As Big Four conseguiram uma receita anual de 134 bilhões de dólares em 2017, auditando a grande maioria das empresas com ações negociadas na bolsa. Nas 500 empresas que compõe o índice SP500, 497 foram auditadas pelas Big Four. Do FTSE 100, com as maiores empresas inglesas, foram 99 empresas.
Apesar disto, as empresas são cobradas pelas falhas cometidas, como foi, recentemente, o caso da Carillion (KPMG e Deloitte) ou da Steinhoff (Deloitte). Esses dois casos são típicos. Um ex-executivo da Carillion, afirmou que os problemas da empresa já eram perceptíveis desde 2016. O pior é que o auditor não reconhece que cometeu um erro.
A impressão que fica é que o auditor trabalha para a gestão da empresa, não para o empregado ou o investidor ou o governo. E as punições parecem não resolver muito, segundo Prem Sikka.
Sem dúvida que existe uma falta de punição para as situações onde os auditores cometem erros grassos. Aconteceu com a Abengoa, uma empresa espanhola, cujos problemas foram notados por um estudante de 17 anos, mas não pela empresa de auditoria.
Mas esta discussão possui um grande problema: temos uma grande dificuldade de analisar o trabalho de um auditor mesmo a posteriori. Basicamente, o trabalho do auditor pode ter quatro situações típicas. Imagine que o parecer (ou mais modernamente, o relatório) do auditor tenha duas possíveis saídas: limpo ou com ressalvas (ou até mesmo negativo). Se o parecer for limpo e a situação da empresa se mostrar adequada nos próximos meses, podemos dizer que a auditoria fez seu papel. Mas o parecer pode ser com ressalva e realmente a situação da empresa não é das melhores. Também podemos dizer que a auditoria fez seu papel. Estas duas situações são mostradas na figura abaixo no quadrado rosa.
Uma terceira situação é que o parecer foi com ressalva e na verdade a situação estava adequada. A empresa de auditoria errou, mas este é aquele erro “desculpável” já que pode-se argumentar que “ventos favoráveis” ajudaram a empresa. Lembro de um caso muito antigo, quando uma empresa do Paraná adotou pela primeira vez a correção integral no Brasil. O auditor deu um parecer com ressalva, mas o problema foi a visão estreita do auditor, que afirmou que a correção integral não fazia parte dos princípios contábeis brasileiros.
O problema está no quadrante “Parecer limpo, mas a situação é ruim”. Este foi o caso da Abengoa, da Carrillon e de inúmeros outras situações. Mas como dizemos anteriormente, temos dificuldade de analisar o trabalho a posteriori, pois não sabemos o quanto representa este quadrante no total de auditorias realizadas, mas certamente é uma exceção, não a regra. Também não sabemos com precisão os casos que a auditoria fez a ressalva e a situação era realmente ruim.
De qualquer forma, diversas sugestões são apresentadas para tentar melhorar o sistema de auditoria. Uma delas é o rodízio do auditor. Acredita-se que o auditor familiarizado com uma determinada empresa se torne menos eficiente com o tempo. Ou que este auditor termine por vestir a camisa da empresa. Outra possibilidade é aumentar a concorrência do setor, aumentando o número de grandes empresas, como existia no passado. Também alguns imaginam que o problema está nas regras que ou são detalhadas demais ou de menos, dependendo do argumento. Ou que a contratação deveria ser feita pelo governo e não pelas empresas. Ou contratar um seguro contra fraude e as seguradoras seriam responsáveis pela auditoria. Finalmente, poderíamos pensar em um processo de auditoria que fosse independente nas suas partes; em caso de falha de uma das partes, a outra poderia alertar para algum problema. (De certa forma é isto que ocorre hoje com o Conselho de Auditoria e o Relatório do Auditor)
É bem verdade que nenhuma destas situações permite julgar a qualidade do trabalho dos auditores. Afinal, não conseguimos compreender aquilo que não conseguimos medir.
Muito interessante, César. Obrigado por levantar esta questão!
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