Alguns economistas têm criticado a “obsessão” pelo ajuste fiscal em decorrência dos seus efeitos deletérios sobre a atividade econômica, enquanto outros defendem a expansão do investimento em infraestrutura.
A atual política fiscal, no entanto, não é o resultado de uma escolha. O dinheiro acabou e o governo não pode aumentar o gasto público.
O problema decorre de muitas leis que tornaram compulsórios diversos gastos públicos, há décadas crescendo bem mais do que a renda nacional. Faz tempo, a receita corrente não é suficiente para pagar esses gastos, quanto mais as despesas discricionárias necessárias para manter a máquina pública funcionando.
Nos últimos anos, as contas foram pagas com receitas extraordinárias, como a devolução dos empréstimos ao BNDES ou o lucro do Banco Central. Essas fontes, no entanto, estão secando. A saída seria o governo se endividar para pagar as despesas correntes, mas isso é proibido por artigo da Constituição —a regra de ouro.
Por essa razão, o governo teve que pedir ao Congresso a aprovação de crédito suplementar, uma saída que pode ser até legal, mas fere o espírito da regra de ouro. A alternativa seria interromper pagamentos de programas como o Bolsa Família, o que ninguém tem defendido.
Não há mais nada que o governo possa fazer na seara fiscal sem a revisão das leis em vigor.
Parece inevitável rever a regra de ouro. Essa mudança deveria ser acompanhada de medidas adicionais que interrompam o aumento descontrolado do gasto público, a começar pela reforma da Previdência.
Caso o governo tenha que se endividar para pagar despesas correntes, a contrapartida deveria ser proibir o aumento dos gastos com os servidores, a concessão de subsídios e a criação de despesas obrigatórias.
Sem essas medidas, o crescimento da dívida pública levará ao aumento da inflação e das taxas de juros, prejudicando ainda mais a economia.
A expansão da infraestrutura seria bem-vinda, mas vale lembrar alguns dos projetos do governo dos últimos 15 anos, como as refinarias ineficientes, o trem-bala e Angra 3. Se é para fazer isso, melhor mesmo não ter dinheiro para gastar.
O poder público foi, inclusive, incapaz de propor projetos executivos detalhados, o que resultou em falta de previsibilidade das contrapartidas ambientais e sociais, comprometendo severamente os planos iniciais.
Quem vai investir em infraestrutura depois dos seguidos problemas emBelo Monte e no linhão de energia em Roraima? Houve ainda as desastrosas intervenções nos setores de óleo e gás e de energia.
Não faltam recursos privados para os investimentos; faltam, isso sim, regras previsíveis, o que é fácil de diagnosticar, mas difícil de resolver. Os problemas são mais sutis do que sugerem as frases de efeito.
Marcos Lisboa
Presidente do Insper, ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda (2003-2005) e doutor em economia.
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