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No amplo universo dos clichês tributários, o maior deles é a presunção de que tributo é responsável por todos os males ou instrumento capaz de prover todos os remédios. As desigualdades, de todos os matizes, são chagas que ameaçam a coesão social. Nenhum governo, com um mínimo de responsabilidade social, pode abdicar do propósito de enfrentá-las. É um equívoco, todavia, pretender que a política tributária seja um meio eficaz para alcançar esse objetivo, pois não há evidências que deem sustentação à tese.
As proposições que vinculam tributo à redução das desigualdades, como as de Thomas Piketty (“O capital no século XXI”), são de uma impressionante ingenuidade. Presumem que os contribuintes são incapazes de reagir às pretensões de aumento da tributação e abdicam da mobilidade que a globalização propicia ou dos sempre eficientes serviços dos planejadores tributários.
As mudanças recentes no perfil das desigualdades brasileiras estiveram claramente ligadas à estabilidade monetária, às transferências de renda, às regras de reajuste do salário mínimo, ao aumento na oferta de empregos, etc. Nada que lembre, ainda que remotamente, a política tributária.
A despeito disso, não há como negar que os privilégios tributários das aplicações financeiras, inclusive no mercado de renda variável, tanto quanto os subsídios creditícios concedidos pelo BNDES, são mecanismos ostensivos de acumulação de capital que devem ser revistos.
Outro clichê muito difundido é qualificar como regressivos ou progressivos os sistemas tributários, com base em prevalência da tributação da renda ou do consumo, especialmente quando se tem em conta que a tributação do consumo no Brasil – aliás, infelizmente – pouco se assemelha à de outros países. Alguns qualificam as contribuições do PIS e da Cofins como tributos incidentes sobre o consumo, e não sobre a renda, embora tenham, em relação ao Imposto de Renda, a mesma base de cálculo, no regime cumulativo, e muita semelhança, como atesta farta jurisprudência administrativa e judicial, no regime não cumulativo.
À luz dessa hipótese insubsistente, concluem que a tributação no Brasil é regressiva. Se aquelas contribuições, contudo, forem contabilizadas no campo da tributação da renda, a conclusão simplesmente se inverte. O que, no meu entender, também não autoriza afirmar que a tributação brasileira é progressiva.
Essas inferências são de um simplismo comovente. Já é tempo de abandonarmos falsas teorias e clichês.
Sobre jabuticabas e clichês- Everardo Maciel
Fonte: O Estado de S. Paulo, 5/11/2015
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