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10 abril 2012

Millôr

O falecimento do humorista Millôr deixou o país mais triste. Minha principal lembrança dele como autor foi a "análise" que ele fez de um livro de Sarney. Vale a pena a leitura,  do Millôr obviamente, mas para aqueles que querem um resumo, o articulista Sérgio Augusto o fez no jornal de sábado:

"Não se pode confiar o destino de um povo, sobretudo neste momento especialmente difícil, a um homem que escreve isso [Brejal dos Guajás]", ponderou o humorista, acrescentando que em qualquer país civilizado Brejal seria motivo para impeachment. "Não tendo no cérebro os dois bits mínimos para orientá-lo na concordância entre sujeito e verbo, entre frase e frase, entre ideia e ideia, como exigir dele um programa de governo coerente pelo menos por 24 horas? [Sarney era presidente da república. Com "p" minúsculo]" Mais que uma indagação, uma presságio.

E teve início a implacável desconstrução, acompanhada com avidez e às gargalhadas pelos leitores do JB. Enredo inconsistente, tentativa poética lamentável, filosofia ridícula, personagens mais rasos que um pires, solecismos em penca, ideias que nunca se complementam e sempre se contradizem - não sobrou tijolo sobre tijolo na demolição executada por Millôr.

A cidade, nos cafundós do Maranhão, onde se desenrola a ação, não tem escola, mas tem professores e alunos; não tem telégrafo mas transmite e recebe telegramas; não tem edifícios públicos, mas tem prefeitura, câmara de vereadores, juizado de casamento, dois cartórios, afora mercado, lojas, igreja da matriz. Em suas duas únicas ruas, de apenas 120 casas, moram 12.683 pessoas (ou 105 pessoas por casa, pelas contas do Millôr), protegidas por uma força pública de 12 policiais (relativamente ao Rio teria que ter meio milhão de policiais). O realismo fantástico custou, mas chegou ao Maranhão.

"Errado da primeira à última frase", segundo o Saint-Beuve do Méier, nem o título de Brejal dos Guajás fazia sentido. Sir Ney confundiu as tribos dos Guajás com a dos Guajajaras.

Na antepenúltima exegese, o pândego crítico permitiu-se o luxo de copidescar toda a primeira página do relato respeitando o estilo do autor, mudando léxico e sintaxe só quando fundamental. Dá para conferir tudo no Millôr Online, hospedado no UOL, ou, parcialmente, no verbete Brejal dos Guajás de A Bíblia do Caos, editado pela L&PM. Foi inspirado na magnum opus ficcional de sir Sarney (Os Maribondos de Fogo era de poesia) que Millôr nos legou uma de suas tiradas mais geniais: "É um desses livros que quando você larga não consegue mais pegar."

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