Candidatas a financiamentos de R$ 4,8 bilhões do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), as obras milionárias dos estádios para a Copa do Mundo de 2014 reúnem indícios de superfaturamento, desperdício de recursos e negócios arriscados para os cofres públicos. Até sexta-feira, o Comitê Organizador do evento contabilizava o início das obras em apenas metade das 12 arenas pré-selecionadas para o Mundial. O palco de São Paulo segue indefinido.
A reconstrução do estádio da Fonte Nova, em Salvador, por exemplo, custará R$ 591,7 milhões, mas o Estado da Bahia já se comprometeu a pagar valor pelo menos 50% maior ao parceiro privado, responsável também pela administração e exploração da nova arena. Em Brasília, a reforma do Mané Garrincha é a obra mais cara da Copa, orçada em R$ 745,3 milhões. O novo estádio, com 71 mil lugares, corre o risco de virar um elefante branco em uma cidade sem torcidas nem tradição no futebol. Em Manaus, a construção da Arena Amazônia começou sob suspeita de preços superfaturados em pelo menos R$ 63 milhões.
De acordo com a divisão de responsabilidades, os governos locais se encarregam da construção e reforma dos estádios. A União participa com os financiamentos do BNDES, que têm taxas de juros abaixo da média do mercado, além de três anos de carência e 12 para pagar. “Tememos que aconteça como nos Jogos Pan-Americanos”, observou o procurador da República no Amazonas, Athaíde Ribeiro Costa. Ele coordena grupo do Ministério Público (MP) responsável por acompanhar os empreendimentos do Mundial. No Pan-Americano de 2007, o orçamento inicial estourou e a União cobriu o rombo para evitar o fiasco do evento. O grupo de procuradores se reúne no final desta semana em Brasília.
Riscos. As primeiras movimentações dos órgãos de controle tornam evidentes os riscos dos negócios da Copa para os cofres públicos. Correspondência encaminhada ao BNDES pela procuradora da República Juliana de Azevedo Moraes recomenda que o banco não conceda empréstimo de R$ 400 milhões ao consórcio responsável pela reconstrução da Fonte Nova. O consórcio é integrado pelas empreiteiras OAS e Odebrecht.
Contabilidade do Ministério Público mostra que em 15 anos o Estado pagará ao consórcio mais de três vezes o valor do estádio. O governo da Bahia contesta o cálculo, mas confirma que o pagamento supera o custo da obra, apesar de o parceiro privado ter assegurada pelo menos parte da bilheteria dos eventos. A taxa de retorno do investimento foi fixada em 16,47% ao ano, informou o secretário executivo da Parceria Público-Privada, Rogério Princhak.
O BNDES se limitou a informar que não há decisão sobre o empréstimo. Ao Estado, o banco informou que analisa os pedidos de financiamento já formalizados por seis Estados, mas o crédito ainda não foi aprovado para nenhum deles.
O estudo de viabilidade econômica dos estádios a longo prazo é uma das exigências do BNDES para a liberação do dinheiro. Esse pré-requisito pode inviabilizar o financiamento da reforma do Mané Garrincha. Caso a operação dos estádios não se mostre lucrativa, os governos estaduais serão chamados a cobrir os prejuízos.
Elefantes brancos. Em relatório aprovado há pouco mais de um mês, o Tribunal de Contas da União (TCU) destacou o risco de gestão dos estádios em Brasília, Manaus, Recife e Cuiabá. “O risco de elefantes brancos pode ser considerado alto em virtude de serem locais com pouca tradição de futebol”, destaca o documento.
Para o TCU, o novo estádio do Amazonas reúne os principais riscos das obras iniciadas no País para adequar as arenas das cidades-sede às exigências da Fifa. Auditores do Tribunal identificaram indícios de 46% de superfaturamento em apenas uma amostra dos custos do Vivaldão. O preço extra apontado era de R$ 63 milhões.
Risco dos elefantes - Marta Salomon/BRASÍLIA - 1 Ago 2010 - O Estado de São Paulo