Danilo Fariello, Geralda Doca, Cristiane Bonfanti e Henrique Gomes Batista
O Globo, 12/12/2014
Dinheiro quitará dívida com Eletrobras. Para analistas, medida resolve "esqueleto" criado por MP do Setor Elétrico
Antes
da posse da nova equipe econômica, que promete ser mais austera, o
governo federal valeu-se de mais uma manobra para reforçar o caixa da
Petrobras e aliviar as contas da Eletrobras, que também enfrenta
dificuldades financeiras. A empresa do setor elétrico tem dívida de
cerca de R$ 9 bilhões junto à petroleira decorrente do fornecimento de
combustível para as usinas térmicas da Região Norte. Com a operação,
confirmada ontem pelo ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, e
antecipada pela "Folha de S. Paulo", o governo vai autorizar a Petrobras
a captar recursos no mercado por meio de papeis lastreados nessa dívida
e com a garantia do Tesouro. Como possui uma dívida de R$ 6 bilhões com
a Eletrobras, o Tesouro vai bancar a maior parte dessa operação. A
emissão de títulos deve ocorrer ainda neste ano.
Segundo analistas,
além de afetar as contas públicas, a operação mostra que há esqueletos
que podem representar trabalho adicional ao futuro ministro Joaquim
Levy. A dívida da Eletrobras remonta à decisão da presidente Dilma
Rousseff de baratear a conta de luz em 2012 por meio da Medida
Provisória 579. Nivalde de Castro, da UFRJ, lembra que o governo tentou
desonerar a conta de luz tirando encargos como a chamada CCC (Conta de
Consumo de Combustíveis) - atual Conta de Desenvolvimento Energético
(CDE) - que era uma forma de todos os consumidores subsidiarem a energia
elétrica de alguns estados da Região Norte, que têm geração de energia
mais cara, a diesel e óleo.
Para que não houvesse grande diferença
tarifária entre estes clientes e o resto do país, o valor arrecadado
pela CCC diretamente pela Eletrobras compensava a compra de combustível
da Petrobras para quitar esta conta. Mas com a extinção da CCC, a conta
ficou para ser paga pelo Tesouro Nacional.
Segundo Lobão, R$ 6
bilhões do total da emissão referem-se a valores que o governo federal
já deveria ter transferido. A previsão do governo não é de desembolso
imediato . Esses valores e seus custos deverão ser parcelados em até 120
meses, sendo posteriormente pagos pelos consumidores de energia
elétrica ou pelo Tesouro Nacional, por meio da CDE.bb vê "oportunidade"Imersa
em uma grave crise, a Petrobras poderá, por meio desta operação, captar
recursos sem ter de aumentar sua dívida líquida. Sem esse aval do
governo, a Petrobras correria o risco de não conseguir levantar os
recursos ou ter de pagar juros muito elevados em razão das denúncias de
corrupção.
- Assina-se o contrato de reconhecimento da dívida entre
Eletrobras e Petrobras com o aval do Tesouro Nacional e aí a Petrobras
vai ao mercado financeiro emitir papel. Com a garantia do Tesouro -
explicou Lobão.
O presidente do Banco do Brasil, Aldemir Bendine,
disse ontem que as instituições financeiras brasileiras têm apetite em
participar da operação.
- É uma oportunidade para os bancos, já que a
Petrobras não vai conseguir captar no mercado externo. É a maior
empresa brasileira, mas que está com dificuldade em acessar o mercado
externo. Vai ter um interesse óbvio - afirmou ontem, apos encontro anual
da Federação Brasileira dos Bancos (Febraban).
Para Bendine, a operação não oferece risco:
-
A empresa não publicou balanço por causa do processo de investigação.
Mas todos os bancos brasileiros conhecem a situação de caixa da
Petrobras.
Para a professora de Economia Margarida Gutierrez, da UFRJ, o governo não tinha outra solução:
-
Trata-se de um problema criado no passado, o governo tinha de assumir
este esqueleto, pois a outra alternativa, não fazer nada, significaria
quebrar de vez o setor elétrico. Mas isso mostra os graves problemas do
setor elétrico brasileiro - disse.
pagamento de terceirizados
Raul Velloso, especialista em contas públicas, destaca que estes esqueletos serão um desafio a mais para as contas públicas:
-
Há vários esqueletos rondando o governo, que só conhecemos na hora que
saem do armário. Temos de enfrentá-los, mas o importante é matá-los de
vez, e não deixar estes esqueletos vivos, gerando filhotes que serão
novos problemas no futuro - disse.
Ontem, a ministra do Planejamento,
Miriam Belchior, que é conselheira da Petrobras, disse que os
investimentos no pré-sal terão continuidade e que o patamar atual do
preço do petróleo - que fechou a US$ 63,68 ontem - permite a manutenção
da carteira de negócios da empresa.
O governo quer ainda que a
Petrobras assuma as dívidas com trabalhadores terceirizados de empresas
prestadoras de serviço, cujos contratos estão sendo revistos por
suspeitas de irregularidades apontadas na operação Lava-Jato. A medida,
defendida pelas centrais sindicais, prevê que a Petrobras deposite os
valores devidos, numa espécie de adiantamento, e depois desconte as
quantias do montante a ser pago a esses fornecedores. Os trabalhadores
seriam beneficiados porque poderão receber mais rapidamente, sem
precisar recorrer à Justiça.
Para firmar um acordo com abrangência
nacional, o Planalto quer o aval do Ministério Público e da
Advocacia-Geral da União (AGU). Os detalhes serão discutidos na próxima
segunda-feira em reunião coordenada pelo ministro da Casa Civil, Aloizio
Mercadante, com a presença das autoridades envolvidas e sindicalistas.
Anteontem,
trabalhadores das obras da Refinaria de Abreu e Lima (PE) conseguiram
fechar um acordo para o recebimento das verbas trabalhistas, em
audiência no Tribunal Regional do Trabalho (6ª região), com o sindicato
da categoria, a Petrobras e as empresas contratadas. Segundo a Força
Sindical, há problemas com trabalhadores terceirizados de prestadores de
serviço da Petrobras na Bahia, no Rio Grande do Sul e no Rio (Comperj).
Cerca
de mil trabalhadores do estaleiro Enseada Indústria Naval realizaram
passeata ontem no centro comercial de Salvador e ato em frente à sede
regional da Petrobras, em protesto contra 470 demissões no estaleiro,
localizado em Maragogipe. O estaleiro tem entre os sócios companhias que
estão sendo investigadas na Operação Lava-Jato, como Odebrecht, OAS e
UTC.
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