Mais de um mês após sua divulgação, as demonstrações contábeis da Oi ainda causam estranheza. Não pelo fato da empresa ter divulgado um “Ebitda de rotina”; nada de estranho ocorre quando a palavra “Ebitda” é escrita ou pronunciada.
Com quase 60 milhões de clientes, é a maior empresa brasileira de telefonia fixa, um negócio em declínio, e a quarta empresa de telefonia móvel. A Oi é uma empresa em recuperação judicial desde 2016. No início de 2018, um Plano de Recuperação Judicial foi homologado, o que resultou na reestruturação da dívida e aumento de capital da empresa. As consequências disto são as mais diversas possíveis, mas destaco dois aspectos:
a) a composição do endividamento foi substancialmente alterada - no final de 2017 a empresa tinha dívidas de curto prazo de 54,6 bilhões, sendo 39,7 em moeda estrangeira. A dívida líquida total da empresa era de 47,6 bilhões. Um ano depois, a dívida de curto prazo é muito pequena (673 milhões) e a dívida líquida reduziu para 11,8 bilhões.
b) reversão do prejuízo líquido para um substancial lucro líquido - Se em 2017 a empresa teve um prejuízo de 6,4 bilhões (para uma receita de 23,8 bilhões), em 2018 o resultado foi de 24,6 bilhões, para uma receita um pouco menor.
A estranheza contábil está justamente neste dois aspectos. Antes de detalhar, é bom lembrar que o fluxo de caixa das atividades operacionais caiu de 4,4 bilhões para 2,9 bilhões de reais. A margem bruta foi de 37% para 29%, já que a receita caiu e os custos aumentaram. E o patrimônio líquido, que era negativo em 13,8 bilhões, estava positivo no final de dezembro de 2018, em 22,9 bilhões. Parece mágina, mas não é.
A resposta para a mudança está na reestruturação da dívida. Com este fato, o passivo de curto prazo foi parcialmente transformado em passivo de longo prazo. Uma dívida que tinha um valor contábil de 54,6 bilhões passou a valer menos, graças ao acordo judicial. A contrapartida da “redução” da dívida foi uma receita financeira. Assim, conforme a nota explicativa 6 do balanço da empresa, teve um “ganho de reestruturação” de 11,1 bilhões, além de uma mudança no “ajuste a valor presente”, de 13,3 bilhões. Isto somado a uma reversão de 4,1 bilhões e outros valores menores, fez com que a Oi tivesse uma “receita financeira” de 30,95 bilhões. Quando confrontado com as despesas financeiras e outros encargos, tem-se um “resultado financeiro” de 26,6 bilhões de reais. Como o lucro líquido foi de 24,6 bilhões, foi somente com o “resultado financeiro” que a empresa obteve lucro.
O interesse contábil desta história é o fato de que ao renegociar sua dívida, reconhecendo que a empresa não teria condições de honrar seus compromissos, a Oi terminou MELHORANDO seu resultado. As novas condições do endividamento permitiu este fato. Mas isto realmente causa uma certa estranheza.
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