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16 agosto 2013

Em defesa do hedge accounting

Num texto publicado no Valor Econômico ('Geografia contábil' sob os holofotes - Fernando Torres - Valor Econômico - 16/08/2013) algumas afirmações interessantes e controversas sobre a contabilidade das empresas brasileiras. Logo no primeiro parágrafo:
A temporada de balanços do segundo trimestre trouxe para o holofote temas contábeis extremamente áridos como "geografia contábil" e o uso do "valor justo" para mensurar ativos e passivos.
Devo confessar que é a primeira vez que deparo com o termo "geografia contábil". Pesquisei no Google e encontrei somente 37 resultados (pesquisa realizada no dia 16, as 10:35 da manhã, quando estava redigindo este texto). Já o termo valor justo realmente é controverso e não de agora. Prossegue o texto:
A grande razão para essas discussões virem à tona neste momento foi que no segundo trimestre houve mudança relevante nos preços dos instrumentos financeiros. O dólar saltou 10% e as taxas de juros subiram bastante tanto no Brasil como no exterior, seja pela sinalização do Banco Central de que vai continuar elevar a Selic, ou por causa da expectativa de mudança no rumo da política monetária dos Estados Unidos.
Não é a primeira vez que isto ocorre e certamente não será a última. E novamente temos controvérsias sobre o tratamento da variação cambial. Prossegue o texto:
O impacto da variação do dólar provocou um aumento - em reais - da dívida em moeda estrangeira das empresas. E teria como contrapartida natural uma despesa na conta de lucros e perdas das companhias.
O termo "conta de lucros e perdas" não é recente. Talvez esteja um pouco em desuso e não deveria ser relembrado.
Embora isso tenha ocorrido para muitas empresas, e provocado as despesas "não caixa" no resultado, não foi assim com Petrobras e Braskem, que decidiram adotar a contabilidade de hedge para evitar esse impacto. Dessa forma, o efeito do câmbio na dívida foi registrado diretamente no patrimônio, sem reduzir o lucro das companhias no trimestre.
Esta é uma discussão muito mais profunda. O efeito cambial não passar pelo resultado contraria os defensores do "clean surplus".
Se a "geografia contábil" não tivesse relevância, não haveria diferença entre se registrar o efeito no resultado ou no PL, já que o impacto final é igual.
O texto parece esclarecer o conceito de geografia contábil aqui: o registro do efeito no resultado ou no PL. Mas ao contrário do que afirma o texto, existe diferença entre registrar no resultado ou no PL. Sobre a contabilidade de hedge:
Segundo um dos contadores mais respeitados do país, o professor Eliseu Martins, da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP, a contabilidade de hedge permite uma "representação melhor da situação econômica" das empresas.
"Se o passivo aumentou, eu reconheço a perda de patrimônio, mas não registro a pancada no resultado porque vou contrapor isso aos ganhos com exportação no futuro", resume o professor, que lembra que as exigências para se aferir a eficácia desse hedge ao longo do tempo são severas.
A questão parece não ser bem sua utilização, mas o fato das empresas resolverem alterar sua política contábil no meio do caminho, sem comunicar adequadamente ao mercado, aparentemente "gerenciando" seus resultados.
Como oscilações bruscas no câmbio não são novidade no Brasil, o que aparentemente aconteceu é que as empresas preferiram enfrentar o trabalho de ter que provar aos auditores que seus hedges funcionam do que ter que passar horas tentando convencer investidores e o público que a despesa "não caixa" que corroeu o lucro não terá efeito nenhum - quando na maior parte dos casos a distribuição de dividendos é sim afetada pelo sobe e desce cambial.
Não vejo muito problema em "provar aos auditores" já que a contabilidade de hedge já estava normatizada pelo CPC. A gritaria dos investidores foi decorrente da falta de clareza na mudança da política contábil.
Já outra discussão sobre a geografia contábil tem a ver com categoria "disponível para venda", que permite que a variação de preço dos instrumentos financeiros seja registrada no patrimônio líquido, e não no resultado.
O texto insiste em usar o termo "geografia contábil". Agora sobre o tratamento dos instrumentos financeiros.
Se não houvesse essa possibilidade - e assumindo tudo mais constante -, o Bradesco teria registrado prejuízo no segundo trimestre, já que a perda registrada no patrimônio por causa desses títulos foi de R$ 5,3 bilhões e o lucro apurado no período somou R$ 3 bilhões. Da mesma forma, o Itaú teria lucro R$ 1,2 bilhões menor e o Bando do Brasil, R$ 685 milhões.
"Essa categoria disponível para venda nunca me convenceu muito. Tanto que está para morrer dentro do IFRS", diz Martins.
Para ele, se houvesse o entendimento de que ganhos e perdas não realizados não deveriam transitar pelo resultado, como já ocorreu no passado, isso funcionaria melhor se a regra valesse para todo o conjunto de ativos. "O problema é a classificação ficar ao arbítrio da instituição."
Para minimizar esse problema de geografia, o professor defende que os lançamentos tratados como "outros resultados abrangentes" apareçam logo abaixo da demonstração de resultados, e não numa peça separada do balanço.

Mais do que isto, que o resultado abrangente seja a base de desempenho das empresas.
Por fim, a última pergunta que surge dessa safra de balanços é: se os ativos financeiros mudaram tão bruscamente de preço no trimestre, por que não houve mudança perceptível no valor dos ativos não financeiros, mesmo naqueles registrados pelo chamado valor justo, como os ativos biológicos e os prédios de empresas que vivem de renda de aluguel e de administradoras de shoppings?
De acordo com Luiz Paulo Silveira, sócio da Apsis, consultoria especializada em avaliação de ativos, ao se calcular o efeito da recente alta da Selic sobre os modelos de avaliação de valor justo do setor imobiliário, por exemplo, haveria uma alta de 13% na taxa de desconto, o que, a princípio, provocaria uma redução no valor dos bens. Ele diz, contudo, que, como os modelos de avaliação de ativos não financeiros dependem de inúmeras outras informações e premissas, além da taxa de juros brasileira, "a sensibilidade do valor final é bem menor".
O especialista lembra ainda que os demais ativos não financeiros - que não os biológicos e nem as propriedades para investimento - só precisam ser reavaliados em fusões e aquisições ou quando há evidências de perda do valor recuperável. "E apenas variações relevantes no desempenho da companhia ou na conjuntura econômica deflagrariam a necessidade de ajuste, o que não parece o caso."
Particularmente achei este o melhor trecho da reportagem. A pergunta a pertinente, mas a resposta apresentada não convence. Além do efeito da alta da Selic, as manifestações populares alteraram a percepção do risco Brasil. Isto é inegável. E deveria interferir diretamente na taxa de desconto. Mas isto não ocorreu. Minha opinião é que as empresas evitam alterar suas avaliações por serem subjetivas, imprecisas e inadequadas. Se fosse realizada de maneira adequada, haveria um grande quantidade de amortizações.
(Cartoon adaptado daqui)

Rir é o melhor remédio

Do The Telegraph (via Boring is optional): Accoutants (e não acountants) não são somente contadores de feijão. Mas a fotografia é de ervilhas.

Max Geringher fala da sua experiência em contabilidade

Na palestra de abertura da XXVIII Contesc (Convenção da Contabilidade de Santa Catarina) em Itajaí, o consultor e comentarista Max Geringher fez um passeio pelo próprio passado e fez analogias com situações do mundo corporativo para elogiar as habilidades dos profissionais da contabilidade.

Administrador e Técnico em Contabilidade
"A humanidade começou a escrever por conta do contador, que precisava registrar as transações", começou ele, contando em seguida que, além de Administração, fez o curso de Técnico em Contabilidade, o que lhe fez prestar mais atenção nos detalhes numéricos. "Essa talvez fosse a diferença que eu tinha nas empresas onde trabalhei, pois eu montava balanços dentro da empresa de um modo diferente, montando por ordem de despesa, da maior para menor. Outro ponto que aprendi foi ir atrás de mais dados quando a descrição da despesa não era detalhada, ou seja, eu abria para entender e acabei recebendo pontos nas organizações ao fazer observações do detalhe do detalhe", relatou.

Ao fazer comparações de hábitos de décadas passadas com a atualidade, Max Geringher ressaltou preocupações com a segurança antes inexistentes, aumento do poder de compra que fez mais pessoas terem acesso a bens de consumo antes destinados apenas aos mais abastados e tecnologias que facilitam o dia a dia mas confundem a percepção dos profissionais, pois mudam os instrumentos, mas alguns valores continuam os mesmos.

Entre uma frase de efeito e outra, o palestrante fazia considerações sobre a profissão de contador. "Arrume o melhor contador do mundo, pois não há nada pior do que decidir com base em dados errados. E quem toma a decisão é que será sempre cobrado", disse.

Ao abordar o tema da Contesc, que uniu Conhecimento, Habilidade e Atitude, ele enfatizou que as escolhas são de cada um, podemos ver o lado ruim ou o lado bom. "No mundo corporativo temos o tempo de trabalhar e o tempo de colher. Precisamos ter muitas experiências para poder escolher mais tarde o que queremos fazer, portanto o recado está dado, é preciso trabalhar muito antes de alcançar qualquer resultado", afirmou.

Outro tema abordado por Max Geringher foi o tema liderança. "Existem algumas palavras que estão na moda, liderar é uma delas, mas não adianta só espírito de liderança, é preciso termos os liderados. Existem estimativas que dizem que de cada 10 profissionais numa empresa, oito nunca serão promovidos. Parece alto, mas essa é a proporção. É importante ter essas características e existem pessoas que tiveram carreiras brilhantes e nunca foram chefes".

Fonte: Aqui

Ebitda e Caixa

Sobre o desempenho da OGX (OGX tem prejuízo de R$ 4,7 bi com provisões por fracasso geológico, Brasil Econômico, 15/08/13):

A empresa de petróleo de Eike Batista OGX, que vive uma grave crise de confiança no mercado, amargou prejuízo bilionário no segundo trimestre, impactado principalmente pela provisão de perdas com campos de petróleo considerados inviáveis economicamente.

O prejuízo líquido contábil da petrolífera subiu quase 12 vezes no segundo trimestre, para R$ 4,722 bilhões, ante prejuízo de R$ 398,6 milhões no mesmo período de 2012, informou a empresa nesta quarta-feira (14/8).

O aumento expressivo do prejuízo reflete principalmente despesas de R$ 3,6 bilhões referentes à provisão para perda dos investimentos realizados nos campos de Tubarão Azul, Tubarão Areia, Tubarão Gato e Tubarão Tigre.

Os três últimos foram considerados inviáveis comercialmente, enquanto o Tubarão Azul, ainda em produção, tende a continuar em declínio, sem novos investimentos após a empresa concluir que sua continuidade também é inviável.

Outros R$ 491 milhões no prejuízo estão associados a poços secos e áreas subcomerciais devolvidas à Agência Nacional de Petróleo (ANP) e R$ 491 milhões referem-se a despesas com variação cambial, basicamente não realizadas.

A posição de caixa da empresa de Eike minguou em cerca de US$ 822 milhões no trimestre, encerrando junho em US$ 326 milhões.

"Essa redução ocorreu principalmente devido ao desembolso de US$ 369 milhões (R$ 779 milhões) à OSX", afirmou a companhia em comunicado.


O interessante do texto é revelar que o Ebitda da empresa ainda foi positivo ...

Apesar dos problemas operacionais, a empresa fechou o segundo trimestre com Ebitda (lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortizações) positivo de R$ 46 milhões, ante Ebitda negativo de R$ 110 milhões no mesmo período do ano passado.
... e que o caixa reduziu

Emblemática preocupação dos investidores, o caixa da empresa recuou significativamente em seis meses, com queda de R$ 3,4 bilhões em relação a 31 de dezembro de 2012.

Além da compensação para a OSX, a queda na posição do caixa da empresa reflete também investimentos realizados no período de R$ 1,2 bilhão e pagamentos de juros de R$ 344 milhões.


Ou seja, o caixa operacional reduziu.

Passivo Ambiental do município

O jornal Valor Econômico trouxe um texto interessante (São Félix do Xingu encara seu passivo ambiental, Bettina Barros, Valor Econômico - 15/08/2013) sobre a mudança de mentalidade ambiental nos municípios da região Norte.

Na década de 70, para cada alqueire de floresta derrubada, o governo lhe dava cinco de presente. Desmatar era um dever, e quem não o fizesse corria o risco de perder a propriedade.

Nos dias de hoje o desmatamento tem consequências negativas. O texto relata o caso de São Félix do Xingu, considerado o primeiro na lista dos desmatadores da Amazônia:

A "lista negra" lançada pelo Ministério do Meio Ambiente em 2008 interrompeu o crédito público aos produtores do município - sem distinção entre pecuaristas, agricultores, desmatadores ou seguidores da lei. Foi o primeiro baque. Logo depois, a indústria de carne bovina passou a pressionar na outra ponta, exigindo correções nas fazendas para eximi-la de complicações futuras com a Justiça.

O resultado foi a redução do desmatamento, de 2,5 mil km2 para 162 km2. E o município está fazendo investimentos para sair da lista. E isto sobrou para as empresas:

Após o chacoalhão que embargou os municípios, as autoridades foram atrás dos compradores de bovinos da Amazônia derrubada ilegalmente. Num piscar de olhos, frigoríficos passaram a ser corresponsabilizados por crimes ambientais. Não demorou para a cadeia produtiva se mexer.

"Os frigoríficos tomaram a iniciativa de procurar São Félix do Xingu para o odernamento rural. A chegada deles foi determinante", diz Ian Thompson, diretor do programa Amazônia da The Nature Conservancy (TNC), ONG ambientalista por trás da costura do pacto pelo desmatamento ilegal zero.


O passivo ambiental do título do artigo está claramente presente, embora não apareça ninguém para tentar mensurá-lo. É interessante que sua existência para o município de São Félix poderá ser revertida com as medidas que estão sendo tomadas.

Domenico Dolce e Stefano Gabbana podem encerrar a marca

Domenico Dolce e Stefano Gabbana, diretores criativos e fundadores da Dolce & Gabbana, foram sentenciados, como comentamos anteriormente, a um ano e oito meses de prisão pela justiça italiana, que os acusa de sonegar cerca de € 1 bilhão em impostos (quase R$ 3 bilhões). Apesar da sentença, é muito difícil que os acusados cumpram sua pena na cadeia, já que, em geral, na Itália não se encarcera réus sentenciados a menos de dois anos de prisão. A dupla ainda foi condenada ao pagamento de uma multa no valor de € 500 mil (R$ 1,48 milhão) à Receita Federal do país.

O processo que acusava a dupla de lavagem de dinheiro já teve um final feliz. Esse teve como fundamento a avaliação monetária feita sobre a Dolce & Gabbana, que, segundo a “Folha de S.Paulo”, foi vendida por € 360 milhões para uma empresa de fachada, de nome Gado Srl, com sede em Luxemburgo. Aí, o problema seria que, de acordo com o jornal espanhol “El País”, a marca valeria, na verdade, € 700 milhões. Mas após a decisão favorável da juíza Brambilla, Massimo Dinoia, Armando Simbari e Fortunato Taglioretti, advogados de Dolce e Gabbana, expressaram “grande satisfação” já que, pela segunda vez, seus clientes foram inocentados quanto à venda da marca por um valor inferior ao estimado. Fabio Cagnola, defensor de Patelli, comentou ainda que “aconteça o que acontecer, o veredito não é eficaz até ter passado pela Corte di Cassazione”, equivalente ao nosso Supremo Tribunal Federal (STF).

Update: o jornal “The Telegraph”, noticiou nesta sexta (26.07) que a marca corre até o risco de encerrar seus negócios caso os estilistas não consigam recorrer à sentença. Domenico Dolce disse: “Nós iremos fechar. O que você quer que a gente faça? Fecharemos. Não seremos capazes de lidar com isso. Impossível”. Já Stefano Gabbana falou que “nós não iremos nos entregar sendo crucificados como ladrões porque não somos ladrões”.

por Carla Valois do Fashion Forward