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11 julho 2006

Direito e o mais fraco

O jornal Valor Econômico, do dia 10/07, divulga uma pesquisa sobre a justiça e o mais fraco. É um estudo muito questionável pois escolher ao "acaso" um conjunto de decisões não garante sua conclusão. Talvez uma amostragem estratificada fosse mais interessante pois afinal uma causa de milhões é diferente de uma causa de alguns reais. E, pelo que deixa a entender a reportagem, isto não foi feito.

Além disto, as percentagens e a suposição de que a decisão deva ser neutra (50% de chance para cada lado) é também muito questionável. Com base em qual fundamento isto foi feito? Na verdade a reportagem não informa que estudo foi realizado (uma tese não seria, pois são dois autores do trabalho) e como ter acesso ao trabalho.

De qualquer forma, eis a reportagem:

Justiça não favorece os mais fracos

Felipe Frisch

Um estudo com base em quase 200 acórdãos do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) contraria o que tem se tornado cada vez mais um senso comum - a afirmação de que a incerteza jurídica e o rompimento dos contratos pela Justiça justificam, em parte, as altas taxas de juros dos financiamentos dos bancos. Segundo testes realizados pelos pesquisadores Ivan César Ribeiro e Brisa Ferrão, quando o contrato favorece a parte mais forte - casos dos contratos de leasing (alienação fiduciária), fornecimento, representação, crédito rotativo e duplicatas -, há 45,41% a mais de chances de ele ser mantido no processo.

Essa vantagem da instituição financeira cai em apenas um terço quando a legislação intervém em favor do mais fraco, pela análise das decisões. O ideal, diz Ribeiro, seria essa relação ser neutra. Teóricos usuais do assunto tendem a dizer que os mais fracos são favorecidos pelos juízes, sendo os contratos rompidos em boa parte dos casos.

Em outro teste, os pesquisadores chegaram à conclusão de que, quanto maior a regulação - casos de relação de consumo, por exemplo, reguladas pelo Código de Defesa do Consumidor -, menor é a chance, em 22,28%, de o contrato ser mantido. Na interpretação dos pesquisadores, isso significa que, quando há menos liberdade para contratar, menor a chance de o contrato conter algum dispositivo que contrarie a lei. Além das decisões judiciais propriamente, a pesquisa contou com questionários preenchidos pelos desembargadores do TJSP.

O estudo foi feito com base em 181 decisões escolhidas aleatoriamente de 1.019 acórdãos dos anos de 2004 e 2005 levantados. Segundo os pesquisadores, o favorecimento dos "economicamente privilegiados" acontece porque a suposta neutralidade do juiz ignora as maiores chances de defesa que o "litigante organizacional" - a instituição financeira - normalmente tem. Para assegurar a separação - de um lado devedores como a parte efetivamente mais fraca e, de outro, credores como a mais forte - a pesquisa eliminou da base analisada os casos em que os devedores eram grandes grupos, onde a definição de "mais forte" era dificultada. Com isso, restaram 129 casos em que esse contraste era claro.

O economista Armando Castelar Pinheiro, referência nas pesquisas que apontam o Judiciário como um dos responsáveis pelos juros altos dos bancos, reconhece o mérito da pesquisa em ir na fonte primária de informações - as decisões judiciais. Mas faz uma ressalva de que, para saber até que ponto o cumprimento ou não dos contratos pelos juízes não está associado a fazer justiça social, seria necessário avaliar as motivações dos magistrados por trás de cada decisão. "Quando um juiz revê um contrato para favorecer a parte mais fraca, não diz que está fazendo isso em nome da justiça social, mas procura a lei para justificar", diz Castelar. Na pesquisa dele, feita em 12 Estados, 25% dos juízes disseram que era muito freqüente uma sentença ser justificada pela ideologia do julgador.

A tese de Ivan Ribeiro e Brisa Ferrão, no entanto, encontra eco entre especialistas em direito bancário. O advogado Rodrigo Guedes acha ainda pequeno o percentual de favorecimento da parte mais forte. Ele avalia que mesmo inovações na legislação, como a nova Lei de Falências, que facilitam a cobrança de créditos pelo banco, as taxas de juros não caíram. Para o advogado João Antonio Motta, a incerteza jurídica é irrelevante para a definição das taxas de juros, já que os níveis de inadimplência são baixos e apenas uma pequena parte dos devedores - segundo ele, menos da metade dos que não pagam - chega ao Judiciário. De fato, segundo dados de maio do Banco Central, os últimos disponíveis, os atrasos de pagamento superiores a 90 dias são apenas 4,9% e as taxas do cheque especial são de 145,36% ao ano, em média, e as do crédito pessoal, empréstimo direto, de 62,29%.

Em dívida com o Mercado

A CVM divulgou uma lista com as empresas abertas que estão em dívida com o usuário da informação contábil. Em outras palavras, são empresas em atraso há mais de seis meses com as informações obrigatórias ao mercado.

A CVM informa que o "objetivo é que considerem essa informação nas suas relações com as citadas companhias abertas, ou nas suas decisões de investimento." Bastante sutil o recado da CVM. O comunicado (sem o CNPJ e observações) encontra-se a seguir:

COMISSÃO DE VALORES MOBILIÁRIOS
SUPERINTENDÊNCIA DE RELAÇÕES COM EMPRESAS
EDITAL DE NOTIFICAÇÃO

(Publicado no DOU de 05.07.06)

A COMISSÃO DE VALORES MOBILIÁRIOS – CVM, de acordo com a Deliberação CVM nº 178, de 13.02.95, vem a público divulgar a relação das companhias abertas que estão inadimplentes há mais de 06 (seis) meses quanto à divulgação de informações obrigatórias ao mercado, nos termos da Lei nº 6.385, de 07.12.76, e da Instrução CVM nº 202, de 12.06.93.

O objetivo desse comunicado é alertar aos investidores e ao público em geral que considerem essa informação nas suas relações com as citadas companhias abertas, ou nas suas decisões de investimento.

Na relação estão incluídas 17 (dezessete) companhias abertas que estão em atraso superior a 06 (seis) meses com pelo menos um dos formulários ITR, DFP e IAN, até a emissão de relação (03.07.2006), valendo ressaltar que não fazem parte dessa lista as companhias que estejam, segundo o cadastro da CVM, em situação de falência, liquidação ou liquidação extrajudicial.

1 - AMERICEL S.A.
2 - BERGAMO CIA INDUSTRIAL
3 - CACHOEIRA VELONORTE S.A. - CONCORDATÁRIA
4 - CENTRO HOSPITALAR ALBERT SABIN S.A.
5 - CTM CITRUS S.A.
6 - DIJON S.A.
7 - FERRAGENS DEMELLOT S.A.
8 - MAORI S.A.
9 - MINASFER S.A.
10 - PROCID PARTICIPAÇÕES E NEGÓCIOS S.A.
11 - RIMET EMPREENDIMENTOS IND. E COMERCIAIS S.A.
12 - SOLE DO BRASIL S.A. TELECOMUNICAÇÕES E COMÉRCIO EXTERIOR
13 - TORCEDOR S.A.
14 - TRORION S.A.
15 - USINA COSTA PINTO S.A. ACUC ALC
16 - VERPAR CENTROS COMERCIAIS S.A.
17 - VIAÇÃO AÉREA SÃO PAULO S.A. – VASP

Rio de Janeiro, 03 de julho de 2006


FERNANDO SOARES VIEIRA
Gerente de Acompanhamentos de Empresas



ELIZABETH LOPEZ RIOS MACHADO
Superintendente de Relações com Empresas

Os investimentos do Presidente

A semana passada trouxe notícias sobre a riqueza do nosso presidente. (É bem verdade que os jornais também anunciaram que a fortuna de Quércia ultrapassava a R$100 milhões!)

Um comentário interessante apareceu no jornal Estado de S. Paulo de 7/7/2006, p. A5, com o título "Presidente pode ter ferido código de ética", de Lisandra Paraguassú. Conforme lembra a reporter:

"O detalhamento do patrimônio do presidente (...) inclui aplicações em ações de três empresas: Banco do Brasil, Petrobrás e Vale do Rio Doce. As aplicações somam R$3.473,23 e poderiam passar desapercebidas frente ao patrimônio do presidente, de cerca de R$839 mil, não fosse um detalhe que chama a atenção de quem conhece as normas que regem o comportamento dos funcionários públicos."

"O Código de Conduta da Alta Administração Federal veta o investimento de servidores de primeiro e segundo escalões em bens que possam ter seu valor alterado em conseqüência de decisões governamentais."


A reportagem esclarece que o Código não faz nenhuma referência explícita sobre o cargo de Presidente, mas deixa a entender que é razoável que o mesmo também seja contemplado.

Num pequeno quadro o repórter Sérgio Gobetti, foi mais feliz ainda:

"As declarações apresentadas pelo presidente Lula ao TSE mostram que ele precisaria ter economizado ao menos 76% de sua renda mensal desde 2003 para dobrar seu patrimônio. Lula tem duas fontes de renda: salário de presidente (R$8.885,48) e aposentadoria de anistiado político, de R$4.509 desde maio.

Nos últimos três anos e cinco meses, Lula ganhou R$565,3 mil - R$448,9 mil líquido. Despesas pessoais do presidente são pagas pelos cofres públicos. Simulando qual seria o ganho se economizasse por mês 76% do que ganha e investisse em fundos de renda fixa e poupança, há rendimento líquido com juros de R$76,8 mil. Mais o valor original da poupança, fora CPMF, são R$416 mil, valor da expansão dos bens desde 2002."

Grafismo

O estudo do comportamento de preços através dos gráficos tem defensores que acreditam realmente que é possível antever o que ocorre com o mercado através do comportamento histórico dos preços. Mas existe uma grande parcela de pessoas que não acreditam no grafismo e consideram algo próximo a astrologia.

A reportagem a seguir é da revista Isto é Dinheiro número 460, desta semana, e explica o que é o grafismo, com uma dose de ironia.

Desvendando o Código Da Vinci
nos mercados
Como uma corrente de analistas financeiros lê o futuro em gráficos de ações


Por Alexandre Teixeira

Eles não são místicos, mas pertencem a uma corrente de pensamento que, para os leigos, parece uma seita esotérica. Dizem-se capazes de ler o futuro em gráficos, onde enxergam figuras como a de um Buda meditando ou um homem enforcado. Parte importante de suas teorias é elaborada a partir da Seqüência de Fibonacci, imortalizada em uma das pistas para o “simbologista” Robert Langdon no best seller O Código Da Vinci. Os personagens. personagens em questão são analistas de mercado, trabalham em bancos ou corretoras e dedicam-se a recomendar compras e vendas de ações. Chamam-se analistas gráficos ou técnicos e, na turbulência que sacudiu os mercados nos últimos dois meses, provocaram seus colegas ortodoxos, gabando-se de ter antecipado a virada do mercado, a partir de 9 de maio. Com a ajuda de Fernando Góes, analista gráfico da corretora Ágora Senior, DINHEIRO desvenda a seguir os mistérios dessa versão financista de O Código Da Vinci.

A REVELAÇÃO
O ponto de partida para o desenvolvimento desta trama está em um mercado de arroz na cidade de Sakata, no Japão do século 18. Foi ali que um negociante conhecido como Homma criou os fundamentos da análise gráfica. Fez isso desenhando durante anos os preços de abertura e fechamento do mercado até detectar padrões de comportamento cíclicos que lhe permitiam antecipar movimentos. Um dos gráficos assim criado lembrava o formato de um Buda meditando. Rebatizado de “figura ombro-cabeça-ombro” ao ser adaptado à teoria ocidental, tornou-se um clássico da análise técnica, muito usado até hoje.

A TEORIA DE DOW
Mais de um século depois, em Nova York, Charles H. Dow, fundador da agência de notícias Dow Jones, formulou a primeira teoria ocidental para o estudo do movimento dos preços por meio de gráficos, que norteia a análise técnica até os dias de hoje. Mas os padrões encontrados em Sakata, reunidos na chamada “Teoria de Candlestick (castiçal, já que os gráficos de Homma eram em forma de vela)” ainda são muito usados atualmente.

AS ONDAS DE ELLIOT
Há uma série de vertentes alternativas da análise gráfica, como a “Teoria das Ondas de Elliot”, de 1939, que defende que o mercado de ações segue um padrão de cinco ondas de subida e três ondas de descida para completar um ciclo. Cada grafista tem suas preferências e vários deles usam um pouco de cada uma. “O mais importante”, diz Góes, “é que a análise gráfica está sempre refletindo a psicologia das massas, oscilando entre otimismo e pessimismo, em ciclos que tendem a se repetir”.

SEQÜÊNCIA DE FIBONACCI
Dentro de toda essa discussão sobre ciclos é que entra a Seqüência de Fibonacci – que se forma somando um número ao anterior infinitamente, como em “1,1,2,3,5,8,13”. Criado pelo matemático italiano Leonardo de Pisa (Fibonacci é uma corruptela de Filho de Bonaccio), no século 12, este padrão é encontrado em constelações, nos ciclos das marés e até nas proporções do corpo humano. Da Vinci a chamava de Divina Proporção e a usou em muitos de seus trabalhos. “Como a natureza, o mercado também segue o padrão”, diz Góes. “Após configurar um gráfico, apontando alta ou baixa da bolsa, podemos projetar para onde o mercado vai usando Fibonacci”, ensina.

PROFECIA REALIZADA
Mesmo os mais céticos surpreendem-se com a capacidade da análise gráfica em antecipar o movimento dos mercados. “Antes do atentado de 11 de setembro, tínhamos gráficos totalmente configurados para quedas, com grandes figuras apontando nessa direção”, lembra Góes. Pode ser coincidência. E há até quem diga que insiders da Al Qaeda se posicionaram no mercado antecipando a grande baixa. “O importante é que estava tudo estampado nos gráficos, e a queda realmente veio”, pontifica o analista.

NÃO PERGUNTE POR QUÊ
A bola de cristal dos grafistas teria funcionado, também, na reversão de expectativas na bolsa no último mês de maio. O mercado subia de vento em popa, até que uma súbita reviravolta mudou a direção das cotações das ações, que despencaram. “Isso também foi antecipado por uma figura de queda, a chamada ombro-cabeça-ombro”, afirma Góes. Segundo ele, o analista gráfico não está interessado nas razões do mercado, mas sim no seu modus operandi. Em outras palavras, se quiser decifrar este código, não pergunte por que os preços sobem e descem, mas como e quando isso acontece.

29 junho 2006

Cilada Emocional

Reportagem enviada por Ricardo Viana, publicada no Jornal Valor Econômico:

Cilada emocional

Por Catherine Vieira
20/06/2006

O empresário Hélio do Amaral começou a investir em ações há cerca de três anos, como forma de turbinar a renda de sua futura aposentadoria. Até maio, com a animadora seqüência de altas no mercado local, ele nunca precisou rever a estratégia. Com as turbulências iniciadas em maio, porém, o temor de colocar o futuro em risco assustou Amaral. Assim como milhares de investidores individuais, que passaram a abarrotar os chats na internet e as centrais telefônicas das corretoras, ele se viu diante da necessidade de tomar uma decisão: é hora de vender ou devo manter minhas posições?

É justamente nestes momentos, de maior pressão, quando o assunto envolve decisões estratégicas, que os especialistas do comportamento humano alertam: cuidado com as armadilhas internas.

Quando o mercado passa por momentos de virada e os investidores precisam decidir o que fazer em relação ao novo cenário, ficam mais evidentes os fatores que mostram que os aplicadores não se comportam de forma puramente racional, lembra o professor da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e especialista em finanças comportamentais Jurandir Sell Macedo. Eles são também influenciados pelas emoções e as chamadas "ilusões cognitivas". "Quem só conhece mercado em alta pode ter essa ilusão, mas a queda também faz parte da dinâmica e quem não convive bem com isso não deve investir em ações", diz.

Um artigo dos especialistas John Hammond, Ralph Keeney e Howard Raiffa na revista Harvard Busines Review enumerou as sete ciladas psicológicas que costumam atrapalhar gestores de negócios e carteiras na hora da decisão. A primeira das chamadas "armadilhas ocultas" é a que eles chamaram de efeito-âncora, que leva o investidor a dar um peso desproporcional à primeira informação recebida sobre determinado assunto. Já a armadilha do status quo mostra a tendência a manter a carteira ou posição como está, ainda que possam haver alternativas melhores, enquanto o problema do custo irrecuperável leva o investidor a perpetuar erros cometidos no passado por evitar realizar algum prejuízo. Outro vício é aquele que faz com que as pessoas tentem sempre buscar dados que confirmem suas teses e recusar dados que as refutam.

Há ainda a questão do excesso de confiança, que leva a superestimar a exatidão das próprias projeções ou de terceiros ou, ao contrário, a armadilha da prudência exagerada, que traz demasiada cautela na hora de prever eventos incertos. Por fim, há o efeito lembrança, que é uma espécie de trauma no qual o indivíduo acaba atribuindo um peso desmedido a eventos recentes e dramáticos.

Ao contrário do que ocorreu em outros momentos de volatilidade do passado, os investidores individuais revelam uma paciência maior com o sobe-e-desce. Isso também é explicado pela fase prolongada de altas do Índice Bovespa, que chegou a valer 8.500 pontos em 2002 e este ano, antes dos solavancos, foi perto dos 42.000 pontos. "Não vou dizer que não dá medo olhar o mercado em queda, o mercado está perigoso", diz o empresário Hélio Amaral. Cliente da Corretora Ativa, ele prefere continuar acompanhando de perto antes de tomar a decisão de vender. "Mas estou mais cauteloso, não dá para entrar em qualquer lançamento de ações, por exemplo."

O diretor de varejo da corretora Ágora Senior, Marcelo Smarrito, conta que os clientes aumentaram muito o volume de consultas e freqüência aos chats. "Mas em geral eles têm mantido as posições", conta o executivo.

Se as decisões tomadas hoje são acertadas é difícil saber, diz Macedo, da UFSC. Mas, pelo menos num ponto, o especialista acredita que a atitude atual dos investidores pode estar sendo mais positiva do que em outros momentos. "Não ser movido pelo pânico e não tentar vencer o mercado a todo momento já é um bom caminho, demonstra um maturidade maior do investidor brasileiro", diz. "O que os estudos de finanças comportamentais mostram é que bater o mercado, ou seja, os índices básicos, com consistência, é praticamente impossível", acrescenta.

O especialista americano Meir Statman, que esteve no Brasil no mês passado, lembrou que justamente dessa conclusão nasceram os chamados fundos de ações passivos, ou fundos de índice, que só reproduzem as carteiras teóricas dos índices.

De acordo com o especialista catarinense, muitos investidores tendem a acreditar que podem conseguir sempre superar o mercado, a começar por ele próprio, que também é consultor. " Eu tenho um perfil muito especulador e um dos clientes que eu assessoro é superconservador, quase não gira a carteira e gosta de bons dividendos ", conta Macedo. "Sempre achei que eu ganhava muito mais que ele e, um dia, coloquei na ponta do lápis e descobri que, num período de oito anos, minha carteira perdia em 3% para a dele".

Para se livrar das ciladas, os especialistas recomendam comprar devagar, vender devagar, não ficar suscetível a momentos de pânico e manter-se fiel aos objetivos. "Quem quer juntar dinheiro para comprar um apartamento por exemplo, quando a quantia já for suficiente, deve vender as ações e comprar o imóvel", diz Macedo. "Não se pode ceder à tentação de acreditar que a bolsa só sobe e ficar sempre tentando ganhar mais, assim como não se deve resistir a realizar um ganho menor porque surgiu uma queda", conclui.

Valor Econômico

24 junho 2006

A arte de escrever difícil

Um belo texto publicado hoje (24/06) no Estado de S Paulo sobre a arte de escrever difícil:

O hábito de escrever e falar difícil

De onde vem o gosto pela incomunicabilidade? Vem de longe, mas hoje pelo menos os jornais primam pela expressão enxuta

Aluízio Falcão

A exposição sobre o nosso idioma e sua merecida repercussão trouxe para as salas de aulas e páginas de jornais um debate enriquecedor sobre o tema. Houve, na abertura do evento, reparos a imprecisões históricas em alguns de seus painéis, mas feitas num tom não construtivo que denunciava, antes do zelo, uma certa inveja dos formuladores. A exposição não sofreu com isso e despertou grande interesse da população.

Passado o impacto sobre a beleza da lusofonia, é preciso retomar a batalha por sua clareza. Até acho que todos os dicionários deviam ter na capa aquele aviso da propaganda de cerveja: use com moderação. A Língua Portuguesa precisa de um regime para emagrecer. Deve urgentemente perder celulites que agridem a decantada formosura do seu corpo. Perdão leitora, mas não há outro termo, somente celulite corresponde ao tenebroso vocábulo aleivosia, por exemplo, tão presente na oratória política e em alguns escritos que leio de vez em quando. Na tribuna, Suas Excelências querem afirmar que não admitem injúrias e acabam por dizer que não admitem aleivosias. Há outros recursos, talvez mais feios. Dizem "condutas deste jaez", quando poderiam dizer simplesmente "condutas desse tipo". Jaez, ínterim, encômio, vitupério, entrementes... a lista daria um dicionário. Um dicionário de sinônimos, provando que a cada palavra rebarbativa corresponde outra mais bonita e mais simples, de igual significado, que todo mundo entende. O problema é que falar difícil ainda confere status perante certas platéias. Ainda ontem, no restaurante, escutei um vizinho de mesa explicando qualquer coisa: "Esforço hercúleo..." A julgar pelo franzido nas testas de sua mulher e dos filhos, ninguém entendeu o hercúleo.

De onde vem esse gosto pela incomunicabilidade? Vem de longe, dos primeiros bacharéis. Não satisfeitos com os excessos em português, decoravam um latinório para rechear de sabedoria suas petições e recursos. Um amigo advogado, Núncio Nastari, divertiu-me com páginas e páginas dessas invocações. Pesquei algumas: est modus in rebus (cada caso é um caso); ad argumentandum tantum (apenas para argumentar); data venia (com o devido respeito); res nulius (coisa de ninguém); dura lex, sed lex (a lei é dura, mas é lei); pacta sunt servanda (os contratos devem ser respeitados); ad impossibilia nemo tenetur (ninguém é obrigado ao impossível); mutatis, mutandis (mudando o que deve ser mudado) e vai por aí a listagem do Núncio.

Ainda hoje tais preciosismos adornam os papéis jurídicos. Rui Barbosa foi um precursor. Profissionais de outras áreas também criaram jargões próprios, dificultando a compreensão de seus textos pelos outros mortais. Daí o "economês", o "sociologuês" e outros idiomas dentro do idioma.

Houve uma literatura de linguagem complicada, que parte da crítica endeusou exatamente pelos exageros formais, e não por seu conteúdo superior. Foi o caso de Os Sertões, do grande Euclides da Cunha, repleto de afetações que mais escondiam do que mostravam a genialidade do autor. Joaquim Nabuco, em seus Diários, registra que não agüentou ler os adjetivos de Euclides: (...) "Aqui a floresta impede também de ver as árvores. É um imenso cipoal; a pena do escritor parece-me mesmo um cipó dos mais rijos e dos mais enroscados. Tudo isso precisa ser arranjado por outro, ou de outra forma." E houve um excelente poeta brasileiro, Augusto dos Anjos, que se tornou famoso pelos seus piores versos, aqueles de linguajar rebarbativo: "Cosmopolitismo das moneras / pólipo de recônditas reentrâncias..."

Os jornais, que no passado imitavam a literatura pedante, hoje primam pela expressão enxuta, e com isso prestam importante serviço ao idioma. Inclusive quando incorporam uma linguagem que, pelo uso corrente na oralidade, adquirem o direito de ingressar na linguagem escrita. Machado de Assis defendia esse valor da espontaneidade. Escreveu, a propósito de vocábulos que pulam das ruas para o papel: (...) "Eles nascem como as plantas da terra. Não são flores artificiais de academias, pétalas de papelão recortadas em gabinetes nas quais o povo não pega. Ao contrário, as geradas naturalmente é que acabam entrando nas academias."

Os parnasianos contribuíram fartamente para difundir os palavrões. O termo é aqui usado para definir palavras solenes, cobertas de lantejoulas, que passeiam a sua pose nos sonetos. Mesmo aquele de Olavo Bilac sobre a Língua Portuguesa e que começa com "Última flor do Lácio, inculta e bela", merece reparos. Primeiro, porque o poeta imaginou que todos os seus leitores tinham a obrigação de saber que o Lácio era uma antiga região da Itália, onde primitivamente se falava o latim. Segundo, porque já no quarteto seguinte ele chama sua musa de "Tuba de alto clangor", parecendo insultá-la. Ainda bem que se redime dos excessos iniciais nos dois belos tercetos aqui transcritos em homenagem ao autor e ao nosso idioma:

"Amo o teu viço agreste e o teu aroma / De virgens selvas e de oceano largo! / Amo-te, ó rude e doloroso idioma, / Em que da voz materna ouvi: 'Meu filho!', / E em que Camões chorou, no exílio amargo, / O gênio sem ventura e o amor sem brilho!"

Sonetos, discursos e papéis jurídicos não foram os únicos a prejudicar a clareza do texto em português. É preciso lembrar as dissertações acadêmicas, especialmente aquelas da área de humanidades. Claro está que várias teses desta área contribuíram decisivamente para o avanço do conhecimento e a compreensão do Brasil. Mas houve outras, e também muitas, que vieram mais para complicar do que para explicar. Ainda bem que não saíram em livros. Esconderam-se, xerocadas, no escurinho das bibliotecas. Talvez com algum acanhamento de serem tão ininteligíveis e confusas.

Deixei para o fim, como nas estórias policiais, um culpado acima de qualquer suspeita. Ele goza de certa respeitabilidade e provavelmente não tem exata noção do mal que faz, em nome do bem. Estou me referindo ao gramático obsessivo, um guardião fundamentalista do idioma, que também age como carrasco da boa prosa. Não falo de bons e anônimos professores de português empenhados em difundir as boas normas nas escolas secundárias. Palmas para estes heróis obscuros que nem sempre têm o reconhecimento dos alunos e dos patrões, sejam estes governos ou empresários do ensino. Mas o purista ortodoxo trava a fluência da escrita, inibe os predicados que a embelezam para receber a visita dos leitores. O purista não é mau sujeito, ele erra supondo combater o erro. Um pai antiquado, rigoroso além da conta, que proíbe a filha de se fazer bonita para os rapazes. E, sendo intolerante como um pai de outros tempos, adora palavras daquele repertório dos oradores e passadistas em geral.

Grandes criadores na literatura mundial já se queixaram amargamente das restrições desses fiscais do vernáculo, que não abrem um livro em busca de prazer estético, e sim de erros para denunciar ou criticar. Não são erros, mas carícias de quem adivinha, pelo trato constante e apaixonado, as mil possibilidades que as palavras oferecem aos seus verdadeiros amantes. Palavras, palavras. Poetas e escritores dormem com elas, decifram seus mistérios. Nessa intimidade o texto é concebido. Já os gramatiqueiros, brandindo regras inflexíveis, não cansam jamais em sua tarefa de patrulhar as aventuras das meninas com os seus artistas.

23 junho 2006

O custo de não fazer

Uma reportagem do Wall Street Journal de hoje mostra o custo de não fazer. No caso, refere-se ao filme do Superman, adiado várias vezes.

A reportagem completa a seguir:

O supercusto de não realizar um filme
June 23, 2006 4:05 a.m.

Por Kate Kelly
The Wall Street Journal

Alguns anos atrás, o então presidente de produção da Warner Bros. Entertainment, Bill Gerber, levou um pequeno grupo de pessoas de Hollywood para uma luxuosa casa de veraneio que o estúdio mantinha em Acapulco. Entre eles estava o agente Gerry Harrington, cujo cliente Nicolas Cage havia sido escolhido para o papel principal numa nova encarnação da série de filmes Superman.

Logo depois de chegarem lá, Gerber recebeu um desagradável telefonema informando-o que o estúdio estava descartando o projeto com Cage por questões de orçamento e roteiro. "Eu tinha a nada invejável tarefa de dizer a Gerry Harrington que estava tudo acabado", lembra Gerber. "Foi um desastre."

Oito anos depois, a Warner Bros., da Time Warner Inc., está pronta para apresentar sua nova versão do mais famoso super-herói. Superman – O Retorno — que estréia dia 28 de junho nos EUA e 14 de julho no Brasil — traz o pouco conhecido ator Brandon Routh e o diretor de X-Men, Bryan Singer. A Warner Bros. diz que o filme custou US$ 228 milhões mas que, com a isenção de impostos por ter sido feito na Austrália, o desembolso ficou perto dos US$ 209 milhões.

Nos últimos dez anos, a Warner Bros. experimentou cinco diretores, várias equipes administrativas no estúdio e pelo menos dez roteiros na tentativa de trazer o Super-Homem de volta à tela. A série estava dormente desde Superman IV – Em Busca da Paz, de 1987, o último e menos popular dos filmes com Christopher Reeve.

O esforço da Warner para relançar Superman é prova de que, em Hollywood, os filmes que não são feitos podem ser tão penosos e custosos quanto os que são. Estima-se que as versões fracassadas de Superman que precederam o filme de Singer custaram à Warner US$ 60 milhões em despesas de desenvolvimento, segundo entrevistas com mais de uma dúzia de atuais e ex-executivos, roteiristas, diretores e consultores que estiveram envolvidos no projeto em várias fases. Esse é o custo médio atualmente de uma produção hollywoodiana.

A Warner Bros. diz que esses custos já foram baixados de seu balanço. Mas a experiência mostra que mesmo a tarefa aparentemente simples de passar uma história popular de gibi para o celulóide às vezes pode virar uma peregrinação agonizante e custosa.

O projeto de Superman – O Retorno nasceu em 1993, quando a Warner Bros. adquiriu os direitos de fazer um novo filme do Homem de Aço. Jon Peters, o produtor ligado ao filme, trocou de roteirista pelo menos três vezes até 1997, passando por Jonathan Lemkin, um veterano roteirista de televisão, e Kevin Smith, do sucesso independente O Balconista. A Warner Bros. diz que 11 roteiristas custaram-lhe em média US$ 850.000 cada.

Mas foi tudo jogado fora em 1997, quando Tim Burton, diretor de Batman, entrou no projeto acompanhado por Cage e um novo roteirista de sua escolha, Wesley Strick. Mas o projeto, que seria baseado no quadrinho A Morte do Super-Homem, acabou engavetado no ano seguinte, por dúvidas quanto aos custos e ao roteiro, segundo pessoas à época envolvidas. O estúdio diz que gastou aí US$ 30 milhões.

Dali em diante, a Warner cogitou um filme de Batman contra Super-Homem, que seria dirigido por Wolfgang Petersen, de Na Linha de Fogo, mas voltou a arquivá-lo, antes de contratar Brett Ratner, que fez a comédia A Hora do Rush, para um novo filme só do Super-Homem.

Em seis meses de preparação, Ratner trabalhou com artistas de efeitos visuais e designers numa produção estimada em mais de US$ 200 milhões, gastando cerca de US$ 10 milhões. No começo de 2003, ele foi demitido.

A Warner Bros. finalmente acertou com Singer em 2004.