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10 março 2009

Remuneração e executivos da Merrill no Brasil

Merrill Lynch fez aposta cara no Brasil quando mercado engasgava
Antonio Regalado, The Wall Street Journal
10/03/2009

No início do ano passado, a Merrill Lynch & Co. apostou pesado no Brasil quando atraiu um ex-banqueiro de investimentos do UBS Pactual, Alexandre Bettamio, e nove outros especialistas em fusões no país, oferecendo-lhes milhões em bônus garantidos. Bettamio recebeu pelo menos US$ 7 milhões, segundo pessoas a par da questão.

Mas os banqueiros de investimentos da Merrill na América Latina, incluindo Brasil, México e Argentina, geraram receita de uns US$ 50 milhões até o fim de dezembro, enquanto criaram pelo menos US$ 100 milhões em despesas, a maioria ligada a salários, disse uma pessoa familiarizada com os resultados. A Merrill não quis comentar os números.

Embora esses valores sejam só uma gota no prejuízo total de US$ 27,6 bilhões da empresa em 2008, o revés é um raro exemplo de banqueiros de investimento que custaram a seu empregador mais do que renderam. Os bônus também mostram como a Merrill estava disposta a pagar agressivamente por talento, enquanto conduzia seu ambicioso plano de expansão fora dos Estados Unidos, num período em que já contabilizava perdas gigantescas com suas operações.

Durante o boom do mercado, os bônus pré-estabelecidos e outras mordomias eram oferecidos rotineiramente pelas firmas de Wall Street que tentavam incrementar suas operações ao redor do mundo. A Merrill não foi considerada especialmente esbanjadora, mas o pagamento em torno de US$ 3,5 bilhões em bônus durante seus últimos dias como uma empresa independente lançou uma luz nada lisonjeira sobre seu sistema de remuneração. A Merrill fez acordo para ser comprada pelo Bank of America Corp. em setembro, mas agora seus bônus, pagos em dezembro, estão sendo investigando pelo procurador-geral do Estado de Nova York, Andrew Cuomo.

Entre os executivos da Merrill intimados por Cuomo está Andrea Orcel, o principal banqueiro de investimentos da Merrill, que teve um papel crucial nas contratações brasileiras. O ex-presidente John Thain também considerava o Brasil como uma das oportunidades de crescimento mais promissoras para a empresa.

"As perspectivas de crescimento fora dos EUA na verdade são melhores do que nos EUA, e não há motivo para não lucrarmos com isso", disse Thain em janeiro de 2008.

Para atrair os dez banqueiros brasileiros, oriundos principalmente do UBS Pactual e do Credit Suisse Group, a Merrill ofereceu pagamentos garantidos, que recrutadores e pessoas a par das operações da firma acreditam estar na faixa de US$ 50 milhões a US$ 60 milhões em dinheiro e ações.

Uma porta-voz da divisão do Bank of America que inclui a Merrill disse que a empresa não comenta sobre os bônus, mas que as operações latino-americanas foram de modo geral lucrativas em 2008. "A Merrill Lynch obteve na América Latina o segundo ano mais lucrativo da sua história, e o Brasil foi o que mais contribuiu para esse feito", disse a porta-voz.

Uma chuva de subscrições para ofertas iniciais de ações ajudou a transformar São Paulo num dos mercados mais lucrativos do mundo para bancos de investimentos, em parte por causa da falta de gente talentosa. Em 2007, os salários na versão local de Wall Street, a Avenida Brigageiro Faria Lima, tinham subido de 20% a 30% mais do que cargos equivalentes em Nova York, segundo recrutadores.

A Merrill não foi a única empresa a oferecer salários polpudos no Brasil. Mas nenhum concorrente se expandiu tanto nos dias da alta do mercado. "Esses valores eram realistas para o mercado daquele momento", diz Ademar Couto, consultor de capital humano da firma de recrutamento Ray & Berndtson Group em São Paulo. "Hoje em dia, estão totalmente fora da realidade."

Segundo um memorando interno da Merrill, a "expansão de larga escala na equipe" deveria revigorar os negócios da Merrill e "prejudicar" as operações dos dois bancos suíços, que estão entre os maiores do mercado brasileiro de banco de investimentos. Nos anos 90, a Merrill tinha um papel importante no país, mas perdeu mercado quando ficou fora da onda de aberturas de capital de empresas de médio porte.

Ainda em setembro, a Merrill continuava a elogiar Bettamio e sua turma, incluindo Adriano Borges, um especialista em fusões no setor imobiliário que foi recrutado quando trabalhava no Credit Suisse. A equipe foi elogiada por Thain e o presidente do Bank of America, Kenneth Lewis, pouco depois de o banco americano, sediado em Charlotte, na Carolina do Norte, anunciar a aquisição da Merrill.

Mas a expansão das operações brasileiras da Merrill não poderia ter ocorrido num momento pior. Quando a equipe de Bettamio chegou, o mercado de abertura de capital no Brasil estava praticamente paralisado.

No fim do ano passado, a Merrill tinha perdido ainda mais brilho na região. Para todo o ano, ela caiu para a décima colocação ou pior em operações latino-americanas com dívidas, ações ou fusões e aquisições, segundo a Thomson Reuters. No Brasil, a Merrill foi responsável por apenas US$ 330 milhões em novas operações com ações, ficando em 14º lugar, com uma participação de 1,8% do mercado. Em 2007 a Merrill estava em 5º.

Também não ajudou que a Merrill teve se retirar da abertura de capital, em junho, da petrolífera OGX Petróleo e Gás Participações SA, depois que o analista de petróleo e gás da firma em Nova York desconfiou da polpuda avaliação para a empresa, de US$ 22 bilhões. Isso custou à Merrill cerca de US$ 30 milhões em comissões.

Apesar dos resultados ruins, a Merrill ainda devia milhões em bônus garantidos, o que provocou dificuldades para pagar outros executivos. Bettamio, que agora chefia as operações da Merrill no Brasil, não devolveu dinheiro nenhum de seu bônus, disseram pessoas a par da situação. Mas, depois que a Merrill cancelou as festas de fim de ano para economizar, Bettamio e outros pagaram do próprio bolso uma festa no Cafe de la Musique, um restaurante da moda em São Paulo.

O Bank of America afirmou que ainda espera que as contratações brasileiras deem o devido retorno à firma. "Contratamos a equipe com um plano de longo prazo em mente, e estamos satisfeitos porque eles estão atendendo às nossas expectativas", disse um porta-voz. "Nosso compromisso é continuar construindo nossa marca e nossa capacidade no Brasil."

(Colaborou Susanne Craig)

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