Já postamos aqui no blog sobre a década de 70. No seu
início, as normas do Banco Central e as resoluções do CFC mudaram a face da
auditoria brasileira. Além disto, precederam as mudanças contábeis da lei
6.404, já em1976.
Nesta postagem iremos comentar sobre os anos finais da
década de setenta. A rigor não ocorreu nenhum grande evento neste curto período
de tempo. Mas a pesquisa em documentos daquele período é possível perceber a
consolidação de algumas empresas especializadas em treinamento contábil, entre
as quais o IOB, IOPEC, Mapa Fiscal entre outras (1). Estas entidades promovem
uma serie de cursos de aperfeiçoamento, com assuntos como contabilidade custos,
correção monetária e análise de balanços. Nestes cursos, a presença de nomes
ainda hoje conhecidos: Eliseu Martins, Sérgio de Iudicidus, Edson Riccio e Dante
Matarazzo. Além disto, surge a Fipecafi, uma fundação de apoio do departamento
de contabilidade da USP.
Mas a pesquisa revela algumas surpresas interessantes, que
listarei a seguir.
Primeiros balanços
com a correção monetária
A Lei 6.404 trouxe o mecanismo da correção monetária,
bastante inovador (2). Entretanto este sistema de correção será incompreendido durante
anos. No primeiro semestre de 1979 apresentaram uma redução no lucro. Veja o
que disse uma reportagem do jornal Estado de S Paulo daquele período:
A redução das margens de
lucro é porém mais aparente que real, segundo analistas do mercado de capitais.
Em grande parte a contabilidade caiu em consequência dos critérios contábeis
introduzidos pela lei das Sociedades Anônimas e que praticamente criou um novo
conceito de lucro, ao permitir a correção monetária do balanço (3).
Poderíamos contrapor as grandes bobagens das afirmações
acima. Mas basicamente é possível afirmar que o lucro é realmente existente e
considera as perdas e ganhos monetários com a inflação daquele momento.
Profissão Contábil
A atuação do CFC no início da década, com aprovação de
normas de auditoria, permitiu um fortalecimento desta entidade. Mas no final da
década, alguns percalços. Uma proposta de Lelio Lauretti teve destaque e por
pouco não interferiu nas atribuições do contabilista, em prol dos economistas (4).
Lauretti defendia que as informações contábeis deveriam estar acompanhadas do
certificado de auditoria contábil e de um parecer de análise econômico-financeira,
assinado por um economista sem vinculo com a empresa, mas registrado no
conselho.
Ao mesmo tempo, o Conselho Federal de Educação rechaça a
proposta de unificar os currículos dos cursos de Economia, Administração e
Contabilidade (5). Segundo este conselho, os cursos devem ser paralelos. O
Conselho Federal de Educação respondeu a uma preocupação do Conselho de
Economia sobre uma pretendida unificação dos currículos.
Computador na
Contabilidade
O computador ter sido introduzido na contabilidade brasileira
no início do século, através da importação das máquinas Hollerith (6), que
ajudavam na folha de pagamento, por exemplo. Mas no final da década de 79
surgem os primeiros computadores pessoais, que ainda não seriam usados na nossa
área. Mas já existia uma popularização das máquinas; alguns escritórios de
contabilidade, mais avançados, já faziam a contabilidade por contador.
Junto com isto, começa a existir uma preocupação com a
auditoria neste tipo de ambiente. Nesta época surgem os primeiros encontros de
profissionais que debatem estes assuntos. Em junho de 1979 ocorreu uma
conferência do Instituto of Internal Audits nos Estados Unidos, que contou com
a participação do professor Loureiro Gil (7).
Um aspecto interessante que encontrei nas minhas pesquisas:
Foi em 1950 que
ocorreu a primeira incursão dessa empresa [IBM] na utilização do computador na
indústria privada, com o lançamento de uma série
de máquinas de contabilidade chamada CPC. (8)
Contabilidade e
Futebol
Finalmente, para distração do leitor, dois casos curiosos
envolvendo futebol. O primeiro diz respeito ao jogador Clodoaldo, que atuava no
Santos e foi titular da seleção de 70. Comentando sobre o jogador, que estava
prestes de sair do Santos, o presidente do clube, Rubens Quintas, fez o
seguinte comentário:
Não posso rescindir o
contrato, ao mesmo tempo, dar passe livre ao Clodoaldo. Afinal, consta na
contabilidade do clube que o “passe” de Clodoaldo custou 1,3 milhão de
cruzeiros [moeda da época], quando todos sabem que ele veio de graça para o
Santos. Quer dizer, quando o clube sofria prejuízos, os ex-dirigentes lançavam
em cima do Clodô (9)
Entendeu? Confesso que também não entendi nada.
Outro aspecto curioso. Ao comentar sobre a Copa do Mundo de
1978, mais especificamente do grupo 1, que tinha Argentina, França, Hungria e
Itália, um texto jornalístico procurou fez uma reportagem sobre um jovem
artilheiro que tinha sido comprado recentemente por cinco milhões de dólares
pela Juventus. Filho de uma família de classe média de Arezzo, o jogador
planejava terminar, nos próximos meses, aos 20 anos de idade, o curso de
contabilidade. Afirmava ele:
Afinal, sou jovem e
preciso cuidar do meu futuro (10)
Nome do artilheiro: o carrasco Paolo Rossi (11), que
brilharia na copa de 1982, no estádio de Sariá (12).
Referências
(1) Estas empresas também criavam material didático para o
profissional. O Mapa Fiscal chegou a venda a Enciclopedia Contábil Mapa Fiscal.
Anunciada como uma ideia inédita que estaria revolucionando o mundo da
contabilidade, continha três mil fichas, “com todos os lançamentos contábeis
existentes”. Vide, por exemplo, propaganda O Estado de S Paulo, 28 de setembro
de 1978, ed. 31.760, p. 39.
(2) Vide sobre ele em NIYAMA, Jorge Katsumi; SILVA, César A.
Tibúrcio. Teoria da Contabilidade, São Paulo: Atlas, 2013.
(3) Correção reduz lucro aparente de banco em 79. O Estado
de S Paulo, 29 de agosto de 1979, ed. 32042, p. 21.
(4) LAURETTI, Lelio. A defesa do parecer de análise econômica.
O Estado de S Paulo, 10 de julho de 1979, ed 32076, p. 66.
(5) Alterado critério para o diploma. O Estado de S. Paulo,
29 de agosto de 1979, ed 32042, p. 10.
(6) Comentamos sobre isto na postagem em homenagem a Valetim.
Vide aqui
(7) EUA: congresso sobre auditorias em computador. O Estado
de S Paulo, 1 de abril de 1979, ed 31916, p. 55.
(8) FREGNI, Edson. Computação eletrônica. O Estado de S
Paulo, 25 de novembro de 1979, ed 32117, p. 231. Grifo nosso, destacando a
coincidência (será?) entre o nome da máquina e a entidade contábil.
(9) Clodô rescinde o seu contrato. O Estado de S Paulo, ed.
32066, 26 de setembro de 1979, p. 22.
(10) Um artilheiro que condena a própria fama. O Estado de S
Paulo, ed. 31.660, 2 de junho de 1978, p. 20.
(11) Vide aqui.
(12) Vide aqui
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