A condenação de Kátia Rabello, José Roberto Salgado e Vinícius Samarane, três executivos graduados do Banco Rural, terá reflexo importante em coibir o que está se repetindo de forma assustadora: bancos quebram e são salvos pelo Fundo Garantidor de Crédito (FGC). Como a operação fica parecendo uma venda, os banqueiros não são punidos. A decisão do STF ajudará a mudar isso.
Cinco bancos quebraram nos últimos anos. Matone, Schahin, Morada, PanAmericano e Cruzeiro do Sul. Em alguns deles as fraudes são gritantes.
No Proer do governo Fernando Henrique, os bens dos donos e dirigentes ficavam indisponíveis e até hoje alguns ex-banqueiros correm o risco de enfrentar a execução da dívida pelo Banco Central. Os donos e administradores dos bancos que quebram hoje são beneficiados pela engenharia financeira da operação montada pelo Fundo Garantidor de Crédito.
Os controladores e dirigentes dos bancos Matone e Schahin escaparam com facilidade. O FGC emprestou dinheiro a quem comprou os bancos. No caso do Matone, o grupo JBS recebeu R$ 800 milhões, com juros facilitados, a perder de vista, para assumir o banco quebrado. Como ficou parecendo uma compra, não houve problema para quem quebrou o banco.
O PanAmericano inventou carteiras de ativos que não tinha. O nome disso é fraude. Pior, o banco atraiu a Caixa Econômica para o buraco [1]. A instituição pública pagou R$ 700 milhões para ser sócia de um banco quebrado, no qual teve que fazer altos aportes. O Fundo Garantidor de Crédito absorveu um prejuízo de R$ 4 bilhões e vendeu o banco para o BTG Pactual. Os bens dos donos e administradores do PanAmericano não ficaram indisponíveis, como ocorreria se fosse no velho Proer [2].
Isso começou a mudar quando o Juiz Marcelo Costenaro Cavali, da 6a. Vara Federal Criminal de São Paulo, aceitou, dias atrás, a denúncia contra dois ex-dirigentes e 15 funcionários do PanAme-ricano. Eles foram acusados pelo Ministério Público e responderão por crime contra o Sistema Financeiro Nacional. A condenação dos dirigentes do Banco Rural por gestão fraudulenta reforçará na Justiça o entendimento de que é necessário rigor contra esse tipo de crime. [3]
Os pontos-chave
1Quebrar banco estava virando [4] crime perfeito no Brasil, sem punições e com salvamento do FGC
2 A decisão do STF de condenar executivos do banco Rural vai ajudar a mudar esse quadro
3 Os dirigentes de bancos vão redobrar a atenção na administração de bens de terceiros sob seus cuidados
Tipo de crime.
No caso do Cruzeiro do Sul, houve também fraude, balanços maquiados, invenção de ativos. O Fundo Garantidor está agora negociando com os credores. Se eles aceitarem a proposta do FGC, o prejuízo será rateado: a maior parte da conta será paga pelo Fundo; outra parte, pelos credores.
Segundo o FGC, como o Cruzeiro do Sul deu prejuízo a terceiros — os investidores nacionais e internacionais — seus dirigentes poderão responder a processos. E as investigações sobre o que houve continua na Polícia Federal, Banco Central e CVM.
No PanAmericano, falta explicar por que a Caixa entrou de sócia num banco quebrado. Como a análise dos ativos que ela fez (a due diligence) não percebeu o rombo? Perguntas que nunca vão calar. Oficialmente, o banco foi vendido. Essa simulação de uma operação "de mercado’,’ com o buraco sendo coberto pelo FGC, beneficia quem quebrou o banco. Espera-se que tudo mude agora que o STF mostrou rigor com o caso do Banco Rural.
Sem punição poderia ocorrer o moral hazard, a desmoralização da lei. Isso incentivaria a fraude. Quebrar um banco estava virando o crime perfeito, porque bastava entregar a batata quente nas mãos do FGC. Com a decisão do STF, os dirigentes de bancos passarão a redobrar seus cuidados na administração dos bens de terceiros que estão sob seus cuidados. Isso tornará o mercado financeiro mais saudável e sólido.
STF e o crime financeiro - 9 de Setembro de 2012 - O Globo - Miriam Leitão
[1] Parece até que a Caixa foi inocente na história. Foi gananciosa, querendo ganhar mercado a qualquer custo.
[2] Quem diria que o governo do partido que tanto condenava os banqueiros pudesse favorecê-los tanto...
[3] Vejam os comentários na postagem "Banco Rural"
[4] Sempre foi, não?
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