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14 setembro 2017

Luta pela materialidade

O International Accounting Standards Board (IASB), entidade que normatiza a contabilidade em mais de 100 países, emitiu orientações no sentido de reduzir o volume das demonstrações contábeis. Segundo afirmou a vice-presidente da entidade, Sue Lloyd, as empresas deverão divulgar o que interessa aos investidores e deixar de lado os pormenores. Ela citou um exemplo:

"Se eu sou um banco, as pessoas realmente se preocupam com minha propriedade, planta e equipamento?"

Ocorrendo isto, muitas páginas deixarão de serem divulgadas. O objetivo é fazer com que os relatórios anuais sejam mais concisos. E isto passa por uma mudança comportamental, afirmou Lloyd.

Em termos práticos, a proposta do Iasb passa por um guia sobre materialidade. A entidade está encorajando as empresas a aplicar julgamento, em lugar de um checklist. A entidade afirmou que “o conceito de materialidade é importante na preparação das demonstrações financeiras, pois ajuda as empresas a determinar que informação incluir ou excluir dos relatórios”. Isto também diz respeito a apresentação, reconhecimento e mensuração. Para isto, a entidade reguladora preparou o guia prático, com exemplos, para ajudar na decisão. E preparou também uma emenda ao IAS 1 e IAS 8, que ficará como minuta até janeiro de 2018.

Outro lado - A iniciativa do Iasb possui quatro grandes problemas, além do aspecto comportamental, citado por Lloyd. Em primeiro lugar, o guia prático não é obrigatório e não altera em nada as normas existentes. Por razões óbvias, as empresas possuem uma cultura legalista e a decisão do que evidenciar é sempre difícil na prática. Isto faz com que a abordagem do checklist é muito mais fácil e prática para o preparador da informação.

O segundo grande problema é que a decisão do que evidenciar passa a ser do preparador da informação. De certa forma é isto que ocorre. Mas temos que relembrar que a contabilidade é um sistema de comunicação e o Iasb está dizendo que o emissor da informação deve selecionar o que dizer. Parece ser muito mais razoável que a decisão do que gostaria de ler seja do usuário, não do preparador. Mas este poder de selecionar o que divulgar é uma tarefa inglória para o preparador, que exige poderes para que este profissional tome esta decisão.
O Iasb talvez tenha esquecido que nos últimos anos o custo de produzir e reproduzir uma informação caiu substancialmente. Assim, divulgar a forma de depreciação num banco tem um custo muito pequeno para uma instituição financeira. Os dois custos mais relevantes na contabilidade moderna são: (1) da publicação em jornais, que ainda é obrigatória em alguns países, e (2) do excesso da informação e dos seus efeitos colaterais, que o Iasb tenta combater com a “não divulgação”. Para o nosso terceiro problema existem alternativas, como focar na divulgação concisa de certas informações, com a possibilidade de um detalhamento para aqueles que desejarem.

O quarto problema é que muito do excesso de informação encontra-se nas próprias normas emitidas pelo Iasb. Por um lado, o regulador diz para reduzir a divulgação com baixa materialidade. De outro lado, emite uma norma do recuperabilidade onde recomenda uma evidenciação detalhada dos parâmetros usados. A conciliação entre os opostos deveria ser feita como lição de casa pelo regulador, antes de descentralizar a responsabilidade pelo problema para as empresas.

Comportamental - Sob a ótica do preparador da informação é muito difícil classificar o que seria material. Veja o exemplo do Instituto Ronald MacDonalds, que divulga suas ações em demonstrações financeiras concisas e bem produzidas. Talvez a maioria dos usuários aprove as informações divulgadas. Mas esta entidade não evidencia os números da contabilidade ou quando faz é de forma parcial. Isto sob o olhar complascente do auditor, que assina e aprova as demonstrações publicadas no site da entidade. Para um usuário as informações divulgadas estão adequadas; para outros, não.

No mundo digital, o usuário já possui ferramentas para selecionar o que é relevante. E existem intermediários que podem fazer esta análise. Qual o sentido de deixar para o preparador a decisão de fazer esta seleção? Se um pesquisador pretende estudar a taxa de depreciação utilizada pelas empresas, saber sobre o tratamento para uma instituição financeira pode ser importante para sua pesquisa.

Apesar de parecer uma medida adequada, focar a atenção na materialidade parece pouco produtivo. As normas estão cada vez mais longas e detalhadas. Permitir que o preparador escolha o que é material talvez traga mais problemas do que soluções.

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