VALDO CRUZ DE BRASÍLIA
Folha de S. Paulo, 19/05/2014
No início de seu mandato, em 2011, Dilma Rousseff fez uma cobrança dura à equipe: na sua opinião, eles não estavam fazendo nada para segurar o aumento, considerado por ela "exagerado", das passagens aéreas.
Ao ouvir de assessores que os preços do setor são livres, a presidente, irritada, gritou: "Isso é coisa de tucano". Foi então lembrada que a última normatização sobre a área havia sido feita em 2006 –no governo Lula, portanto.
O episódio ilustra bem o que passa na cabeça da presidente quando o assunto é o sistema de preços. Dilma tem uma visão ideológica do mercado, o que desperta nela uma tendência intervencionista, de conter preços administrados como gasolina.
A avaliação é partilhada por assessores presidenciais e por conselheiros do ex-presidente Lula. O primeiro grupo enxerga no estilo presidencial uma virtude, na linha de quem busca segurar o apetite de lucro dos empresários e proteger o consumidor.
O segundo grupo considera a estratégia uma política equivocada, que provoca distorções e trará custos pesados para ser desmontada. O debate sobre preços administrados gerou polêmica na semana passada depois que o ministro Aloizio Mercadante (Casa Civil) admitiu à Folha que o governo dosa os reajustes de preços públicos para não prejudicar o consumidor e garantir o cumprimento da meta de inflação.
Sua fala foi criticada pela oposição e acabou sendo contestada por Guido Mantega (Fazenda), que não quis admitir o que o governo tem feito nos últimos anos ao conter o aumento da gasolina e empurrar para 2015 o das tarifas de energia elétrica.
Criticado, o discurso de Mercadante reflete o que vem sendo debatido pela cúpula da campanha da reeleição. Em reuniões no Alvorada, Dilma e sua equipe buscam uma vacina contra a tática da oposição de acusar o governo de segurar artificialmente o aumento de preços e jogar a conta para 2015.
A estratégia, definida nas reuniões no Alvorada, vai na linha da fala de Mercadante, que participa dos encontros. O governo e a candidata vão sustentar que o governo adota esta política para poupar o bolso do consumidor em períodos desfavoráveis da economia e não fazer um tarifaço no ano que vem, diluindo os aumentos ao longo dos próximos anos.
DESCONFIANÇA
Segundo interlocutores, Dilma tem uma "desconfiança do empresariado" e acredita que o governo tem de enfrentá-lo para evitar "lucros excessivos". Foi isso, diz um assessor, que fez o governo fixar uma taxa de retorno muito baixa para as concessões de rodovias -depois foi obrigado a recuar para garantir a realização dos leilões.
Como, no final, as taxas ficaram próximas do que o governo defendia, Dilma disse que sua visão de apertar o lucro estava na linha correta.
No caso da gasolina, ela é contra repassar para o preço toda a variação cambial, como quer a Petrobras. Para Dilma, o consumidor não pode pagar tudo e a estatal tem de absorver parte do custo. Além disso, ela adotou essa política para conter artificialmente a inflação e evitar que estoure o teto de 6,5%.