[...] Em entrevista à Livraria da Folha, por telefone, Dad [Squarisi] frisou que a escola não ensina, e os professores repassam a meia lição e não a lição completa sobre a gramática da língua portuguesa para os estudantes. Daí, a perpetuação da calosidade em nossa escrita.
A especialista disse que boa parte dos alunos não sabe gramática. Ela atribui o deslocamento incorreto da pontuação a um problema de análise sintática. "A vírgula não é saber pausa, não é onde você respira e põe a vírgula. A vírgula é problema de análise sintática".
Dad afirmou que os pleonasmos sofisticados estão invadindo os textos e se tornando frequentes, como "manter a mesma", "continuar ainda", "além de e também". "Se é 'manter' só pode ser 'a mesma', 'ainda' é dispensável, 'além de e também' juntos indicam adição", exemplifica.
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Livraria da Folha - Quais vícios mais lhe incomodam nos textos jornalísticos?Dad - Se você me perguntar como é que jornalista escreve, eu lhe digo que
jornalista escreve com pressa. O problema do jornalista é a pressão, escreve muito rápido e sob pressão. Às vezes, não tem tempo de revisar o texto, e ele vai para a edição sem revisões. [O jornalista] Tropeça em vírgulas e em concordâncias por causa da rapidez, comete erros por falta de traquejo. Tem também as ambiguidades, que a gente vê com muita frequência. O jornalista lê e não percebe que a frase está ambígua, mas o leitor ou ouvinte lê ou ouve e vê imediatamente que a frase está ambígua. Há vícios recorrentes de pleonasmos, mas de pleonasmos sofisticados.
Por exemplo, "manter a mesma", "continuar ainda", "além de e também". Se é "manter" só pode ser "a mesma", "ainda" é dispensável, "além de e também" juntos indicam adição. Esses pleonasmos são muito frequentes. Um tropeço muito grande que a gente percebe é o futuro do subjuntivo, um calo muito grande no pé. A vírgula é um calo no pé de todo mundo.
Livraria da Folha - E os tipos de "porque"?Dad - Erra-se muito nos tipos de "porque", nos "ques" (com e sem acento) e na crase. Alguns são decorrentes de descuido e outros de uma base que não foi tão boa, um primário que não foi tão bem feito. A gente é muito da cultura oral. Nós escutamos muito dito desse jeito e acabamos repetindo o que foi dito.
Livraria da Folha - Isso se deve à falta de leitura também?Dad - Sim. A grafia e as estruturas se fixam pela leitura.
Livraria da Folha - Casos como "mais grande" e "mais pequeno" parecem ser usados de forma incorreta quando podem ser utilizados. Qual outra ocorrência gramatical habita o imaginário popular como errada e é apropriada?Dad - O "mais bem" e o "mais mal". Eu digo "o candidato mais bem classificado" e não "melhor classificado", porque antes de particípio eu uso o "mais bem". Eu uso "mais bom" e "mais mal", "mais grande" e "mais pequeno" nas comparações. Os professores, na ânsia de ensinar os alunos a empregar "melhor" e "pior", dizem que está errado, e, na verdade, ensinam meia lição e não a lição completa.
Livraria da Folha - Então escreve-se baseado em uma meia gramática?Dad - Boa parte dos alunos não sabe gramática. Por que existe tanto problema na vírgula?
Porque a vírgula não é saber pausa, não é onde você respira e põe a vírgula. A vírgula é sintática, é problema de análise sintática. Se ela [pessoa] não sabe análise sintática, não sabe usar a vírgula. A escola não ensina, e os jovens vão arrastando a dificuldade.
Livraria da Folha - Isso piora na rede com o chamado "internetês"?Dad - Depende de que internet você fala. Se for a internet que eu leio os jornais, é uma linguagem bem cuidada. O jornal que está na internet tem a mesma qualidade do jornal impresso. A internet é um universo muito grande. Tem que ser adequado. Na sala de bate-papo, a língua tem que dar a impressão de que está sendo falada, tem que abreviar, tem que inventar grafias diferentes para ser rápido, para ser entendido. Se eu não fizer isso, eu sou excluída. Tenho conversado com professores de universidades para saber se há uma interferência do "internetês" nos textos escritos, e a resposta de 99% é não. Nós falamos várias línguas, nós escrevemos várias línguas.
Livraria da Folha - Em quais autores vocês perceberam desvios ou ruídos no uso da língua?Dad - Nossa procura não foi pelos maus textos, que há de montão, mas pelos bons textos. Tivemos a preocupação de selecionar
quem tem bom texto para expor como modelo, como Roberto Pompeu de Toledo e Diogo Mainardi, que você pode concordar ou não com o que ele diz, mas ele tem um texto muito moderno. O texto não nasce de uma sentada. Ele exige muito trabalho para fazer, refazer, tornar a fazer, substituir palavras e estruturas.