Opção da Petrobras não foi isolada e pode parar na Justiça
Valor Econômico - 13/5/2009
A iniciativa da Petrobras de alterar a contabilização das variações cambiais no cálculo do Imposto de Renda (IR) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) foi tomada por outras companhias e deve gerar uma nova disputa entre Receita Federal e empresas. No caso da Petrobras, a mudança deu origem a um crédito tributário utilizado entre dezembro e março para compensar R$ 3,94 bilhões em PIS/Cofins e Cide, segundo informações da companhia.
O saldo de crédito tributário foi obtido depois que a Petrobras resolveu mudar a forma de contabilização das variações cambiais. No início de 2008, os valores eram apurados pela companhia pelo regime de competência. Isso significa que as variações cambiais de valores de direitos a receber e de obrigações a pagar eram considerados para IR e CSLL assim que reconhecidos formalmente pela contabilidade.
No decorrer de 2008, porém, a Petrobras foi para o regime de caixa, pelo qual esses valores são considerados para IR e CSLL somente quando liquidados. Ou seja, quando efetivamente recebidos ou pagos. Como a mudança foi feita num quadro de valorização do dólar, o regime de caixa trouxe uma vantagem fiscal para a empresa, que fechou o ano com resultados tributáveis menores, dando origem a um crédito a seu favor. Em relação ao regime aplicado em 2009, a empresa informa que "essa decisão pode ser tomada pela companhia até o dia 30 de junho de 2010".
Tributaristas procurados pelo Valor dizem que, em função da valorização inesperada do dólar no ano passado, houve uma preocupação das empresas em verificar os efeitos da variação cambial no IR e na CSLL. "Cerca de cinco clientes fizeram a mudança de regime durante o ano", diz a sócia de um grande escritório que não quis ter seu nome identificado. Ela explica que desde 2000 as empresas podem optar por contabilizar os efeitos de variação cambial pelo regime de caixa ou competência.
Segundo ela, a discussão entre Fisco e empresas está surgindo agora porque em 2008 houve uma mudança brusca de quadro cambial que surpreendeu muitas empresas e provocou a mudança de opção no decorrer do ano.
Segundo a Receita, em texto enviado à imprensa, uma vez feita a opção pela competência ou pelo caixa, não há mais possibilidade de alterar o regime de contabilização no decorrer do ano. Alguns tributaristas discordam.
"Não existe manifestação irretratável para essa questão", diz Andréa Bazzo Lauletta, sócia do Mattos Filho Advogados. Segundo ela, é facultada às empresas fazer ajustes durante todo o decorrer do ano, inclusive migrar do regime de competência para o caixa ou vice-versa. Para as empresas que estão apurando IR pelo lucro real anual, diz, o imposto é devido de acordo com o resultado em 31 de dezembro.
Pela legislação essa opção envolve quatro tributos federais: além do IR e da CSLL, também o PIS e a Cofins. Pedro Miguel Ferreira Custódio, do Souza, Schneider e Pugliese Advogados, explica que o efeito atualmente ficou mais restrito ao IR e à CSLL. Desde 2004, lembra, as receitas de variação cambial contam com alíquota zero de PIS/Cofins para as empresas que estão no cálculo não-cumulativo das duas contribuições. A alteração de competência para caixa, salienta Custódio, permite apenas a postergação do pagamento e não a eliminação da tributação.
O consultor Pedro César da Silva, da ASPR Auditoria e Consultoria, diz que as empresas tentam estimar no início do ano se o melhor regime é o de caixa ou de competência, mas uma mudança cambial acaba surtindo efeitos inesperados. Ele lembra que não há uma receita específica para todas as empresas, já que a escolha do regime depende de como estão estruturadas as obrigações e direitos a receber sujeitos à variação do dólar.
Segundos os tributaristas, a escolha pelo regime de contabilização é formalizada na declaração entregue pelas pessoas jurídicas à Receita Federal. A declaração relativa ao ano de 2008 pode ser entregue até 30 de junho de 2009. A Petrobras informa que formalizará a definição relacionada a 2008 para a Receita dentro desse prazo.
Questionada sobre o assunto, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) informou que, do ponto de vista das obrigações contábeis - que é a alçada de competência da autarquia - não se verificam problemas. "No caso em questão não há qualquer problema de natureza contábil envolvido, tendo em vista que a companhia continua a reconhecer seus tributos pelo regime de competência, mesmo que haja mudança temporal quanto ao seu efetivo desembolso. Isso significa que não há alteração no resultado do exercício bem como no cálculo dos dividendos como decorrência da mudança na forma de desembolso", informou a área técnica da autarquia, por meio de nota.
A CVM esclareceu ainda que não houve nem está prevista qualquer mudança na forma de contabilização dos tributos. "Todos eles têm que continuar a ser reconhecidos por regime de competência, não podendo ser registrados apenas por regime de caixa. Um especialista em normas contábeis consultado pelo Valor também diz que não visualiza irregularidades e que as práticas contábeis adotadas foram de acordo com a legislação.
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