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17 abril 2012

Entrevista com Michel Shermer


Fundador da revista "Skeptic", diretor-executivo da Skeptics Society, colunista da revista "Scientific American" e professor da Claremont University, na Califórnia, o cientista americano Michael Shermer é um destes autores aos quais, para o bem ou para o mal, não se pode ficar indiferente.

Shermer é um radical defensor da ciência como único método válido de explicação do mundo e adepto de um ceticismo científico que se desenvolve a partir de descobertas recentes das neurociências. É dessa imbricação entre neurociência e ceticismo que ele propõe sua principal teoria: a de que o cérebro é feito para acreditar em qualquer tipo de coisa, sejam verdadeiras ou não. O ceticismo seria, então, o único remédio contra essa compulsão à crença que leva o ser humano a crer, até mesmo, em coisas estranhas, como anuncia o título do único livro do cientista traduzido no Brasil: "Por Que as Pessoas Acreditam em Coisas Estranhas" (JSN Editora).

Crítico do relativismo, do criacionismo que se expande nos Estados Unidos e de toda forma de fé religiosa, Shermer reconhece, no ceticismo que prega, a necessidade de relativizar seu discurso, quando afirma, nesta entrevista: "Nós devemos ser céticos em relação à neurociência, à ciência e até mesmo ao ceticismo!"

Valor: Seu novo livro, recém-lançado nos EUA ("The Believing Brain") começa com uma narrativa pessoal sobre as suas crenças. Em que acredita alguém que se define como cético?

Michael Shermer: Ser cético significa que você precisa de evidências antes de acreditar em algo. Evidências confiáveis, claro. Céticos são pessoas que pensam como cientistas, sempre buscando evidências. Mas não é preciso ser cientista para ser cético. Escrevi um capítulo sobre as minhas crenças pessoais, sobre a época em que eu acreditava em Deus, na religião, nos fenômenos paranormais e sobrenaturais e outras coisas desse tipo. Até que me tornei um cientista e aprendi a pensar de forma crítica, cética e científica e resolvi procurar evidências para as minhas crenças. Quando fiz isso, deixei de acreditar nos fenômenos sobrenaturais e paranormais, em Deus, na religião etc. Mas o ponto principal do livro é sobre o fato de que todos nós temos nossas crenças, pois o cérebro funciona de maneira a estabelecer crenças e reforçá-las como verdades.

Valor: O seu ceticismo é um método de levar a dúvida até a última consequência? Haverá sempre algo a duvidar?

Shermer: O objetivo do ceticismo é entender como o mundo funciona. O mundo sempre será como ele é; não importa como queremos que ele seja. O problema é que nosso cérebro está programado para estabelecer crenças e reforçá-las como verdades absolutas, e não é assim que o mundo funciona. O objetivo da ciência é tentar superar essa tendência cognitiva a acreditar, essa tendência a acreditar em coisas nas quais queremos acreditar mesmo quando não existem evidências.

Valor: O senhor acha que acreditar em Deus também é parte dessa tendência? Como explicar a fé religiosa?

Shermer: Nosso cérebro é programado pela evolução para acreditar em todo tipo de coisa, não importa se são verdadeiras ou não, só pela possibilidade de serem verdadeiras. E nós procuramos evidências que se encaixem naquilo em que já decidimos acreditar. Por exemplo, se você é católico e acredita em Deus, só vai procurar evidências que reforcem essa crença e vai ignorar qualquer outra evidência que vá contra isso. Na ciência, isso não é permitido. Você é obrigado a procurar as evidências contrárias à sua teoria. Se você não fizer isso, outra pessoa vai fazer.

Valor: Ainda haveria motivos para o debate sobre o valor da ciência em relação ao valor da religião como forma de explicação do mundo?

Shermer: A ciência é uma maneira de explicar o mundo natural, de tentar entender por que o mundo é assim, utilizando métodos confiáveis. Não importa se eu, você ou alguém na Índia tem uma teoria, todos nós podemos usar um método para verificar se ela é verdadeira ou não. Um exemplo: uma pessoa nascida na Índia provavelmente vai seguir a religião hindu, uma pessoa no Brasil provavelmente vai ser católica, e uma pessoa nascida no Sul dos EUA provavelmente será da religião batista. Portanto, o local onde você nasce vai determinar qual será sua religião, em qual deus você vai acreditar. Na ciência, digamos na física, por exemplo, é diferente. Não existe a física da Índia, do Brasil ou dos EUA. Existe simplesmente a física

Valor:No Brasil, seu único livro traduzido é "Por Que as Pessoas Acreditam em Coisas Estranhas". A resposta para isso está no cérebro?

Shermer: Sim, o cérebro não consegue viver sem acreditar em nada. Temos que acreditar em diversas coisas para conseguir levantar da cama de manhã, sair de casa para trabalhar. Nós estabelecemos várias crenças e temos que fazer isso para sobreviver. Todos os animais fazem isso. Nós estabelecemos associações, conexões, aprendemos, ligamos A a B, criamos padrões, isso é um processo normal para todos nós. Mas sem a ciência é impossível saber se nossas crenças são verdadeiras ou não. O que a ciência faz é trazer um conhecimento confiável, determinar se uma teoria é verdadeira ou não. Uma teoria não é verdadeira só porque você acredita nela. Ela é ou não é verdadeira.

Valor: Como conciliar seu ceticismo com alegações de que nossos cérebros são, do ponto de vista da neurociência, programados para acreditar? Ou por que não ser cético sobre neurociência também?

Shermer: Devemos ser céticos em relação à neurociência, à ciência e até mesmo ao ceticismo! Não há problema em ser cético sobre tudo. Não há vacas sagradas. No entanto, é importante notar que isso não significa que vale tudo e que todas as "teorias" têm o mesmo valor científico. Toda pessoa tem direito às próprias opiniões, mas nem todo mundo tem direito aos próprios fatos.

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