Novo modelo trará testes à governança das companhias
Gazeta Mercantil - 6/11/2008
São Paulo, 6 de Novembro de 2008 - Os sistemas de governança corporativa das empresas brasileiras, cujas falhas foram evidenciadas nos recentes episódios de perdas com derivativos, terão um teste permanente até 2010. Durante o período, as companhias do País enfrentarão o desafio da convergência contábil. A necessidade deve, segundo especialistas, reforçar os papéis e responsabilidades de administradores e conselheiros. Isso deve ocorrer devido ao maior nível de subjetividade a que os balanços estarão submetidos sendo preparados pelo modelo International Financial Reporting Standards (IFRS). (...)
Com o uso do IFRS, desaparecem tetos, pisos e regras prontas para elaborar balanços. Ambos darão lugar à tentativa de fazer as melhores escolhas contábeis para situações específicas da vida das empresas. Será puro julgamento. Isso significa que conselhos fiscais e de administração terão de estar prontos para interpretar cenários. "Um bom sistema de governança corporativa tem de contar com diversidade. As empresas precisarão manter em seus quadros especialistas nas temáticas contábeis para que as coisas aconteçam da melhor maneira", diz Heloisa Bedicks, diretora executiva do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC).
O grande desafio, porém, será encontrar profissionais que dêem conta da tarefa. A mão-de-obra é escassa. Afinal, até mesmo as principais empresas de auditoria com atuação no Brasil têm enfrentado o problema. "O que tem acontecido é que os Conselhos fiscal e de administração das companhias têm se apoiado bastante nos serviços de auditoria. Os profissionais que entendem de convergência e normas internacionais em profundidade são considerados moscas brancas pelo mercado", brinca André Coutinho, sócio da KPMG.
O IFRS trouxe outra novidade considerável às atividades de contadores e auditores. "Esses profissionais no Brasil são apaixonados pelo conservadorismo, o que entra em confronto direto com o princípio de neutralidade contido no espírito das normas internacionais", diz Nelson Carvalho.
Mudanças no direito
O processo de convergência contábil para as empresas brasileiras, que foi reforçado pela aprovação da lei 11.638, no fim do ano passado, também trouxe novidades para advogados especializados em mercado de capitais. A maior delas é harmonizar as distinções entre os sistemas de direito no Brasil e na Europa, de onde originaram-se as normas IFRS. "Temos no País a tradição de um direito formal e escrito, baseado em regras. Esse é o maior choque com a incorporação do novo modelo, que se orienta mais por práticas, necessidades e costumes", compara Ana Claudia Utumi, especialista em direito tributário do escritório TozziniFreire .
Paulo Aragão, um dos sócios do Barbosa Müssnich & Aragão, cita outras dificuldades que surgirão para os advogados que estarão próximos ao processo de convergência contábil. "Os mundos do direito e da contabilidade passarão por um inevitável confronto", afirma. "Não há nada mais difícil para um advogado brasileiro do que ter de lidar com comportamentos e condutas. Vai ser difícil aprender a pensar a expressão do fenômeno econômico. Só assim será possível entender por que e como se faz contabilidade", afirma Aragão.
(Gazeta Mercantil/Finanças & Mercados - Pág. 4)(Luciano Feltrin)
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