Nos anos 80, do século XIX, a Companhia Paulista, uma
estrada de ferro, publicava regularmente suas demonstrações, com periodicidade
semestral (1). O relatório da diretoria apresentado aos acionistas constava da
apuração do lucro, a proposta de distribuição de dividendos, a quantidade de
mercadorias transportadas, pagamentos de empréstimos, obras futuras, entre
outras.
É bem verdade que as informações contábeis são reduzidas. O
que corresponderia a atual Demonstração do Resultado possuía duas três linhas:
receitas, despesas e o saldo. Indicava também a relação entre despesa e
receita, que no caso da Cia Paulista atingia 39%. Esta elevada lucratividade
pode estar mascarada pela ausência da depreciação. Sobre a contabilidade,
somente uma observação (em linguagem da época): “está em dia esta parte do
serviço como podeis verificar pelos annexos ns. 3 e 4, e pelos livros, que
estão à vossa disposição.” E só.
Profissional
O profissional da contabilidade era denominado de
guarda-livros. Aqui cabe uma observação: alguns autores confundem a denominação
“contador”, existente desde a descoberta do Brasil. Este termo não corresponde
a profissão, mas uma função da administração pública. Em 1882, por exemplo, o
contador José Julio Dreys é o diretor de contabilidade do Tesouro Nacional (2).
Contabilidade Pública
Apesar da existência de legislação sugerindo a adoção do
regime de competência, o setor público ainda funcionava pelo caixa. Após o
encerramento da Guerra do Paraguai, que consumiu uma grande quantidade de recursos
nos anos 60, os relatórios da contabilidade pública apresentavam contínuos déficits.
Ademais, tudo leva a crer que existia uma grande desorganização nas contas
públicas (3). Em 1884 o governo nomeou uma comissão para compilar todas as
disposições e regulamentos da contabilidade do tesouro, tomando providências
para uniformizar a legislação (4). O presidente da comissão nomeada foi o Barão
de Paranapiacaba, que indicaria os demais membros.
Antes disto, o governo chegou a enviar para Europa um
conselheiro para estudar o serviço de
contabilidade e a organização do tesouro (5)
Ensino
Além das aulas particulares, a contabilidade era ensinada em
colégios e internatos, inclusive em escolas técnicas. E a contabilidade era
ensinada para homens e mulheres, garotos e adultos. O interessante é que o
ensino ocorria junto com matérias como leitura, caligrafia, ortografia e
gramática. Em 1884, por exemplo, o Collegio Paulistano anunciava que seu estabelecimento,
localizado na Rua do Barão de Itapetininga 6, na cidade de São Paulo, aceitava
no curso geral o ensinamento de contabilidade (6). O mesmo ocorria em outro
anuncio, onde a instrução primária considerava a leitura, caligrafia,
contabilidade e desenho linear (7).
Livro
Em 1883 é lançada a obra Manual
do Escriptorio, de Ildefonso de Sousa Cunha, como 153 páginas. O autor era
um guarda-livros que atuava no Rio de Janeiro, que depois passou a ser
negociante de fazendas, miudezas e ferragens (8). Anteriormente tinha publicado
Guia Theórico e prático da escripturação commercial
ou a escripturação a alcance de todos.
Também um autor deste período foi Jeronymo Joaquim de Oliveira,
que também era guarda-livros e escreveu o Compêndio
Commercial, publicado em Campos, no estado do Rio de Janeiro. O livro teve
duas edições, a primeira de 1878 e a segunda de 1887, três anos antes do seu
falecimento.
Finalmente, outro autor foi João Baptista da Silva Sobrinho,
empregado do tesouro nacional e docente do Collegio de Pedro II. Escreveu duas
obras na área: Noções elementares de
Escripturação Mercantil e Escripturação
Mercantil. O primeiro, de 24 páginas, publicado em 1882; o segundo, com 141
páginas, de 1885, que recebeu uma segunda edição em 1890.
(1) Vide, por exemplo, Correio Paulistano, edição 6979,
1880, p. 1-2, para o relatório submetido à assembleia de 29 de fevereiro de
1880.
(2) Correio Paulistano, edição 7651, 1882, p. 2.
(3) Correio Paulistano, edição 7689, 1882, p. 2. Conforme o
texto do jornal: “lamentamos a verdadeira desordem que do systema em voga,
resulta para a contabilidade”.
(4) Conforme notícia da Gazeta de Notícias e Correio do Rio,
publicada no Correio Paulistano, edição 8234, 1884, p. 3. É interessante notar
que esta comissão foi designada após a publicação da Lei de 20 de janeiro de
1883, que organizou a tesouraria e a contabilidade geral. Vide Correio
Paulistano, edição 8381, p.1, 1884.
(5) A Constituinte, edição 286, p. 3, 1880. Trata-se do
conselheiro João José do Rosario.
(6) Correio Paulistano, edição 8536, p. 3, 1884. A escola
anunciava que a diretora era “norte-americana”.
(7) Correio Paulistano, edição 8600, p. 2, 1885. Tratava-se
de um curso noturno, para adultos e menores, localizado na rua do Commercio.
(8) Esta informação e as seguintes foram retiradas do
Diccionário Bibliographico Brazileiro, de Augusto Victorino Alves Sacramento
Blake, publicado em 1895, pela Imprensa Nacional.
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