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30 novembro 2023

História da Riqueza do Brasil e a Contabilidade

É possível encontrar em algumas obras alguma notícia sobre a história da contabilidade no Brasil a partir do início da colonização do país por parte dos portugueses. Se de um lado isto significa deixar de lado contagem de patrimônio rudimentar dos povos que viviam no Brasil, por outro lado valoriza demais um período de marasmo no país. É sempre bom lembrar que em Portugal não tinha adotado as partidas dobradas, algo que só ocorreu em meados dos anos de 1700. O país prefere excluir o progresso e ignora a principal inovação ocorrida na Europa e já de conhecimento de comerciantes desde 1300. 

Ao tentar buscar tirar a diferença entre a economia de Portugal e outros países da Europa, o Marquês de Pombal cria uma escola de negócios e com ela a necessidade de ensinar as partidas dobradas. Isso 450 anos depois do aparecimento das partidas dobradas. E é importante notar que o Brasil, apesar de ser a principal fonte de receita do reino, não tinha imprensa e nem universidade, ao contrário da América Espanhola. Ou seja, estamos no atraso total.

Sobre o fato do Brasil ser a fonte de riqueza de Portugal, veja o que diz Caldeira, Historia da Riqueza, p. 103:

No final do século XVII, o Brasil fornecia cerca de 60% da receita tributária de Portugal, enquanto as demais partes do império ultramarino (possessões africanas, com destaque para Angola, onde traficantes brasileiros pagavam impostos, além de uns poucos domínios asiáticos restantes) forneciam 20%. No total, 80% das receitas tributárias do império vinham das possessões e apenas 20% dos moradores metropolitanos. Naquilo que se refere às despesas, 75% delas eram realizadas no Reino e 25% no ultramar. 

Outro dado interessante, do mesmo livro (p. 159)

Entre 1796 e 1807, as exportações brasileiras corresponderam a nada menos que 83,7% do total de todas as exportações coloniais para a metrópole. 

Uma das condições necessárias para a adoção das partidas dobradas era a existência de pessoas alfabetizadas. O Brasil não tinha nenhuma tipografia autorizada - era na verdada proibido ter máquinas de impressão inventada por Gutemberg trezentos anos antes, e eram negados todos os pedidos de criação de faculdades no país. Livros, só impressos em Lisboa, com autorização dos censores. Apesar do crescimento econômico do país entre a descoberta e os anos de 1800,  o que incluía um grande mercado interno, o atraso da metrópole teve influencia sobre o nosso país. 

Parte da diferença é reduzida com a chegada de Dom João ao país. Ele trouxe a escola de negócios, chamada de Academia de Comércio, a imprensa, agora permitida, e profissionais contábeis. Com isso, podemos dizer que pela primeira vez o país tem uma contabilidade por partidas dobradas, mas talvez restrita a alguns poucos negócios, mas não ao governo. É preciso uma maior investigação aqui para saber o real grau de desenvolvimento da contabilidade da época. 

Entre o governo de Dom João e de Dom Pedro I, a bagunça das finanças públicas brasileiras, decorrente da má gestão dos dois reis citados, impede um maior progresso dos negócios. O acordo que Pedro fez para acertar a independência do país incluía um empréstimo secreto, usado pelo próprio Pedro, para investir nos seus interesses políticos em Portugal. Pagamos caro para ficar livre dos portugueses e muito mais ainda para livrar de Pedro I. O imperador brasileiro fez um empréstimo de 3 milhões de libras esterlinas da época, que correspondia a dois terços das exportações do país ou 10% da economia, sendo que 600 mil ficou no Banco do Brasil e o restante foi usado no exército e missões diplomáticas na Europa. 

A regência trouxe a primeira eleição do país, mas eram necessários acertos na estrutura que não foi obtido nem com os regentes, nem com o sucessor Pedro II. Merece destaque aqui o governo de Feijó, o primeiro governante eleito do nosso país. Feijó tinha boas qualidades e uma delas era o respeito ao legislativo, algo que não aconteceu com Pedro I e nem com Pedro II. Outra qualidade de Feijó foi sua gestão fiscal. Ele reduziu substancialmente o exército, dispensando 30 mil soldades, o que representava uma redução de gasto de 36% neste item. Cortou a emissão de moeda e vários gastos. Ele conseguiu a aprovação do código criminal e do código de processo, um avanço na justiça brasileira. Sua herança foi o equilíbrio das finanças públicas.  


Apesar do Código Comercial, de leis decorrentes e alguns avanços nos negócios, o período do Império representou um tempo que deveríamos esquecer. Veja o caso da Lei 2711. Segundo Caldeira: 

introduzia restrições para a formação de empresas - restrições tão severas que acabou sendo conhecida como "Lei dos Entraves"

De certa forma, este blog já dedicou bastante espaço para esse período, que teve a primeira obra publicada de contabilidade, a primeira associação de profissionais e normas bancárias. Mas a economia realmente não avançou, teve a invasão do Paraguai e a falência do Banco Souto. 

Minha leitura atual, História da Riqueza, de Jorge Caldeira, e anterior, Adeus Senhor Portugal, revelam esse pano de fundo. Minha lembrança da história da contabilidade é tradicional, ensinada na escola. Minhas descobertas recentes mostram que o país merecia um destino melhor do que o julgo português. E que a vida o Império foi, antes de tudo, um atraso na vida econômica do Brasil. A derrubada de Pedro I, pelo legislativo, e de Pedro II, pelos militares, demorou demais. 

No período do segundo império ocorreu um aumento na alfabetização da população, de 2% para 17%. Isso era pouco no comparativo com o mundo moderno, onde vários países já estavam próximos de alcançar a alfabetização da população adulta. A população saiu de 4,4 milhões de habitantes em 1819 para 14,3 milhões em 1890. A renda per capita saiu de 670 dólares, em 1820, para ridículos 704 dólares, em 1890. Compare isso com os Estados Unidos, que saiu de 1300, em 1820, para 4 mil, em 1900. Foi o século perdido:

o século XIX como um todo e o período imperial em particular, foi um período de estagnação da economia brasileira e, por outro lado, de aceleração da economia mundial. Foi, portanto, um período de acentuado atraso para o país na comparação com o mundo (Caldeira, p. 297)