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22 novembro 2010

Auditoria no setor público: motolâncias

Auditoria do Sistema Nacional de Auditoria (Denasus), órgão de fiscalização do Ministério da Saúde, aponta que a aquisição de motolâncias (motocicletas equipadas com equipamento de primeiros socorros, para atendimentos rápidos) pelo Serviço de Atendimento Móvel de Emergências (Samu) 192 transformou-se em porta aberta para toda sorte de irregularidades. O documento obtido com exclusividade pelo GLOBO mostra que 400 motolâncias, adquiridas em 2008 por R$6 milhões, foram entregues sem condições de salvar um infartado ou mesmo de auxiliar no primeiro atendimento a vítimas de acidentes de trânsito. Também há suspeita de superfaturamento para a realização de evento em Brasília com o objetivo de promover o programa, além de pagamentos não explicados pelo trabalho de supostos consultores técnicos.

Segundo a auditoria, os veículos adquiridos para dar mais velocidade ao atendimento chegaram ao destino sem desfibrilador, oxímetro e cilindro de oxigênio, descumprindo a portaria 2.971 do Ministério da Saúde, que regulamenta o atendimento por motolâncias. Aliada à dificuldades para formar condutores (que têm que ser paramédicos), a entrega das motos “peladas” fez com que inúmeros equipamentos ficassem parados ou estocados, alguns até hoje.

Em Brasília, a rede Samu recebeu 22 motos, mas só usa dez. O coordenador dos motociclistas de atendimento de urgência, Marcos Machado, diz que os 12 aparelhos parados integram a “reserva técnica”. Para compensar a falta dos equipamentos elementares de atendimento, o coordenador deu um “jeitinho”:

— O Ministério da Saúde não entregou os equipamentos nem aqui nem em nenhum outro lugar. As nossas motos foram equipadas com o material que tinha no almoxarifado, que eu adaptei. Hoje, conseguimos fazer os atendimentos graças a isso, garantindo bons resultados.

Machado explica ainda que para o sistema dele funcionar é preciso acionar sempre duas motos ao mesmo tempo.

— Como não há espaço para tudo, o oxigênio e o desfibrilador seguem numa moto. Na outra, nós levamos o restante do material — diz.

Enquanto Brasília tem uma “reserva técnica” superior à frota rodando, em Goiânia (GO) faltam motolâncias. As 11 motos que a prefeitura recebeu entraram em operação em março deste ano, após um ano e meio mofando na garagem.

— Agora, estamos com todas as motos na rua. São cinco equipes. Até já pedimos mais ao ministério — informa.

Suspeita de superfaturamento em transporte de motos

As motos que chegaram a Goiânia e Brasília fazem parte de um lote de 51 motolâncias entregues em 2008 pela Rontam, montadora de Tatuí (SP), ao Ministério da Saúde. Essas motos foram usadas em cerimônia realizada no pátio do ministério, em dezembro desse ano, para promover o sistema. O seu transporte de São Paulo a Brasília custou R$51 mil, R$1 mil por unidade.

Mas, inicialmente, o preço orçado para o transporte era de R$430 por unidade. O novo valor foi questionado em troca de e-mails entre servidores da Saúde. Os auditores constataram “indicativos de superfaturamento” e recomendaram investigação para apurar “responsabilidade e reparação do suposto prejuízo ao erário”. Até hoje, entretanto, nenhum processo administrativo foi instaurado.

Para o evento, o ministério gastou R$12 mil com a montagem do aparato para a entrega simbólica das motolâncias. Mas os auditores não encontraram documentos básicos, como as notas fiscais dos serviços.


Motolâncias levam irregularidades na garupa - 22 Nov 2010 - O Globo - Roberto Maltchik

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