O texto a seguir comenta os problemas da AGU, uma carreira bem remunerada, mas onde os resultados são decepcionantes. Parte da culpa é do processual da nossa justiça, que permite muitas possibilidade de recursos. Certamente, o processo de seleção também não ajuda, onde os concursos incentivam habilidades que talvez não sejam as melhores para o cargo.
AGU cresce, mas União tem perdas maiores
Folha de São Paulo - 7/12/2009
GUSTAVO PATU
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
"Servidor aposentado ou pensionista! O Supremo Tribunal Federal já decidiu: se você entrar na Justiça, irá receber entre R$ 11,7 mil e R$ 200 mil."
Ao lado de um cartão de boas festas, a mensagem é o destaque da página da Associação Nacional dos Servidores Públicos na internet, que conclama seus representados a tirarem proveito de uma vitória judicial que pode parecer inexplicável aos menos familiarizados com o cotidiano do serviço público.
Trata-se, simplificando o caso, de uma sentença do STF que abriu caminho para elevar o pagamento de uma série de gratificações aos funcionários inativos do Executivo. Em comum, todas essas gratificações foram criadas para premiar os funcionários mais produtivos -da ativa, presumivelmente.
Pela tese dos vencedores, a falta de critérios objetivos de avaliação do desempenho dos servidores mostrava que as gratificações eram reajustes salariais disfarçados. Logo, pelo princípio constitucional da paridade, deveriam valer também para os aposentados, ao menos nos percentuais mínimos pagos aos ativos.
Se a causa em particular é inusitada, derrotas judiciais do gênero, em especial envolvendo aposentados e funcionários públicos, tornaram-se uma despesa crescente para o governo federal e um próspero negócio para escritórios de advocacia, entidades sindicais e até investidores em renda fixa.
A despeito da multiplicação do quadro de pessoal e das verbas da AGU (Advocacia Geral da União), os gastos definidos por sentenças da Justiça mais que triplicaram na administração petista. Em 2002, foram R$ 2,2 bilhões, equivalentes a R$ 3,5 bilhões em valores atuais; neste ano, até o início do mês passado, o volume já chegava aos R$ 13 bilhões.
De nota de rodapé no Orçamento, os pagamentos de dívidas judiciais ultrapassaram em 2009 os benefícios do Bolsa Família, principal marca do governo Lula. A tendência de crescimento constante nos últimos anos (veja quadro nesta página) se manterá no próximo, para o qual estão reservados R$ 15,3 bilhões.
A quase totalidade do dinheiro é dividida em ações movidas por servidores públicos, ativos e inativos, e pela clientela do INSS. O peso das derrotas na Justiça passou a ter influência decisiva na evolução das despesas com previdência e pessoal, as maiores da União.
Em janeiro deste ano, mês de concentração dos pagamentos de sentenças, o gasto com o funcionalismo teve crescimento de 31% em relação a janeiro de 2008 -excluídas as vitórias judiciais dos servidores, o crescimento teria sido de 17%. Na Previdência Social, as despesas judiciais responderam por R$ 5,8 bilhões de um deficit de R$ 41,5 bilhões até outubro.
Os volumes crescentes alimentam comissões de advogados e departamentos jurídicos de sindicatos, que procuram servidores e aposentados para causas coletivas a partir de precedentes abertos pela Justiça -a decisão do STF relativa às gratificações por desempenho, por exemplo, é de 2007, mas ainda produz ações.
Expansão da AGU
Não é por falta de defensores que a União acumula cada vez mais gastos com as sentenças. Proporcionalmente, a AGU foi o órgão que mais cresceu no governo Lula, em grande parte devido à incorporação de procuradores antes espalhados pela administração federal. Houve ainda mais de 3.000 ingressos por concurso para a área jurídica, o que contribuiu para praticamente duplicar o quadro de advogados da União.
A carreira, da elite do Executivo, foi uma das mais beneficiadas pelos pacotes de reajustes salariais concedidos pelo governo. Sob Lula, o teto dos vencimentos de advogados e procuradores aumentou de R$ 7.500 para R$ 18,3 mil.
Em nota enviada à Folha, a AGU apresentou, como razões para o aumento das despesas com sentenças judiciais, a instituição dos juizados especiais em 2001 e o processo de "interiorização da Justiça", com a criação de novas varas federais.
"Tal fato tem aumentado sensivelmente a quantidade de novas ações judiciais, tendo em vista a demanda reprimida da sociedade em decorrência do difícil acesso à Justiça."
O órgão acrescenta que grande parte das ações decorre de políticas previdenciárias e de recursos humanos das décadas de 80 e 90, decorrentes, por exemplo, dos planos econômicos para combater a inflação.