O organismo regulador do mercado acionário norte-americano iniciou processo administrativo contra os braços chineses das grandes empresas mundiais de auditoria, sob a acusação de que elas se recusaram a entregar documentos exigidos em investigações de fraudes contábeis.
O caso revela divergências entre os governos dos dois países em relação ao grau de transparência de companhias abertas e poderá inviabilizar a negociação de ações de empresas da China em Bolsas dos Estados Unidos.
As auditoras sustentam que são impedidas pela legislação chinesa de apresentar a documentação exigida, que é classificada como "segredo de Estado" - um amplo e nebuloso conceito usado pelo governo como instrumento de controle político e econômico.
Patrick Chovanec, professor da Universidade Tsinghua, considera que o impasse entre a SEC e as autoridades de Pequim é um "Armageddon contábil", que poderá obrigar o cancelamento do registro em Bolsas norte-americanas de todas as companhias abertas chinesas, incluindo pesos pesados como Sinopec, China Unicom e China Life.
Anunciada anteontem, a ofensiva da Securities and Exchange Commission (SEC) atinge as operações chinesas da BDO e das quatro gigantes globais de autoria: Deloitte Touche Tohmatsu, Ernst & Young, KPMG e PricewaterhouseCoopers.
As cinco empresas são acusadas de violar legislação do mercado acionário, segundo a qual firmas estrangeiras de contabilidade devem atender às solicitações da SEC de papéis de auditoria relativos a qualquer companhia listada em Bolsas dos EUA.
Segundo nota publicada no site da SEC, os documentos foram requeridos na investigação de nove empresas chinesas que têm ações no mercado americano. As cinco auditoras se recusaram a atender à solicitação.
O diretor da Divisão de Sanções da SEC, Robert Khuzami, afirmou que o acesso aos papeis é essencial para o organismo cumprir sua função de proteger os investidores de fraudes contábeis. "Firmas que realizam auditorias sabendo que não podem cumprir as leis que exigem acesso a esses papeis de trabalho enfrentam sérias punições."
Ofensiva. Paul Gillis, professor de contabilidade da Universidade de Pequim, diz que a ofensiva da SEC marca o começo do processo de cancelamento dos registros dos braços chineses das empresas de auditoria junto aos órgãos reguladores norte-americanos, o que provavelmente também levará à saída das companhias chinesas das Bolsas dos Estados Unidos.
Chovanec e Gillis observaram que as restrições no acesso a documentos contábeis pode afetar companhias multinacionais que atuam na China e precisam auditar suas operações locais. Para fazer o trabalho, as firmas de autoria precisam estar registradas no Public Company Accounting Oversight Board (PCAOB), um organismo subordinado à SEC. Mas é pouco provável que obtenham ou mantenham esse status caso sejam condenadas sob a acusação de desrespeitarem a legislação norte-americana.
A PricewaterhouseCoopers divulgou nota na qual afirma que há um conflito entre as leis dos EUA e da China, que precisa ser resolvido pelos governos dos países. A Deloitte lamentou que os as autoridades não tenham conseguido chegar a um acordo sobre o assunto, mas se disse esperar que uma solução "diplomática" seja alcançada.
Segundo Chovanec, os gestores dos braços chineses das auditorias foram alertados pelas autoridades de Pequim de que poderão ser condenados à prisão perpétua caso entreguem documentos que obtiveram no exercício de seu trabalho.
CLÁUDIA TREVISAN, CORRESPONDENTE /PEQUIM - O Estado de S.Paulo - 5 de dez de 2012
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