O IFRS, padrão internacional de contabilidade adotado no Brasil, ainda não atingiu um de seus principais objetivos – o de facilitar a comparação entre empresas de diferentes nacionalidades.[1]. Pelo menos, não na visão de alguns profissionais de relações com investidores de companhias abertas brasileiras.
Uma pesquisa da auditoria e consultoria Deloitte em parceira com o Instituto Brasileiro de Relações com Investidores (Ibri) mostrou que apenas 24% dos profissionais de relações com investidores acreditam que as demonstrações financeiras ficaram mais facilmente comparáveis entre os países, competidores e indústrias a partir da adoção do IFRS. A maioria não tem opinião sobre o assunto (60%) ou não acha que a comparação ficou mais fácil (16%).[1]
“Enquanto o Japão e os Estados Unidos não adotarem as normas internacionais, os profissionais de RI não vão sentir com força a melhoria na comparabilidade entre as empresas”, avalia o presidente-executivo do Ibri, Ricardo Florence. [2]
O levantamento buscou revelar os impactos da adoção do IFRS na área de RI das empresas. A pesquisa envolveu 46 companhias, com faturamento total de R$ 40 bilhões, dentre cerca de 380 empresas com ações na bolsa. Os questionários foram respondidos voluntariamente entre abril e junho deste ano pelos profissionais das áreas de RI e o resultado foi divulgado ontem durante 13º Encontro Nacional de Relações com Investidores e Mercado de Capitais, em São Paulo, organizado pelo Ibri e pela Abrasca (Associação Brasileira das Companhias Abertas).
Quase 40% das empresas responderam que ainda é cedo para avaliar se a adoção ao IFRS melhorou o acesso a linhas de crédito internacional, aumentou a geração de negócios ou reduziu o custo de capital. [3]
Por outro lado, 58% dos profissionais de relações com investidores apontaram a ampliação da transparência nas demonstrações financeiras como principal fator positivo já observado no mercado e nas organizações. [4]
“Há mais disponibilidade de informação, inclusive um maior detalhamento setorial a partir do IFRS. Mas, mesmo que seja uma linguagem única, a comparabilidade nunca será perfeita”, disse Bruce Mescher, sócio da Deloitte.
A pesquisa apontou ainda que a adesão ao IFRS exigiu mais investimentos das empresas na área de relações com investidores. A parcela de companhias que gastou mais de R$ 2 milhões ao ano em atividades de RI subiu de 7%, em 2009, para 12%, em 2010.
No mesmo período, o percentual de empresas que gastou entre R$ 500 mil e R$ 1 milhão caiu de 19% para 16%. A parcela de companhias que investiram de R$ 1 milhão a R$ 2 milhões diminuiu, também de 19% para 16%.
“Companhias de pequeno e médio porte passaram a gastar mais com as áreas de RI”, explica Mescher. “Cresceram os gastos com pessoal, tecnologia e programas de apresentação de resultados.
Na Gerdau, por exemplo, alguns desses aspectos têm sido encarados como desafio para a empresa se ajustar às normas do IFRS. “Para um profissional interpretar, julgar e aplicar a norma é preciso que tenha bagagem importante sobre a legislação. Também não basta ter conhecimento técnico, é preciso ter vivência na empresa”, diz Geraldo Toffanello, diretor contábil da Gerdau. “O grupo de profissionais e a retenção dos talentos estão entre os maiores desafios da companhia.” [5]
O depoimento de Toffanello foi dado no primeiro painel do encontro de RIs, que ainda debateu os impactos da implementação das novas normas contábeis e os principais problemas encontrados nos balanços.
Para Iara Pasian, diretora da Deloitte, o processo de implantação das novas normas já deixou uma série de lições para as companhias de energia. A consultora mencionou como exemplo que os novos padrões não alteram o fluxo de caixa das empresas, mas modificam a apresentação dos dividendos pagos aos investidores. Iara ainda ressaltou que a grande polêmica para a indústria de energia diz respeito à indenização sobre o valor residual da infraestrutura no fim do período de concessão. [6]
As polêmicas não se restringiram ao setor elétrico. Alexandre Labetta, sócio da Ernst & Young Terco, lembrou que as incorporadoras imobiliárias ainda esperam novo pronunciamento do Iasb sobre o reconhecimento de receitas de imóveis vendidos na planta – se durante o andamento das obras de construção ou apenas na entrega das chaves. As incorporadoras hoje reconhecem as vendas no decorrer da construção.
Arthur Gigueira Júnior, superintendente financeiro e de normas contábeis do Santander, Enio Bonafé, diretor da Delos Finanças e membro do Experts Advisory Panel do Iasb, e o professor da USP Eliseu Martins salientaram que as polêmicas visam identificar que modelo contábil melhor representa a “essência” das companhias. Ou seja, “como aproximar a norma contábil da realidade econômica das empresas”.
Fonte: Denise Carvalho e Marina Falcão, Valor Economico
Comentários de Pedro Correia:
[1]Em verdade, existem diversos GAAP's nacionais "disfarçados" de IFRS.No Brasil, é interessante observar a redação do caput 3º da Instrução ICVM 457/2007 :
“(…) uma declaração explícita e sem reservas de que estas demonstrações estão em conformidade com as normas internacionais de contabilidade emitidas pelo IASB e também de acordo com as práticas contábeis adotadas no Brasil”.
Os CPC's são normas que não são as IFRS traduzidas "palavra-por-palavra".Além disso, foram editadas pela CVM de acordo com as práticas contábeis adotadas no Brasil.Esta situação ocorre em diversos países.Assim,o aumento da comparabilidade é pífio.
[2]A percepção dos investidores será que a entrada de Japão e EUA dará mais credibilidade para as IFRS.
[3]São questões relevantes, no entanto, sem evidências empíricas acerca do impacto das novas normas.
[4]Tenho dúvidas em relação ao aumento da transparência das demonstrações financeiras.
[5]A subjetividade das novas normas irá exigir profissionais cada vez mais qualificados.Em verdade, é preciso entender o fenômeno contábil e a essência econômica do evento.
[6] As discussões sobre a contabilidade das empresas que detêm concessões do Estado e as IFRS são muito interessantes.Leia mais aqui, aqui e aqui
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