Glover Teixeira, estrela em ascensão no mundo das artes marciais mistas (MMA), foi embora do Brasil para treinar nos Estados Unidos. Quando perguntado por uma repórter sobre o porquê da mudança, ele disse que precisava de um pneu de trator, para treinar, que custa R$ 2 mil no Brasil. Nos Estados Unidos, o mesmo pneu custa cento e poucos dólares, e rapidamente estava à disposição dele para treinos.
Todo mundo sabe que tudo custa muito caro no Brasil, muito mais caro que no resto do mundo. Mas o que a história do Glover deixa claro é o custo social de se viver num país com essa condição. Imagine a quantidade de atletas que param de treinar ou não tornam competitivos porque os equipamentos são caros demais; a de meninos que não viram grandes pianistas, porque piano no Brasil custa três vezes o preço cobrado no resto do mundo; a de Airton Sennas que não passam de promessas, porque, no Brasil, um kart e seus custos de manutenção são 2,5 vezes maiores, e por aí vai.
Mas esse custo social invisível não se restringe a isso, há também um efeito toque de Midas muito ruim para a produtividade do país: quando alguém consegue fazer um produto entrar nas fronteiras do país, ele, instantaneamente, tem o valor de mercado duplicado ou triplicado. O contrabando torna-se extremamente lucrativo, e uma larga parcela da população deixa de usar seu potencial criativo e produtivo na produção de bens e serviços para tentar achar brechas no curral imposto pela Receita Federal, e lucrar com o efeito toque de Midas. Quem conhece a Feira dos Importados em Brasília sabe do que eu estou falando.
O fato é que não é por acaso que tudo no Brasil custa muito caro. Há toda uma arquitetura econômica deliberadamente construída que é responsável por isso. Do sistema tributário ao tamanho do setor público, da falta de concorrência em muitos setores à herança de uma mentalidade pró-substituição de importações (em que importar é intrinsecamente errado, e quem insistir no erro deve ser punido), tudo contribui para que o Brasil seja um país muito caro.
O Brasil tem quase que por tradição um imenso setor público, e uma pretensão de ter um Estado de bem-estar social à la países nórdicos, com saúde pública e educação universais, larga rede de proteção social etc. Tudo isso custa caro e tem que ser pago com impostos.
Com uma razão arrecadação/PNB se aproximando dos 40%, o Brasil fica bem acima de países como Chile (18,4%), México (17,4%) e Estados Unidos (24,1%) e bem próximo das vedetes mundiais de proteção social, como Noruega (42,9%) e Suécia (46,7%).
Mas, diferentemente desses países, que concentram a tributação em impostos diretos, sobretudo no Imposto de Renda, nosso sistema tributário ainda é típico de país terceiro-mundista, com altíssimo percentual de impostos indiretos no total da arrecadação. No Brasil, 48,4% do total arrecadado vem na forma de impostos indiretos, contra 27,5% na Noruega.
Mas se os impostos indiretos, como o IPI ou o ICMS, são exatamente aqueles que fazem os bens ficarem mais caros, e se há um enorme custo social no convívio com preços tão altos, por que, então, o Brasil não faz como o mundo desenvolvido e tributa mais a renda e menos os bens? Porque tributar os consumo de bens é muito mais fácil do que tributar a renda.
No Brasil, quase a metade do mercado de trabalho é informal. Uma maior tributação sobre a renda seguramente levaria a uma informalidade ainda maior. Mas, além disso, boa parte da metade que é formal não paga um único centavo de Imposto de Renda, porque cai na faixa de isenção, que vai de zero a aproximadamente R$ 1.600 mensais. Como esse é também o valor de nossa renda per capita, o indivíduo mediano simplesmente não paga IR no Brasil.
De um grupo selecionado de 100 países com alguma estrutura tributária civilizada, 45 não têm faixa de isenção alguma do Imposto de Renda. Dos 55 que têm isenção, o Brasil é um dos mais generosos, com uma razão limite de isenção do IR/renda per capita de 100%. Para efeito de comparação, na Noruega essa razão fica em torno de 6%; ou seja, quem ganha 6% da renda per capita já começa a pagar Imposto de Renda.
Então, como é possível sustentar um governo que gasta quase 40% do PNB, com uma arrecadação de tributos diretos insuficiente? Basta enfiar impostos indiretos nos bens que a população compra. Mas que fique tudo nebuloso, porque se ela souber o quanto paga de impostos quando vai às compras, seria capaz de sair às ruas revoltada em passeatas de protesto.
Enquanto isso, o efeito toque de Midas corre solto. Um borracheiro estava me dizendo que quem tem carros grandes, como picapes Hilux, S10 etc., tem ido até o Paraguai na hora de trocar os pneus. Um jogo custa R$ 4 mil no Brasil, contra R$ 1,7 mil no Paraguai. “Mas tem que cortar os cabelinhos do pneu, doutor, senão a Receita descobre que o pneu é novo e aí já era.”
Fonte: aqui
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