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17 junho 2024

Um caso de falência e o preço do ativo

A notícia é bem interessante:

Em maio os advogados responsáveis pela falência da FTX apresentaram um plano de reorganização que reembolsaria quase todos os clientes da corretora e também pagaria 18% de juros pelo período em que seus investimentos ficaram presos. Se a maioria dos credores e o juiz da falência concordassem, os cheques seriam emitidos dentro de dois meses.

Pelos padrões típicos de falência, esse é um ótimo acordo. Raramente todos os credores recebem em dinheiro, e alguns podem esperar anos para recuperar apenas uma fração de suas reivindicações. Mas nem todos os credores estão comemorando. Alguns estão insatisfeitos porque não receberão suas criptomoedas de volta.

Em vez disso, os ex-clientes serão reembolsados em dólares com base no valor de suas participações na época do pedido de falência da FTX em novembro de 2022, quando as criptomoedas estavam desvalorizadas pela crise da indústria que levou a empresa à ruína.

Desde então, o valor do bitcoin quase quadruplicou, assim como o de muitos outros tokens, cujos preços bateram recordes. Essa oportunidade foi perdida pelos investidores cujas criptomoedas ficaram presas na corretora.

A falência é sempre um caso atípico e no caso em questão os ativos foram pagos pelo preço histórico mais uma percentagem adicional. Mas os ativos se valorizaram e o preço atual é maior que o histórico. E se tivesse ocorrido o contrário? Provavelmente não haveria o pagamento, nem a reclamação. 

04 agosto 2021

Doação


Um dos aspectos mais complicados em uma entidade do terceiro setor é a contabilidade das doações. Eis uma situação prática apresentada pelo IntheBlack da Austrália

Uma grande quantidade de receita vem de doações concedidas por governos, fundos fiduciários e fundações, filantropos privados e, em muitos casos, membros do público em geral fazendo pequenas doações.

É aqui que as coisas podem ficar bastante complicadas do ponto de vista contábil, especialmente quando se trata de determinar o momento em que certas formas de receita precisam ser reconhecidas.

Fazer isso efetivamente requer um entendimento detalhado de dois padrões contábeis da Conselho Australiano de Normas Contábeis (AASB) - AASB 15 Receita de contratos com clientes e AASB 1058 Renda de entidades sem fins lucrativos.

Também é importante entender a distinção entre revenue e income.

Embora "revenue" seja geralmente definida como receita decorrente no curso das atividades comuns de uma entidade, "income" inclui não apenas receita, mas também outros aumentos nos benefícios econômicos recebidos (incluindo doações) que não sejam contribuições dos proprietários.

(...)

 “Algumas doações podem envolver o recebimento de uma quantia em dinheiro sem condições específicas de como ela é usada. Outros envolvem dinheiro fornecido sob um contrato formal que especifica como e quando o dinheiro é gasto. A questão gira em torno do momento do reconhecimento da receita da subvenção.

“Às vezes, quando um ESL (entidade sem fins lucrativos) recebe uma grande quantia em dinheiro da subvenção, as regras contábeis podem exigir o reconhecimento de todo o dinheiro recebido como receita no ano do recebimento.

“Isso pode causar desafios para a ESL, pois os leitores de suas demonstrações financeiras podem assumir que a entidade teve um ano muito bom quando, de fato, o dinheiro reconhecido como receita naquele ano deve ser alocado para uso em anos futuros." (...) 

"As organizações sem fins lucrativos querem um resultado equilibrado ou sustentável que não possua oscilações. Eles não querem mostrar um grande lucro com o reconhecimento antecipado de receita em um ano e depois despesas no próximo exercício financeiro. David Hardidge FCPA, Escritório de Auditoria de Queensland

"Eles não têm necessariamente a equipe que pode passar um tempo lendo os padrões de 100 páginas.

(...)

27 fevereiro 2019

Teoria na Era do Big Data


  • Na era do Big Data, há um questionamento se a teoria ainda é importante
  • A grande presença de dados pode alterar a escolha sobre como fazer uma pesquisa
  • O perigo é a possibilidade de correlação espúria

Uma vez que a pesquisa científica está usando cada vez mais dados, em grandes quantidades, há um questionamento se a teoria ainda é importante. Jackson, em The Role of Theory in an Age of Design and Big Data, discussa a questão sob a ótica dos economistas. Mas sua visão pode ser expandida para a contabilidade. Ele relembra que recentemente Duflo afirma que economistas seriam como plumbers encanadores, onde o trabalho envolve questões para melhorar a vida das pessoas. E acrescenta que as pesquisas teóricas estão em claro declínio: eram 57% dos artigos publicados em 1983 e representava 19% em 2011. Mas na visão dele, a teoria ainda é necessária na era do design e do big data.

Uma típica pesquisa na era do Big Data coleta uma grande quantidade de dados e procura extrair dali algum tipo de relação estatística. Explora as informações, sem um conhecimento prévio do que pode encontrar. Com o resultado encontrado, o pesquisador tenta buscar teorias que poderia sustentar os achados. Um trabalho deste tipo começaria com a metodologia e análise dos dados para depois fazer a revisão da literatura ou revisão da teoria (são coisas distintas). Alguns pesquisadores acham que esta maneira de fazer pesquisa está errada. É uma opinião baseada no fato de que, em alguns casos, os achados não possuem vínculo com uma base teórica. Isto ocorre quando temos a situação de correlação espúria (aqui, aqui, aqui e aqui), onde o tamanho do vestido apresenta correlação com o comportamento do mercado acionário.

Entretanto, é inegável que algumas descobertas da ciência são feitas desta forma. O que parece estranho quando temos o resultado, pode ser um achado importante. O famoso paper de Fama e French usou uma pesquisa deste tipo para chegar ao modelo de três fatores, segundo afirma Justin Fox. Criticando Fama, é bem verdade.

Para o pesquisador, é importante saber que sua escolha por este tipo de pesquisa também leva a algumas escolhas de técnicas. Uma pesquisa que trabalha os dados, “sem uma teoria”, deveria usar o método Stepwise na regressa múltipla; já uma pesquisa com base teórica precedendo a análise dos dados poderia optar pelo método Enter (vide Andy Field no seu livro de estatística).

Imagem, a partir de uma imagem retirada daqui

14 janeiro 2019

Big Data e Teoria

A questão do Big Data ainda irá gerar uma boa discussão na ciência. Há uma certa associação entre a chegada do Big Data e o fato de estarmos livre da teoria. A pesquisa tradicional começa com uma teoria. Em uma ótica mais atual, coleta-se uma tonelada de dados para validar o palpite e tenta encontrar padrões.

A questão é que os padrões podem surgir em um grande conjunto de dados sem que exista uma base para isto

Em seu best-seller 2001 Good to Great, Jim Collins comparou 11 empresas que superaram o mercado de ações geral nos últimos 40 anos com 11 empresas que não o fizeram. Ele identificou cinco características que as empresas de sucesso tinham em comum. "Nós não começamos este projeto com uma teoria para testar ou provar", gabou-se Collins. "Procuramos construir uma teoria a partir do zero, derivada diretamente da evidência".


O fracasso de Collins é bastante conhecido.

Após a publicação de Good to Great, o desempenho das magníficas 11 ações da Collins foi claramente medíocre: cinco ações tiveram um desempenho melhor do que o mercado de ações em geral, enquanto seis tiveram resultados piores.

Em um exemplo mais recente, a empresa Google criou um programa que usava as consultas de pesquisa para prever os surtos de gripe. Usando 50 milhões de consultas de pesquisa, foram identificados 45 termos que possuíam mais correlação com a incidência de gripe. Depois disto, o programa estimou os casos. Na verdade, superestimou, já que o número de casos previsto foi o dobro do que realmente ocorreu.

Segundo Gary Smith:

Uma boa pesquisa começa com uma ideia clara do que alguém está procurando e espera encontrar. A mineração de dados apenas procura padrões e, inevitavelmente, encontra alguns.

Um pouco nesta linha, aqui uma interessante discussão entre o aprendizado de máquina e a econometria.

30 outubro 2015

Teoria tem que ser interessante

"Há muito tempo se pensou que um teórico é considerado ótimo, porque suas teorias são verdadeiras, mas isso é falso. Um teórico é considerado grande, não porque suas teorias são verdadeiras, mas porque eles são interessantes." - Murray Davis

19 janeiro 2014

Entrevista: Francisco Fernandes de Sousa

Multitasking: enquanto nos atendia, Chiquinho continuava a atender demandas.
Francisco Fernandes de Sousa, contador, começou a trabalhar na Eletrobras Eletronorte há cerca de 30 anos. Além de ser gerente na diretoria financeira, Chiquinho, como é conhecido por toda a empresa, tem certificação como consultor SAP/R3 e é um dos principais responsáveis pela configuração dos sistemas financeiros e de custos (módulos FI e CO no SAP).

Blog_CF: Como era a contabilidade na Eletrobras Eletronorte há 20 anos e como é hoje?
Francisco: Antigamente fazíamos tudo "a mão". Há 20 ou 30 anos as contas eram mais simples, mas a falta de uma planilha Excel tornava tudo mais difícil. Risos. Levávamos muito tempo para preparar o balanço. Houve um tempo em que tínhamos alguns computadores para suprir a demanda de todos nós. Havia fila! Hoje acho engraçado relembrar.

Era muito difícil receber a prestação de contas de um engenheiro que estava participando da construção de Tucuruí, por exemplo. Hoje em dia isso é feio com o auxílio do SAP R3, a plataforma que utilizamos na Eletronorte. Com ele cada um tem a devida autorização para fazer o que está dentro dos seus limites. Essas autorizações são sempre revistas pois adotamos a Sarbanes-Oxley, que exige isso.

Por exemplo, quem está em Tucuruí e tem que preencher uma planilha com as horas gastas em cada centro de custos, tem acesso ao TimeSheet. Se ele precisa fazer a solicitação de materiais ao almoxarifado, não vai poder. Isso caberá, talvez, à secretária, ou a quem foi autorizado a seguir com aquela tarefa. Na contabilidade, quem participa do encerramento mensal das contas tem acesso a transações específicas para aquilo. Em um sistema de compras, a pessoa que faz a solicitação, é diferente da que confere e autoriza. Tudo isso dá mais segurança ao usuário, ao sistema e facilita, inclusive, o trabalho da auditoria.

Atualmente a principal dificuldade se encontra nas alterações advindas do IFRS. Temos o impairment, o ativo financeiro, o impacto nas concessões. Isso não existia para nós e a adoção pelo Brasil trouxe uma repercussão tremenda.

Claro que a contabilidade cresceu porque era necessário e acho positiva essa "globalização". Mas quando se trata do dia-a-dia, fica um pouco menos romântico.

Colocar a teoria na prática sem ter um exemplo a seguir é ao mesmo tempo emocionante e arriscado. Investimos muito em treinamento para estar em dia com todas as mudanças e conseguirmos passar tudo tanto para a configuração do sistema, quanto para as demonstrações contábeis, de forma fidedigna. Mas até que o balanço seja oficialmente publicado, há muito debate, reclassificação, revisão. É um trabalho para quem realmente gosta de colocar a mão na massa.

Blog_CF: Para conseguir fazer o que você faz, mexer com contabilidade e com a configuração do sistema, o que é ideal conhecer? O que um aluno deve estudar para ter uma oportunidade similar?
Francisco: Além de ser um bom contador, é necessário que ele faça alguns cursos. A empresa SAP oferece certificações para que a pessoa se torne oficialmente um consultor SAP. O SAP R3 é dividido em vários módulos. A sua certificação dependerá do seu interesse. MM é o módulo de materiais, HR o de recursos humanos. No meu caso, cursei FI (referente ao módulo financeiro) e CO (referente ao módulo de custos). Ideal seria alguém que soubesse uma linguagem de programação denominada ABAP.



Blog_CF: Qual é a maior dificuldade encontrada atualmente na sua área?
Francisco: A falta de profissionais qualificados e a burocracia para suprir os cargos. Desde o vencimento do concurso muitas pessoas saíram, incluindo aquelas em programa de demissão voluntária. Enxugamos os gastos com pessoal, porém houve sobrecarga dos funcionários que permaneceram. Ademais, na minha área, necessito de contadores maleáveis e dispostos. Acreditem, não é fácil encontrar pessoas assim.

A necessidade desse perfil advém do fato de que a contabilidade está em constante atualização. Como comentei, antes do IFRS era muito mais fácil ser um contador. Atualmente precisamos estar sempre em cursos, reuniões, palestras e eventos que envolvem tempo e dedicação. Não só isso, temos que saber como aplicar os conceitos na prática.

A Eletronorte é uma empresa de capital fechado, mas somos parte da Eletrobras, que depende das informações que passamos, da forma como nos comunicamos. Assim, além de um funcionário que esteja sempre disposto a aprender, espero que ele também saiba aplicar a teoria à prática, saiba tomar decisões, entenda de sistemas (pois nos comunicamos em grande parte via SAP R3), saiba trabalhar em equipe.

Blog_CF: Como ocorreu o treinamento dos funcionários para que o sistema fosse adotado de forma eficiente?
Francisco: Nós estamos constantemente desenvolvendo treinamentos para ensinar SAP R3. Cada área com a sua parte, claro. Por exemplo, a gerência de ativos capacita funcionários não apenas da sede, como também das regionais, a lidar com o inventário.

A regra, todavia, é que os colegas ensinem uns aos outros o que sabem. Incentivamos a criação de manuais e passo a passo das tarefas para, caso alguém tenha que se ausentar, ou fique enfermo, tudo possa seguir em frete com tranquilidade.

Mas, sempre que possível, retomamos os treinamentos para haver uma reciclagem constante. Ademais, damos assistência por e-mail e telefone. Algo similar a um help desk.

Blog_CF: Quais dicas você daria para um jovem ainda cursando a faculdade?
Francisco: Inicialmente ressalto que o programa para estagiários na Eletrobras, como um todo, é excelente. Sugiro que fiquem atentos à página da Eletrobras Eletronorte pois logo sairá o edital para novas contratações. Antecipando a pergunta, já simplifico a resposta. O que procuramos em estagiários é a vontade de aprender e o conhecimento contábil e de informática. Não é necessário saber SAP/R3 pois te ensinaremos aqui. A minha filosofia faz com que contratemos estagiários para o crescimento do aluno e não como "mão de obra barata".

Mas de forma mais abrangente, eu aconselho que você, jovem, aprenda a aprender. Estude além do que é exigido para passar em provas, saiba conversar sobre o assunto, interpretar arriscar uma aplicação. Alimente desde o início a sua curiosidade.

Se você já faz estágio, tente sempre procurar alguém que precise de ajuda. Não fique lendo resumos de novela ou esperando o tempo passar. Nesses momento em que você oferece ajuda para outros colegas, você pode aprender algumas coisas que te trarão um diferencial por toda a vida.

Estude inglês (e saiba português!) e informática. Um contador deve saber mexer com ferramentas básicas como Word, Excel e Power Point com excelência. Além disso, aproveite as férias (ou a greve, o sábado de manhã, ou qualquer momento que tenha livre) para fazer cursos de Access ou algum software que te mantenha versado em sistema, melhore o seu currículo e te diferencie ainda mais de seus pares. Mesmo em trabalhos concursados, o seu currículo define a sua caminhada.