O legado de Bachelier – Por Isabel Sales
Acho que todo pesquisador já passou por isso: Às vezes escrevemos um artigo com todo o afinco, temos certeza de que será publicado com louros e honrarias, mas o contrário ocorre. Outras vezes submetemos um paper só porque ainda não estouramos o limite de artigos naquele congresso e esse é o trabalho aprovado e bem qualificado. Tenho uma amiga que teve uma pesquisa recusada em certo lugar, mas concorreu a melhor da área em outras (e boas) vizinhanças. Vá entender!
Não que eu queira comparar, só estava criando uma leve ambientação numa segunda-feira pós-feriado!!! Mas então tá. Tenhamos em mente que o julgamento dos nossos pares nem sempre nos acrescenta e que seguir os nossos ideais certamente é mais importante que algumas tradições ou que se encaixar em algum tipo de regra invisível de boa conduta.
Hoje eu estava lendo o livro The (Mis)behavior of Markets dos autores Benoit Mandelbrot e Richard L. Hudson (no Brasil: Mercados Financeiros Fora de Controle, editora Campus BB) que conta a interessante história de Bachelier (acometido pelo grande fardo de todo gênio: não foi reconhecido em sua época).
Louis Bachelier foi um matemático francês que defendeu, em março de 1900, a sua tese intitulada “Théorie de la spéculation" que (é claro!) causou pouca impressão em seus professores. Seu orientador era o famoso matemático Henri Poincaré, que avaliou o trabalho de seu pupilo da seguinte forma: “o assunto escolhido pelo senhor Bachelier está um pouco distante daqueles usualmente tratados por nossos candidatos”. A menção foi um respeitável “mention honorable” e não o “très honorable” que teria garantido a Bachelier um bilhete de primeira classe para uma carreira majestosa na matemática.
Até um brasileiro que não desiste nunca (!!!) teria deixado isso de lado, mas não o senhor Bachelier. Ele passou os próximos 27 anos batalhando por reconhecimento da academia francesa. O rapaz acreditava mesmo em seus ideais!
Você nunca ouviu falar desse matemático antes? Pois bem. Essa tese simplesmente estabeleceu alguns dos fundamentos das finanças. Com base nas questões que ele formulou foi construída uma teoria de mercados, investimentos e finanças compreensiva e elaborada (como os preços variam, como os investidores pensam, como administrar seu dinheiro, como definir risco).
Ele morreu desconhecido. Mas, como destacado por Benoit Mandelbrot e Richard L. Hudson, felizmente a tese de Bachelier foi publicada em um importante periódico (cerca de meio século após a defesa) salvando-o do esquecimento. Hum... Daria um bom filme. Mas calma! Não para por aí.
Em 1965 o nome de Bachelier reapareceu na economia como um precursor reconhecido na tese de precificação de opções do economista estudante do Massachusetts Institute of Technology – MIT: Paul A. Samuelson. Posteriormente ninguém menos que Eugene F. Fama, um estudante da Universidade de Chicago, discutiu com seu orientador as ideias de Bachelier além do modelo de incrementos independentes dos preços e subsequentemente elaborou a Hipótese de Eficiência de Mercado.
Um respeitável economista da MIT, Paul H. Cootner, afirma que o Bachelier foi tão “extraordinário em seu trabalho que podemos dizer que o estudo dos preços especulativos teve o seu momento de glória no momento de sua concepção”.
Outra leitura interessante é o livro “o mito dos mercados racionais”, que já foi objeto de resenha aqui no blog. Para quem quiser ler mais, a tese de Bachelier foi transformada em um livro em inglês e está a venda pela Amazon nesse link.
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