Em muitas demonstrações contábeis divulgadas pelas empresas surge o conceito de Dívida Líquida. No capítulo 4 do volume 2, do nosso livro Curso de Contabilidade Básica, abordamos as principais contas do passivo e apresentamos o cálculo desse e de alguns outros indicadores que o analisam. No final de 2014 já fizemos uma postagem sobre o assunto também (veja no link), mas é sempre bom voltar a esse tema.
Tradicionalmente consideramos o passivo como o valor das dívidas de uma empresa. Entretanto, algumas obrigações apresentam algum tipo de ônus, mas isto não ocorre com outros passivos. Um empréstimo gera pagamento de despesas financeiras; já numa obrigação com o fornecedor isto não ocorre. No primeiro caso, temos um passivo com ônus ou passivo oneroso; no segundo exemplo, é uma situação onde temos um passivo não oneroso.
A dívida bruta corresponde ao total dos passivos onerosos de uma empresa. É a soma dos empréstimos, financiamentos, debêntures e qualquer outro tipo de passivo que gera despesa financeira. Muitas empresas podem ter um determinado valor de dívida bruta, mas também podem ter recursos financeiros de elevada liquidez capazes de quitar esta dívida. Surge, então, o conceito de dívida líquida, que corresponde à dívida bruta menos caixa e equivalentes.
Pela sua natureza, a dívida líquida pode ser positiva ou negativa. Em algumas situações, pode ser uma informação valiosa sobre a empresa. Em outras, pode levar a enganos, já que induz ao pensamento de que a empresa usará todo o caixa e equivalentes para quitar estas obrigações. E, muitas vezes, o caixa e equivalentes já estão comprometidos, no planejamento financeiro da empresa, com algum tipo de desembolso futuro.
Veja a seguir algumas informações da Neoenergia, uma empresa do setor elétrico, retiradas do balanço do exercício findo em 31/12/2016:
O Ativo Total da empresa era de quase 28 bilhões, para o PL de 9,3 bilhões. Isto significa um passivo de R$18,7 bilhões. Mas como nem todo passivo é oneroso, a empresa apresentou um valor de dívida bruta de 11,347 bilhões.
Aqui uma ressalva importante: como não existe uma definição normativa para desse termo, cada empresa pode calcular o valor da dívida bruta que achar mais adequado. Se considerarmos no balanço patrimonial da empresa somente “empréstimos, financiamentos e encargos” e “debêntures”, tanto a curto quanto a longo prazo, o valor total seria um pouco maior, de 11,96 bilhões.
Como o valor de “caixa e equivalentes” foi de 1,383 bilhões, o valor da dívida líquida seria:
Dívida Líquida = 11,347 – 1,383 = 9,964 bilhões
Observe que o valor que calculamos aqui também é um pouco maior que aquele constante da figura. Novamente, a empresa pode realizar os cálculos da forma que achar mais conveniente. Se usarmos os valores do balanço somente, o valor da dívida líquida seria de 10,577 bilhões ou 693 milhões a mais.
Na figura, é possível observar que a empresa ainda usa tal conceito para calcular dois “indicadores financeiros da dívida”. A relação entre “dívida líquida/Ebitda” mostra que a empresa tem capacidade de quitar o passivo oneroso com o caixa gerado por suas atividades operacionais. Já o endividamento demonstra quanto do ativo está sendo financiado com capital de terceiros. Como o valor da dívida líquida calculado e apresentado na figura foi menor, isso gera uma situação mais favorável para a empresa.
Finalmente, este texto mostra que devemos olhar com cuidado as informações analíticas que a empresa fornece nos resultados. Nesse exemplo da Neoenergia, usar o valor fornecido pela empresa subestimaria a dívida da empresa.
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