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07 agosto 2009

Propina

O governo dos Estados Unidos intensificou muito nos últimos anos a investigação de pagamento de propinas feito no exterior por empresas com forte presença no mercado americano. O combate à corrupção alcançou cinco continentes e gerou multas vultosas - US$ 800 milhões num único caso.

Mas, enquanto o governo tenta apanhar os violadores da Lei Contra Práticas de Corrupção no Exterior (FCPA, na sigla em inglês), alguns céticos apontam para possíveis consequências indesejadas da iniciativa, que, segundo eles, pode fazer a corrupção proliferar nos mercados emergentes.

Andy Spalding, pesquisador da fundação Fulbright na Índia e ex-advogado de fraudes no setor financeiro em Washington, que pesquisa o impacto da FCPA nos países emergentes, diz que a aplicação da lei pode estar fazendo com que as empresas temam investir em países em desenvolvimento onde a corrupção não é reprimida e a cobrança de propina é comum.

Se as empresas americanas pararem de investir nos mercados emergentes, outros países que os defensores do combate à corrupção não consideram interessados em combater as propinas aumentarão seus investimentos, diz ele. "Esses 'cavaleiros negros' se moverão para preencher a lacuna", escreveu Spalding num relatório recente. "A economia mundial poderia lentamente se dividir em duas economias: uma onde a corrupção é tolerada e outra em que não é."

A FCPA, aprovada em 1977 mas em geral ignorada até a década passada, proíbe que empresas americanas ou listadas em bolsas dos EUA paguem ou ofereçam pagamento a autoridades ou a empresas estatais estrangeiras em troca de vantagens em negócios. A lei proíbe até dar presentes.

O Departamento de Justiça, junto com a SEC, a comissão de valores mobiliários dos EUA, usou a FCPA para aplicar enormes multas e punições contra grandes e pequenas empresas multinacionais.

Pelo menos 120 companhias foram investigadas por violações da FCPA até junho. As autoridades americanas também dizem que foram bem-sucedidas em encorajar outros países a adotar suas próprias leis anticorrupção.

Um dos casos mais importantes da aplicação da lei envolve o conglomerado industrial alemão Siemens, acusado de gastar mais de US$ 1 bilhão para corromper funcionários de governos em todo o mundo com o objetivo de ganhar contratos de infraestrutura. Em dezembro, a Siemens, embora sem admitir culpa, aceitou pagar US$ 800 milhões em multas ao governo dos EUA para encerrar o caso.

Na semana passada, a Control Components, fabricante americana de roupas especiais para empresas de petróleo e usinas nucleares, declarou-se culpada de um esquema de corrupção de dez anos em 36 países. A empresa aceitou pagar multa de US$ 18,2 milhões.

Os defensores da causa anticorrupção elogiam a FCPA por ajudar a eliminar a corrupção no mundo.

"A FCPA é um marco que, na nossa opinião, deveria ser seguido por outros governos", diz Nancy Boswell, presidente da Transparência Internacional-USA. "O que é vital é uma ação consistente e coordenada de todos os países exportadores para obedecer à proibição de propinas."

A ideia de que o combate à corrupção prejudica os investimentos nos mercados emergentes circula há algum tempo. A pesquisa de Spalding refere-se a estudos acadêmicos, inclusive uma análise de um economista da Escola de Governo John F. Kennedy, da Universidade Harvard, mostrando que, desde que a FCPA foi sancionada, os investimentos de empresas dos EUA em países considerados corruptos não cresceu com a mesma rapidez com que cresceriam se a lei não estivesse em vigor.

Na opinião de Spalding, um dos principais problemas do cumprimento da lei é o valor cada vez mais alto das multas, que pode arrefecer os negócios em certos países. Outros críticos da FCPA, inclusive alguns defensores das medidas de combate à corrupção, dizem que a lei é muito vaga.

O Departamento de Justiça divulga em seu website um "Guia para profissionais sobre a FCPA" e também oferece orientação a empresas sobre transações com potencial de questionamento.

Essa orientação não é suficiente, alegam alguns especialistas. Por exemplo, a FCPA não especifica quanto dinheiro constitui uma propina; as empresas têm que adivinhar se o pagamento de um jantar de US$ 100 pode lhes trazer problemas. "Se a empresa decidiu assumir o risco de entrar num mercado sem transparência e corrupto, dê a ela todas as ferramentas que puder", diz Alexandra Wrage, presidente da Trace International, consultoria sem fins lucrativos de Washington especializada em regras contra corrupção.

Apesar desses problemas, Wrage diz que o argumento de que as empresas estão sendo "prejudicadas" pela FCPA é exagerado. As empresas dos EUA e outras multinacionais com atuação no país costumam ser as únicas com tecnologia avançada para realizar certos projetos, como perfuração complicada de poços de petróleo, o que torna improvável que empresas de países mais corruptos tentem obter esses contratos.

Como o maior esforço anticorrupção, muitas empresas definiram como navegar seus investimentos no mundo em desenvolvimento sem precisar abandonar esses mercados inteiramente, diz Manny Alas, co-diretor de acompanhamento da FCPA da auditoria e consultoria PricewaterhouseCoopers. "O nível de conhecimento e informações subiu muito", diz ele. "As pessoas estão sendo muito mais inteligentes em como estruturar essas questões de forma a não se compromete mais adiante."


EUA ampliam ações contra pagamento de propina no exterior
Dionne Searcey, The Wall Street Journal - Valor Econômico - 6/8/2009 - Grifo meu

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