Ao assistir a transmissão de um jogo de xadrez é interessante perceber a emoção dos jogadores. É isto mesmo. Apesar de ser um jogo cerebral, no tabuleiro tem seres humanos mexendo as peças. Ontem aconteceu um fato no torneio de candidatos em Moscou que mostra isto.
Para esclarecer, o torneio de candidatos atualmente está sendo disputado entre oito dos mais fortes jogadores do mundo. São dois russos, dois dos EUA e um da Armênia, Índia, Holanda e Bulgária, jogando todos contra todos e o melhor colocado irá desafiar o atual campeão mundial, o norueguês Carlsen. Das catorze partidas, seis já foram disputadas.
O jogo era entre Nakamura, dos EUA, e Aronian, da Armênia. Enquanto Aronian estava entre os primeiros com uma vitória e quatro empates, Nakamura tinha quatro empates e uma derrota. A partida já estava no seu final e uma pequena vantagem para Aronian, que jogava com as peças brancas. Em outras palavras, a partida deveria terminar em empate ou vitória para Aronian.
Existem duas regras que o leitor precisa conhecer. A primeira é “peça tocava, peça movida” impõe que quando o jogador segura uma das peças ele deve obrigatoriamente fazer a sua jogada com esta peça. Se ele pegou no rei, o rei deve ser movido, não outra peça. A segunda peça é que o jogador pode arrumar suas peças quando estas estiverem mal colocadas no tabuleiro. Para isto deve falar “j´adoube” para deixar claro que não irá mover a peça e sim arrumá-la no tabuleiro.
A jogada estava com as pretas (Nakamura). A fotografia a seguir mostra o jogador tocando no seu rei. Ou seja, deveria ser a peça a ser movida. O problema é que qualquer movimentação do rei traria a derrota quase que imediata de Nakamura.
Assim que tocou no rei, Nakamura parece ter percebido que esta não seria uma jogada boa. E retirou rapidamente a mão da peça, insinuando que estava arrumando a peça:
Mas Aronian reclamou da atitude de Nakamura. Este olha espantado para seu adversário, não compreendendo o que estava se passando. Ou fazendo de conta que não estava entendendo o que Aronian queria dizer.
A seguir Aronian abre os braços, reclamando da atitude de Nakamura.
Ao lado dos jogadores o juiz, que observa o que esta ocorrendo. Aronian dirige ao árbitro com sua reclamação, enquanto Nakamura espera. Enquanto o juiz age, Aronian levanta e sai.
O juiz determina que Nakamura deva jogar com o rei, conforme a regra. Ele se abaixa e começa a pensar na posição. A expressão é de frustação. Logo depois faz sua jogada e em menos de dez jogadas reconhece que a partida está perdida.
Com a vitória Aronian passa a dividir a liderança do torneio, com quatro pontos em seis possíveis. Nakamura tem somente dois pontos em seis e está em oitavo. Suas chances são reduzidas de vencer o torneio, já que faltam oito partidas.
Qual deveria ser a atitude de Aronian? Ser cavaleiro e aceitar o engano de Nakamura, fingindo acreditar que o americano estava arrumando as peças? Esta foi a opinião do presidente da Association of Chess Professionals, Emil Sutovsky. Seria elegante, sem dúvida, mas ele está disputando o direito de ser o desafiante ao campeão. Mas Nakamura fingiu que estava arrumando a peças e sua atitude foi questionável. Perder a partida, como ocorreu, praticamente afasta da possibilidade de vencer o torneio.
Um fato depõe contra Nakamura. Numa disputa ocorrida em 2015 contra outro jogador, Ian Nepomniachtchi, exatamente para selecionar os participantes do torneio atual, Nakamura fez um movimento, o roque, com as duas mãos, também proibido nas regras. Naquele momento, a reclamação de Ian não foi levada em consideração e ele perdeu o jogo. (Nota: como era um jogo rápido, mover com as duas mãos economiza o tempo do jogador, dando um vantagem para ele)
Xadrez, emoção, comportamento.
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