Governo queria Lina fora da CPI
Adriana Fernandes e Edna Simão
O Estado de São Paulo - 14/7/2009
O governo federal começou a se armar para enfrentar a CPI da Petrobrás com a demissão da secretária da Receita Federal, Lina Vieira. A avaliação é que Lina não era a mais indicada para defender o governo na CPI. Mesmo com a queda da arrecadação, ela só ficou “queimada” no Palácio do Planalto por causa do episódio da Petrobrás.
Lina foi surpreendida com a sua demissão nas páginas do jornal O Globo, sábado, e administra agora outra crise: os superintendentes ameaçam pedir demissão em solidariedade. Todos foram indicados por ela. Até o início da noite de ontem, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, evitava comentar o assunto. “Isso não é o assunto da conversa. Não tenho que confirmar nada”, disse, após sair da reunião ministerial na Granja do Torto. Se não confirmou, Mantega tampouco desmentiu.
A falta de comunicação oficial da demissão de Lina, segundo assessores, impôs um desgaste a Mantega e seu secretário executivo, Nelson Machado. Machado, que indicou Lina e nos bastidores era quem comandava a Receita, é um dos cotados para o posto. Outro nome é o do presidente do Conselho de Contribuintes, Carlos Alberto Barreto, remanescente da equipe do ex-secretário Jorge Rachid.
A secretária sofria pressões do governo e do corporativismo da casa. Ela assumiu há 11 meses e deu início a um desmonte do comando de postos-chave da Receita. A estratégia gerou insatisfação na corporação e disputa de poder, afetando as atividades do órgão, como a fiscalização. As metas e a Estratégia Nacional de Fiscalização, com resultados que seriam alcançados nos próximos anos, foram deixados de lado, sem que se repassasse uma nova orientação.
A demissão de Lina, segundo assessores, explicita a crise institucional que abateu o órgão, considerado um dos mais importantes do setor público federal e com papel decisivo para economia e o equilíbrio das contas públicas. A situação de caos no atendimento dos contribuintes, apontado pela própria secretária alguns dias depois da sua posse, também não foi solucionada. Ao contrário, agravou-se com o retorno dos servidores do Ministério da Previdência que não quiseram permanecer no quadro da Receita, depois da absorção da Secretaria de Arrecadação Previdenciária.
Especializados na cobrança das contribuições previdenciárias, esses servidores fizeram falta no atendimento, na avaliação dessas fontes.
Não bastassem os problemas internos, o cenário de crise financeira, retração da atividade econômica e queda da arrecadação amplificaram as distorções na condução do dia a dia das atividades da Receita Federal.
Segundo uma fonte graduada do governo, Mantega demorou a perceber que o órgão estava se desestruturando. O ministro, de acordo com a mesma fonte, estaria mais envolvido na discussão e anúncio das medidas anticrise. Ele teria subestimado o tamanho da crise interna na Receita e agora foi pressionado pelo Palácio do Planalto a demitir Lina. Há alguns dias, assessores do gabinete do ministro ainda insistiam na versão de que o bombardeio público contra a secretária partia do grupo de servidores ligados ao ex-secretário Jorge Rachid.
Outro foco de resistência seriam as instituições financeiras, que, nos bastidores, reagiam ao aparelhamento da Delegacia de São Paulo, que deveria intensificar a fiscalização das atividades dos bancos. Essa versão, no entanto, não prospera. Isso porque o reforço na delegacia da Receita em São Paulo só recentemente foi concluído, com a remoção dos últimos servidores. Portanto, como ponderou um assessor, não houve tempo para que a fiscalização surtisse efeito.
“É mais uma espécie de saída honrosa para a secretária”, reconheceu uma fonte do Ministério da Fazenda. Ninguém questiona a necessidade de renovação do comando da Receita, remanescente do governo Fernando Henrique Cardoso. A questão foi o momento do processo e a forma de condução, considerados inadequados porque os sinais da crise já estavam evidentes. “Não deu certo, foi um problema de má gestão”, admitiu um assessor de Mantega.
Em meio à desarticulação das atividades, a crise aberta com a decisão da Petrobrás de compensar créditos tributários de R$ 4 bilhões só agravou a insatisfação com Lina. À revelia do próprio Mantega, ela teria orientado a divulgação de uma nota contestando a estatal, daí a avaliação de que seu afastamento seria uma forma de o governo não respaldar um eventual depoimento de Lina na CPI da Petrobrás.
A oposição já anunciou que vai convocar a secretária para esclarecer a mudança de contabilidade da estatal e a forma como foram classificados como créditos tributários cerca de R$ 4 bilhões utilizados para compensar o pagamento de impostos.
Grifo meu.
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