Com a entrada em vigor da nova Lei de Defesa da Concorrência, Lei nº 12.529, de 30 de novembro, o Brasil deixou de fazer parte de um pequeno grupo de países, como Egito e Paquistão, que ainda conta com o sistema de análise posterior de atos de concentração.
Passa a valer no Brasil o sistema de controle prévio de concentrações, segundo o qual um negócio jurídico (entre eles, fusão, aquisição ou incorporação), que preencha o critério legal de pelo menos um dos grupos envolvidos na operação ter registrado faturamento bruto anual ou volume de negócios total no país, no ano anterior à operação, equivalente ou superior a R$ 400 milhões e pelo menos um outro grupo envolvido na operação ter registrado R$ 30 milhões, não poderá ser consumado se não for previamente aprovado pelo Cade.
A adoção do sistema de notificação prévia de atos de concentração está em linha com as melhores práticas internacionais e vai ao encontro das jurisdições que contam com os órgãos antitrustes mais experientes e respeitados no mundo: a Divisão Antitruste do Departamento de Justiça e a Federal Trade Commission (Estados Unidos) e a Diretoria Geral de Concorrência (União Europeia).
O novo sistema tende a ser mais eficaz na tutela do interesse público e mais eficiente sob o aspecto econômico, pois, sendo a aprovação pelo Cade condição para a realização do negócio jurídico, as empresas tendem a prestar as informações e esclarecimentos sobre a operação, de modo célere e completo, sempre com vistas a obter a aprovação no menor prazo possível.
O novo sistema tende a ser mais eficaz na tutela do interesse público
Apesar de a lei estabelecer apenas o prazo máximo para que o Cade profira decisão em ato de concentração (330 dias), a autoridade antitruste já sinalizou que pretende ter como meta analisar os casos simples, que representam mais de 70% das operações, em até 30 dias. O prazo de 330 dias serviria para a análise das operações de alta complexidade, que historicamente representam uma pequena fração dos atos julgados pelo Cade. Se confirmada na prática tal meta, o Brasil estará em linha com o teto de análise de atos de concentração simples tanto nos Estados Unidos (30 dias) quanto na União Europeia (25 dias úteis).
O esperado sucesso do novo sistema de controle de concentrações, por sua vez, está diretamente relacionado ao reforço que terá o Cade em seu quadro funcional e em seu orçamento. Nesse sentido, a lei criou 200 cargos de técnicos para atuarem junto ao Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência, dos quais, até o momento, já se tem notícia da autorização de concurso para 50 técnicos - número modesto ante o desafio a ser enfrentado.
Além disso, uma série de aperfeiçoamentos, somados ao reforço de recursos humanos e de orçamento do Cade, teriam o condão de trazer maior celeridade e segurança jurídica à análise dos atos de concentração.
Entre tais medidas, que independem de lei para serem adotadas, destaca-se a necessidade de maior clareza à identificação das operações que devem ser submetidas ao crivo do Cade, especialmente aquelas que envolvam fundos de investimento, aquisição de participação minoritária ou aquisição de ações em bolsa, mas que não façam parte de uma oferta pública de ações (OPA). Outra medida refere-se à sinalização por parte do Cade da definição de contratos associativos e de quais modalidades de consórcios e joint ventures deverão ser submetidos à análise antitruste.
Infelizmente, a incerteza quanto à identificação do dever de notificar tais operações ao Cade exigirá a submissão de inúmeros negócios jurídicos inaptos a gerar qualquer efeito prejudicial à livre concorrência.
Nesse contexto, é imperioso destacar que o Cade já sinalizou que irá expedir resoluções tratando dessas questões, bem como de outros pontos de relevo, entre eles a definição de grupo econômico para a análise do conhecimento de operações e o procedimento de notificação de operações envolvendo OPAs.
Afinal, se por um lado são grandes os desafios para o devido funcionamento do controle prévio de concentrações, por outro lado não tem sido menor o empenho da autoridade antitruste em preparar o novo Cade para o sistema que se inicia. Há muito ainda a se fazer e o diálogo entre as autoridades e a sociedade civil permanecerá elemento essencial para o aperfeiçoamento do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência.
Fonte: Autor(es): Vicente Bagnoli e Eduardo C. Anders
Valor Econômico - 29/05/2012 - Vicente Bagnoli e Eduardo Caminati Anders são, respectivamente, professor adjunto da Faculdade de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie, membro da Comissão de Estudos da Concorrência e Regulação Econômica da OAB-SP, conselheiro do Ibrac e advogado; e presidente da Comissão de Estudos da Concorrência e Regulação Econômica da OAB-SP, membro do IDSA, conselheiro do Ibrac e advogado.
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