Contratos provocam prejuízos recordes
Valor Econômico - 30/3/2009
Os balanços de 2008 da Sadia e da Aracruz revelaram que os derivativos contratados pelas companhias para ganhos financeiros provaram ser mais tóxicos do que imaginado inicialmente. Além de não trazerem lucro, geraram perdas bilionárias. A contínua escalada do dólar durante o quarto trimestre ampliou os prejuízos estimados quando os problemas foram revelados ao público. A perda da Sadia com os contratos foi 3,3 vezes maior: no lugar dos R$ 760 milhões projetados inicialmente, R$ 2,6 bilhões sairão do caixa da empresa no total. No caso da Aracruz, o prejuízo foi 2,6 vezes superior ao R$ 1,9 bilhão inicialmente calculado, pois transformou-se numa dívida de R$ 5,1 bilhões.
O episódio dos derivativos levou a Sadia a apresentar o primeiro prejuízo líquido anual de seus 64 anos de história. A última linha do balanço do ano passado ficou negativa em R$ 2,5 bilhões, comparado a um lucro de R$ 768 milhões em 2007. Apenas no quarto trimestre, a perda foi de R$ 2 bilhões, frente a lucro de R$ 375 milhões no mesmo intervalo do ano anterior.
O prejuízo foi anunciado na sexta-feira. Durante teleconferência com jornalistas, Gilberto Tomazoni, presidente da companhia, tentou dar um tom otimista ao futuro da companhia. Chegou até mesmo a afirmar que "a Sadia não está procurando ninguém, ela é que está sendo procurada", quando uma eventual capitalização ou associação com a concorrente Perdigão entrou em pauta. Foi praticamente o único comentário sobre a possível fusão com a rival, já que preferiu não tratar do assunto.
O prejuízo da Sadia só não foi maior porque a empresa foi beneficiada por uma reversão de Imposto de Renda e Contribuição Social de R$ 703 milhões em 2008, dos quais R$ 450 milhões foram lançados no quarto trimestre.
O saldo negativo do balanço foi basicamente provocado pelas perdas com os derivativos, mas a pressão nos custos de grãos - principal matéria-prima da empresa - também pesou nas contas operacionais.
Apesar de mostrar um crescimento de 16% na receita líquida do quarto trimestre, para R$ 3,1 bilhões, o lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização (lajida) recuou 21,7%, para R$ 343,5 milhões, na comparação com igual intervalo de 2007. No ano, o faturamento líquido foi de R$ 10,7 bilhões, com alta de 23,2%, enquanto o lajida recuou 0,7%, para R$ 1,1 bilhão. Na prática, isso significa que a margem do quarto trimestre caiu de 16,6% para 11,2% e a anual, de 13,5% para 10,9%.
A despesa financeira líquida foi de R$ 2,7 bilhões no quarto trimestre e de R$ 3,9 bilhões no acumulado de 2008. Isoladamente, os derivativos responderam por R$ 2,0 bilhões na despesa trimestral e R$ 2,6 bilhões na anual.
Do total lançado no ano de despesas dos derivativos, R$ 706 milhões foram de efeito caixa, de contratos já encerrados, e R$ 1,9 bilhão serão desembolsados até setembro. Welson Teixeira, diretor de relações com investidores, explicou que o total a vencer terá pouca modificação daqui para frente, independentemente da variação cambial. Isso porque os contratos de venda de dólar foram compensados com operações de compra, que permitem travar a perda. "Mas ainda temos de carregar o peso da dívida nos próximos trimestre."
A Sadia fechou dezembro com R$ 8,5 bilhões de endividamento bruto, sendo R$ 4,1 bilhões com vencimento durante 2009. Para fazer frente aos vencimentos, a empresa tinha R$ 3,5 bilhões de caixa, mas apenas R$ 980 milhões disponíveis, pois R$ 1,7 bilhão estava comprometido em garantia para os bancos, por conta dos derivativos, e o restante em aplicações de baixa liquidez.
Dos vencimentos deste ano, R$ 1,4 bilhão está previsto para o primeiro trimestre. "Esse total está tranquilo, já renegociamos", afirmou, explicando que os prazos conseguidos variam de 180 a 360 dias. Outros R$ 2,0 bilhões vencem no terceiro trimestre. "Estamos concentrados no primeiro e no terceiro trimestre."
Atualmente, a dívida líquida equivale a 5,8 vezes o lajida. O plano é alcançar um indicador entre 3,0 e 4,0 vezes em 2010.
Apesar do evidente aperto financeiro, a Sadia planeja investir R$ 600 milhões neste ano, para terminar as obras de expansão já em andamento, que consumiram R$ 1,8 bilhão em 2008. "A empresa não corre nenhum risco de insolvência", disse Tomazoni, quando questionado sobre a origem dos recursos diante do cenário.
O executivo voltou a relatar os planos de vender ativos não operacionais e operacionais não prioritários para explicar a fonte do dinheiro. Foram mencionados como alvos de venda a fábrica da Rússia, a unidade de bovinos e também terras reflorestadas, centros de distribuição e fábricas de ração. A outra alternativa citada é uma eventual capitalização por um novo sócio. Questionado sobre a demora de uma solução, Teixeira disse: "Essas coisas demoram. Não se pode perder de foco o valor da empresa e fazer as coisas às pressas."
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