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24 maio 2009

Pesquisa

A Folha de São Paulo conta a história de um dos principais pesquisadores brasileiros (A vida para a pesquisa, Antonio Gois, 24/5/2009):

A partir das histórias de Wladimir Lobato Paraense aprende-se muito sobre a medicina e a ciência no Brasil. Seus 94 anos fazem dele um dos mais velhos cientistas ainda em atividade no mundo.

Diariamente -inclusive aos sábados, domingos e feriados- Lobato vai a pé ou mesmo dirigindo o próprio carro, de sua casa, na vila residencial do campus da Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz), no Rio, para o laboratório onde ainda hoje realiza estudos com caramujos.

Malacologista (profissional especialista em moluscos) de reputação internacional, suas pesquisas foram fundamentais no combate à esquistossomose, doença que, ainda hoje, estima-se que atinja mais de cinco milhões de brasileiros.

"Os estudos do doutor Lobato foram um divisor de águas. Antes, os pesquisadores não sabiam distinguir as espécies de moluscos que transmitiam das que não transmitiam a doença. Foi ele, praticamente sozinho, que identificou quais eram essas espécies", conta Otávio Pieri, pesquisador e especialista em esquistossomose.

Lobato nunca reclamou do trabalho e não pensa em parar: "Vou fazer o que em casa?".

Obstinação

Sua obstinação pela pesquisa científica começou quando ainda era criança, e seu caminho natural foi ingressar aos 16 anos, em 1931, na Faculdade de Medicina do Pará, já que não existiam ainda cursos de biologia no Estado.

Naquela época, o currículo era cópia fiel do que se ensinava nas universidades francesas. Aprendia-se basicamente por livros e, antes mesmo de começar o curso, a faculdade chegou à sua porta, por meio de uma encomenda dos correios com a coleção completa de todos os periódicos de que precisaria.

Foi uma surpresa de seu padrinho, rico fazendeiro paraense, que passara por Paris meses antes e resolveu fazer um agrado a seu afilhado.

O curso, no entanto, só foi concluído anos mais tarde no Recife (PE). Para isso, foi preciso que ele vendesse o único bem de que dispunha: um anel que ganhara após concluir o curso de contabilidade, feito paralelamente ao de medicina.

Seu objetivo era chegar ao Rio de Janeiro, mas o dinheiro era suficiente apenas para uma passagem até o Recife, na terceira classe do Ita, barco que ligava o Rio ao Norte do país.

O sonho de se instalar no Rio só viria a se concretizar anos depois, e por influência de Assis Chateaubriand, que procurava talentos no Nordeste e financiava -com o dinheiro de outros empresários- seus estudos no Sudeste.

Ao receber Lobato e outros cientistas em seu escritório, o maior empresário de telecomunicações do Brasil logo se encantou com a história dos rapazes, pegou o telefone e ligou para vários empresários determinando que concedessem a eles uma bolsa de estudos.

A de Lobato foi paga pelas indústrias de papel Klabin. "O valor era de um conto de réis. Um bocado de dinheiro na época."

Inicialmente, Lobato foi para São Paulo, onde estudou na USP. Depois, morou no Rio, em Belo Horizonte e em Brasília, até voltar ao Rio e se instalar definitivamente no campus da Fiocruz, em 1977, onde mora e trabalha até hoje.

"Ele poderia perfeitamente parar de trabalhar e morar em uma casa em frente à praia. Mas prefere viver dentro do campus, pois isso permite que vá ao laboratório até aos sábados e domingos", diz o cientista José Rodrigues Coura, amigo de Lobato há 40 anos.

Coura diz que seu colega é conhecido pelo rigor acadêmico. Quando foi vice-presidente de pesquisa da Fiocruz (de 1976 a 1978), queria reformular o instituto contratando jovens talentosos. Fez questão de elaborar as questões da prova.

"É verdade que o nível havia caído muito ao longo dos anos devido à massa de estudantes que se formava nas áreas médicas, mas ele foi tão rigoroso que, de 200 vagas oferecidas, apenas dois candidatos passaram", lembra Coura.

Além de se dedicar ao trabalho, um dos poucos hobbies do cientista é dirigir. Mas sua mulher, Lygia dos Reis Corrêa, conta que só o deixa pilotar dentro do campus.

"Ele tem, aos 94 anos, o mesmo fascínio por carros que um menino que ganha um automóvel de brinquedo. Mas não deixo que ele dirija fora do campus de jeito nenhum. Aqui, todos dão passagem", diz ela.

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