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24 agosto 2022

Bancos brasileiros e a questão ambiental


Do Estadão (Via aqui

Os bancos brasileiros vão entrar em dezembro numa nova era sobre como medir os impactos das mudanças climáticas para seus negócios. O Banco Central (BC) começará a cobrar a inclusão de riscos climáticos no gerenciamento de risco e capital, além de uma política de responsabilidade social, ambiental e climática e de um relatório anual com informações padronizadas sobre o tema.

Na América Latina, o Brasil está na vanguarda desse processo, que começou a ser tateado pelas principais economias do globo. Em outubro, o BC deve apresentar no Relatório de Estabilidade Financeira (REF) algumas referências para as instituições seguirem na elaboração de suas estimativas.No documento, devem vir, por exemplo, detalhes sobre como as instituições terão de calcular reflexos de uma seca extrema sobre seus serviços e ativos, além de um estudo sobre riscos de transição.

Como se trata de um aprendizado para todos, o BC promete não ser tão exigente no início desses trabalhos. Já avisou que não necessariamente os bancos devem seguir esse modelo, embora vá monitorar os preparativos para cumprir as novas normas em sua agenda de supervisão para o semestre.

"Em geral, visões agregadas apresentam simplificações, pois é necessário adequar o estudo à disponibilidade de dados e informações de diferentes tipos de instituição. Se o risco for relevante para uma dada instituição, essa deve desenvolver uma técnica mais aprimorada para avaliar o risco", ressaltou o órgão.

Antecipando-se às regras

Sem um padrão definido pelo BC sobre como contabilizar em seus balanços os riscos climáticos, as instituições financeiras no Brasil buscam apoio de especialistas para seguir as novas regras do regulador, que devem ser conhecidas em dois meses. Consultorias têm sido procuradas para tirar dúvidas sobre o tema, e a tendência é de que todos "entreguem a prova", mas algumas casas devem se aprofundar mais no tema e ser mais agressivas do que outras.

"As maiores acabam ficando na vanguarda, pois índices e investidores externos geram pressão. Não está todo mundo na mesma página. Mas a regulação trouxe a urgência do tema, não é mais uma questão voluntária", disse a coordenadora para América Latina e Caribe da iniciativa para o setor financeiro do programa das Nações Unidas (ONU), Maria Eugenia Sosa Taborda.

O BC destaca que não há metodologia ou técnica de elaboração prescrita para os testes de estresse, a partir das estabelecidas pela regulação: análise de sensibilidade; análise de cenários; e teste de estresse reverso. "A escolha de qual metodologia e da complexidade da técnica aplicada deve ser adequada ao risco incorrido em cada instituição", argumenta o BC, reforçando que vem se posicionado sobre o tema no Relatório de Estabilidade Financeira (REF).

No mercado, o diretor de Sustentabilidade da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), Amaury Oliva, afirmou que, apesar de o BC não ter definido metodologia ou cenários específicos para os testes de estresse, criou requisitos importantes, como a análise temporal, geográfica, setorial e o alinhamento a aspectos já considerados no gerenciamento de risco.

"Temos um diálogo respeitoso e construtivo com o BC, que tem expectativa de agenda evolutiva. Não é para ter punição, é para avançar como setor bancário."

Segundo Oliva, a Febraban já desenvolveu, com a Coppe/UFRJ e a empresa WayCarbon, cenários climáticos "tropicalizados" para setores-chave da economia brasileira, que podem ser subsídios para análises e testes de estresse dos bancos. Segundo relatório de 2021, com base em dados do BC e em um estudo desenvolvido pela Febraban, a exposição da carteira de crédito para empresas ao risco ambiental era de 43,60% no fim de 2020.

Já a exposição moderada ou alta às mudanças climáticas era de 53,29%.Além disso, a federação criou um grupo específico para implementar as novas regras do BC, com encontros mensais para tirar dúvidas e orientar sobre bases de dados e procedimentos. Conforme Oliva, os associados, que já seguem uma autorregulação sobre o tema desde 2014, estão trabalhando "sem parar" para estar de acordo com as novas regras em dezembro. "Colocamos a régua lá em cima, queremos que os bancos alinhem seus portfólios ao Acordo de Paris, ajudando os clientes nessa transição", diz Sosa Taborda.

Estabelecer padrão para o setor bancário é um dos desafios

Como não há um padrão internacional até o momento e muitos acreditam que dificilmente será feito um, algumas instituições financeiras passaram a criar seus próprios requisitos básicos para avançar em serviços e transparência em relação às mudanças climáticas.O que o mundo todo se pergunta é: como ajustar um só padrão para todos os tipos de itens e negociações que faça sentido para um mercado específico e, ao mesmo tempo, sirva de referência para operações com outros agentes e países?

Da mesma forma que não se pretende engessar demasiadamente um mercado que está apenas engatinhando, temem-se os riscos que possam vir dele, principalmente o chamado greenwashing, que é a prática de classificar ativos como verdes quando, na realidade, não são.Para se ter uma ideia, as três maiores agências de classificação de risco do mundo também criaram suas próprias referências. Apesar de ser do mesmo setor e buscar o mesmo objetivo de medir a saúde financeira de um papel, empresa ou governo, têm réguas distintas para as variáveis relacionadas às questões climáticas.

Veja que já apareceram os consultores para "ajudar". 

18 outubro 2020

Frase


É por isso que costumo dizer que o negócio dos bancos centrais é como a pornografia: em essência, é apenas entretenimento e não tem nenhum efeito real.

(Eugene Fama, aqui, via Marginal Revolution)

10 junho 2017

Fato da Semana: Fortalecimento dos reguladores

Fato: Fortalecimento dos reguladores

Data: 8 junho

Contextualização
Os problemas políticos fizeram caminhar uma proposta de fortalecimento de dois órgãos reguladores brasileiros: CVM e Banco Central. Uma proposta de medida provisória estava parada na presidência da república. Aparentemente, diante das revelações da relação entre o atual presidente e o executivo da JBS, o governo decidiu aprovar a medida.

Com isto, CVM e Banco Central poderão fazer acordos de leniência e ampliaram o valor de uma possível multa a ser aplicada para a entidade que cometer infrações.

Relevância
A medida provisória tem o mérito de facilitar o trabalho dos reguladores e agilizar o processo de punição. É mais um instrumento para melhorar a qualidade da fiscalização e regulamentação da CVM e do Banco Central.

Notícia boa para contabilidade?
Sim. Como entidades de controle de caráter mais técnico, a CVM e o Banco Central passam a contar com melhores mecanismos para regular o mercado.

Desdobramentos
A medida não deve ser aplicada à JBS, já que seus problemas são anteriores à sua edição. Mas significa que estes reguladores terão mais força numa negociação.

Mas a semana só teve isto?
A compra do Popular pelo Santander por um euro, a troca do auditor da BT, a multa da Braskem e mais punições para JBS - agora com o corte na linha de financiamento do governo na Caixa - foram notícias importantes da semana.

(Fonte da Figura, aqui)

08 junho 2017

Mais punição

Ontem divulgamos uma investigação da Reuters onde a Caixa Econômica Federal estaria "punindo" a JBS pela divulgação de acusações contra o presidente da República.

Hoje o Valor divulgou que o governo ampliou os poderes punitivos da CVM e do Banco Central. Através de uma medida provisória, o governo  multiplicou as multas das duas entidades. Na CVM, a multa máxima passou de 500 mil para 500 milhões; no Banco Central, de 250 mil para 2 bilhões. A medida estava parada na presidência da república desde 2015, segundo o jornal.

No texto da capa do jornal tem-se que a JBS afirma ser vítima de represálias pelas delações.

15 março 2016

Desapareceram 81 milhões de dólares do Banco Central de Bangladesh

Atiur Rahman (foto) renunciou ao cargo que ocupava no Banco Central de Bangladesh, informou o El País. A razão foi um estranho saque ocorrido na conta do banco existe no Federal Reserve de Nova Iorque. No início de fevereiro, um grupo de hackers infiltrou no sistema do Banco Central e transferiu dinheiro para vários casinos da Filipinas.

O roubo foi descoberto somente dias depois por um jornal. O Federal Reserve e a empresa de mensagens financeiras Swift informaram que não ocorreu nenhum problema nos seus sistemas e que as transferências foram feitas com base nos procedimentos habituais.

A perda só não foi maior em razão de um erro de digitação de uma das ordens transferência, que interrompeu a transação. Do total que sumiu da conta do Banco Central, 30 milhões de dólares foram entregues em dinheiro vivo em Manila, Filipinas.

Além disto, o banco central não informou o governo do ocorrido, que soube pela imprensa.

P.S. Segundo o Estadão, os hackers escreveram errado a palavra "foundation" (digitaram "fandation").

29 setembro 2015

Metas de Inflação não ancoram as expectativas das firmas

Resumo:

We study the (lack of) anchoring of inflation expectations in New Zealand using a new survey of firms. Managers of these firms display little anchoring of inflation expectations, despite twenty-five years of inflation targeting by the Reserve Bank of New Zealand, a fact which we document along a number of dimensions. Managers are unaware of the identities of central bankers as well as central banks’ objectives, and are generally poorly informed about recent inflation dynamics. Their forecasts of future inflation reflect high levels of uncertainty and are extremely dispersed as well as volatile at both short and long-run horizons. Similar results can be found in the U.S. using currently available surveys.

Fonte:Inflation Targeting Does Not Anchor Inflation Expectations: Evidence from Firms in New Zealand- Saten Kumar of Auckland University of Technology; Hassan Afrouzi and Olivier Coibion of University of Texas at Austin; and Yuriy Gorodnichenko of University of California at Berkeley.

“Indeed, expectations matter so much that a central bank may be able to help make policy more effective by working to shape those expectations. … the effects of monetary policy on the economy today depend importantly not only on current policy actions, but also on the public's expectations of how policy will evolve.” Ben Bernanke



Trecho do paper:

After twenty-five years of largely successful inflation targeting in New Zealand, the inflation expectations of households and firms there do not appear particularly well anchored.

Managers of firms there disagree dramatically about recent and future inflation levels, even at long horizons, and many are poorly informed about the RBNZ's inflation target.

Most managers appear to rely to a large extent on their personal shopping experience to make inferences about aggregate inflation, and are particularly sensitive to gasoline prices, much as is the case with households in the U.S. Indeed, along most metrics, the expectations of managers are much more similar to those of households than those of professional forecasters.

Since neither group appears to be well-informed about monetary policy overall, this suggests that central banks' communications strategy changes of the last twenty years have not had the desired effects on this segment of the population, even if they may have been more effective with professionals or financial market participants.


As pessoas nos EUA pesquisam no Google mais sobre cachorros do que variáveis macroeconômicas.

22 setembro 2015

Monitoração dos possíveis impactos da Operação Lava Jato

Um blog fantástico é o “Análise Real”.

Abaixo segue um vídeo postado por eles para ajuda a entender como o Banco Central mapeia exposições e riscos de contágio da Operação Lava Jato:


21 dezembro 2014

Os dois lados da moeda

Os dois lados da moeda
Por Alex Ribeiro | De Brasília
Valor Econômico, 19/12/2014

O primeiro presidente do Banco Central, Denio Nogueira, mantinha-se entrincheirado no cargo naquele começo de 1967. O novo presidente linha-dura do regime militar, Arthur da Costa e Silva, queria substituí-lo por alguém mais maleável no trato da inflação, na esperança de alavancar o crescimento da economia. Mas havia um obstáculo: a lei que criara o BC apenas dois anos antes garantia independência formal à instituição e mandatos fixos a seus dirigentes.

"Não vamos pedir demissão", avisou à equipe do BC, segundo relato de um de seus diretores, Casimiro Ribeiro, em entrevista concedida 22 anos depois ao programa de história oral da Fundação Getúlio Vargas, conhecido pela sigla CPDOC/FGV. Mas Costa e Silva insistiu. Enviou mensagem ao Senado nomeando um novo presidente do BC - o economista Ruy Leme, indicado pelo poderoso ministro da Fazenda, Delfim Netto.

Os parlamentares recusaram a mensagem, alegando que os cargos não estavam vagos. A pressão aumentou a tal ponto que, em 22 de março, Nogueira jogou a toalha e enviou a Costa e Silva as cartas de renúncia de todos. Foram vencidos pelo receio do fim da independência legal do BC ou mesmo de sua extinção. "Levamos nossa resistência até um certo ponto", explicou Ribeiro ao CPDOC/FGV. "Aí, você pode até prejudicar o BC."

Hoje, às vésperas dos 50 anos da lei 4.595, de 31 de dezembro de 1964 - a chamada Lei da Reforma Bancária, que incluiu a criação do BC, instalado três meses depois - a independência legal ainda é o avanço institucional que falta para criar um BC à altura de seus pares de economias desenvolvidas, com plenos poderes para cumprir a missão de garantir a estabilidade da moeda. A recente campanha eleitoral mostrou que o país não está pronto para tanto. A propaganda da reeleição da presidente Dilma Rousseff veiculou anúncios que sugeriam que dar autonomia legal ao BC é entregá-lo a banqueiros que gostam de juros altos e tiram a comida da mesa dos trabalhadores. O candidado a vice-presidente de Aécio Neves, Aloysio Nunes Ferreira (PSDB), posicionou-se contra a ideia. Só Marina Silva agregou a proposta ao seu programa de governo.

Nada disso muda o fato de que, nesses 50 anos de história, o BC teve progressos extraordinários, depois de ser criado tardiamente, muito depois dos bancos centrais de países vizinhos da América Latina, como uma instituição fraca e submissa a interesses variados, como os de ruralistas, funcionários do Banco do Brasil, industriais e governantes, que tinham suas demandas atendidas com gastos orçamentários associados à impressão de dinheiro. "No fundo, mais do que uma lei, o que cria uma instituição forte e autônoma para cumprir suas funções é a tradição criada no dia a dia", afirma o ex-presidente do BC Armínio Fraga.

O economista Octavio Gouvêa de Bulhões é o pai do BC, que nasceu em dois atos. Em 1945, ele aproveitou o fim do Estado Novo, de Getúlio Vargas, e articulou a edição de um decreto-lei que criaria a Superintendência da Moeda e do Crédito (Sumoc), o embrião do BC.

O BC que conhecemos hoje foi aprovado pouco após o golpe militar de 1964. "Um tanto ironicamente, foram precisos dois regimes não democráticos para criar o BC. É triste. Mas é preciso dizer que nos dois casos o dr. Bulhões estava lá", comentou Ribeiro.

Bulhões, nascido no começo do século passado, foi o típico servidor público. Entrou no governo com 20 e poucos anos, para integrar o grupo que criou o Imposto de Renda no Brasil e, décadas depois, chegou a ministro da Fazenda - interino, por menos de dois meses, após a renúncia de Eugênio Gudin, até a posse de José Maria Whitaker; e, com mandato próprio no governo Castello Branco. Ajudou a formar uma geração de economistas e foi muito influente na definição da política econômica no Brasil durante muito tempo. Depois de deixar o governo, recorreu à ajuda de amigos para custear uma cirurgia nos Estados Unidos.

"O Brasil precisava ter uma moeda estável", disse Bulhões sobre a criação da Sumoc, em outro depoimento ao CPDOC/FGV, em 1990. "E, para ter uma moeda estável, precisava ter pelo menos um início de banco central." Na época, ele era um dos economistas mais preocupados com a estabilidade fiscal e monetária, nisso identificado com Eugênio Gudin, referência do pensamento econômico liberal no Brasil. "Bulhões era um pragmático, que não se prendia a ideologias", definiu, em entrevista ao Valor, o professor Antonio Dias Leite, que lecionou ao lado do futuro ministro na antiga Faculdade de Ciências Econômicas e Administrativas do Rio de Janeiro.

O pragmatismo fez com que Bulhões optasse por criar a Sumoc, e não um banco central clássico. "O professor Gudin achava, na época, inoportuno criar um banco central, mas que poderia fazer algo no caminho de sua criação", relatou Bulhões, na entrevista ao CPDOC/FGV. "Ele achava que, com um déficit do Tesouro grande e sem perspectivas de equilíbrio orçamentário, um BC seria inútil."

A Sumoc era uma instituição enxuta, com poucos funcionários, que tinha o objetivo de controlar a emissão de moeda e preparar o terreno para criar o BC. Havia um colegiado - o conselho - que realmente tomava as decisões. Acabou sendo dominado pelo Banco do Brasil.

Esse não foi o primeiro esforço para criar um banco central no Brasil. O economista José Júlio Senna conta em seu livro "Política Monetária: Ideias, Experiências e Evolução" que, em 1808, quando a família real portuguesa veio de Lisboa para o Rio de Janeiro, para fugir das tropas de Napoleão Bonaparte, o príncipe regente, d. João, fundou o primeiro Banco do Brasil com funções de banco central e banco comercial. Entre elas, estava manter reservas em ouro e outros metais valiosos para lastrear as emissões de dinheiro. "Quando voltou para Portugal, d. João raspou os cofres do Banco do Brasil", disse Senna em entrevista para esta reportagem. Assim, o primeiro BC do país faliu.

A onda de criação de bancos centrais na América Latina ocorreu entre as décadas de 1920 e 1930 por recomendação dos chamados "money doctors", ou terapeutas financeiros, assim chamados economistas de países ricos que visitavam a região para prescrever remédios financeiros em nome dos grandes bancos de Londres e Nova York, trabalho bem parecido com o feito hoje em dia pelo Fundo Monetário Internacional (FMI). Na década de 1920, o americano Edwin Kemmerer visitou vários países da América do Sul, como Colômbia, Chile, Equador e Bolívia, e inspirou a criação de vários bancos centrais. Em 1931, logo no inicio do Estado Novo, quando uma revolução com a participação de tenentes levou Getúlio Vargas ao poder, chegou ao Brasil uma missão chefiada por um diretor do Banco da Inglaterra, Sir Otto Niemeyer. Seus conselhos tinham sido decisivos para criar bancos centrais na Nova Zelândia e Argentina. Mas o governo Vargas não tocou a ideia adiante.

"Otto Niemeyer recomendou a criação de um banco central e uma série de medidas que não se coadunavam bem com a situação", disse Bulhões. "Eles queriam estabelecer o equilíbrio orçamentário numa época em que isso era praticamente impossível. Impossível e indesejável, conforme [o economista John Maynard] Keynes iria demonstrar." Bulhões provavelmente se referia ao fato de que, em meio à Grande Depressão, os governos precisavam aumentar os gastos para induzir a recuperação da economia. O padrão-ouro, então sugerido ao Brasil por Niemeyer, desmoronaria pouco depois na própria Inglaterra. "Naquele tempo, surpreendentemente, os tenentes foram keynesianos antes de Keynes", afirmou Bulhões.

A visão de Bulhões sobre a proposta de Niemeyer mostra seu estilo nada dogmático que moldaria o processo de gestação do BC, que levou quase 20 anos. Ele não era graduado em economia, mas em direito. Filho de diplomatas, quando criança viveu na França e na Áustria e aprendeu economia por conta própria, lendo clássicos, como Adam Smith, em livros da biblioteca de um tio. Mas também faria um curso de especialização em economia na American University.

"Os livros de economia eram todos em francês e não tinham nada de matemática", afirma Dias Leite, abrindo alguns volumes da biblioteca em sua casa, na Gávea. O parente mais ilustre de Bulhões foi um tio-avô, Leopoldo de Bulhões, deputado goiano que foi ministro da Fazenda de Rodrigues Alves - e defendeu a austeridade monetária na Primeira República, fazendo contraponto às propostas expansionistas de Rui Barbosa.

A principal crítica à Sumoc sempre foi o fato de que, com seu desenho institucional, estava sujeita aos propósitos dos inflacionistas do governo e, principalmente, do Banco do Brasil, com vários ralos que permitiam emitir dinheiro para financiar gastos públicos e irrigar o crédito bancário barato. Mas o interesse de Bulhões era criar um órgão que reunisse as áreas monetária e fiscal do governo para, assim, desenhar orçamentos bem definidos, numa época em que essas relações corriam frouxas. "Não aspirava propriamente a independência", explicou Bulhões. "O que aspirava era a coordenação, a coerência."

"O BC poderia ter sido criado no final da Segunda Guerra, mas talvez as instituições não estivessem preparadas", afirma o ex-presidente do BC Gustavo Loyola. "Naquela época, criar um BC representaria tirar um pedaço do poder do Banco do Brasil. Não criar o BC, e fazer a Sumoc no lugar, foi uma coisa brasileira de acomodar o jogo de interesses."

O economista e ex-presidente do BC Gustavo Franco, um dos principais estudiosos do tema, acha que a criação da Sumoc representou, em muitos aspectos, um avanço. "Se não fosse a Sumoc, não sairia nada", afirma. Mas seu desenho institucional, com um conselho dominado pelo Banco do Brasil, que decidia de fato quanto dinheiro seria emitido, foi o germe do atual Conselho Monetário Nacional (CMN). "Esse é um bicho diferente que se criou no Brasil", diz Franco. O CMN deixa a política monetária exposta a outros interesses que não a estabilidade do poder de compra da moeda. Mundo afora, os bancos centrais tomam as medidas monetárias e ponto final, sem conselhos paralelos.

Em tese, uma vez baixado o decreto-lei que criou a Sumoc, no dia seguinte deveria ter começado o trabalho para instalação de um banco central. Mas esse era um grande passo, talvez maior do que era possível na época. Significaria sair de uma estrutura mínima, da Sumoc, para montar uma grande operação, capaz de assumir serviços típicos de um banco central que eram executados pelo Banco do Brasil. Entre eles, administrar as exigências de recolhimento compulsório sobre depósitos, fazer o redesconto de títulos do sistema bancário e administrar o numerário em circulação na economia - enfim, um conjunto de atividades que, na prática, significava controlar o volume de dinheiro em circulação na economia.

Um dos obstáculos era a falta de quadros para tocar um BC - que, aos poucos, foi sendo resolvido com a formação de um pequeno pelotão de elite, que incluía nomes que integrariam a primeira diretoria colegiada do BC, como Casimiro Ribeiro e o próprio Denio Nogueira. "O departamento econômico do BC (Depec) começou a ser formado nessa época", afirma o diretor de administração do BC, Altamir Lopes, um ex-chefe do Depec.

Outra questão era aprovar a lei de criação do BC. Com a democratização do pais, em 1946, o assunto tinha que passar pelo Congresso Nacional. Lá, o objetivo de proteger o poder de compra da moeda, que é bastante difuso, concorria com outros interesses. Um projeto em tramitação tornou-se uma perigosa bola de neve, que previa a criação não apenas de um BC, mas de cinco novos bancos de fomento: industrial, agrícola, infraestrutura, hipotecário e de comércio exterior.

"Eram bancos públicos que iriam se alimentar de suprimentos do BC", explica Franco. "Se fosse assim, era melhor não criar nada. Por isso os chamados 'sumoquianos', como Bulhões e Gudin, foram contra criar o BC naqueles moldes."

Só no governo de João Goulart o projeto de lei do BC voltou a ganhar impulso, quando a inflação avançava a passos largos. O presidente resolveu incluir uma lei bancária entre suas reformas de base. Quando os militares deram o golpe, em 1964, a tramitação da proposta já estava bem adiantada. Bulhões assumiu o Ministério da Fazenda, mas, segundo depoimento de Denio Nogueira ao CPDOC/FGV em 1993, ele não estava convencido de que haveria disposição do governo para batalhar pela criação de um BC em um Congresso Nacional que ainda operava com certa independência. A preocupação maior de Bulhões naquela altura, na verdade, era barrar o projeto de reforma bancária de João Goulart, que, a seu ver, produziria mais mal do que bem. Mais tarde, ele batalharia para criar o CMN, como forma de reforçar a coordenação dos orçamentos monetário e fiscal. Nogueira afirma ter insistido na criação do BC, e acabou vencendo. "Está bem. Vá criar o seu Banco Central", teria dito Bulhões, depois de obter a aprovação do presidente Castello Branco, segundo relato de Nogueira.

Nogueira era um discípulo de Bulhões. Nasceu em 1920, em uma família de militares. Depois de se formar em engenharia, tornou-se aluno de Gudin na terceira turma do primeiro curso de economia do país, da Faculdade de Ciências Econômicas e Administrativas do Rio de Janeiro. Mais tarde, fez pós-graduação na Universidade de Michigan, Estados Unidos. Na volta ao Brasil, integrou-se à equipe econômica de Bulhões. Entre suas várias atividades, dentro e fora do governo, está a de técnico do Instituto de Pesquisas e Estudos Especiais (Ipes), grupo de estudos financiado por empresários que mobilizava a oposição ao governo Goulart.

Nogueira negociou com o Congresso o projeto que daria origem à lei 4.595. O relator foi o deputado Ulisses Guimarães. Para atender aos diversos interesses, Nogueira teve que ceder, como no caso dos ruralistas. "O fato é que o BC nasceu distorcido", afirma Franco.

O BC foi criado com funções de fomento - uma diretoria de crédito agrícola, que abria caminho para financiar os ruralistas com subsídios e, portanto, emissão de moeda. "Foi um erro que cometemos", reconheceu Bulhões anos mais tarde. "O BC nunca deveria ter aceito essa incumbência." Nogueira achava que o modo de resistir à pressão dos ruralistas para extrair subsídios do Tesouro seria colocar a carteira agrícola sob a guarda de um BC independente.

Outra distorção no nascimento do BC foi a conta movimento, criada, a princípio, apenas para fazer um acerto de contas final da nova instituição com o Banco do Brasil, quando este passava àquele o bastão das funções de autoridade monetária. "O tempo foi passando, e o Banco do Brasil percebeu que poderia fazer mais com a conta movimento", diz Franco. A conta movimento se tornou um duto de dinheiro pelo qual o BC injetava moeda no Banco do Brasil para bancar suas operações de fomento da economia.

Junto com o BC, foi criado o CMN. Nogueira conta que foi uma ideia de Bulhões, que achava que o essencial naquele momento era ter um órgão que garantisse a coordenação entre as políticas fiscal e monetária. "Se um dia eu for chamado a opinar, sugiro a extinção do CMN", disse Nogueira. "Eu era e continuo a ser contra o CMN. O BC não precisa de CMN."

Na origem, o CMN era formado pelo ministro da Fazenda, pelos presidentes do Banco do Brasil e do BNDES e por seis membros nomeados pelo presidente da República, com mandatos de seis anos. A diretoria do BC era formada por um presidente e três diretores escolhidos entre os membros com mandato fixo do CMN. O arranjo funcionou bem enquanto a economia era comandada por Bulhões e o ministro do Planejamento, Roberto Campos, que deram prioridade ao combate à inflação. Ao longo dos anos, porém, o CMN foi sendo ampliado e, nos anos 1980, chegou a ter 27 membros, integrado por outros ministros, como o da Agricultura, e representantes de empresários e trabalhadores. Era comum que decisões fossem tomadas para atender interesses localizados, com resultantes pressões sobre o orçamento da União.

Uma fragilidade importante nesses primeiros anos do BC foi o orçamento monetário, que havia sido criado nos tempos da Sumoc como instrumento para conter a emissão de moeda e os grandes agregados monetários da economia, como o crédito. No fim das contas, tornou-se apenas mais um braço do orçamento fiscal, em que o governo definia quanto iria expandir os agregados monetários para cumprir seus objetivos de financiar investimentos e algumas atividades econômicas.

É possível que esse arranjo criado pela lei 4.595, apesar de seus vários flancos, tivesse sobrevivido bem se a independência do BC não tivesse sido violada em 1967. Ruy Leme, o escolhido por Delfim Netto após a demissão de Denio Nogueira, ficou menos de um ano na presidência do BC. Para seu lugar foi nomeado o economista Ernane Galvêas, que cumpriu o mandato de seis anos, conforme dizia a lei.

Na década de 1980, esse arranjo institucional precário já empurrava a economia para a hiperinflação, quando começaram a ser feitas algumas reformas importantes, que fortaleceram o BC. A conta movimento foi extinta; retirou-se o crédito rural do BC; o orçamento geral da União passou a englobar subsídios para operações de crédito oficial; e a Constituição de 1988 proibiu o BC de financiar o Tesouro Nacional.

Os progressos, porém, foram acompanhados de alguns passos para trás. Quando o país vivia um período de transição para a democracia, os primeiros governadores eleitos descobriram que podiam usar seus bancos estaduais como máquinas de imprimir dinheiro, sacando a descoberto em suas contas de reserva bancária mantidas no BC. O CMN tornou-se uma entidade figurativa.

Só em 1994, com a edição do Plano Real, esses problemas começaram a ser resolvidos. Gustavo Franco, um dos responsáveis pelo programa de estabilização, conta que o ideal seria ter acabado com o CMN, mas para tanto seria necessário mudar a lei 4.595, o que poderia acarretar um grande transtorno. O artigo 192 da Constituição, que tratava do assunto, previa também um teto dos juros de 12% ao ano, algo impraticável. Era impossível mudar uma coisa sem lidar com a outra. A solução encontrada foi restringir o CMN a um tamanho mínimo, vigente até hoje, com três membros: os ministros da Fazenda e do Planejamento e o presidente do BC.

Pouco depois do Plano Real, o BC enfrentou o problema dos bancos estaduais, fazendo intervenções. O governo criou um programa de saneamento dessas instituições, que levou ao fechamento ou privatização da maioria. Os poucos que restaram passaram a ser submetidos à mesma regra de supervisão dos bancos privados. Mais tarde, o governo socorreu os bancos federais, e o BC passou a vigiá-los.

O Comitê de Política Monetária (Copom) do BC foi criado em 1996. Apesar de ser um órgão poderoso, responsável por elevar os juros para esfriar a economia e controlar a inflação, a base legal de sua criação é apenas uma circular do próprio BC. "Copom é o nome que foi dado a uma seção especial da diretoria do BC", diz Franco. "Não há nenhuma lei para protegê-lo, mas hoje nenhum presidente da República teria coragem de extingui-lo. É uma ideia que tem um poder muito maior do que muitas leis que não pegam no país."

O sistema de metas de inflação foi implantado três anos depois, em 1999, quando o Brasil abandonou o regime de câmbio administrado, que havia sido a principal âncora contra a inflação no Plano Real. "Quando fui convidado para assumir o BC, disse que topava se fosse para ter metas de inflação, meta fiscal e câmbio flutuante", relata Armínio Fraga. Mas a ideia já vinha sendo cogitada pouco antes disso. Em janeiro de 1999, quando o antecessor de Armínio, Francisco Lopes, estava negociando com o FMI os termos da flutuação cambial brasileira, houve um entendimento para que fosse adotado também um regime de metas de inflação.

O regime de metas de inflação também tem uma base legal frágil - um simples decreto do então presidente, Fernando Henrique Cardoso, que, em tese, pode ser revogado facilmente. "É muito frágil do ponto de vista institucional", diz Franco. "Mas nem a presidente Dilma, que tem opiniões fortes e é cheia de ideias próprias sobre o que fazer na economia, tem coragem de modificar esse decreto."

O que falta agora é a independência. Dirigentes do BC das últimas duas décadas, incluindo o atual presidente, Alexandre Tombini, são unânimes em afirmar que tiveram autonomia para pilotar a política monetária e vigiar o sistema financeiro, apesar de não haver proteção em lei. Mas, de forma geral, reconhecem que a falta de proteção legal deixa o BC vulnerável a declarações de autoridades do próprio governo contra suas decisões e a rumores que circulam no mercado.

O problema já existia no governo Lula, quando o vice-presidente da República, José Alencar, dava declarações contra a alta de juros e assessores do Palácio do Planalto plantavam notas e reportagens contra o BC. No governo Dilma, a própria presidente passou a fazer declarações contra a autonomia do BC. "Não acredito em políticas de combate à inflação que olhem a redução do crescimento econômico", disse Dilma no começo do ano passado, quando o BC começava um ciclo de aperto monetário, criando uma confusão que precisou ser corrigida por Tombini.

Em 1999, quando o regime de metas de inflação foi adotado, um memorando assinado pelo governo FHC com o FMI previa a adoção de mandatos fixos para o presidente e o restante da diretoria do BC, quarentena e mecanismos para sua demissão. "Chegamos a elaborar uma Lei de Responsabilidade Monetária, mas nunca houve consenso dentro do governo", diz Armínio. FHC, que teve que fazer duas trocas de presidentes do BC em meio a uma crise, não era partidário da ideia.

Depois que Lula assumiu, foi aprovada uma emenda constitucional que permitiu a regulamentação fatiada do artigo 192 da Constituição. Era uma forma de escapar da casca de banana do teto de 12% para os juros e tocar adiante o projeto de autonomia do BC. Mas o assunto criou tantas divisões que não foi adiante.

Por imposição de circunstâncias políticas, a autonomia do BC acabou formalmente nas mãos de um dos economistas mais admirados do país, mentor de toda uma geração e claramente comprometido com a responsabilidade monetária e fiscal. Em 1974, no começo do governo Ernesto Geisel, o ministro da Fazenda, Mario Henrique Simonsen, enviou um projeto de lei ao Congresso que acabava com os mandatos fixos. "Quando tomei posse no Ministério da Fazenda, em 1974, achei melhor, já que o AI-5 estava em vigor, tornar o presidente e os diretores do BC demissíveis pelo presidente da República", explicou Simonsen em um depoimento para o CPDOC/FGV. Numa ditadura militar, em que não havia garantias nem para quem tinha mandatos eleitos, não havia espaço para a autonomia do BC. "O Mario perdeu, tristemente", disse Casimiro Ribeiro.

10 outubro 2014

Um debate necessário


Por Gustavo Loyola

A campanha eleitoral colocou na berlinda a questão da independência do Banco Central. Lamentavelmente, graças à empulhação perpetrada por um marketing político da pior espécie, o debate sobre esse importante tema descambou para o terreno do deboche e da sordidez.
A independência (ou autonomia) do Banco Central é característica dos países democráticos e institucionalmente avançados. Ao contrário do que o marqueteiro oficial quer fazer crer, a independência do BC protege a instituição de pressões espúrias e permite o exercício mais efetivo e transparente de suas funções de preservação do poder de compra da moeda e da estabilidade financeira. Aliás, a ideia de que a independência do BC é contrária aos princípios democráticos é apenas um dos muitos equívocos que permeiam a discussão do assunto no Brasil nas últimas décadas.
A necessidade da independência dos bancos centrais tem sido colocada no contexto da própria natureza da política monetária, cujos resultados ocorrem somente depois de decorrido um prazo razoável de tempo da sua execução. A influência benéfica da política monetária sobre os preços e o produto aflora com certa demora, havendo um período de tempo em que seus efeitos não são perceptíveis, embora seus custos já estejam sendo plenamente sentidos pela sociedade. Por causa disso, os bancos centrais ficam sujeitos a pressões das lideranças políticas e da opinião pública para utilizar indevidamente seus instrumentos de política monetária, abandonando objetivos de longo prazo em favor de ganhos passageiros e ilusórios de curto prazo.

Além disso, a independência do BC protege a política monetária de pressões naturais relacionadas aos ciclos eleitorais, já que há sempre a tentação de utilizá-la para gerar episódios efêmeros de crescimento, com vistas à coleta de benefícios políticos imediatos. Vale ressaltar que a independência formal não impede de forma absoluta que o BC seja utilizado com fins eleitorais, mas torna transparente qualquer tentativa de fazê-lo.

A independência dos bancos centrais viria como resposta a esses riscos. Isoladas das pressões políticas por resultados de curto prazo, essas instituições podem se dedicar a seus objetivos de forma mais eficiente e eficaz, sendo esta a razão pela qual se atribui mandatos estáveis e relativamente longos aos dirigentes dos bancos centrais.

Uma crítica frequente à independência dos bancos centrais costuma compará-la ao estabelecimento de um “quarto poder”, que se tornaria fonte de dificuldades para a condução das políticas públicas, mormente da política econômica. Trata-se, obviamente, de uma leitura equivocada. A autonomia do BC é sempre outorgada em caráter precário pelo Congresso Nacional, que é a verdadeira fonte do poder. O estatuto de independência do BC pode ser revogado a qualquer momento e sua autonomia é exercida sobre um terreno extremamente restrito e sujeito a fortes restrições, inclusive no que concerne à prestação de contas e a responsabilização perante o Executivo e o Legislativo.
Desse modo, do ponto de vista político, a independência do Banco Central aumenta o controle da sociedade sobre a instituição, na medida em que suas ações se tornam mais transparentes e seus dirigentes passam a prestar contas regularmente à sociedade por meio do Poder Legislativo. Dar mandatos a seus dirigentes não os desobriga da prestação de contas à sociedade e nem lhes confere estabilidade absoluta em seus cargos.

No Brasil, sob o ponto de vista institucional, resta pouco para que seja conferida a independência legal ao Banco Central. Os avanços das últimas décadas formaram um quadro em que é possível a existência de uma autoridade monetária formalmente independente. A Constituição de 1988 proíbe expressamente o financiamento do Tesouro pelo Banco Central e veda sua atuação como banco de fomento, assim como impõe a necessidade de aprovação prévia dos nomes de seus dirigentes pelo Senado Federal. Por outro lado, a Lei de Responsabilidade Fiscal e outras normas legais estabeleceram uma moldura adequada disciplinando o relacionamento entre o Tesouro e o Banco Central.

Dessa maneira, o que falta basicamente para a independência do BC é a atribuição de mandatos para seus dirigentes e a formalização de mecanismos de coordenação e de solução de conflitos entre a instituição e o Tesouro, especialmente nos campos da política cambial e de reservas internacionais.
Vale ressaltar que o próprio regime de metas de inflação já explicita que o BC teria independência “de instrumentos” e não a “de objetivos”, pois a meta de inflação não seria fixada pela instituição, mas sim por outra instância de governo. Por outro lado, como órgão regulador e supervisor bancário, a questão da autonomia do BC não seria estranha ao ambiente legal brasileiro, uma vez que outros reguladores – como é o caso da CVM – já adquiriram esse status.

Fonte: Valor Econômico, 06/10/2014.

12 setembro 2014

BC e Auditorias

(...) As empresas que auditam os balanços ganharam o direito de serem ouvidas antes de o BC apresentar o relatório final de inquérito no qual aponta os responsáveis pelos problemas encontrados nas instituições.

Por meio da Portaria 82.265, o presidente do BC, Alexandre Tombini, abriu a possibilidade de a comissão de inquérito convidar as empresas de auditoria a prestar esclarecimento caso encontre indícios de negligência ou imperícia. Até então, essa possibilidade não existia. (...)


As auditorias reclamavam que tinham seus nomes listados nos relatórios finais do BC, que são remetidos ao poder judiciário, sem ter chance de defesa. A questão é que por força da Lei todos os citados pelo BC nesses relatórios tem de ser acionados pelo Ministério Público, que pede o bloqueio de bens, sejam eles diretores ex-diretores ou firmas de auditoria que tiveram relação com a empresa durante os cinco anos anteriores à decretação do regime especial. (...)

BC ouvirá auditorias em casos de liquidação - Por Eduardo Campos - Valor Econômico

25 fevereiro 2014

Lucro do Bacen

Com reservas cambiais de US$ 377 bilhões, e uma desvalorização nominal da taxa de câmbio de 14,6% (a desvalorização real é estimada na Pesquisa Focus em 10,4%), em 2013, não é surpresa o resultado positivo do Banco Central (BC) de R$ 31,9 bilhões, dos quais R$ 17,7 bilhões obtidos no primeiro semestre e R$ 14,2 bilhões, no segundo. "Quando o valor das reservas (expressas) em real aumenta, a gente tem um ganho em reais", notou o chefe do Departamento de Contabilidade e Execução Financeira do BC, Eduardo Rocha.
Mas esse lucro do Banco Central é contábil. Decorre da administração das reservas internacionais e das operações com derivativos (swaps) cambiais. Embora sua transferência para o Tesouro Nacional já esteja marcada (ocorrerá até 2 de março), o lucro só pode ser empregado para abater dívida, segundo as regras oficiais. Não pode, portanto, ser empregado para elevar gastos fiscais.
A constatação não é novidade, mas se deve enfatizá-la num governo que tende a gastar mais do que arrecada e que acaba de anunciar um superávit primário ligeiramente mais elevado, neste ano, para enfrentar as desconfianças internas e externas.
O resultado do BC tem como origem a diferença entre receitas e despesas com juros que incidem sobre as operações em moeda local e com o reembolso do custo de captação das reservas internacionais. Assim como houve lucro, em 2013 - explicável pela valorização das reservas -, poderia ter havido prejuízo contábil, caso o real se tivesse valorizado. Foi o que ocorreu, por exemplo, em 2009. Houve uma expressiva desvalorização do dólar e o Banco Central teve, naquele ano, prejuízo contábil de R$ 4,86 bilhões no item moedas estrangeiras da demonstração de resultados do balanço.
Mais importante é que, ante o expressivo lucro contábil do ano passado, um recorde na história do Banco Central, não se ignore que a manutenção das reservas cambiais tem custos para o País. Um deles é que o governo tem de emitir títulos públicos para adquirir moeda estrangeira - e a remuneração que paga aos tomadores dos papéis governamentais é superior àquela que obtém aplicando as reservas no exterior.
Outro custo é o da venda de swaps no mercado local, para evitar oscilações excessivas do câmbio. No ano passado, o BC perdeu R$ 2,4 bilhões com essas operações de venda de dólares no mercado futuro. Evita-se, com o mecanismo dos swaps, o risco de perda de reservas, mas não o ônus fiscal.
Fonte: aqui

27 janeiro 2014

Brasil: devedor líquido do mundo

Segundo reportagem do G1: 

O chefe-adjunto do Departamento Econômico do Banco Central, Fernando Rocha, avaliou, porém, que as reservas internacionais brasileiras ainda são maiores do que a dívida externa do país, o que confere ao país a posição de credor líquido , e que a dívida externa de curto prazo (até um ano) representa pouco mais de 10% do valor total do endividamento externo brasileiro. 

Meu comentário: Nominalmente as reservas internacionais brasileiras são superiores à dívida privada e pública com exterior (obrigações externas). No entanto, quando intervém no mercado de câmbio, o Banco Central utiliza contratos de swaps cambiais. . A reportagem abaixo explica de forma detalhada essas operações. O BC deve honrar esses contratos no futuro. Considerando o custo desses contratos, o Brasil não é mais credor do mundo desde Outubro de 2013.




Brazil: net debtor to the world 
Jonathan Wheatley 
Financial Times, January 16, 2014

How well protected is Brazil against external shocks? Perhaps not as well as is commonly thought. 
It has been a proud boast of Brasília for several years that it is a net creditor to the world because it holds more in foreign exchange reserves than it owes in overseas debt. However, it is far from clear that this is still the case. The issue is just one example of the vulnerabilities investors must include in their calculations of how Brazil and other emerging markets will fare as monetary policy in the developed world becomes less accommodating. 

Global liquidity has been a boon to Brazil for at least a decade. Before the crisis of 2008-09, global demand for Brazil’s commodities and the rise of millions of new consumers at home led to and fed off huge inflows of money. Since the crisis, the flows have continued thanks to quantitative easing by the US Federal Reserve and other central banks in the developed world. 
The impact is clearly visible in Brazil’s foreign exchange reserves, which rose from about $35bn in 2001 to about $360bn by the end of last year. 

Combined public and private sector foreign debt was steady at about $200bn from 2001 until 2009 and then began to rise, reaching about $310bn by the end of last year. Nevertheless, thanks to the steady increase in foreign reserves, Brazil has been a net creditor since early 2009. 


Or has it? 


At about the same time as the country became a creditor, Brazil’s central bank began using a nifty new method of intervention on foreign exchange markets. Instead of buying and selling dollars on the spot market – the standard method of central bank intervention – it used currency swaps. This is a clever alternative because it achieves the same result as buying or selling dollars with no impact on the stock of reserves. 

When the bank uses such a swap to limit the depreciation of the real, it offers to pay the difference between the initial exchange rate and the final exchange rate during the period of the contract, plus a dollar-linked rate of interest (known to traders as the cupom cambial). In return, it receives the cumulative interbank interest rate (currently about 10 per cent a year) on the amount of the contract in Brazilian reals. Crucially, the contracts are settled entirely in reals. No dollars exchange hands and there is no obvious impact on the country’s ability to pay its foreign debts.
The method works because it satisfies demand for foreign exchange contracts by financial market participants looking to hedge foreign exchange exposure or to speculate on movements in the exchange rate. By doing so, it removes demand from the market and has the same effect on the exchange rate as if that demand had been met by buying or selling dollars. 

During several periods since the method was introduced, the central bank used it (in a mirror image of the contract described above) to limit the appreciation of the real, which was being driven up by the arrival of all that hard currency and undercutting the competitiveness of Brazilian exports. 

But when the US Fed began talking about tapering its QE programme last year, the real went on a slide. Since then, the central bank has upped its currency swap programme to a different order of magnitude. As Gabriel Gersztein and Thiago Alday at BNP Paribas in São Paulo pointed out in a recent note, between May 31 last year and January 10, the bank accumulated a short position on the US dollar through currency swaps of more than $77bn. 

You may well ask, so what? It is all done in reals, after all, so there is no impact on foreign reserves. But big bazookas don’t come cheap and you can’t support your currency to the tune of $77bn at no cost. 
And of course there is a cost. If the swaps are successful – and a central bank working paper published in July 2013 suggests they often are – then the bank may even make a profit on them. But what if the real continues to slide, in spite of the central bank’s heavy weaponry? The currency has shown some resilience since the panic went out of foreign exchange markets last September. But it has still weakened from R$1.95 to the dollar last March to about R$2.35 today. Every time its swap contracts go against it, the central bank – or rather Brazil’s national treasury – takes a hit. 

How big is that hit? If we assume there is no such thing as a free lunch, let alone a free big bazooka, we must also assume the cost is significant. Gersztein and Alday at BNP Paribas think a reasonable indication of the cost is to net out the central bank’s short dollar position through currency swaps from its foreign reserves. After all, it is not only the stock of reserves but also the broader health of the Brazilian economy that affects its ability to pay its debts. 

If we do that, we discover that, thanks to the use of its bazooka, Brazil ceased to be a net creditor to the world in October last year. The central bank’s latest figures, for November 2013, show external debt at $312bn and foreign reserves at $362bn, giving a cushion of $50bn. Net out its short position through swaps of $68bn at the end of November and the cushion is gone. 

That is something investors may wish to keep a close eye on if, as widely predicted, the real continues to weaken and Brazil’s fiscal position continues to deteriorate during 2014 and 2015. 

26 janeiro 2014

Deterioração das transações correntes

G1, 24/01/2014

A conta de transações correntes do Brasil, um dos principais indicadores da situação da economia brasileira, fechou 2013 com um déficit inédito de US$ 81,37 bilhões, informou o Banco Central nesta sexta-feira (24).

Para chegar a esse valor se somam os resultados da balança comercial (saldo entre importações e exportações) e de outras operações não comerciais que impliquem entrada ou saída de capitais (serviços e rendas).

[...]

Balança comercial piora 

Os números do Banco Central mostram que a deterioração das contas externas está relacionada com a má situação da balança comercial, que registrou, no ano passado, o pior resultado em 13 anos. Em 2013, a balança teve um superávit de US$ 2,55 bilhões, contra um resultado positivo de US$ 19,39 bilhões no ano anterior. Houve, deste modo, uma reversão de US$ 16,83 bilhões no saldo comercial no último ano.
Em outras palavras, estamos vendendo menos os produtos que produzimos e compramos cada vez mais.

Os outros componentes das contas externas, entretanto, também mostraram deterioração no primeiro semestre de 2013. O resultado negativo da conta de serviços (que inclui, entre outras coisas, turismo e aluguel de equipamento), por exemplo, somou US$ 47,5 bilhões em 2013, impulsionadas, entre outros, pelos gastos recordes de brasileiros no exterior , o que representa aumento frente ao déficit de US$ 41 bilhões registrado em 2012.

Nas rendas (nas quais entram desde a multinacional que envia ou traz dinheiro do exterior ao ganho ou perda de rendimentos em investimentos em outras moedas), o déficit somou US$ 39,77 bilhões em 2013 – com alta frente ao mesmo período do ano passado (-US$ 35,44 bilhões).

Investimentos estrangeiros 

O BC informou ainda que os investimentos estrangeiros diretos (empresas ou investidores que resolvem colocar dinheiro no Brasil) somaram US$ 64 bilhões em 2013, com queda de 1,87% frente ao ano anterior (US$ 65,27 bilhões). O valor ficou abaixo também do recorde histórico para este indicador, registrado em 2011 (US$ 66,6 bilhões).

Financiamento do déficit externo 

O BC confirmou, assim, que o resultado negativo da conta corrente (US$ 81,37 bilhões) não foi integralmente "financiado" pela entrada de investimentos produtivos na economia brasileira em 2013 – algo que não acontece desde 2001.

Quando o déficit não é "coberto" pelos investimentos estrangeiros, o país tem de se apoiar em outros fluxos, como ingresso de recursos para aplicações financeiras, ou empréstimos buscados no exterior, para fechar as contas.

Analistas alertam, entretanto, que em um cenário de crescimento menor do PIB e menor disponibilidade de recursos nos mercados (com a sinalização do fim das medidas de estímulo nos Estados Unidos), e com uma confiança menor na economia brasileira, a atratividade do Brasil também é mais baixa – o que pode significar mais dificuldades no financiamento do déficit das contas externas.

[...]

14 janeiro 2014

Contas dos partidos

O Banco Central estabeleceu orientações a respeito da abertura, movimentação e encerramento de contas de depósitos à vista de comitês financeiros, partidos políticos e candidatos, bem como sobre os extratos eletrônicos dessas contas. As regras estão presentes no comunicado nº 25.091, publicado no Diário Oficial da União desta segunda-feira,13.


Será que isto é um assunto do Banco Central? Não seria mais apropriado que fosse o TSE o regulador da matéria?

A norma estabelece que Caixa Econômica Federal, Banco do Brasil, bancos comerciais e bancos múltiplos com carteira comercial devem realizar a abertura de contas de depósitos à vista, as "contas eleitorais", quando isso for solicitado por comitês financeiros, partidos políticos e candidatos que venham a se registrar na Justiça Eleitoral para participar de eleição. O BC determinou que os bancos devem realizar a abertura da conta eleitoral em até três dias úteis, contados a partir da solicitação.


Novamente, isto seria passível de regulamentação?

Está proibida a exigência de depósito mínimo, a cobrança de tarifas de abertura de cadastro e de manutenção, bem como a concessão de qualquer benefício ou crédito não contratado especificamente pelo titular. Os bancos deverão apresentar mensalmente os extratos eletrônicos dessas contas aos órgãos da Justiça Eleitoral. O BC lembra, ainda, que os extratos eletrônicos terão de conter identificação e registro de depósitos em cheque, de liquidação de cheques depositados em outras instituições financeiras e de emissão de instrumentos de transferência de recursos.


Qual a diferença entre o cliente "político" e o cliente normal? Proibir que os bancos cobrem "tarifas" é um incentivo ao "subsídio cruzado". Ou seja, o que o banco deixa de ganhar com este cliente ele cobra de outro cliente. Nós estaremos pagando indiretamente por isto.

Na abertura das contas eleitorais de candidatos e de comitês financeiros, devem ser apresentados Requerimento de Abertura de Conta Eleitoral (Race); comprovante de inscrição do interessado no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ). Para a abertura das contas eleitorais dos diretórios partidários, devem ser apresentados o Requerimento de Abertura de Conta Eleitoral de Partidos (Racep); comprovante de inscrição do interessado no CNPJ e Certidão de Composição Partidária, disponível na página do TSE na Internet.


Isto é muito burocracia, para tentar controlar as contas dos partidos. Mas não seria atribuição do TSE?

As contas devem ser identificadas com a mesma nomenclatura constante do Race ou do Racep. A movimentação terá de ser realizada exclusivamente pelas pessoas identificadas no Race ou no Racep.

O BC ressalta que as contas eleitorais seguem a regulamentação pertinente às contas de depósito à vista. Mas lembra que precisam ser observadas, com destaque, questões como a proibição do fornecimento de folhas de cheques a candidato ou representantes que figurarem no Cadastro de Emitentes de Cheques sem Fundos (CCF), situação na qual a movimentação deve ser realizada por meio de cartão ou cheque avulso.


BC estabelece normas sobre as 'contas eleitorais' - Por Ayr Aliski (Cartoon aqui)

02 agosto 2013

Banco Central: intervenção no Banco Rural

Já comentamos em postagens anteriores diversos problemas do Banco Rural incluindo um pagamento milionário a ex funcionários da finada empresa aérea VASP, o empenho de bens devido à uma transação infeliz envolvendo uma usina da Petroforte e até empréstimos que irrigaram o esquema mensalão! Se você digitar "Banco Rural" aqui no nosso buscador terá diversas opções de leitura envolvendo fraude.

Agora, conforme uma publicação da Agência Estado (por Célia Froufe e Eduardo Cucolo) o Banco Central (Bacen) decretou a liquidação extrajudicial do Banco Rural devido ao comprometimento da situação econômico-financeira da instituição, à existência de graves violações às normas legais e estatutárias que disciplinam a atividade e à ocorrência de sucessivos prejuízos que sujeitam a risco anormal seus credores quirografários (que não possuem qualquer preferência).

Segundo nota divulgada pela assessoria de imprensa do Banco Central, pesou também a falta de um plano viável para a recuperação da situação do banco. A assessoria informou ainda que, em março de 2013, o conglomerado financeiro Rural detinha 0,07% dos ativos e 0,13% dos depósitos do sistema financeiro (dados de março de 2013).

Por extensão, o ato do presidente do Bacen obviamente inclui as demais empresas do conglomerado: o Banco Rural de Investimentos S. A.; o Banco Rural Mais S. A.; o Banco Simples S. A.; e a Rural Distribuidora de Títulos e Valores Mobiliários S. A.

"O Banco Central está tomando todas as medidas cabíveis para apurar as responsabilidades, nos termos de suas competências legais de supervisão do sistema financeiro. O resultado das apurações poderá levar à aplicação de medidas punitivas de caráter administrativo e a comunicações às autoridades competentes, observadas as disposições legais aplicáveis", trouxe a nota.

Com isso, ficam indisponíveis os bens dos controladores e dos ex-administradores da instituição. A data de liquidação a ser considerada é retroativa a 3 de julho de 2013.

16 abril 2013

IFRS nas Instituições Financeiras Brasileiras 2

O presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, destacou nesta segunda-feira, 15, que as demonstrações financeiras de alta qualidade "são essenciais para proteger o investidor", especialmente por causa de sua grande relação com práticas de boa governança e de responsabilização dos administradores. "Assim, padrões de alta qualidade são referidos como um dos principais ingredientes para uma alocação e uso eficiente de recursos econômicos escassos", comentou. [1] 

Segundo Tombini, a adoção pelo BC das normas internacionais de contabilidade oriundas do IASB (International Accounting Standards Board) está no contexto da regulação do Sistema Financeiro Nacional, que tem como um de seus pilares "a crescente convergência com padrões regulatórios reconhecidos internacionalmente" como de alta qualidade. "O maior protagonismo da economia brasileira no cenário internacional impõe a aderência às melhores práticas", destacou, em palestra do IFRS (International Financial Reporting Standards), realizada em São Paulo.

De acordo com Tombini, o uso desses padrões internacionais eleva a qualidade e a transparência das informações contábeis, facilita o acesso das instituições do sistema financeiro nacional aos mercados financeiros e de capitais internacionais, e reduz seus custos de captação nesses mercados, pois facilita a comparação das demonstrações contábeis das instituições brasileiras com as das instituições estrangeiras. "Entendo oportuno destacar que o Banco Central do Brasil foi pioneiro no processo de adoção dos padrões internacionais, tendo sua Diretoria Colegiada assumido um compromisso com a convergência ainda no ano de 2006, com a emissão do Comunicado n.º 14.259", disse. "Em termos das Normas Internacionais de Informação Financeira (IFRS), a Resolução do CMN n.º 3.786, de 2009, materializou esse compromisso, com a exigência da aplicação do IFRS na elaboração de Demonstrações Contábeis Consolidadas dos bancos a partir do exercício de 2010." [2]

[1] Se é assim, qual a razão pela não adoção pelo Banco Central?
[2] Mas isto não está completo. E as outras situações?

Observe o leitor que este texto é muito mais "parcial" do que aquele publicado na Folha (Vide a outra postagem).

IFRS nas Instituições Financeiras Brasileiras

O Brasil adotará o padrão contábil internacional de forma gradual [1], em um processo de médio a longo prazo, disse nesta segunda-feira (15) o presidente do BC (Banco Central), Alexandre Tombini, em discurso para a IFRS (International Financial Reporting Standards) Conference, em São Paulo.

Tombini afirmou que, entre as atribuições do BC, está a de assegurar que o sistema financeiro seja sólido e eficiente --e é nesse contexto que as normas contábeis são importantes-- e a adoção dos padrões internacionais pode reduzir os custos de captação das instituições financeiras no exterior.

Ele disse, no entanto, que é preciso absorver as mudanças necessária de maneira "paulatina e responsável" [2]. "Como regulador do sistema financeiro, o Banco Central do Brasil deve pensar no equilíbrio entre transparência e estabilidade do sistema [3], de modo que todos os impactos sejam meticulosamente analisados anteriormente à introdução de uma nova norma."

Para o presidente da autoridade monetária, "o processo de alinhamento do Cosif [Plano Contábil das Instituições do Sistema Financeiro Nacional] à norma internacional tende a ser um processo de médio a longo prazo" [4].

Ele destacou a participação do Brasil nas discussões das principais questões contábeis propostas pela Iasb e disse que o BC tem avaliado "com interesse" [5] uma minuta recém-editada que propõe alterações nos padrões para o reconhecimento de provisão para perdas em instrumentos financeiros.

"Esse assunto é de grande interesse de todos os reguladores prudenciais, pois afeta uma parcela considerável dos ativos dos bancos. O modelo atual, baseado nas perdas incorridas, não proporciona provisões em volumes suficientes e de forma tempestiva, o que ficou conhecido internacionalmente no jargão 'too little, too late'", disse Tombini.


Fonte: Folha de S Paulo

[1] Esta frase é relevante. Mostra que ainda não adotamos as normas internacionais de contabilidade plenamente, como creem alguns.
[2] Ou seja, adotar as IFRS é agir de maneira irresponsável? Ele está dizendo que o Banco Central age com cautela quando o assunto é a convergência. Mas e os outros setores?
[3] Mais uma vez Tombini deixa dúvida sobre a qualidade das IFRS. Talvez as críticas recebidas na Inglaterra e EUA com respeito as IFRS tenham aumentado a cautela do Banco Central.
[4] Isto não é bem verdadeiro. O alinhamento já foi feito em outros setores. Qual a razão para o excesso de conservadorismo do Banco Central? Medo?
[5] Novamente cautela excessiva.

12 fevereiro 2013

Banco Central e Fiscalização

O Banco Central reduziu drasticamente o volume de multas aplicadas ao sistema financeiro nos últimos três anos. Durante toda a década passada, essas punições somavam centenas de milhões de reais por ano. Em 2009, por exemplo, o valor foi de R$ 318 milhões. Desde então, vêm caindo, por causa de mudanças na forma de atuação da equipe de fiscais do BC. As multas aplicadas nos últimos três anos somaram apenas R$ 80,2 milhões.

Cercada de sigilo, a área de fiscalização não dá detalhes da atuação. Também não atendeu aos pedidos de entrevista. Os documentos oficiais do BC, como o Relatório de Gestão de 2011, oferecem algumas pistas para explicar a queda nas multas.

"Substituiu-se, em 2010, a aplicação de multa pecuniária automática pela responsabilização da alta administração das instituições, nas ocorrências de falhas nos fluxos de informações. Essa responsabilização atinge tanto a instituição financeira, quanto a pessoa física de seus administradores", assinala o relatório. "Em 2011 foram convocados 16 conglomerados, que respondem por 124 empresas, e mais 16 empresas independentes." Em vez de cobrar valores considerados baixos de bancos, o BC acelerou as punições às pessoas que cometem os erros nessas instituições. De 2007 a 2009, foram 508 dirigentes inabilitados. Em 2010, 2011 e 2012, 893. O BC não divulga os nomes ou os motivos das punições.


BC multa menos, mas condena mais executivos de bancos - 10 de Fevereiro de 2013 - O Estado de São Paulo - Iuri Dantas

28 dezembro 2012

Banco Central e a Inflação


[...]em dezembro de 2009, o BC previu que a inflação em 2010 atingiria 4,6%; o número final foi 5,9%.Em 2010, a previsão oficial para 2011 indicava 5%, mas a inflação bateu 6,5%, o teto exato do intervalo de tolerância.

Apesar disso, em dezembro daquele ano, o BC redobrou a aposta e prometeu a convergência para a meta, cravando 4,7% para a inflação de 2012, que, tudo indica, deverá ficar mesmo na casa de 5,8%, como adiantado pelo IPCA-15.
Em três anos consecutivos, pois, o BC errou por mais de um ponto percentual de diferença (o erro médio é de 1,3 ponto percentual).Diga-se, porém, que errar a previsão não é, a princípio, nenhuma grande vergonha nem o principal tema da discussão.

Caso o BC tivesse por vezes superestimado a inflação e em outras oportunidades a subestimado, diríamos que há problemas com a precisão das estimativas, mas não um viés. Afinal de contas, como se diz por aí (e eu, como economista, subscrevo entusiasticamente), fazer previsões é um negócio complicado, ainda mais sobre o futuro.

Na prática, porém, o que se observa são erros para um lado só: a subestimação sistemática da inflação. No primeiro caso, diríamos que a bola de cristal do BC está embaçada, como de resto a de todos nós economistas; já no segundo, eu diria que a bola de cristal do BC não está prevendo, mas torcendo, o que é muito diferente.

Não é por acaso, portanto, que, quando o BC projeta que a inflação será 4,8% em 2013 (ou mesmo quando promete apenas que será inferior à observada em 2012), tanto economistas como pessoas normais (a distinção é intencional) encarem a promessa com visível incredulidade, expressa, por exemplo, na previsão consensual de mercado para a inflação na casa de 5,5% para o ano que vem (embora eu acredite que será ainda mais alta).
A triste verdade é que o Banco Central perdeu o controle do processo inflacionário ao perder as rédeas sobre as expectativas. Caso ache que vai segurá-las por meio de previsões excessivamente otimistas acerca da trajetória da inflação, está em vias de sofrer um desapontamento amargo.

Se quiser recuperar a mão, o passo inicial é reconhecer a extensão do problema, atitude muito diferente da que encontramos no Relatório de Inflação e na comunicação do BC em geral.

Fonte: aqui