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Mostrando postagens com marcador setor público. Mostrar todas as postagens
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18 novembro 2024

Valor justo em empréstimos públicos

Um relatório da National Taxpayers Union Foundation, publicado em 8 de novembro de 2024, afirma que os programas federais de crédito dos Estados Unidos estão custando aos contribuintes dezenas de bilhões de dólares a mais do que o estimado, devido ao uso inadequado de métodos de contabilidade. Atualmente, o governo utiliza o método de contabilidade do Federal Credit Reform Act (FCRA), que assume que as atividades de crédito federal têm risco tão baixo quanto os títulos do governo. No entanto, esse método subestima os custos reais, pois não considera os riscos de mercado associados à inadimplência de indivíduos e empresas. O relatório sugere a adoção da contabilidade de valor justo, que incorporaria um prêmio de risco de mercado, proporcionando uma estimativa mais precisa dos custos dos programas de crédito federal.

Isso parece muito estranho. O uso do custo histórico, acompanhado de uma boa estimativa dos inadimplentes e sua contabilização, já seria suficiente. 

Fonte: aqui 

28 junho 2023

Nova Estrutura Conceitual do IFAC para o setor público

O IFAC, em maio de 2023, divulgou uma alteração na estrutura conceitual para o setor público. O documento que apresenta os elementos das demonstrações financeiras tem 40 páginas, enquanto o documento que aborda as considerações sobre o processo de mensuração possui 175 páginas. Neste texto, iremos analisar somente o primeiro documento, destacando seus principais elementos.

Inicialmente, o IFAC considera seis elementos nas demonstrações financeiras: ativo, passivo, receita, despesa, contribuição do proprietário e distribuição do proprietário. Portanto, não há uma definição separada para o patrimônio líquido, seguindo a mesma lógica da estrutura anterior. Além disso, não existe uma categoria "separada" para superávit e déficit, os quais serão abordados posteriormente.

Ativo:

Anteriormente, o ativo era definido como um recurso controlado no presente pela entidade como resultado de um evento passado (do livro "Teoria da Contabilidade", quarta edição, p. 214). Na proposta apresentada, o ativo é um recurso atualmente controlado pela entidade como resultado de eventos passados. Ou seja, a definição continua essencialmente a mesma.

Conforme mostrado no capítulo sobre ativo do livro "Teoria da Contabilidade", há três elementos principais na definição mais conhecida de ativo: a capacidade de gerar riqueza no futuro, decorrente de um evento passado e controlado atualmente pela entidade. Portanto, na definição clássica de ativo, temos o passado, o presente e o futuro. No entanto, existe uma vertente da teoria que contesta a necessidade do evento passado, dando maior destaque à capacidade do ativo em gerar riqueza.

No caso de uma entidade pública, essa capacidade não recebe tanto destaque, uma vez que existem ativos no setor público cuja finalidade não é gerar riqueza. No entanto, a definição mantém o termo "recurso", embora não o qualifique como "econômico". Isso diferencia a definição da proposta recente do IFR4NPO, que considera um ativo como um recurso econômico presente, controlado pela ONG, como resultado de eventos passados.

Portanto, para o setor público, um ativo é um recurso atualmente controlado pela entidade como resultado de eventos passados. Assim como ocorreu na estrutura conceitual do setor privado, que no Brasil recebeu a denominação "CPC 00", é necessária uma definição de recursos. Na estrutura do IFAC, um recurso é um direito tanto ao potencial de prestação de serviços quanto à capacidade de gerar benefícios econômicos, ou um direito a ambos. Essa definição não muda substancialmente em relação à estrutura anterior.

Em termos de redação, há duas mudanças. A primeira foi a colocação do termo "eventos passados" no plural. Isso parece ser um detalhe sem importância. Há outra diferença no fato de o termo "presente" estar vinculado ao controle, no setor público, enquanto seu vínculo maior, na definição da IFRS, é com o recurso econômico. Portanto, a definição final é a seguinte: recurso é um direito tanto ao potencial de prestação de serviços quanto à capacidade de gerar benefícios econômicos, ou um direito a ambos.

No entanto, é importante observar que existem três componentes principais na definição de recurso: direito, potencial de serviço e benefício econômico, e controle atual decorrente de eventos passados. Vamos abordar cada um deles na ordem.

Os direitos podem estar associados ou não a uma obrigação da outra parte. Por exemplo, um direito que envolve uma obrigação da outra parte é o direito de receber dinheiro, bens ou serviços. Mas há direitos que não correspondem a uma obrigação da outra parte, como os direitos sobre propriedades. A mera existência do direito não garante que um item seja considerado um ativo. Isso também é válido para uma entidade privada. É necessário que a definição completa de ativo seja atendida, e não apenas parte dela. Em outras palavras, um ativo precisa ser um direito, mas também deve ter potencial de serviço ou benefício econômico e ser controlado pela entidade. Portanto, um direito que está disponível para todas as pessoas sem custo significativo, como o acesso a certos bens públicos ou conhecimento de domínio público, não é considerado um ativo.

Um mesmo ativo pode dar origem a vários "direitos". Por exemplo, a propriedade de um terreno pode gerar o direito de vendê-lo, o direito de usar o imóvel ou o direito de oferecê-lo como garantia. No entanto, para fins contábeis, o ativo é tratado como único. Na verdade, o que caracteriza o terreno como ativo são exatamente esses conjuntos de direitos, e não o objeto físico em si. Isso é destacado adequadamente na estrutura do IFAC.

O segundo elemento é o potencial de serviço do ativo. No setor público, isso significa fornecer serviços que ajudem a alcançar os objetivos da entidade. Ao contrário do setor privado, não é necessário gerar fluxo de caixa. Por exemplo, a construção de um parque é um ativo que não gerará fluxo de caixa, mas pode atender aos objetivos do setor público. O mesmo ocorre com serviços comunitários, segurança pública, entre outros.

A prestação do serviço pode ocorrer em atividades em que não há interesse do setor privado. Apesar dessa característica, nada impede que o setor público tenha ativos que geram entradas de caixa. Aqui, faço uma ressalva ao documento, que manteve o conceito de benefício econômico no título e no item 5.10. Embora os itens anteriores parecessem deixar claro que a produção de benefício econômico não é a essência do ativo no setor público, a presença desse termo no título e em um item específico torna o texto confuso.

O terceiro elemento do ativo é o fato de ser controlado atualmente pela entidade como resultado de eventos passados. Isso significa que a entidade deve ter a capacidade de usar o recurso para obter o potencial de serviço. A questão do controle pode envolver não apenas os ativos que estão dentro do escopo da entidade, mas também aqueles em que existe questionamento sobre o controle.

Determinar o controle de um ativo envolve verificar a propriedade legal, o acesso ao recurso, o uso do recurso para alcançar os objetivos e a existência de um direito.

O IFAC considera, assim como a Fundação IFRS, que é necessário que esse controle seja decorrente de uma ou mais transações ou eventos que ocorreram no passado. Um aspecto específico do setor público é que um ativo pode surgir de uma transação não comercial, como o exercício de poderes soberanos. Isso inclui, por exemplo, o poder de emitir uma licença para um terceiro. Quando o setor público concede a uma empresa a possibilidade de explorar a telefonia celular, isso representa um poder específico do setor público, que pode ser considerado um ativo caso seja usado.

Nesse caso, o setor público deve ter a capacidade de estabelecer uma lei ou criar um direito reconhecido que possa resultar na obtenção de recursos futuros.

Em resumo, a definição do ativo para o setor público manteve a essência da Estrutura Conceitual do Iasb. Talvez fosse interessante observar a definição do Fasb: ativo é um direito presente a um benefício econômico. Caso fosse necessária uma adaptação para o setor público, talvez pudesse considerar o ativo como sendo um direito presente a um serviço potencial.

Passivo

Na estrutura anterior, o passivo estava definido como sendo uma obrigação presente, derivada de um evento passado, cuja extinção deva resultar na saída de recursos da entidade. Assim como no ativo, a definição nova sofreu alterações sutis. Senão, vejamos: passivo é uma obrigação presente da entidade de transferir recursos, como resultado de eventos passados. Permanecemos com o triângulo do passado (eventos), presente (obrigação) e futuro (transferir recursos). Assim, a crítica da definição ser redundante – afinal, se a obrigação é presente isto decorre de um evento passado – não foi considerada aqui. É bom lembrar que o Fasb já fez esta eliminação.

Duas pequenas alterações que passariam despercebidas. A primeira é a troca do termo “saída de recursos” por “transferir recursos”, que parece ampliar o escopo do conceito. Uma concessão talvez não seja, na sua essência, uma saída de recursos. A segunda pequena alteração é o plural para eventos passados.

Vamos começar analisando o fato do passivo ser uma obrigação. É importante salientar que um passivo pode ser exigido por lei. Entretanto, há o poder soberano, onde o governo pode criar, alterar ou revogar disposições legais. Neste sentido, há autores – vide o livro de Teoria, nos seus exercícios – que lembram deste fato para indicar que a existência de um passivo no setor público não é relevante. A EC considera que a figura do poder soberano não é suficiente para excluir uma obrigação em razão de não atender à definição de passivo. Esta parte da EC ainda não conseguiu resolver algumas questões como a existência de uma obrigação, na constituição, de que o governo deva assumir certos passivos, embora na prática o faça. Neste caso, a constituição já seria suficiente para reconhecer o passivo?

O texto da EC do IFAC realmente é confuso na questão das obrigações, criando termos como “obrigações não legalmente vinculativas” e “obrigações legais”. O primeiro termo considera que a outra parte não pode tomar medidas legais para exigir a liquidação, ao contrário das obrigações legais.

O segundo aspecto da definição de passivo é a transferência de recursos da entidade. Para isto é necessário que se exista algo que possa exigir da entidade o ato de transferir recursos. Não há aqui uma necessidade associada a uma probabilidade. A EC evita esta discussão considerando que existe um passivo mesmo que a chance seja reduzida. Isto seria objeto das orientações sobre o reconhecimento e mensuração, mas não estaria vinculada à definição.

A transferência de recursos pode ocorrer através do pagamento em dinheiro, do fornecimento de serviços, entre outros. Uma das hipóteses prevista na EC é a possibilidade da transferência seja através de troca de recursos em termos desfavoráveis. Isto parece muito estranho, pois admitir, na definição do passivo, esta possibilidade parece perigoso para qualquer governo que adote o texto da estrutura do IFAC.

Uma forma possível de liquidar um passivo, também existente em uma entidade do terceiro setor, é através da liberação da obrigação. Mas também é possível transferir a obrigação para terceiro ou substituir por outra obrigação.

Finalmente, o passivo está vinculado ao passado. Isto pode surgir em diversos momentos do tempo como durante as eleições, no anúncio de um programa de governo, na aprovação do orçamento, entre outros momentos. Ou seja, deve existir uma responsabilidade por parte do setor público em cumprir com a obrigação.

Conforme afirma o texto da EC, o momento em que a obrigação gera uma responsabilidade para o setor público irá depender da natureza da obrigação. Basicamente, a entidade pública não deve ter muitas formas de evitar que a obrigação seja cumprida. Uma promessa eleitoral talvez não seja motivo suficiente para a existência do passivo. Mas em alguns casos, este anúncio pode ter tanto apoio, que há pouca opção ao governo na sua desistência.

Após a definição do passivo, a EC do IFAC apresenta uma novidade, em termos do documento: conceito e aplicação de unidade de conta.

Unidade de Conta

De uma maneira simplificada, a unidade de conta é o ativo ou passivo onde os critérios de reconhecimento e mensuração são aplicados. Apesar da definição – a EC não aborda isto, o reconhecimento e a mensuração serem independentes, a escolha da unidade de conta é influenciada pela relevância e representação fiel das informações. É importante lembrar que estes dois elementos (relevância e representação fiel) são dois elementos desejados da informação, conforme definido no próprio documento.

Também neste item, a EC chama a atenção para um termo técnico, que não possui correspondente razoável em língua portuguesa: offsetting de ativos e passivos. Esta é uma situação onde ativo e passivo são reconhecidos e mensurados em contas separadas, mas agrupados, para fins de evidenciação no balanço patrimonial, em um único valor. Significa classificar itens diferentes juntos, não sendo recomendado. Isto é diferente de considerar um ativo e um passivo dentro de uma única conta.

É interessante notar que este tópico, apesar de estar logo após a definição de ativo e passivo, também se refere às receitas e despesas. Aqui parece que o documento foi infeliz em posicionar o tema. Além disso, não consigo deixar de pensar que a escolha de discutir este tema extrapola uma estrutura conceitual, sendo um elemento muito mais operacional.

Patrimônio Líquido ou melhor Posição Financeira Líquida

Na EC do Iasb há um momento onde apresenta-se a definição de patrimônio líquido. Bom, chamar o texto de definição talvez seja muito. É muito mais o anúncio de que o patrimônio líquido é fruto de uma equação. Na EC do IFAC há um item chamado de posição financeira líquida, outros recursos e outras obrigações.

A posição financeira líquida – leia-se patrimônio líquido – refere-se a diferença entre ativos e passivos, após adicionar outros recursos e subtrair outras obrigações reconhecidas no balanço patrimonial. Parece diferente do conceito do patrimônio líquido. O que seriam estes outros recursos e outras obrigações? Em termos bem simples é o recurso ou obrigação que não atende a definição existente na estrutura conceitual, mas o que o IPSASB entende que seja importante reconhecer nas demonstrações financeiras. E isto pode acontecer quando for desenvolvida ou revisada uma norma.

Assim, temos outro conceito: a posição financeira líquida é a diferença entre ativos e passivos, após adicionar outros recursos e deduzir outras obrigações reconhecidas no balanço patrimonial.

Antes de prosseguir, é importante salientar que a EC já tinha esta figura de outros recursos e outras obrigações. Mas há acréscimos na EC para elucidar melhor a questão. Entretanto, não podemos deixar de admitir que esta opção afasta a contabilidade do setor público das demais entidades.

Vamos agora tratar da Receita e Despesa.

Receita e Despesa e Resultado

Não ocorreu nenhuma mudança na definição da receita e da despesa. A rigor não temos uma definição aqui, mas simplesmente algo resultante da famosa equação contábil: Ativo = Passivo mais Situação Financeira. Assim, a receita é algo que será somado na situação financeira e a despesa é algo que será subtraído. Ou conforme a estrutura conceitual, receita é o aumento na posição financeira líquida da entidade, excluindo aumentos decorrentes de contribuições de proprietários. Despesa é a diminuição na posição financeira líquida da entidade, excluindo diminuições decorrentes de distribuições aos proprietários.

(Uma curiosidade aqui é que o texto do IPSAS usa o termo “Revenue”, ao contrário da EC do Iasb que usa o termo “Income”. Ponto para o IFAC)

Apesar das definições serem oriundas da equação básica, acho que esta escolha sábia. Afinal, quanto mais simples, melhor. No Fasb a definição contempla a origem da receita e despesa. Isto ficou de fora da definição da EC do setor público do IFAC. Mas logo a seguir, o texto informa que tanto a receita quanto a despesa podem surgir de transações de troca e não troca, eventos como aumentos e diminuições não realizados no valor de ativos e passivos e consumo de ativos (como depreciação).

E como seria de esperar, o resultado, denominado aqui de superávit ou déficit do período, será obtido pela diferença entre a receita e a despesa – ambos termos no singular – do período e como apresentada na demonstração do desempenho financeiro.

Contribuições e Distribuições dos proprietários

Fiz uma tradução pessoal aqui. O documento usa o termo "Ownership”, que corresponde à propriedade. Conforme a wikipedia, "is the state or fact of legal possession and control over property, which may be any asset, tangible or intangible". Mas isto me pareceu muito estranho, assim como é estranho a adaptação que fiz aqui. Afinal estamos falando do setor público, onde a figura do proprietário não deveria existir.

Mas minha escolha está coerente com o texto da atual estrutura (a NBC-TSP de setembro de 2016) que usa “contribuição dos proprietários e distribuição aos proprietários”. Esta expressão está lá na definição de receita e despesa do CPC 00 e aqui também. Um exemplo grosseiro dos dois seria o aumento de capital e os dividendos.

Mas a estrutura do setor público diz que as contribuições “são entradas de recursos em uma entidade, fornecidas por partes externas na qualidade de proprietários, que estabelecem ou aumentam a participação na posição financeira líquida da entidade”. E as distribuições seriam o oposto, ou seja, “são saídas de recursos da entidade, distribuídas a partes externas na qualidade de proprietários, que reduzem a participação na posição financeira líquida da entidade”.

Além dos exemplos citados dois parágrafos antes, a transferência de ativo ou passivo entre entidades do setor público estaria nesta condição.

30 maio 2023

Sustentabilidade no setor público

 


A entidade CIPFA (Chartered Institute of Public Finance and Accountancy), do Reino Unido, emitiu orientações sobre como os órgãos do setor público podem cumprir os padrões de contabilidade e divulgações de sustentabilidade.

O guia analisa as barreiras para a adoção generalizada da divulgação de sustentabilidade no setor público, em comparação com o setor privado, onde essa prática já é comum. Ele foi produzido para lidar com a "inadequação da atual divulgação de sustentabilidade no setor público".

Desenvolvido pela professora de contabilidade Carol Adams, o relatório inclui orientações, melhores práticas e conselhos para ajudar os órgãos do setor público a preparar relatórios de sustentabilidade e divulgar seus impactos de sustentabilidade.

Profissionais de contabilidade e finanças do setor público podem usar essas orientações para avaliar suas habilidades em relação à integridade dos dados, controles internos, auditoria interna, garantia externa e fornecimento de dados para tomada de decisão, auxiliando os profissionais de relatórios de sustentabilidade.

Em vez de propor o desenvolvimento e adoção de novos padrões, a CIPFA utiliza os padrões e estruturas já existentes e relevantes para o setor público.

Os conselhos são baseados em recomendações de organizações, incluindo o International Sustainability Standards Board (ISSB), o International Public Sector Accounting Standards Board (IPSASB) e a Global Reporting Initiative (GRI).

Clique aqui

10 maio 2023

Questões climáticas no setor público

Isto parece ser tão surreal: 

O International Public Sector Accounting Standards Board (IPSASB) está trabalhando em novos padrões contábeis para a divulgação de informações sobre mudanças climáticas no setor público. O objetivo seria fornecer orientações para entidades do setor público sobre como divulgar informações relacionadas às mudanças climáticas em suas demonstrações financeiras.


O IPSASB reconhece que é importante que as entidades do setor público possam relatar adequadamente as informações relacionadas às mudanças climáticas. Essas informações incluem, por exemplo, os impactos das mudanças climáticas sobre as operações e os ativos das entidades do setor público, bem como os riscos e oportunidades associados.

Os novos padrões contábeis estão sendo desenvolvidos em resposta a uma suposta demanda por informações claras e confiáveis sobre o assunto no setor público. Um argumento usado para o desenvolvimento destes padrões, questionável, é que garante que as entidades do setor público estejam em conformidade com os padrões internacionais de contabilidade. 

Minhas razões para questionar este passo. Em primeiro lugar, parece que o setor público tem prioridades mais urgentes na sua contabilidade, do que as informações relacionadas com o clima. Só para citar uma delas, a adoção mais efetiva do regime de competência. Segundo, isto parece ser muito mais uma atitude reativa e não um tratamento mais rigoroso do assunto. Terceiro, o documento será muito mais sugestivo, onde a divulgação será feita em notas explicativas. O IFAC não tem como impor norma para nações soberanas. 

Foto: William Bossen

21 fevereiro 2023

Papel da auditoria no setor público

Audits are a common mechanism used by governments to monitor public spending. In this paper, we discuss the effectiveness of auditing with theory and empirics. In our model, the value of audits depends on both the underlying presence of abuse and the government’s ability to observe it and enforce punishments,making auditing most effective in middling state-capacity environments. Consistent with this theory, we survey all the existing credibly causal studies and show that government audits seem to have positive effects mostly in middle-state-capacity environments like Brazil. We present new empirical evidence from American city governments, a high-capacity and low-impropriety environment. Using a previously unexplored threshold in federal audit rules and a dynamic regression discontinuity framework, we estimate the effects of these audits on American city finance and find no marginal effect of audits.

Apesar do trabalho não usar dados do Brasil, é interessante a modelagem do valor da auditoria. A relação entre o valor da auditoria e a capacidade do Estado encontra-se na figura abaixo:




02 agosto 2022

Desonestos, seleção e persistência da corrupção


A questão da desonestidade é cara no setor público. Diversos estudos mostraram que isto também pode estar vinculado a chance de ser funcionário público. Em países como a Dinamarca, ser funcionário público é destinado as pessoas honestas. Eis a ideia:

La noción de que se pueden generar círculos viciosos o virtuosos es consistente con evidencia empírica que muestra que hay una relación inversa entre el nivel de corrupción en el sector público de un país y la integridad de quienes se interesan por la función pública. En India, donde existe la percepción de que la corrupción es un fenómeno extendido, estudiantes universitarios más deshonestos muestran mayor interés en ser funcionarios públicos (Hanna y Wang, 2017). En Dinamarca, país caracterizado por la baja percepción de corrupción, son los individuos más íntegros los que manifiestan una mayor preferencia por un empleo en el sector público (Barfort, Harmon, Hjorth y Olsen, 2019).

La idea de que las rentas de la corrupción pueden atraer a la función pública a individuos más proclives a incurrir en actos corruptos no es nueva (Besley, 2005), pero la evidencia empírica escasea por la dificultad de hacer una estimación causal de esta relación. Esta estimación requiere i) tener una medida de integridad a nivel individual y ii) contar con una variación exógena en la disponibilidad de puestos de trabajo con y sin oportunidades de extracción de rentas.

A grande questão é que o processo seletivo dever levar em consideração a luta contra a corrupção. A melhoria da contratação passa por levar em consideração o passado de honestidade de uma pessoa:

Los resultados también son relevantes para las políticas de lucha contra la corrupción, pues sugieren que i) es importante tener en cuenta los posibles efectos sobre la selección a la hora de diseñar normas e incentivos en una organización (como se advierte aquí), y ii) la mejora de las prácticas de contratación del sector público (como las analizadas aquí y aquí) debería ser un foco central de la reforma en los lugares donde se percibe que la corrupción es frecuente.

02 março 2022

Competência no Setor público mundial


O IFAC lançou um endereço específico para os governos que desejem fazer a transição do regime de caixa para o regime de competência. O endereço baseia-se no Estudo 14 do IPSASB, Conselho Internacional de Normas Contábeis para o Setor Público, com conteúdo atualizado e ferramentas para a transição.

A posição do IFAC é que a competência melhora a transparência, as decisões e a prestação de contas no setor público. Entretanto, nem sempre sua adoção parece ser simples.  A ferramenta é uma resposta para o aumento do interesse pelo regime de competência no setor público. Segundo Ian Carruthers, até 2025, metade das juridições do Índice Internacional de Responsabilidade do Setor Público de 2021 deve usar o regime de competência.  

02 fevereiro 2022

IPSASB propõe mudanças na EC do Setor Público


A entidade que emite normas para o setor público, o IPSASB, está propondo diversas alterações na Estrutura Conceitual. Parte das mudanças reflete as alterações ocorridas em 2018 na Estrutura do Iasb, na qual as normas do setor público são inspiradas. 

A proposta ainda está na fase da minuta, mas podemos destacar aqui quatro alterações relevantes.  

Prudência - O antigo termo conservadorismo sempre foi marcado por polêmica e a mudança de nome, para prudência, não eliminou os problemas. Há uma acusação que o excesso de prudência pode descaracterizar a mensuração contábil e impedir a representação fiel. Se a presença da prudência traz problemas, a ausência pode ser muito pior. Os políticos perceberam isto durante a crise de 2008 e pressionaram para que o termo estivesse presente na estrutura conceitual. Além disto, incorporar a prudência na Estrutura é reconhecer algo que já fazemos na prática: o teste de recuperabilidade e o custo ou mercado são situações práticas onde a prudência domina. 

As cabeças pensantes do Iasb e do Fasb apostaram na neutralidade. Mas em 2018, o termo retorna na EC do Iasb de uma forma torta e confusa. Sem retirar a representação fiel e a neutralidade, o Iasb disse que seria possível a convivência com a prudência. O IPSASB resolveu bater na mesma tecla e repetiu a dose na proposta: a neutralidade é suportada pelo exercício da prudência e isto significa o exercício da cautela quando fazer julgamentos em condições de incerteza - ou seja, sempre. 

Nesta situação, a prudência não seria subestimar as receitas e ativos, nem subestimar as despesas e passivos. Mas como fazer esta mágica não é explicado. Talvez o Iasb quisesse dizer: seja conservador, ma non tropo. Na proposta, os argumentos se repetem nos itens 3.14 e 3.15. Mas mais adiante, no item BC3,16 e 17, o IPSASB reconhece que a não inclusão da prudência nas características qualitativas da informação é problemática. 

Materialidade - Assim como o conservadorismo perdeu terreno para a representação fiel, a materialidade também cedeu espaço para relevância. Mas uma vez que o próprio Iasb está revendo o termo em termos da preparação das demonstrações e no âmbito dos erros e estimativas, através da emenda ao IAS 1 e IAS8, o IPSASB resolveu acrescentar algumas mudanças neste sentido. Mais ainda, o IPSASB considerou que o termo obscuring information é importante para o setor público. 

A própria entidade entende que em lugar de ser uma restrição, a materialidade é um aspecto qualitativo. Mas de forma incoerente, manteve a materialidade como subitem de restrição. 

Ativo - os chamados elementos são essenciais para a contabilidade. A definição de ativo, para o setor público, seria de "um recurso controlado presentemente pela entidade, como um resultado de eventos passado". A definição proposta não inclui nenhum termo que possa lembrar "fluxo esperado". E assim como o Iasb, mantém os três elementos: recurso (recurso econômico no caso do Iasb), controle e eventos passados. Há outras pequenas diferenças, como o fato do Iasb usar "past events" - no plural - e o IPSAB usa o termo no singular. 

Passivo - o termo passivo agora enfatiza a transferência de recursos como resultado de eventos passados. As diferenças entre a definição do Iasb e do IPSASB são similares as listadas anteriormente, para o ativo. Diante da mudança da definição, há uma mudança no texto sobre os critérios relacionados com o termo. 

07 janeiro 2022

Continuidade no setor público


Esta parece ser uma discussão estranha: a continuidade (going-concern) no setor público. Afinal foge da nossa realidade uma situação onde um governo fica em descontinuidade. Mas em alguns países é possível que um município ou um estado atinja esta situação. Nos anos 70 e 80 algumas cidades do mundo desenvolvimento sofreram com suas finanças; a cidade de Nova Iorque esteve perto da "falência" neste período. 

Por este motivo, a questão da continuidade é algo que pode ser considerado dentro da questão contábil na área pública. Mesmo com a possibilidade de elevar tributos ou reduzir o pagamento das dívidas, o governo pode atingir uma situação de insolvência. Para evitar tais situações, testes de estresse pode ser realizados para verificar a possibilidade de algo ocorrer com o governo. 

Atualmente o GASB, a entidade que discute normas contábeis nos Estados Unidos, está com um projeto sobre o assunto. Trata-se de um desafio, pois o resultado de gestão financeira ruim pode implicar em desafios diferentes daqueles existentes na área privada. Mas que merece a atenção da contabilidade pública. 

Neste sentido, o princípio da continuidade é citado no excelente livro Contabilidade Pública, de Pacelli, com a seguinte observação:

Na visão deste autor, o princípio da continuidade permanece válida na medida em que qualquer decisão por descontinuar operações ou atividades é capaz de afetar a mensuração de ativos, podendo ocasionar uma perda de recuperabilidade. (grifo do autor, p. 1499)

Entendo que a continuidade não deve ser aplicada a uma operação ou atividade em particular, mas ao conjunto de operações de um ente público. 

Foto: Sikkema

30 junho 2021

Importância do bom exemplo

No ano passado, o México estava abalado por alegações de corrupção contra três ex-presidentes acusados de participar de esquemas de suborno multimilionários, financiamento ilegal de campanhas e outros crimes. 

O escândalo pode ter longo alcance consequências para a política mexicana, e a publicidade pode estar mudando as normas no resto da sociedade, de acordo com a artigo no American Economic Journal: Applied Economics. 

Autor Nicolás Ajzenman examinou o impacto da corrupção política local na honestidade dos estudantes do ensino médio no México. Usando uma técnica estatística chamada diferença nas diferenças, Ajzenman examinou a auditoria relatórios de municípios entre 2006 e 2013 e taxas de trapaça detectada por software em exames padronizados obrigatórios. 

A Figura 3 do artigo do autor mostra que a trapaça nos testes aumentou significativamente após revelações de corrupção por autoridades locais.


O ponto mais à esquerda representa os municípios do quartil inferior de gastos governamentais não autorizados (menos corruptos), e o ponto mais à direita representa aqueles no quartil superior (mais corrupto). As barras verticais são intervalos de confiança de 95%. 

Em níveis mais baixos de corrupção, há um efeito positivo, mas insignificante, nas taxas de trapaça nas escolas. Esse efeito aumenta à medida que a corrupção se torna mais saliente e é significativa no quartil mais alto da corrupção. 

 No geral, os alunos do ensino médio tinham 10% mais chances de trapacear nos testes padronizados após revelações de comportamento corrupto por parte das autoridades locais. O trabalho de Ajzenman é uma evidência de que os líderes políticos são exemplos para seus cidadãos e ajudam a moldar os padrões éticos das sociedades que governam.

Fonte: aqui

30 abril 2021

Novas minutas de normas para o Setor Público


O Conselho Federal de Contabilidade (CFC) colocou em audiência pública, a partir desta quarta-feira (28), cinco Normas Brasileiras de Contabilidade Aplicadas ao Setor Público (NBC TSP) convergidas às normas internacionais. Quatro delas abordam instrumentos financeiros e a outra tem como foco a substituição da norma de custos em vigor. 

Os comentários podem ser enviados até o dia 1° de agosto de 2021. 

 São elas: NBC TSP 30 – Instrumentos Financeiros: Apresentação, referente à IPSAS 28 – Financial Instruments; NBC TSP 31 – Instrumentos Financeiros: Reconhecimento e Mensuração, referente à IPSAS 41 – Financial Instruments; NBC TSP 32 – Instrumentos Financeiros: Reconhecimento e Mensuração (Contabilidade de Hedge) - Aplicação Residual, referente à IPSAS 29 – Financial Instruments: Recognition and Measurement; NBC TSP 33 – Instrumentos Financeiros: Divulgação, referente à IPSAS 30 – Financial Instruments: Disclosures; e a NBC TSP 34 - Custos no Setor Público. 

Para conhecer o texto das minutas na íntegra, clique aqui.

Destas normas, a TSP 34 está esperando muitos comentários, pois não é mera tradução das IPSAS.

19 novembro 2020

Ranking do Cálculo de Custos no Governo Federal

 No X Encontro de Gestão de Custos, a STN inovou e premiou as instituições que mais se destacaram na apuração de custos no governo federal. O resultado foi o seguinte:


(Figura da apresentação no encontro). Nas universidades, as premiadas trocaram seus contadores nos últimos anos. A minha universidade, que tinha um sistema de custos, referência na área e que propiciou diversos estudos e pesquisas, descontinuou seu sistema. Pena, pois demonstra uma visão estreita da gestão. 

01 setembro 2020

Nova Zelândia, Covid e Regime de Competência




 Ok, talvez seja forçar muito afirmar que o sucesso da Nova Zelândia deva-se ao regime de competência. É o que fez um artigo da Forbes (The Secret Behind New Zealand’s Victory Over Covid-19: Its Balance Sheet, Shivaram Rajgopal), mas esqueça o exagero e aproveite algumas informações uteis do artigo. 

Tenho certeza de que há muitos fatores epidemiológicos e sociais que explicam seu sucesso, mas quero me concentrar em um fator-chave que contribui: o mundo da Nova Zelândia superando a gestão das finanças públicas que criou um poder executivo e legislativo disciplinado e baseado em dados.

A Nova Zelândia é um dos 14 países no mundo que realmente publica um balanço em nível de país. É talvez o único país do mundo que depende totalmente do regime de competência, o padrão ouro do setor privado, onde as entidades precisam antecipar as saídas de caixa futuras por conta dos compromissos assumidos hoje, como pensões e seguridade social.

Como os países podem ter balanços? Bem, para que conste - os membros do G7, Alemanha, Itália e Japão, não[possuem]. Mas, considerando o exemplo da Nova Zelândia, ela opera de forma muito semelhante a uma empresa do setor privado, relatando ativos avaliados em NZ $ 390 bilhões (US $ 257 bilhões) e passivos de NZ $ 274 bilhões (US $ 181 bilhões).

Os maiores ativos nos livros da Nova Zelândia são propriedades, instalações e equipamentos, avaliados coletivamente em NZ $ 182 bilhões (US $ 120 bilhões) e compreendendo terrenos, edifícios, rodovias estaduais e ativos de geração de eletricidade. O número do passivo é dominado por NZ $ 149 bilhões (USD 98 bilhões) de empréstimos, incluindo dívida governamental com garantia soberana de NZ $ 106 bilhões (USD 70 bilhões).

O número mais interessante é a diferença entre os ativos e passivos da NZ ou patrimônio líquido. O patrimônio líquido da NZ caiu de NZ $ 143 bilhões (US $ 94 bilhões) em junho de 2019 para NZ $ 116 bilhões (US $ 77 bilhões) em maio de 2020 por conta dos programas de estímulo da Covid-19. No entanto, o patrimônio líquido de cada um de seus 4,88 milhões de cidadãos, também conhecido como riqueza do cidadão, ainda é de NZ $ 23.770 ou cerca de US $ 15.463.


16 julho 2020

Quem paga?

Uma pesquisa, cujo resumo foi publicado no Valor de hoje, mostra os principais litigiantes do Supremo:
Ao contrário do que destaca o título do jornal, o que mais chama a atenção é o grande número de processos da Confederação Nacional da Agricultura e do CREA-RS. Faz sentido estas duas entidades terem mais de 2 mil processos na mais alta corte do país?

Isto tem um custo e a pergunta "quem paga?" é pertinente. Provavelmente o contribuinte. Existem duas maneiras fáceis de reduzir este número de processos. A primeira é criar regulamentos que impeçam que os processos cheguem ao Supremo. Isto parece que está sendo feito aos poucos e o fato da pesquisa ser histórica não permite ver isto. A segunda razão é transferir os custos para os litigantes quando for possível. Se as partes pagarem estes custos (ou parte destes custos) isto poderia ajudar a reduzir o problema. Para isto, uma condição natural é a necessidade de um sistema oficial de apuração dos custos.

01 fevereiro 2019

Importância do Regime de Competência para o Setor Público

Quando Margaret Thatcher chegou ao poder na Grã-Bretanha, em 1979, uma das suas ações foi a venda de propriedades para o setor privado. Isto incluía terra, campos, parques escolares e outros. Estima-se que um total de 400 bilhões de libras, mas este número carrega muita incerteza em razão de existirem poucos dados sobre o que foi vendido, para quem e qual o preço.

A adoção do regime de competência no setor público ajudou e serviu como um ponto de virada:

The move to accrual accounting is pinpointed as a potential turning point: “Different accounting systems represent different ways of seeing: something visible under one system may not be visible under another, something accorded significant value under one system may be valued much less highly under another.” Accrual accounting makes it more likely that the value of public land will be recognised, and so bargain basement sell-offs less likely. For instance, many councils were valuing parks at £1 each. On the other hand, recognising their true worth – say £100m – makes them an even more tempting target for the Treasury to require to be sold.

Isto realmente é interessante. A contabilidade por competência, ao reconhecer como ativo um terreno, poderia então evitar que bens públicos fossem vendidos como pechincha.

Mas existe o outro lado da moeda: ao avaliar estes bens públicos, muitas vezes sem uma base consistente, isto poderia contribuir para que um bem público dispensável pudesse ser vendido. Haveria uma resistência na comparação entre o preço que seria obtido no mercado e o valor existente na contabilidade. Veja o caso da Eletrobras; estimamos que a empresa destruiu 562 bilhões de reais em valor. O ativo desta empresa é de 178 bilhões de reais. Mas este é o valor contábil dos ativos, não indicando que a empresa irá ou não gerar valor no futuro.

14 novembro 2018

Governança no Brasil

O gráfico abaixo mostra uma série histórica com indicadores de governança do Brasil, de 1996 a 2017. Estes índices foram reunidos pelo Banco Mundial, a partir de cálculos efetuados por outras entidades. A linha azul é o valor observado e as duas linhas laranjas correspondem aos limites de cada medida. Neste endereço aqui estão os gráficos interativos, por país, grupo de países, etc.

A análise é bastante difícil, já que não existe uma tendência clara em alguns índices. Exceto, talvez, o último, relacionado com o controle da corrupção, que apresenta um tendência de redução nos anos recentes. O que seria controverso.

Baseado nesses índices, a Fundação BBVA fez um relatório sobre o custo econômico da corrupção na Espanha. Mais sobre este assunto: aqui

10 agosto 2018

Por que a Contabilidade pública é diferente? Um adendo

No livro Teoria da Contabilidade, em co-autoria com Jorge Katsumi Niyama, apresentamos, no capítulo 10, o que leva a contabilidade pública ser diferente. Usando Ruppel (2004) como base, são listadas características do setor público que promovem esta distinção.

Recentemente, o Brasil traduziu e adaptou a estrutura conceitual do IFAC. Na estrutura conceitual do IFAC, na parte preliminar, apresenta-se algumas características selecionadas do setor público. Estas características possuem uma relação a listagem de Ruppel, mas não a esgota. A figura abaixo (clique para aumentar) é uma tentativa de relacionar estas duas fontes e faz parte da quarta edição do livro, em estágio de elaboração. A questão do usuários da contabilidade pública não é tratada explicitamente como características selecionadas por parte do IFAC, mas dentro do capítulo 2 da norma. Alguns itens destacados por Ruppel (2004) também não foram considerados nesta parte inicial, mas ao longo do documento.

O documento do IFAC chama atenção para um aspecto não contemplado anteriormente: a natureza dos programas e longevidade do setor público. Muitos programas do setor público são de longo prazo. Isto faz com que os efeitos financeiros sejam de longo prazo. Mais ainda, apesar das eventuais mudanças políticas que podem ocorrer em um governo, o mesmo possui um duração longa, podendo sobreviver a crises financeiras, catástrofes naturais, guerras e outros eventos. Isto faz com que a continuidade seja uma fundamentação importante na elaboração das demonstrações contábeis.

07 agosto 2018

Valor Pago por aluno adicional no Reuni

O programa Reuni foi um ambicioso plano de expansão do ensino superior nas universidades federais do Brasil. Muito dinheiro foi alocado pelo governo pensando na expansão das vagas, além do aumento no número de instituições. A análise deste programa já foi realizada, individualmente, em uma série de trabalhos acadêmicos. Uma análise geral era necessária e o seu resultado foi publicado agora na Revista da Controladoria-Geral da União. Usando os dados orçamentários e tendo como medida de atividade o número de matrículas, o artigo Valor Pago por Aluno Adicional nas Universidades Federais Brasileiras com o Programa Reuni procura verificar, por universidade e pelo conjunto das universidades, qual o peso para sociedade desta expansão.

Os dados corrigidos pela inflação mostram que cada aluno adicional que entrou em uma universidade federal representou um valor pago de 36,6 mil reais. O texto toma o cuidado de não indicar que este é o custo, pois está tratando de orçamento (financeiro). Entretanto, como uma universidade federal típica tem como maior custo o pagamento de funcionário (professor e administrativo), muito provavelmente o valor pago pode ser considerado uma proxy bastante razoável deste custo.

Como se trata de um artigo acadêmico, o juízo de valor é deixado de lado. Em algumas universidades, o valor adicional é bem superior a média encontrada; principalmente, nas instituições localizadas em grandes centros e com o foco na área de saúde. Mesmo tratando do valores médios, a quantia de 36,6 mil reais é muito elevada. Observe que muitas instituições poderiam aproveitar a economia de escala e de escopo, mas preferiram optar pela diversificação dos cursos ofertados. Em alguns casos, o foco foi na contratação de pessoal administrativo ou área meio; em outros, a expansão geográfica, que garante votos, mas muitas vezes significa investimentos com baixa rentabilidade social.

Neste primeiro retrato mais amplo do Reuni, o programa não resiste na análise econômica-financeira.

Observação adicional: Durante anos, a Universidade de Brasília procurou mensurar o custo por aluno, segundo as grandes áreas do conhecimento. Além de desenvolver um trabalho pioneiro, a equipe responsável pelo sistema foi dar sua contribuição na docência em diversas universidades do país: Beatriz Morgan, Fernanda Fernandes (co-autora do Curso Prático de Contabilidade), Francisca Souza, José Lúcio Tozetti, entre outros. Infelizmente, recentemente a UnB descontinuou o sistema de apuração de custos, mas a série histórica, de 2002 a 2015, ajuda a contar um pouco a história do custo do aluno. A decisão de descontinuidade, infelizmente, está muito mais associado a atender a certos interesses do que a decisão de mensuração efetiva de desempenho.

19 dezembro 2017

Medindo a eficiência do setor público

Um artigo mostrando como a avaliação de empresas pode ser usada para analisar a eficiência do setor público.

Esta pesquisa tem como propósito demonstrar como a ferramenta de avaliação de empresas, pelo método do fluxo de caixa descontado, pode ser utilizada com a finalidade de avaliar a qualidade dos gastos públicos realizados sob a forma de investimentos em empresas estatais. A pesquisa consistiu em um estudo de caso de uma empresa brasileira do setor de energia elétrica, a CEB Distribuição S.A., subsidiária integral de uma sociedade de economia mista. O valor da empresa foi calculado com base em premissas determinadas a partir da análise do desempenho histórico da entidade e projeções macroeconômicas obtidas de outras fontes. Ressalta-se que foram utilizadas somente informações disponíveis ao público. O valor obtido como resultado indica que a entidade analisada não está gerando o retorno financeiro desejável em vista dos recursos públicos nela investidos e permite inferir que o valor recuperável do investimento da controladora nessa empresa é menor do que o valor contábil reconhecido. Essa conclusão pode servir como guia de ação na área pública, pois demonstra a necessidade de melhoria da qualidade dos gastos públicos realizados na empresa analisada, situação que pode se estender a outras empresas estatais brasileiras. Desta forma, sugere-se que sejam realizadas pesquisas utilizando esta metodologia para analisar outras empresas estatais do país.

Leia o artigo aqui

AVALIAÇÃO DE EMPRESAS ESTATAIS E A EVIDENCIAÇÃO DA QUALIDADE DOS GASTOS PÚBLICOS: O caso da CEB Distribuição S.A. Amanda Guimarães Teixeira Silva Schmidt, César Augusto Tibúrcio Silva