E a conta sobrou para credores e funcionários - Felipe Vanini - 1 fev 2010 - O Estado de São Paulo
Enquanto Ricardo Mansur abandona seu exílio empresarial e volta ao mundo dos negócios, muitos dos ex-funcionários de suas empresas até hoje não conseguiram se recuperar completamente. Segundo a Justiça, 90% do passivo trabalhista do Mappin já está liquidado. Mas o processo é mais lento nos casos da Mesbla, das empresas de consórcio e do banco Crefisul, entre outras. Mesmo para quem recebeu, sobrou o prejuízo profissional. Depois de 32 anos no Mappin, o publicitário Oswaldo Souza Santos saiu do mercado com a falência da loja e não encontrou mais emprego na área. Passou a ganhar menos, vivendo de bicos.
“Passei a trabalhar com vendas numa gráfica e, mais tarde, no comércio de caixas de papelão como autônomo”, afirma. Apenas em 2005, seis anos após o fechamento do Mappin, ele recebeu cerca de R$ 20 mil de seu saldo trabalhista. Ele conhece o poder persuasivo do empresário. “Se o Mansur lhe pedir R$ 100, você vai dar”, diz. “Ele sabe falar muito bem.” Quanto à vida confortável que Mansur leva hoje, Santos afirma que os verdadeiros falidos foram os funcionários do Mappin, enquanto o empresário continuou fazendo jus à fama de bon vivant.
A ex-gerente de loja Maria de Lourdes Silva foi encontrar trabalho no comércio de colchões, depois de um ano sem emprego. Ela trabalhou 24 anos na empresa e diz que ainda sonha com a rotina do antigo emprego. “Imagino que estou entrando na loja, mandando as funcionárias trocarem as roupas das araras. O Mappin foi muito marcante na minha vida”, afirma.
A maior parte dos credores de Mansur ainda espera pelo pagamento. A lista é imensa. Além de impostos e das dívidas trabalhistas, as empresas de Mansur deixaram dívidas com fornecedores, como a Gradiente e Multibrás (dona das marcas Brastemp e Consul); investidores, como o Fundo de Previdência dos Funcionários do Banco do Brasil (Previ) e a Fundação Cesp; e instituições financeiras, como o Bradesco, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e a GE Capital.
Os processos de falência se arrastam há mais de dez anos e ainda estão longe de um desfecho. Além da tradicional morosidade da Justiça, quando quebrou, Mansur vendeu parte de seu patrimônio imobiliário, o que é proibido por lei, e transferiu bens para o nome de outras pessoas - típica manobra para dificultar o acesso da Justiça. “Tivemos de reverter a venda de alguns imóveis. Ainda não temos a avaliação deles”, afirma José Carlos Etrusco, síndico da massa falida da Barnet, controladora do Mappin, Mesbla e Crefisul. Segundo ele, a dívida da Barnet é de R$ 350 milhões.
Quando uma empresa vai à falência, a Justiça põe à venda seus bens e os dos responsáveis para arrecadar dinheiro e liquidar as dívidas. No caso de Mansur, os vários síndicos das massas falidas afirmam que o valor que pode ser amealhado é muito menor do que o débito. “Até agora não arrecadamos nada. A empresa não tinha ativos que pudessem ser vendidos”, afirma Ivan Alexandrino, o síndico da Mesbla. Ao falir, a empresa tinha uma dívida estimada em R$ 500 milhões.
Em dezembro do ano passado, a massa falida do Mappin recebeu um reforço. A marca Mappin foi leiloada por R$ 5 milhões. Mas podia ter sido melhor. A operação demorou tanto a ocorrer que a marca, inicialmente avaliada em R$ 12 milhões, perdeu valor e só foi arrematada na terceira tentativa de venda, por R$ 5 milhões.
Quando o Mappin faliu, em 1999, os empregados faziam manifestações na porta da sede, no centro de São Paulo, na tentativa de pressionar as autoridades a salvar a empresa. Algumas centenas deles não vão receber nada. Por causa da demora, deixaram de acompanhar os processos, faltaram às audiências e perderam seus direitos. “Ele causou um inferno na vida de milhares de trabalhadores”, diz o presidente do Sindicato dos Comerciários de São Paulo, Ricardo Patah. “Muitos deles dedicaram décadas à empresa.”
01 fevereiro 2010
Mappin: história de uma falência
Aqui, o lado dos funcionários do Mappin
Fato Relevante
Como a OGX já vale US$ 30,6 bi sem extrair uma gota de petróleo
Débora Thomé e Nicola Pamplona - O Estado de São Paulo - 1 de fev de 2010
Sem ter extraído uma gota sequer de petróleo, a OGX - braço de óleo e gás do grupo empresarial de Eike Batista - fechou o mês de janeiro como a 9ª maior petroleira em valor de mercado das Américas. Avaliada em US$ 30,6 bilhões, está à frente da Devon Energy e muito próxima da Anadarko Petroleum, empresas tradicionais, com atuação internacional. O bom desempenho da OGX na Bovespa é creditado a uma fórmula que mistura a contratação de uma equipe reconhecida no mercado de petróleo com uma boa estratégia de marketing, que inclui o anúncio sucessivo de seus feitos através de fatos relevantes.
(...) Com apenas 2 anos e meio de vida e 130 pessoas (a maioria geólogos e engenheiros), a OGX equivale hoje a 17% do valor de mercado da Petrobrás. As reservas provadas, por ora, não existem, mas a certificadora DeGolyer and MacNaughton aponta 34,5% de chances de reservas de 6,7 bilhões de boe. Atualmente, tem blocos em cinco bacias: Campos, Santos, Espírito Santo, Pará-Maranhão e Parnaíba.
A história da empresa começou com uma nota de jornal. Em 2007, depois de ler que Paulo Mendonça, então gerente de exploração e produção da Petrobrás, estava se aposentando, Eike Batista entrou em contato com o executivo para discutir a possibilidade de montarem uma companhia de petróleo. O mais importante, desde aquele momento, era formar a equipe.
“Montar uma empresa de petróleo tem duas dificuldades: a maior é ter um empreendedor como o Eike, que bota US$ 1 bilhão no risco. E a segunda é montar equipe, pois todos (os bons quadros) estão na Petrobrás”, comentou Paulo Mendonça, hoje diretor geral da empresa, em entrevista ao Estado.
Mendonça levou para a OGX colegas da área de exploração da Petrobrás, como Edmundo Marques e Luiz Reis. Na época, a companhia era comandada por outro funcionário da estatal, Rodolfo Landim. Além dos salários, a equipe recebeu como incentivo uma parcela do capital da companhia. Segundo dados da empresa, a remuneração aprovada a seus administradores em 2009 foi de R$ 7,25 milhões. Na Petrobrás, o valor ficou em R$ 7,44 milhões, mas sem participação acionária.
A política de participação acionária funciona também como isca para atrair jovens talentos. Até 1% do capital da companhia é destinado a incentivos aos colaboradores da OGX, em forma de opções de compra de ações no futuro.
EXPERIÊNCIA
Quando participou do seu primeiro e único leilão, em 2007, a OGX tinha menos de 20 funcionários. O que garantiu a escolha de bons campos foi justamente a experiência dos seus diretores, “com mais de 9 bilhões de boe e 50 campos descobertos nos últimos 6 anos na Petrobrás”, como destaca o comunicado à imprensa divulgado à época pelo grupo. Entretanto, o próprio Mendonça reconhece que a sorte também os ajudou.
Em alguns casos, chegaram a oferecer mais pelos blocos do que a própria Petrobrás. Ganharam 21 dos 23 blocos mediante pagamento de R$ 1,3 bilhão; R$ 375 milhões de Eike. O valor só foi conseguido na véspera, com um grupo de 12 investidores. “Os investidores que entraram naquela época estão ganhando oito vezes o dinheiro que investiram”, comenta o diretor financeiro, Marcelo Torres.
A evolução do valor das ações, que subiram 218% nos últimos 12 meses, pode ser creditada também à estratégia de divulgação da companhia, que publicou 20 fatos relevantes desde o início do ano passado, mais do que a Petrobrás. Em 11 deles, informava ter verificado a presença de petróleo e gás em suas concessões. A frequência de divulgações é considerada atípica por especialistas, que não veem necessidade legal ou técnica para tanto. “Não temos nada para esconder. Muito pelo contrário”, argumenta Marcelo Torres. Sobre a comparação com a estatal, o executivo diz que “o relevante é relativo”.
Neste momento, a OGX está na etapa exploratória em Campos. Em um mês, deve sair a licença de Santos. Depois virão, Espírito Santo e Pará-Maranhão. À medida em que avançam, o risco aumenta. A intenção é começar, ainda neste ano, a transformar as reservas em dinheiro. O campo OGX3 deve ser o primeiro a produzir. Na terça-feira, em mais um fato relevante, a companhia anunciou a antecipação da produção para o início de 2011.
O caixa da companhia ainda tem 60% dos US$ 6,7 bilhões captados na oferta inicial de ações (IPO), o suficiente, segundo a empresa, para financiar a campanha exploratória. Até 2013, planejam perfurar 79 poços, o que consumirá US$ 3 bilhões. Por enquanto, planejam ficar somente no Brasil. Já foram analisados ativos no Gabão e na Costa do Marfim, mas preferiram não arriscar. “Uma coisa é um bom ativo, outra coisa é um bom negócio”, diz Mendonça. Os diretores não refutam a possibilidade de venda de algum ativo, mas acreditam que a OGX não seguirá o padrão de outras empresas de Eike Batista: que desenvolvem seus projetos e acabam os vendendo para terceiros, como ocorreu com minas da MMX e participações em projetos da LLX.
O texto parece traçar uma relação entre aumento de valor e a quantidade de divulgação de fato relevante. Isto poderia levar a uma conclusão de que evidenciação cria valor. Mas a seguir, o texto indica que o número é excessivo, baseado numa comparação com a Petrobrás. Mas o mercado desconfiaria disto e impediria uma valorização a médio prazo.
Contabilidade Fiscal
Quase tudo se resolve pela internet
Glauco Pinheiro da Cruz
Jornal da Tarde - 1/2/2010
Em dezembro do ano 2008, a Receita Federal do Brasil informou que 1 milhão de contribuintes haviam caído na malha fina por suspeitas de irregularidades ou pendências nas declarações entregues em 2009, ano-base 2008. A consequência foi um aumento das filas de espera no órgão para os contribuintes regularizarem sua situação fiscal.
Diante das dificuldades, a Receita já lançou um sistema de atendimento pela internet, que está disponível no site www.receita.fazenda.gov.br [http://www.receita.fazenda.gov.br].
Nele, é possível saber o motivo do encaminhamento da declaração para a malha fina e como proceder.
O sistema, porém, não elimina por completo a necessidade da presença física na Receita. O cidadão, em casos específicos, dependendo do motivo da necessidade de retificação de sua declaração, precisará comparecer ao órgão. Mas, agora, com horário agendado, o que é uma grande vantagem. Estamos em um momento em que o tempo é escasso e cada minuto é importante. Batalhamos o tempo todo atrás de negócios que garantam a nossa sobrevivência. E, mais do que isso, em um momento de transição, em que as empresas caminham para se adequar às normas internacionais de contabilidade.
É até com atraso que o Brasil adota o sistema online para facilitar a regularização de quem está pendente com a Receita Federal. Porém, o que mais surpreende é que, diante dessas “facilidades” oferecidas por órgãos públicos, com a possibilidade de o cidadão poder realizar tudo – ou quase tudo – pela internet, ainda há pessoas que não estão inseridas no mundo digital. Em muitos casos, impera a falta de interesse – como no caso de micro e pequenos empresários que estão no comando de um negócio familiar. Em outros, a não inclusão se dá por falta de condições financeiras. Um computador com acesso à internet ainda é uma solução cara para alguns microempreendedores.
Mas o que vem pela frente é um caminho sem volta. É necessário que os contribuintes se atualizem quanto à tecnologia para que a utilizem como ferramenta para estar em dia com o Fisco e para outras necessidades. Mas cabe também ao governo, que a cada dia impõe novas exigências aos contribuintes, melhorar a infraestrutura de atendimento que deve ser oferecida àqueles que ainda não puderam se inserir na era digital. O governo poderia disponibilizar pontos de internet gratuitos exclusivos e específicos para os cidadãos conseguirem cumprir suas obrigações fiscais, com monitores para orientá-los quanto ao envio das informações. Todas as inovações são positivas desde que todos possam desfrutá-las.
Contabilidade ambiental
Empresas mudam práticas energéticas antes da regulamentação
Folha de São Paulo - 1/2/2010
Por LESLIE KAUFMAN
Ao inspecionar os buracos feitos para a passagem da fiação elétrica, funcionários do centro de processamento de dados de 1,6 hectare da Boeing perto de Seattle (EUA) notaram neste ano que o ar usado para refrigerar os computadores estava escapando pelas aberturas no piso.
Pensando no programa da empresa para reduzir em 25% o consumo de eletricidade, eles enfiaram insulação nos buracos dessa e de outras cinco unidades da empresa. A economia resultante deverá chegar a US$ 55 mil, ou 685 mil kw/hora de eletricidade por ano.
Mas o objetivo da Boeing não é só economizar dinheiro. Ela espera acompanhar o ritmo de outras empresas que se uniram em um vasto experimento global para verificar as emissões de dióxido de carbono geradas pela indústria.
A Boeing e outras empresas estão fazendo voluntariamente o que outras podem se recusar se não forem obrigadas: apresentar relatórios detalhados sobre o quanto emitem, principalmente com o consumo de combustível fóssil, a uma câmara de compensação central. A informação flui para o Carbon Disclosure Project (Projeto de Revelação de Carbono), organização sem fins lucrativos sediada em Londres que analisa os números e gera retratos por setores industriais em diferentes países.
Ao dar às empresas um mapa para medir suas emissões e indicar como elas se comparam com suas homólogas, dizem os especialistas, o projeto voluntário está persuadindo as empresas a mudar suas práticas energéticas muito antes de os governos tentarem regulamentar as emissões.
Cientistas estimam que a indústria e os provedores de energia produzem quase 45% das emissões do efeito estufa. Enquanto alguns governos estão convencidos de que conter essa poluição é crucial para proteger a atmosfera, um pacto global compulsório não está no horizonte imediato, como mostraram as negociações em Copenhague em dezembro.
Até que haja uma ampla regulamentação, muitos investidores e executivos de empresas dizem que relatórios voluntários como o Carbon Disclosure Project podem ser a melhor forma de alavancar as forças do mercado para a mudança.
Eles dizem que o projeto mostra que uma companhia que contém suas emissões hoje está preparada para o futuro e, portanto, é digna de investimento. "Como as empresas lidam com o carbono é um fator de risco vital", disse Jack Ehnes, executivo-chefe do Calstrs, fundo de pensão dos professores da Califórnia. "Companhias inteligentes vão adotar a informação da CDP e realinhar suas estratégias."
Mary Armstrong, vice-presidente para meio ambiente da Boeing, situa em 2007 o enfoque de sua empresa para a energia, quando ela viu pela primeira vez os formulários que as companhias preenchiam para o projeto de revelação. "Havia perguntas como: 'Você tem metas de desempenho ambiental?' Nós não tínhamos, mas hoje temos", ela disse. As reações individuais das empresas estão postadas no site do projeto.
Em comparação com os EUA, a União Europeia já regulamenta as emissões de dióxido de carbono da maioria de suas indústrias mais intensivas em energia, por meio de um programa de limitação e comercialização, e o Japão também policia o consumo de energia.
Paul Dickinson, fundador do Projeto de Revelação de Carbono, admite rapidamente que seu grupo não substitui a regulamentação do governo. Mas afirma que o projeto voluntário oferece um caminho menos confrontador para conter as emissões, mesmo em mercados relativamente desregulamentados como China e Índia.
Embora o CDP tenha se estabelecido como padrão para métodos de medição de emissões, provocou ceticismo. Os críticos dizem que as emissões não precisam ser verificadas em auditorias externas, como devem ser os números financeiros de companhias negociadas em Bolsa. No entanto, 2.500 das maiores companhias do mundo completaram pelo menos parte do questionário do projeto no ano passado, desde o conglomerado de energia Gazprom, da Rússia, até a Huaxin Cement, da China.
Abyd Karmali, diretor de mercados de carbono para o Bank of America, compara o projeto de revelação ao advento dos princípios gerais de contabilidade, que permitem que os investidores comparem o desempenho financeiro e movimentem seus dólares de acordo. "É muito difícil traduzir o risco relacionado ao carbono em uma revelação padronizada, por isso é uma contribuição fantástica."
Mas outros têm dúvidas. "Existe a revelação, e depois o quê?", disse Hewson Baltzell, cofundador da Innovest, firma de pesquisa financeira. "Eles mergulharam o dedo na água ao perguntar às empresas sobre desempenho, mas não foram muito além."
31 janeiro 2010
Liberalismo no Brasil
A The Economist da semana traz um texto sobre o liberalismo no Brasil (The almost-lost cause of freedom). A constatação do periódico inglês é que o liberalismo é escasso no nosso país. Enquanto a participação do governo na economia cresceu nos últimos anos, nenhum candidato a presidente fala em cortar impostos. (É bom lembrar que pagamos quase 50% de imposto sobre qualquer ligação telefônica. E parece que esquecemos disto quando fazemos uma ligação.)
Enquanto o Chile o termo esteve associado à ditadura militar, no Brasil os militares praticaram um regime onde o Estado era relevante. Isto é estranho, segundo a The Economist, pois o razoável seria uma reação no sentido contrário. Uma possível razão é que o voto é obrigatório no país. Outra possível explicação é que os atuais líderes eram oposicionistas de esquerda, com forte oposição ao pensamento liberal.
P.S. Veja postagem abaixo sobre a capitalização das estatais. Mais presença do Estado na Economia.
Capitalização das Estatais
O governo federal deverá promover uma onda de capitalização e reforço de caixa das principais empresas estatais neste ano. A ideia é elevar investimentos para sustentar o crescimento e gerar dividendos políticos nas eleições. Na lista estão Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, Banco do Nordeste, Petrobrás e Eletrobrás. Também estão previstos empréstimos para aumentar a margem de manobra do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e do Fundo da Marinha Mercante (FNM), que financia a indústria naval.
Ao todo, essas operações devem movimentar em torno de R$ 226 bilhões. Desse valor, R$ 25 bilhões é o que as empresas dizem necessitar de capital e o restante são empréstimos do Tesouro, principalmente ao BNDES (R$ 180 bilhões em 2009 e 2010). Boa parte do empréstimo já autorizado ao banco pelo Tesouro ainda não foi utilizada.
No caso da Petrobrás, a capitalização vai ser equivalente a 5 bilhões em barris de petróleo, como prevê um dos projetos de lei com as regras do pré-sal, ainda no Congresso. Não está certo quanto o Tesouro irá desembolsar nessa capitalização. Pelo projeto, num primeiro momento a União emitiria títulos para a capitalização, mas depois os receberia de volta quando repassasse à estatal reservas de óleo em valor equivalente.
O reforço de capital das estatais não é uma tarefa simples em um ano em que o governo se comprometeu a cumprir a meta “cheia” do superávit primário (economia do governo para pagamento de juros), que é de 3,3% do PIB. Atingir a meta vai significar um esforço fiscal adicional de R$ 31 bilhões em 2010. Além disso, o governo não poderá mais ter tantas receitas extraordinárias como em 2009. Somente as transferências de depósitos judiciais dos bancos para o Tesouro contribuíram com R$ 8,9 bilhões.
Por isso, o assunto é tratado de forma discreta no governo. Na quinta-feira, o Banco do Brasil (BB) anunciou que está finalizando estudos para aumentar seu capital social num valor entre R$ 8 bilhões e R$ 10 bilhões. O objetivo é “sustentar o crescimento da instituição financeira, preservado o controle acionário da União”. Sem essa ajuda, o BB não terá condições de continuar a crescer no mesmo ritmo do ano passado e comprando bancos aqui e no exterior. Como o governo é o principal acionista, terá de entrar com maior volume de recursos.
Mas a situação não é restrita ao BB. O Banco do Nordeste já disse que precisa de R$ 1 bilhão para aumentar os empréstimos em ano em que a expectativa é de que o País cresça mais de 5%. A Eletrobrás quer mais R$ 14 bilhões para acertar dívidas atrasadas com acionistas. Saneada, poderá pegar recursos no mercado e expandir os investimentos públicos, principalmente do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). A Petrobrás também precisará de recursos para explorar o petróleo, mas os técnicos dizem que não haverá impacto fiscal.
CAPITALIZAÇÃO DISFARÇADA
Desde a eclosão da crise mundial, o governo também tem utilizado “instrumentos alternativos”, principalmente para que os bancos públicos acelerem a concessão de crédito. Um deles é a chamada dívida subordinada, na qual a União compra ações e emite títulos para injetar recursos nas empresas. Como os papéis do Tesouro são de boa qualidade, podem ser usados para aumentar o patrimônio, especialmente, dos bancos. Com patrimônio maior, essas instituições ganham mais fôlego para emprestar. A Caixa recebeu R$ 6 bilhões por esse instrumento e já utilizou R$ 2 bilhões. Essas operações, porém, têm limite. Portanto, em algum momento, o governo terá de fazer um aporte direto para que seja mantido o ritmo de expansão da instituição financeira.
No caso do BNDES, foram autorizados R$ 100 bilhões para 2009 e mais R$ 80 bilhões para 2010. “O empréstimo para o BNDES tem um impacto zero do ponto de vista fiscal no curto prazo. No longo prazo, pode se refletir de alguma maneira, pois o governo subsidia a taxa de juros de operações feitas pelo BNDES”, disse um técnico do governo. Mas isso não chega a ser visto como problema porque o País deve apresentar forte crescimento neste ano. Como essas operações funcionam como uma troca de ativos entre entes estatais, elas não têm impacto na dívida líquida do setor público. O real impacto só pode ser visto no comportamento da dívida bruta, que está crescendo numa velocidade que já preocupa analistas de mercado.
De 2008 para 2009, o endividamento público passou de R$ 1,74 trilhão (56,3% do PIB) para R$ 1,972 trilhão (63% do PIB). Do aumento de R$ 233 bilhões, R$ 101,7 bilhões correspondem a créditos concedidos para instituições oficiais. O restante se deve à política do Banco Central de comprar dólares para reforçar as reservas internacionais.
“O aumento da dívida bruta pode implicar mais carga tributária e, aí, o preço pode ser a economia crescer menos”, diz o especialista em contas públicas Raul Velloso. O economista Júlio Callegari, do JPMorgan, destacou ainda que a injeção de recursos nas empresas funciona como estímulo para a economia, o que é bom para o crescimento. Por outro lado, se provocar alta da inflação pode fazer com que os juros fiquem ainda mais altos. “A economia está em um ponto de superaquecimento e não precisa de mais estímulos”, frisou Callegari. “Os investidores poderão pedir mais prêmio na hora de comprar papéis brasileiros.”
O professor da Universidade do Rio de Janeiro (UFRJ) Reinaldo Gonçalves pensa bem diferente. Ele acha que a recuperação da capacidade de investimento das empresas públicas é uma das “poucas coisas boas” feitas no governo Lula. “O BNDES está utilizando recursos (vindos de empréstimos ao Tesouro) para financiar a fusão de empresas, por exemplo”, afirma o economista.
Para Velloso, a injeção de recursos nas estatais, principalmente nas instituições financeiras, foi importante no ano passado para garantir o crescimento econômico. Agora, com a retomada da economia, não faz mais sentido investir na estatização de empresas.
Estatais recebem mais R$ 226 bilhões - Edna Simão - O Estado de São Paulo - 31/1/2010
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