Com 49 dias de prazo na apresentação do balanço do segundo trimestre, a Rossi Residencial divulgou, no fim da noite de quarta-feira, uma revisão dos dados do resultado prévio do período, entregue em 15 de agosto. O novo balanço teve alterações em praticamente todas as linhas contábeis e ainda não passou pela auditoria independente, assim como a prévia apresentada há um mês e meio.
Em comunicado enviado à CVM (Comissão de Valores Mobiliários), a empresa afirmou que modificou suas práticas contábeis para um padrão mais "conservador". A adoção de tais práticas levou a empresa a revisar os resultados não apenas do segundo trimestre, mas todos desde 2009, já que o ciclo da construção é, em média, de três a cinco anos.
As informações trouxeram alguma luz, mas levantaram ainda mais dúvidas entre analistas e investidores sobre a real situação das finanças da Rossi. A incorporadora informou ter realizado ajustes totais de R$ 715,3 milhões em 30 de junho. O grosso dessa revisão, 85%, veio de uma mudança cobrada pela Deloitte, sua nova auditoria. Até o período anterior, a Rossi era auditada pela Ernst & Young Terco.
O prejuízo líquido do segundo trimestre, de R$ 9,06 milhões, virou lucro de R$ 51,3 milhões
A apropriação dos resultados e custos da parte do terreno e da incorporação de um mesmo empreendimento eram feitas de forma separada. Os números das duas etapas entravam em momentos distintos no balanço e elas tinham até margens operacionais diferentes, por serem registradas por SPE's (Sociedades com Propósitos Específicos) diferentes. Agora, as receitas e custos presumidos de um mesmo empreendimento passam a entrar juntos. A nova regra é retroativa aos últimos três anos.
Com isso, a empresa melhorou os resultados da primeira metade deste ano, mas piorou os dados referentes a 2011, 2010 e 2009. "Na prática, eles tiraram receita do passado e jogaram mais receita no presente", afirma Flávio Conde, analista da CGD Securities.
(...) O impacto negativo dos reajustes foi sentido diretamente no patrimônio líquido. Os lucros contabilizados em anos anteriores, partindo de receitas presumidas, foram estornados. Em 30 de junho, o patrimônio líquido, de R$ 2,79 bilhões na prévia de agosto, caiu para R$ 2,075 bilhões, queda de 25%. "A conclusão é que a empresa vale R$ 700 milhões a menos", afirma Conde.
Esse é o ponto mais grave também na visão de Eduardo Silveira, analista da BES Securities. "Essa baixa no PL foi maior do que a gente esperava". O analista comparou com empresas que passaram por problemas financeiros semelhantes recentemente e que estão fazendo operações de aumento de capital em valores equivalentes aos impactos dos estouros de orçamentos. A Brookfield faz uma capitalização de R$ 400 milhões, enquanto a PDG realiza uma operação de R$ 800 milhões. Como a Rossi anunciou que prepara um aumento de capital de R$ 500 milhões, o mercado esperava, no máximo, reajustes dessa ordem.
Outro índice que chamou a atenção do analista foi a alavancagem (endividamento líquido sobre patrimônio líquido). Como as dívidas foram ajustadas para cima e o patrimônio líquido para baixo, esse índice subiu. No segundo trimestre, foi revisado de 108% para 148,5%.
Rossi Residencial muda balanço e adota "padrão mais conservador" - 5 de Outubro de 2012 - Valor Econômico - Ana Fernandes
Ainda segundo o Valor Econômico (De olho no futuro se esquece o passado - Fernando Torres)
Tudo indica que não foi a Rossi que escolheu mudar suas práticas contábeis. Afinal, ter de republicar balanços não é algo desejável para nenhuma companhia. Se ela fez isso, portanto, foi por conta de pressão do auditor. (...)
Nos últimos anos, a empresa usou um sistema de reconhecimento de receita que a favoreceu. Ela divulgou margens brutas compatíveis com a das concorrentes, mas usando um critério que a favorecia perante as rivais.
Como os terrenos são registrados no balanço pelo custo histórico, a margem ligada a eles já costuma ser maior que a do serviço de incorporação. Com o salto recente no valor de mercado dos terrenos nas grandes cidades, e com a queda nas margens de incorporação por conta da elevação dos custos de mão de obra, essa diferença foi duplamente acentuada nos últimos anos.
Enquanto as rivais amargavam quedas de margem por conta de estouro de orçamento na incorporação, a Rossi tinha no reconhecimento antecipado dos terrenos, com margem maior, um fator que sustentava seus resultados na parte superior da média do mercado.
Agora que se aproxima o período da entrega da maior parte dos empreendimentos, em que a tendência das margens era diminuir (para abaixo da média do setor, para compensar o efeito positivo anterior), já que o peso da incorporação seria maior no resultado total, em detrimento dos terrenos, ela muda a prática contábil.
Fazendo o ajuste retroativo, quem olhar o passado verá que as margens da empresa não eram tão boas quanto pareciam. Mas passado é passado. Daqui para frente, chamarão mais atenção as novas margens que serão divulgadas.
Outro texto explora a questão da bolha (A bolha estourou e acabou a folia contábil no setor - Nelson Niero)
Não se sabe ainda se existe uma bolha no setor imobiliário brasileiro, mas uma coisa parece certa: existia uma bolha contábil e ela já estourou. (...)
Um auditor se abstém de dar opinião quando não obteve comprovação suficiente para fundamentar seu parecer. Ou seja, depois de quase 50 dias, a Deloitte não sabia ainda o que fazer dos números da Rossi.
10 outubro 2012
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