analfabetos. Isto nos leva a terceira característica: o número de professores era reduzido. Em quarto lugar, não existia interesse do governo em bancar uma política de ensino.
Conforme comentamos anteriormente, o ensino de contabilidade estava misturado com o aprendizado da alfabetização. Em 1822 um professor anunciava “Aula de Primeiras Letras” que ocorreria na Rua da Gloria 167, Rio de Janeiro. Segundo o anúncio, o mestre iria ensinar a ler e escreve com perfeição, além de aritmética e doutrina cristã. Especificamente sobre aritmética informa que:
“Arithemetica, em toda a sua extenção, e partidas dobradas para os Alunos que se aplicarem ao Commercio; Algebra, e Geometria para os que estiverem no cazo de comprehenção; e que queirão frequentar as Accademias”. (grifo nosso)
O anúncio indicava que o Mestre tinha conhecimentos e que utilizaria sua casa para a docência. Isto é uma prova da falta de institucionalização do ensino e que os professores eram polivalentes.
Fonte: Diário do Rio de Janeiro, edição 2 de 3 de janeiro de 1822, p. 4
01 março 2015
28 fevereiro 2015
Fato da Semana: Nota da Petrobras (Semana 9 de 2015)
Fato da Semana: A agência de classificação de risco de crédito Moody´s reduziu a nota da empresa Petrobras. Isto significa dizer que a empresa terá mais dificuldade de captar recursos, confirmando a percepção de que será necessário muito esforço para sair da atual situação. Este fato afetou o preço da ação da empresa, além de ter incentivado a discussão sobre a demonstração contábil do terceiro trimestre, que ainda não teve a assinatura do auditor. Também permanecem em aberto a questão do valor da propina e a baixa contábil decorrente.
Qual a relevância disto? É bem verdade que as agências de classificação de crédito são lentas e cometem muitos enganos. Também existe a acusação que a Moody´s não analisou adequadamente a situação da Petrobras, uma empresa com uma perspectiva na área operacional no mínimo regular. Talvez a Moody´s tivesse que esperar a apresentação das demonstrações contábeis.
Por outro lado, o mercado já sinalizava que a situação da Petrobras era ruim. O controlador permaneceu impassível durante muito tempo e quando agiu a alteração da direção não foi suficiente para reestabelecer à confiança. Além disto, deverá haver uma amortização, sendo que a direção anterior sinalizou um valor de 88 bilhões de reais e atual disse que este valor é excessivo e incorreto. Em suma, a situação da empresa é ruim e somente agora a Moody´s notou isto.
Qualquer que seja a opinião, a notícia da redução da nota trouxe uma série de questionamentos sobre a passividade da direção da empresa e as difíceis alternativas existentes.
Para a contabilidade é importante dizer que geralmente a nota das agências de ratings está vinculada a índices conhecidos, como endividamento. A situação da Petrobras é boa ou ruim? A resposta esta na demonstração contábil, mesmo que não tenha a assinatura do auditor.
Positivo ou Negativo – Negativo para a Petrobras, para outras empresas brasileiras que estão sofrendo a desconfiança de outros investidores e para o país, principal controlador da empresa.
Desdobramentos – Temos três grandes agências de ratings. Uma delas rebaixou a Petrobras. A questão é saber se as outras também seguirão na nesta direção. Arrisco a dizer que sim, já que as opções da Petrobras não são fáceis e a administração não parece preparada para enfrentar.
Qual a relevância disto? É bem verdade que as agências de classificação de crédito são lentas e cometem muitos enganos. Também existe a acusação que a Moody´s não analisou adequadamente a situação da Petrobras, uma empresa com uma perspectiva na área operacional no mínimo regular. Talvez a Moody´s tivesse que esperar a apresentação das demonstrações contábeis.
Por outro lado, o mercado já sinalizava que a situação da Petrobras era ruim. O controlador permaneceu impassível durante muito tempo e quando agiu a alteração da direção não foi suficiente para reestabelecer à confiança. Além disto, deverá haver uma amortização, sendo que a direção anterior sinalizou um valor de 88 bilhões de reais e atual disse que este valor é excessivo e incorreto. Em suma, a situação da empresa é ruim e somente agora a Moody´s notou isto.
Qualquer que seja a opinião, a notícia da redução da nota trouxe uma série de questionamentos sobre a passividade da direção da empresa e as difíceis alternativas existentes.
Para a contabilidade é importante dizer que geralmente a nota das agências de ratings está vinculada a índices conhecidos, como endividamento. A situação da Petrobras é boa ou ruim? A resposta esta na demonstração contábil, mesmo que não tenha a assinatura do auditor.
Positivo ou Negativo – Negativo para a Petrobras, para outras empresas brasileiras que estão sofrendo a desconfiança de outros investidores e para o país, principal controlador da empresa.
Desdobramentos – Temos três grandes agências de ratings. Uma delas rebaixou a Petrobras. A questão é saber se as outras também seguirão na nesta direção. Arrisco a dizer que sim, já que as opções da Petrobras não são fáceis e a administração não parece preparada para enfrentar.
O que vem pela frente para as economias da América Latina?
O que vem pela frente para as economias da América Latina?Ilan GoldfajnItau Macroeconomia
Seis anos se passaram desde a última crise financeira global. O pior ficou para trás, mas a normalidade ainda não foi restaurada. Os EUA tem conseguido sustentar taxas robustas de crescimento e criar empregos, mas a expansão de salários e a inflação ainda estão baixas e dúvidas em relação a uma estagnação secular persistem. A Zona do Euro evitou um colapso, mas está apresentando dificuldades para sustentar níveis moderados de crescimento. O Japão renovou esforços para combater a deflação, com resultados mistos até agora. O juro básico segue próximo de zero nos EUA. A expansão monetária ainda está sendo implementada na Europa e no Japão.
A China se recuperou rapidamente da crise financeira global, com forte estímulo do governo, em sua maioria medidas parafiscais. Mas as políticas de estímulo criaram distorções: as taxas de investimento, já acima do desejado, aumentaram ainda mais. A capacidade ociosa se acumulou em diversos setores. Hoje a China cresce bem menos e a desaceleração é estrutural, na medida em que as autoridades buscam reequilibrar o crescimento: menos investimento, mais consumo e, talvez, menos danos ao meio ambiente. Em suma, crescimento econômico menor, porém mais equilibrado.
O banco central americano está removendo gradualmente o estímulo monetário implementado durante a crise. À medida em que os juros sobem nos EUA, os títulos de mercados emergentes ficam menos atraentes. A liquidez vai ficar mais cara e os países latino-americanos enfrentarão condições financeiras externas mais apertadas.
Um novo quadro global desponta no horizonte: os EUA estão prestes a iniciar um ciclo de aperto monetário e o crescimento chinês continuará se desacelerando. O que isso significa para a América Latina? Em alguns aspectos, isso significa um ambiente mais desafiador e arriscado para o crescimento adiante.
Os fundamentos vão distinguir os países
O investimento na região é parcialmente financiado pela poupança externa, como mostram os déficits em conta corrente moderados, porém generalizados. Até agora, investidores em busca de rendimentos mais elevados têm estado dispostos a financiar economias emergentes, mas na medida em que os retornos dos títulos americanos subam, isso pode mudar. A disponibilidade de poupança externa vai diminuir. Para manter os níveis atuais de investimento, a poupança interna precisará aumentar.
Os preços das commodities deixarão de jogar a favor dos investimentos nos países latino-americanos. Na última década, os termos de troca na América Latina melhoraram à medida que a urbanização na China impulsionou a demanda por commodities. Termos de troca mais robustos ajudaram a impulsionar o investimento nesta região de baixa poupança. Com o arrefecimento dos investimentos na China, os preços das commodities serão mais baixos do que no passado. A região enfrentará termos de troca menos benignos adiante.
Assim, as condições globais para o investimento serão mais difíceis. Para continuar crescendo, as economias latino-americanas precisarão ganhar produtividade. Chile, Colômbia e Peru se destacam devido ao bom ambiente institucional, à abertura ao comércio internacional e reformas. O processo de reformas e a recuperação dos EUA podem elevar as taxas de crescimento no México. Já a Argentina precisará corrigir políticas micro e macroeconômicas para alcançar taxas de crescimento maiores e controlar a inflação.
No Brasil, há desafios pela frente. A inflação está próxima do teto da meta e os déficits fiscais em termos nominais estão elevados. Além dos desequilíbrios macroeconômicos, persistem os problemas estruturais, como falta de infraestrutura adequada e excesso de burocracia. Restaurar a confiança e implantar reformas é necessário para o País voltar a crescer a taxas altas.
Ambiente mais arriscado para a América Latina
A princípio, a normalização da política monetária nas economias desenvolvidas será suave. Porém, na prática, problemas podem ocorrer — e geralmente são imprevisíveis. A história ensina que longos períodos de política monetária frouxa são frequentemente seguidos por volatilidade financeira e econômica.
Algumas commodities essenciais sofreram recentemente acentuadas quedas de preços, como petróleo, minério de ferro e soja. Os preços mais baixos e voláteis das commodities são uma tendência? Ainda é cedo para tirar conclusões, mas esta certamente é uma possibilidade. A oferta reagiu, com grande defasagem, aos preços elevados praticados nos últimos anos. E agora a China cresce mais lentamente do que no passado.
Independentemente dos fundamentos ou das políticas macroeconômicas domésticas, existe uma tendência comum entre os exportadores de commodities da região: a regra é a desaceleração do crescimento. Isso se aplica à Argentina, Brasil, Chile, Peru e Venezuela. Evidentemente, os fundamentos fazem a diferença: Chile, Colômbia e Peru crescem mais rapidamente do que os outros países. A Argentina enfrenta uma recessão dura e o Brasil está no meio do caminho. O México pertence a outra categoria, por não ser um exportador de commodities e sim um exportador de manufaturados para os EUA.
O ambiente global tornou-se mais arriscado. Os países latino-americanos estão preparados para repentinas fugas de capital? E para preços de commodities mais baixos e possivelmente mais voláteis? A resposta a ambas as perguntas é: mais preparados agora do que no passado. Por quê?
Diversos países da região aproveitaram os anos de ambiente global favorável para aprimorar os fundamentos domésticos. As posições externas ficaram bem mais resistentes. A dívida pública foi reduzida e sua composição se tornou bem mais saudável. Regimes de metas de inflação foram implantados com sucesso, permitindo que as taxas de câmbio absorvam choques vindos de fora. A melhora dos fundamentos macroeconômicos criou espaço para enfrentamento do ambiente externo mais difícil com políticas anticíclicas. Chile, Colômbia, México e Peru se encaixam nessa categoria.
A dívida de curto prazo hoje representa uma parcela pequena das obrigações externas. A maior parte das obrigações é denominada em moeda local, uma vez que investimentos diretos e em carteira representam a maioria dos influxos estrangeiros nos países da América Latina. Além disso, os bancos centrais acumularam reservas internacionais durante o período de bonança, de forma que muitos governos agora são credores líquidos em dólar. As taxas de câmbio retomaram seu papel de garantir o equilíbrio do balanço de pagamentos.
A dívida pública como percentual do PIB recuou significativamente e seu perfil também melhorou: os prazos da dívida se alongaram e a parcela de dívidas denominadas em dólares diminuiu substancialmente. Em alguns países, houve progresso no arcabouço de política fiscal. Os governos começaram a implantar regras fiscais anticíclicas em vez de buscar um nível específico de saldo orçamentário.
Os anos de liquidez global também permitiram aumento da taxa de investimento naqueles países que usaram as condições positivas a seu favor. Nesse contexto, destacam-se Colômbia e Peru, que aumentaram de forma significativa suas taxas de investimento, para níveis maiores do que os observados em seus pares. Ao mesmo tempo, os níveis de investimento na Argentina aumentaram, mas continuam relativamente baixos, enquanto no Brasil a taxa de investimento permaneceu praticamente estável.
A política monetária ganhou mais credibilidade. Os bancos centrais evoluíram de regimes de câmbio fixo para regimes de metas de inflação. As expectativas de inflação são ancoradas na meta de inflação e não na taxa de câmbio. Assim, o repasse da variação cambial à inflação diminuiu bastante. Esses ganhos de credibilidade permitem o uso de política monetária anticíclica.
No entanto, alguns países da região estão em posição pior. Nos anos de bonança, as políticas fiscais e monetárias foram extremamente expansivas e, juntamente com regimes de câmbio fixo, levaram a grandes desequilíbrios internos e externos. Argentina e Venezuela estão nessa categoria.
Ilan Goldfajn
Felipe Salles
Pesquisa macroeconômica - Itaú
Ilan Goldfajn - Economista-Chefe
Seis anos se passaram desde a última crise financeira global. O pior ficou para trás, mas a normalidade ainda não foi restaurada. Os EUA tem conseguido sustentar taxas robustas de crescimento e criar empregos, mas a expansão de salários e a inflação ainda estão baixas e dúvidas em relação a uma estagnação secular persistem. A Zona do Euro evitou um colapso, mas está apresentando dificuldades para sustentar níveis moderados de crescimento. O Japão renovou esforços para combater a deflação, com resultados mistos até agora. O juro básico segue próximo de zero nos EUA. A expansão monetária ainda está sendo implementada na Europa e no Japão.
A China se recuperou rapidamente da crise financeira global, com forte estímulo do governo, em sua maioria medidas parafiscais. Mas as políticas de estímulo criaram distorções: as taxas de investimento, já acima do desejado, aumentaram ainda mais. A capacidade ociosa se acumulou em diversos setores. Hoje a China cresce bem menos e a desaceleração é estrutural, na medida em que as autoridades buscam reequilibrar o crescimento: menos investimento, mais consumo e, talvez, menos danos ao meio ambiente. Em suma, crescimento econômico menor, porém mais equilibrado.
O banco central americano está removendo gradualmente o estímulo monetário implementado durante a crise. À medida em que os juros sobem nos EUA, os títulos de mercados emergentes ficam menos atraentes. A liquidez vai ficar mais cara e os países latino-americanos enfrentarão condições financeiras externas mais apertadas.
Um novo quadro global desponta no horizonte: os EUA estão prestes a iniciar um ciclo de aperto monetário e o crescimento chinês continuará se desacelerando. O que isso significa para a América Latina? Em alguns aspectos, isso significa um ambiente mais desafiador e arriscado para o crescimento adiante.
Os fundamentos vão distinguir os países
O investimento na região é parcialmente financiado pela poupança externa, como mostram os déficits em conta corrente moderados, porém generalizados. Até agora, investidores em busca de rendimentos mais elevados têm estado dispostos a financiar economias emergentes, mas na medida em que os retornos dos títulos americanos subam, isso pode mudar. A disponibilidade de poupança externa vai diminuir. Para manter os níveis atuais de investimento, a poupança interna precisará aumentar.
Os preços das commodities deixarão de jogar a favor dos investimentos nos países latino-americanos. Na última década, os termos de troca na América Latina melhoraram à medida que a urbanização na China impulsionou a demanda por commodities. Termos de troca mais robustos ajudaram a impulsionar o investimento nesta região de baixa poupança. Com o arrefecimento dos investimentos na China, os preços das commodities serão mais baixos do que no passado. A região enfrentará termos de troca menos benignos adiante.
Assim, as condições globais para o investimento serão mais difíceis. Para continuar crescendo, as economias latino-americanas precisarão ganhar produtividade. Chile, Colômbia e Peru se destacam devido ao bom ambiente institucional, à abertura ao comércio internacional e reformas. O processo de reformas e a recuperação dos EUA podem elevar as taxas de crescimento no México. Já a Argentina precisará corrigir políticas micro e macroeconômicas para alcançar taxas de crescimento maiores e controlar a inflação.
No Brasil, há desafios pela frente. A inflação está próxima do teto da meta e os déficits fiscais em termos nominais estão elevados. Além dos desequilíbrios macroeconômicos, persistem os problemas estruturais, como falta de infraestrutura adequada e excesso de burocracia. Restaurar a confiança e implantar reformas é necessário para o País voltar a crescer a taxas altas.
Ambiente mais arriscado para a América Latina
A princípio, a normalização da política monetária nas economias desenvolvidas será suave. Porém, na prática, problemas podem ocorrer — e geralmente são imprevisíveis. A história ensina que longos períodos de política monetária frouxa são frequentemente seguidos por volatilidade financeira e econômica.
Algumas commodities essenciais sofreram recentemente acentuadas quedas de preços, como petróleo, minério de ferro e soja. Os preços mais baixos e voláteis das commodities são uma tendência? Ainda é cedo para tirar conclusões, mas esta certamente é uma possibilidade. A oferta reagiu, com grande defasagem, aos preços elevados praticados nos últimos anos. E agora a China cresce mais lentamente do que no passado.
Independentemente dos fundamentos ou das políticas macroeconômicas domésticas, existe uma tendência comum entre os exportadores de commodities da região: a regra é a desaceleração do crescimento. Isso se aplica à Argentina, Brasil, Chile, Peru e Venezuela. Evidentemente, os fundamentos fazem a diferença: Chile, Colômbia e Peru crescem mais rapidamente do que os outros países. A Argentina enfrenta uma recessão dura e o Brasil está no meio do caminho. O México pertence a outra categoria, por não ser um exportador de commodities e sim um exportador de manufaturados para os EUA.
O ambiente global tornou-se mais arriscado. Os países latino-americanos estão preparados para repentinas fugas de capital? E para preços de commodities mais baixos e possivelmente mais voláteis? A resposta a ambas as perguntas é: mais preparados agora do que no passado. Por quê?
Diversos países da região aproveitaram os anos de ambiente global favorável para aprimorar os fundamentos domésticos. As posições externas ficaram bem mais resistentes. A dívida pública foi reduzida e sua composição se tornou bem mais saudável. Regimes de metas de inflação foram implantados com sucesso, permitindo que as taxas de câmbio absorvam choques vindos de fora. A melhora dos fundamentos macroeconômicos criou espaço para enfrentamento do ambiente externo mais difícil com políticas anticíclicas. Chile, Colômbia, México e Peru se encaixam nessa categoria.
A dívida de curto prazo hoje representa uma parcela pequena das obrigações externas. A maior parte das obrigações é denominada em moeda local, uma vez que investimentos diretos e em carteira representam a maioria dos influxos estrangeiros nos países da América Latina. Além disso, os bancos centrais acumularam reservas internacionais durante o período de bonança, de forma que muitos governos agora são credores líquidos em dólar. As taxas de câmbio retomaram seu papel de garantir o equilíbrio do balanço de pagamentos.
A dívida pública como percentual do PIB recuou significativamente e seu perfil também melhorou: os prazos da dívida se alongaram e a parcela de dívidas denominadas em dólares diminuiu substancialmente. Em alguns países, houve progresso no arcabouço de política fiscal. Os governos começaram a implantar regras fiscais anticíclicas em vez de buscar um nível específico de saldo orçamentário.
Os anos de liquidez global também permitiram aumento da taxa de investimento naqueles países que usaram as condições positivas a seu favor. Nesse contexto, destacam-se Colômbia e Peru, que aumentaram de forma significativa suas taxas de investimento, para níveis maiores do que os observados em seus pares. Ao mesmo tempo, os níveis de investimento na Argentina aumentaram, mas continuam relativamente baixos, enquanto no Brasil a taxa de investimento permaneceu praticamente estável.
A política monetária ganhou mais credibilidade. Os bancos centrais evoluíram de regimes de câmbio fixo para regimes de metas de inflação. As expectativas de inflação são ancoradas na meta de inflação e não na taxa de câmbio. Assim, o repasse da variação cambial à inflação diminuiu bastante. Esses ganhos de credibilidade permitem o uso de política monetária anticíclica.
No entanto, alguns países da região estão em posição pior. Nos anos de bonança, as políticas fiscais e monetárias foram extremamente expansivas e, juntamente com regimes de câmbio fixo, levaram a grandes desequilíbrios internos e externos. Argentina e Venezuela estão nessa categoria.
Ilan Goldfajn
Felipe Salles
Pesquisa macroeconômica - Itaú
Ilan Goldfajn - Economista-Chefe
27 fevereiro 2015
Som da Sexta - Noura Mint Seymali
Noura Mint Seymali, cantora africana da Mauritânia, é autora de um dos melhores discos de rock do ano passado:
Noura Mint Seymali is one of Mauritania's young celebrities, a griot from a celebrated musical family, who started out as a backing vocalist for her celebrated stepmother, Dimi Mint Abba, and has now developed an exuberant, full-tilt style of her own. She accompanies herself on the ardine, the nine-stringed harp traditionally played only by women, but the songs are dominated by the furious, stuttering electric guitar work of her husband Jeiche Ould Chighaly, who is also an exponent of the traditional, guitar-like tidinet. This is an album of gutsy, declamatory playing and singing, from the slow and then exuberant traditional love song El Barm to the powerful, chanting Tikifite, a Dimi Mint Abba favourite. Impressive – but a little more variety in the arrangements would have been welcome.
Noura Mint Seymali is one of Mauritania's young celebrities, a griot from a celebrated musical family, who started out as a backing vocalist for her celebrated stepmother, Dimi Mint Abba, and has now developed an exuberant, full-tilt style of her own. She accompanies herself on the ardine, the nine-stringed harp traditionally played only by women, but the songs are dominated by the furious, stuttering electric guitar work of her husband Jeiche Ould Chighaly, who is also an exponent of the traditional, guitar-like tidinet. This is an album of gutsy, declamatory playing and singing, from the slow and then exuberant traditional love song El Barm to the powerful, chanting Tikifite, a Dimi Mint Abba favourite. Impressive – but a little more variety in the arrangements would have been welcome.
Por que o Brasil cresce tão pouco em relação a outros emergentes?
Edmar Bacha - Phd em Yale- Folha de São Paulo
Podemos reparar que quase tudo em nossas casas é feito no Brasil: material de construção, móveis, eletrodomésticos, roupas, comida.
O raro produto importado é comprado a preços surreais. Isso nos parece natural. O espanto ocorre quando viajamos ao exterior e nos deparamos, nas lojas dos EUA e da Europa, com a grande quantidade de produtos fabricados em outros países e com a ausência quase completa de produtos made in Brazil.
Como me disse minha neta Luiza, de nove anos, em sua primeira viagem a Nova York: "Vovô, aqui tudo é bom e barato. Por que não é assim também no Brasil?".
Dedico a ela este texto, na expectativa de que o possa ler daqui a alguns anos com a mesma perplexidade com que os jovens hoje em dia nos escutam contar como era a hiperinflação antes do Real.
Robert Solow, Prêmio Nobel de Economia, é seguramente um dos economistas mais admirados do mundo. Em entrevista recente, disse não acreditar na estagnação da economia mundial.
E explicou: "A chave são economias como a Rússia, a Índia, a China, o Brasil. Nelas, as indústrias ainda têm que se modernizar para chegar ao nível de avanço tecnológico em que a Europa e a América do Norte já estão. Temos que esperar que essa convergência ocorra. Se não ocorrer, será provavelmente por razões políticas, e não por razões econômicas. Deixando a política de lado, sobre a qual é difícil dizer qualquer coisa inteligente, há ainda muito espaço para essa modernização".
Infelizmente, no Brasil não podemos deixar a política de lado, pois são inúmeros os impedimentos que ela coloca para a modernização. Eles incluem absurdos como a nomeação para ministro da Ciência e Tecnologia do ex-deputado Aldo Rebelo, que apresentou projeto de lei para proibir a adoção de novas tecnologias no setor público. Passam pela bizarrice da tomada de três pontos. E atingem o trágico com os escândalos em série na Petrobras, que revelam o extraordinário poder corruptor de uma política industrial baseada no monopólio estatal, na reserva de mercado e no conteúdo nacional.
São exemplos extremos de políticas de isolamento do país ao comércio internacional, que também se expressam na ausência de acordos comerciais com os países desenvolvidos, na atração das multinacionais para explorar o mercado interno, mas não para exportar a partir do Brasil, na paralisante burocracia portuária e alfandegária, nas altas tarifas aos importados, nas exageradas margens de preferência para as compras governamentais de produtos locais, nas políticas de adensamento produtivo (nome novo para a velha substituição de importações).
Disso tende a resultar uma taxa de câmbio supervalorizada que dificulta ainda mais as exportações e reduz a competitividade dos produtores brasileiros. Paradoxalmente, essa supervalorização fornece justificativa para o próprio protecionismo que está na raiz do câmbio valorizado.
Quando expressa sua confiança em que os emergentes atingirão o nível de renda per capita dos países hoje desenvolvidos, Robert Solow nos fala dos benefícios da interconexão entre as economias.
Da maior importância para o crescimento da produtividade nesses países são o acesso a novas tecnologias, produtos e insumos, as economias de escala que se obtêm num mercado ampliado e as reduções de custo que resultam da maior concorrência entre as empresas.
Não se trata apenas de teoria. Os países que conseguiram entrar para o Primeiro Mundo após a Segunda Guerra Mundial o fizeram com uma forte integração comercial com os países mais ricos.
Foi esse o caso de Israel e dos tigres asiáticos (Coreia do Sul, Cingapura, Hong Kong e Taiwan), cuja integração se baseou na exportação de produtos industriais.
Foi esse o caso da periferia da Europa (Portugal, Espanha, Grécia e Irlanda), com exportações predominantemente de serviços. Foi esse também o caso da Austrália, da Nova Zelândia e da Noruega, cujas exportações são principalmente de produtos primários.
Não se conclua que o comércio internacional só beneficia países pequenos. Há também o exemplo da China, que renasceu a partir da década de 1980 com a decisão de Deng Xiaoping de abandonar o isolacionismo maoista e abrir o país para o comércio e o investimento estrangeiro.
Em contraste, o Brasil se mantém como uma das economias mais fechadas ao comércio internacional. Somos o último da fila, com a menor participação do comércio exterior no PIB entre os 179 países para os quais o Banco Mundial tem dados.
Não é porque sejamos um país grande. Os seis países maiores (EUA, China, Alemanha, Japão, França e Reino Unido) são também os seis maiores exportadores. O Brasil é apenas o 22º maior exportador. Temos 3,3% do PIB mundial, mas nossas exportações representam apenas 1,3% do total mundial.
Caso exemplar é a indústria automobilística brasileira. Protegida há seis décadas, mal exporta para nossos vizinhos. Em contraste, fábricas mexicanas, que produzem duas vezes mais por trabalhador, exportam para o lucrativo mercado americano e participam ativamente das cadeias globais de valor.
Com esse isolamento comercial, não é de estranhar que, além de baixa, a produtividade cresça pouco. Nos últimos 33 anos, a produtividade do trabalho no Brasil cresceu um minúsculo 0,3% ao ano, nos condenando a permanecer como um país de renda média. Enquanto isso, os demais emergentes vão nos ultrapassando, um a um.
Em entrevista recente, Ricardo Paes de Barros, ex-subsecretário da Secretaria de Assuntos Estratégicos, diz: "São mais de 500 políticas voltadas a elevar a produtividade...Então, não é falta de política, é preciso analisar melhor por qual motivo essas políticas não estão tendo o impacto que gostaríamos que elas tivessem".
A razão parece clara diante do que expus. As empresas no Brasil não têm motivos para aumentar a produtividade. Por um lado, são forçadas a comprar localmente insumos caros e obsoletos. Por outro, vendem seus produtos quase que só dentro do país, em mercados protegidos e com diminuta concorrência. Por isso o Brasil cresce tão pouco em relação a outros emergentes.
Podemos reparar que quase tudo em nossas casas é feito no Brasil: material de construção, móveis, eletrodomésticos, roupas, comida.
O raro produto importado é comprado a preços surreais. Isso nos parece natural. O espanto ocorre quando viajamos ao exterior e nos deparamos, nas lojas dos EUA e da Europa, com a grande quantidade de produtos fabricados em outros países e com a ausência quase completa de produtos made in Brazil.
Como me disse minha neta Luiza, de nove anos, em sua primeira viagem a Nova York: "Vovô, aqui tudo é bom e barato. Por que não é assim também no Brasil?".
Dedico a ela este texto, na expectativa de que o possa ler daqui a alguns anos com a mesma perplexidade com que os jovens hoje em dia nos escutam contar como era a hiperinflação antes do Real.
Robert Solow, Prêmio Nobel de Economia, é seguramente um dos economistas mais admirados do mundo. Em entrevista recente, disse não acreditar na estagnação da economia mundial.
E explicou: "A chave são economias como a Rússia, a Índia, a China, o Brasil. Nelas, as indústrias ainda têm que se modernizar para chegar ao nível de avanço tecnológico em que a Europa e a América do Norte já estão. Temos que esperar que essa convergência ocorra. Se não ocorrer, será provavelmente por razões políticas, e não por razões econômicas. Deixando a política de lado, sobre a qual é difícil dizer qualquer coisa inteligente, há ainda muito espaço para essa modernização".
Infelizmente, no Brasil não podemos deixar a política de lado, pois são inúmeros os impedimentos que ela coloca para a modernização. Eles incluem absurdos como a nomeação para ministro da Ciência e Tecnologia do ex-deputado Aldo Rebelo, que apresentou projeto de lei para proibir a adoção de novas tecnologias no setor público. Passam pela bizarrice da tomada de três pontos. E atingem o trágico com os escândalos em série na Petrobras, que revelam o extraordinário poder corruptor de uma política industrial baseada no monopólio estatal, na reserva de mercado e no conteúdo nacional.
São exemplos extremos de políticas de isolamento do país ao comércio internacional, que também se expressam na ausência de acordos comerciais com os países desenvolvidos, na atração das multinacionais para explorar o mercado interno, mas não para exportar a partir do Brasil, na paralisante burocracia portuária e alfandegária, nas altas tarifas aos importados, nas exageradas margens de preferência para as compras governamentais de produtos locais, nas políticas de adensamento produtivo (nome novo para a velha substituição de importações).
Disso tende a resultar uma taxa de câmbio supervalorizada que dificulta ainda mais as exportações e reduz a competitividade dos produtores brasileiros. Paradoxalmente, essa supervalorização fornece justificativa para o próprio protecionismo que está na raiz do câmbio valorizado.
Quando expressa sua confiança em que os emergentes atingirão o nível de renda per capita dos países hoje desenvolvidos, Robert Solow nos fala dos benefícios da interconexão entre as economias.
Da maior importância para o crescimento da produtividade nesses países são o acesso a novas tecnologias, produtos e insumos, as economias de escala que se obtêm num mercado ampliado e as reduções de custo que resultam da maior concorrência entre as empresas.
Não se trata apenas de teoria. Os países que conseguiram entrar para o Primeiro Mundo após a Segunda Guerra Mundial o fizeram com uma forte integração comercial com os países mais ricos.
Foi esse o caso de Israel e dos tigres asiáticos (Coreia do Sul, Cingapura, Hong Kong e Taiwan), cuja integração se baseou na exportação de produtos industriais.
Foi esse o caso da periferia da Europa (Portugal, Espanha, Grécia e Irlanda), com exportações predominantemente de serviços. Foi esse também o caso da Austrália, da Nova Zelândia e da Noruega, cujas exportações são principalmente de produtos primários.
Não se conclua que o comércio internacional só beneficia países pequenos. Há também o exemplo da China, que renasceu a partir da década de 1980 com a decisão de Deng Xiaoping de abandonar o isolacionismo maoista e abrir o país para o comércio e o investimento estrangeiro.
Em contraste, o Brasil se mantém como uma das economias mais fechadas ao comércio internacional. Somos o último da fila, com a menor participação do comércio exterior no PIB entre os 179 países para os quais o Banco Mundial tem dados.
Não é porque sejamos um país grande. Os seis países maiores (EUA, China, Alemanha, Japão, França e Reino Unido) são também os seis maiores exportadores. O Brasil é apenas o 22º maior exportador. Temos 3,3% do PIB mundial, mas nossas exportações representam apenas 1,3% do total mundial.
Caso exemplar é a indústria automobilística brasileira. Protegida há seis décadas, mal exporta para nossos vizinhos. Em contraste, fábricas mexicanas, que produzem duas vezes mais por trabalhador, exportam para o lucrativo mercado americano e participam ativamente das cadeias globais de valor.
Com esse isolamento comercial, não é de estranhar que, além de baixa, a produtividade cresça pouco. Nos últimos 33 anos, a produtividade do trabalho no Brasil cresceu um minúsculo 0,3% ao ano, nos condenando a permanecer como um país de renda média. Enquanto isso, os demais emergentes vão nos ultrapassando, um a um.
Em entrevista recente, Ricardo Paes de Barros, ex-subsecretário da Secretaria de Assuntos Estratégicos, diz: "São mais de 500 políticas voltadas a elevar a produtividade...Então, não é falta de política, é preciso analisar melhor por qual motivo essas políticas não estão tendo o impacto que gostaríamos que elas tivessem".
A razão parece clara diante do que expus. As empresas no Brasil não têm motivos para aumentar a produtividade. Por um lado, são forçadas a comprar localmente insumos caros e obsoletos. Por outro, vendem seus produtos quase que só dentro do país, em mercados protegidos e com diminuta concorrência. Por isso o Brasil cresce tão pouco em relação a outros emergentes.
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