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15 maio 2024

JCP, Ambev e Carf

A 2ª Turma da 3ª Câmara da 1ª Seção do Conselho Administrativo De Recursos Fiscais (Carf) rejeitou parcialmente nesta terça-feira, 14, um recurso da Ambev em processo no qual a Receita questiona métodos contábeis usados pela empresa para pagamentos de Juros sobre Capital Próprio (JCP). O caso somava R$ 6,9 bilhões em discussão, mas, em alguns pontos do julgamento, os conselheiros deram razão à companhia, o que reduz esse impacto. No Formulário de Referência de 2023, a Ambev já classificava a perda como “possível”. A empresa pode recorrer da decisão na Câmara Superior do Carf ou no Judiciário. Em nota, a Ambev afirmou entender que a conclusão não tem amparo legal e que a companhia está “suportada por argumentos jurídicos sólidos”.

O debate jurídico travado entre a Ambev e o Fisco remonta a uma operação de 2013, quando a companhia implementou uma reestruturação societária, que envolveu uma troca de ações. Com isso, a Ambev reconheceu em seus registros contábeis a contrapartida da diferença entre o valor de seus papéis emitidos para a troca e o valor patrimonial das ações da controlada no patrimônio líquido por meio da conta de Ajuste de Avaliação Patrimonial (AAP).

A Receita, contudo, contesta o uso desta conta, por entender que a prática infla o patrimônio líquido e aumenta a base do JCP, pelo fato de a APP não ser utilizada no cálculo dos proventos, que ficam livres desse lançamento redutor. O JCP permite que a remuneração aos acionistas seja enquadrada como despesa – e, assim, abatida do Imposto de Renda, o que é vantajoso para as empresas.

A discussão bilionária que opõe a Ambev e o Fisco se refletiu, inclusive, nas mudanças que o governo negociou para o JCP, aprovadas no ano passado pelo Congresso. A equipe econômica reclamava de registros de entradas relevantes para patrimônio líquido, enquanto o lançamento redutor era feito em outra conta. Para o cálculo do JCP, o valor positivo era considerado e o negativo não era excluído. Isso, agora, está expressamente vedado.

“A empresa escolheu fazer esses lançamentos, aumentando em R$ 97 bilhões seu patrimônio líquido. E, na hora de fazer o ajuste, fez ajustes que não tem efeitos fiscais. É legítimo? Essa é a discussão. E não é apenas inconformismo por efeitos tributários. A empresa violou a expressa previsão da Lei das S.A”, argumentou a procuradora da Fazenda Nacional, Livia Queiroz, durante o julgamento.

O relator no Carf, Wilson Kazumi Nakayama, descartou que a Ambev tenha recorrido a alguma “simulação” na reestruturação societária, mas não concordou com o uso da conta de Ajuste de Avaliação Patrimonial. “O procedimento tornou o patrimônio líquido inflado, pelo fato de ter ajustado o patrimônio líquido pela AAP, que não é utilizada no cálculo do JCP”, disse o conselheiro.

Para os advogados da empresa, a mudança legal aprovada pelo Congresso no ano passado é um dos indicativos de que a prática adotada – uso da conta de AAP – não era vedada, o que não justificaria a ação do Fisco em suas autuações após a operação de 2013. “E a conta de AAP é a mais vocacionada para receber na contabilidade a diferença de valor justo e valor contábil. Esse foi o raciocínio adotado pela Ambev. E as duas auditorias consideraram esse tratamento adequado também (…) Se a lei precisou ser mudada, e essa linha atinge essa operação, é porque no período anterior, o que ela prevê não se aplicava”, afirmou o advogado Gustavo Haddad durante o julgamento no Carf.

Em nota sobre o resultado, a Ambev afirmou entender que a decisão proferida não possui amparo legal. “Trata-se de caso decorrente da divergência de interpretação da legislação tributária e a defesa da Companhia está suportada por argumentos jurídicos sólidos, corroborados por pareceres externos”, disse a companhia, destacando ainda que eventual decisão desfavorável no tribunal administrativo não é definitiva e “que irá recorrer, cabendo a palavra final, em última instância, ao Poder Judiciário”.

A previsão era que a turma julgasse também nesta terça outro processo da Ambev com o mesmo pano de fundo, com R$ 4,6 bilhões em discussão. A relatora deste caso, Maria Angelica Echer Ferreira Feijo, no entanto, avaliou que uma nova diligência é necessária para o julgamento do recurso, envolvendo um laudo apresentado pela Ambev. Já o processo analisado, sob relatoria do conselheiro Nakayama, é de uma autuação referente à dedução de JCP nos anos de 2015 e 2016, questionando os efeitos contábeis e societários da reestruturação societária e seus impactos no incremento do cálculo do limite da dedutibilidade do JCP.

Fonte: aqui

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