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30 dezembro 2011

A Era Pós-Ocidental

Separei alguns trechos da entrevista ao Valor Econômico do cientista político frânces, Dominique Moïsi, que considera que a centralidade ocidental, que durou 250 anos, não é mais a mesma. Moïsi é autor do livro "A Geopolítica das Emoções" (foto), dentre outros.

Valor: Do ponto de vista cultural, como será o mundo pós-ocidental? Critérios estéticos, fundamentos teóricos e valores ético-políticos de hoje são herdeiros de um período bem específico que foi a "modernidade ocidental".

Moïsi: Tenho grande paixão por essa questão. De tudo o que ela contém, o principal é a universalidade. Será que os chineses vão construir uma universalidade para sua forma de ser e pensar? Hoje, a China está centrada em suas questões e não olha o resto do mundo. Uma superpotência global pode se manter assim? E será que é possível se desenvolver sem democracia? Parece que sim, mas acho que não é possível sem o estado de direito. As teorias que relacionam democracia e capitalismo, vê-se agora, não necessariamente estão certas. Os asiáticos querem consumir como nós, mas será que vão querer ser governados como nós?

Valor: Mas, além da ascensão da China, os focos de irradiação cultural e poder político se multiplicam. Antes era só um, o ocidental.

Moïsi: Isso é interessantíssimo e tento desenvolver o assunto no livro que estou escrevendo e provavelmente vai se chamar "O Ocidente na Era Pós-Ocidental". O objetivo é demonstrar aos ocidentais que eles perderam o monopólio dos modelos que detiveram por 250 anos. Isso tem consequências até raciais, porque, até recentemente, a superioridade do branco parecia mais ou menos evidente e nunca mais vai ser assim. É interessante pensar como mesmo no Brasil a questão é importante. Foi, afinal, o último grande país a abolir a escravidão. E embora tenha desenvolvido toda uma narrativa de miscigenação racial e sobretudo cultural, até hoje, quanto mais escura for a pele de uma pessoa, maior é sua chance de sofrer violência.

Valor: A expansão da classe média do mundo emergente suscita outra questão. Diz-se, não sem razão, que é impossível que sete bilhões de pessoas consumam tanto quanto os ocidentais. Mas quem haveria de renunciar ao consumo?

Moïsi: É verdade que seria insustentável. O que vejo de positivo é que, na arte japonesa, e na chinesa também, o homem é representado como parte da natureza, muito integrado. Em que pesem as indústrias altamente poluentes da China e o desastre nuclear no Japão, talvez esses países contribuam com uma mudança de mentalidade. Por sinal, essa questão também é uma oportunidade única para o Brasil: o aumento enorme no consumo de recursos naturais.

Valor: Mas pode-se imaginar a emergência de um capitalismo menos consumista?

Moïsi: Por enquanto, é improvável. Os asiáticos, apesar de tudo, querem poder consumir mais. Se 1 bilhão de chineses comerem tanta carne quanto 300 milhões de americanos, a natureza sofrerá. Eles sonham em consumir como os ocidentais e nosso pesadelo é trabalhar como eles. O que me incomoda é que, no último século, houve uma enorme evolução tecnológica, mas não uma evolução moral. Ganhamos 20 anos de expectativa de vida, mas o que vamos fazer com isso? Não vivemos melhor e o mundo parece mais incerto e instável, embora com instrumentos de governança melhores, mais acesso à informação e menos violência.

Fonte:A geopolítica das placas tectônicas - Por Diego Viana De São Paulo
Valor Econômico , 23/12/2011

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