Ontem o Valor apresentou uma reportagem interessante sobre como o uso de mídias sociais está influenciando o preço das ações. Hoje, uma entrevista com um responsável pela regulação. Iniciamos com o efeito das mídias no preço. Eis alguns trechos:
No dia 21 de julho, as ações da Via Varejo desbancaram Vale e Petrobras na posição de papéis mais negociados na bolsa. Foram R$ 3,6 bilhões, o maior giro da história do papel em termos ajustados. Não por acaso, esse forte giro coincidiu com o período em que a varejista atingiu o pico de menções no Twitter, rede social que ficou conhecida por ser o novo ponto de encontro de entusiastas do mercado financeiro.
Esse movimento ilustra algo que tem chamado a atenção de investidores, analistas e até de órgãos reguladores: a influência das redes sociais no desempenho das ações. Com a queda dos juros e a natural migração dos investidores para a bolsa, discutir teses de investimento tornou-se algo muito mais comum e frequente, e de certa forma necessário. Ocorre que a influência desses debates no comportamento das ações vem ganhando força, o que pode ser uma fonte de preocupação dado o aumento da participação da pessoa física, investidor ainda com pouca experiência.
As ações de Via Varejo, ao lado de Cogna, viraram febre nas últimas semanas nas redes sociais. De acordo com um levantamento da consultoria Bites, especializada em análises de dados de internet, as buscas pelos termos “VVAR3” e “COGN3” - código das ações de Via Varejo e Cogna, respectivamente - no Google Brasil atingiram o pico no fim de julho, justamente o mês em que estes papéis estiveram entre as maiores valorizações do Ibovespa. No período, Via Varejo avançou 27,69% e Cogna teve ganhos de 26,28%. (...)
Em outubro passado, por exemplo, a Via Varejo foi mencionada 916 vezes no Twitter, num período em que o giro médio diário do papel foi de R$ 157,7 milhões. Dois meses depois, esse número já estava em 3.748, com volume médio diário de negócios de R$ 523,6 milhões. Desde maio, a ação da Via Varejo gira mais do que R$ 1,3 bilhão, figurando assim entre os ativos mais negociados de todo o mercado à vista, ao lado de blue chips como Petrobras e Vale. Entre maio e julho, as menções da Via Varejo no Twitter seguiram o mesmo ritmo ascendente, passando de 3.346 para 6.195. De outubro passado até o fim de julho deste ano, os papéis sobem 150,2%.
Se for considerado todo o universo da rede social, esse número de menções é pequeno. Mas é bastante relevante se considerada apenas a comunidade apelidada de Fintwit, que reúne os entusiastas do mercado financeiro. (...)
O problema é que a rede social pode ser usada para manipulação e incentiva a criação de bolhas em determinados títulos. Veja:
Para ele [Enrico Cozzolino, analisa de investimento], o movimento atual ainda não caracteriza uma distorção, mas acende um alerta para a alta indiscriminada de um ativo sem a presença de fundamentos. Em dias de alta forte de um papel, por exemplo, é bastante comum que os usuários da rede publiquem mensagens apostando que o valor da ação irá dobrar em determinado período de tempo, com as comemorações tomando conta das rede e até a formação de grupos de torcida para as empresa. A Via Varejo, por exemplo, é carinhosamente chamada de “Varonga” por aqueles que declaram sua preferência e acreditam em um forte potencial de alta do ativo. (...)
O gestor [um daqueles profissionais que o Valor gosta de citar, "que prefere não ser identificado"] também chama a atenção para o fato de que não há uma diretriz clara sobre esse tipo de comportamento em redes sociais, especialmente para especialistas de mercado. “Em algum momento teremos de discutir se gestor pode ficar postando coisas no Twitter no horário do pregão, se esse perfil é verificado, se essa pessoa presta algum tipo de esclarecimento. Tem gestor que se assume comprado no papel [quando acredita que determina ação irá subir] e depois fica recomendando a empresa no Twitter. O nome disso é manipulação, porque ele ganha em cima dessa valorização”, argumenta.